Como esta e' a primeira actualizacao do "The Palace" nao iremos ter poesia amadora. Em vez disso,
teremos uma compilacao dos melhores sonetos de Florbela Espanca.
As beeing the first time this page goes to the Internet, there will not be amateur poetry. We will have
only poems of a Portuguese female Poet, Florbela Espanca.
FLORBELA ESPANCA
A obra de Florbela é a expressão poética
de um caso humano. Decerto para infelicidade
da sua vida terrena, mas glória do seu
nome e glória da poesia portuguesa, Florbela
viveu a fundo esses estados quer de depressão,
quer de exaltação, quer de concentração
em si mesma, quer dispersão em tudo, que
na sua poesia atingem tão vibrante expressão.
Mulheres com talento vocabular e métrico
para talharem um soneto como quem talha
um vestido; ou bordarem imagens, como
quem borda a missanga; ou (o que é ainda
menos agradável) se dilatarem em ondas de
verbalismo como quem se esperguiça por
nada ter que fazer, quer dizer - naturalmente
as houve, e há, antes e depois da vida
de Florbela. [...] Também, decerto, apare-
ceram na nossa poesia autênticas poetisas,
antes e depois de Florbela. Nehuma, porém
até hoje, viveu tão a sério um caso tão
excepcional e, ao mesmo tempo, tão
significativamente humano. Jorge de Sena dirá:
tão expressivamente feminino.
SER POETA
Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!
É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!
É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
é condensar o mundo num só grito!
E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!
ÁRVORES DO ALENTEJO
Horas mortas... curvadas aos pés do Monte
A planície é um brasido... e, torturadas,
As árvores sangrentas, revoltadas,
Gritam a Deus a bênção duma fonte!
E quando, manhã alta, o sol postonte
A oiro a giesta, a arder, pelas estradas,
Esfíngicas, recortam desgrenhadas
Os trágicos perfis no horizonte!
Árvores! Corações, almas que choram,
Almas iguais à minha, almas que imploram
Em vão remédio para tanta mágoa!
Árvores! Não choreis! Olhai e vede:
-Também ando a gritar, morta de sede,
Pedindo a Deus a minha gota de água!
O MEU IMPOSSÍVEL
Minh'alma ardente é uma fogueira acesa,
É um brasido enorme a crepitar!
Ânsia de procurar sem encontrar
A chama onde queimar uma incerteza!
Tudo é vago e incompleto! E o que mais pesa
É nada ser perfeito. É deslumbrar
A noite tormentosa até cegar,
E tudo ser em vão! Deus, que tristeza!...
Aos meus irmãos na dor já disse tudo
E não me compreenderam!... Vão e mudo
Foi tudo o que entendi e o que pressinto...
Mas se eu pudesse a mágoa que em mim chora
Contar, não a chorava como agora,
Irmãos, não a sentia como a sinto!...
SILÊNCIO!...
No fadário que é meu, neste penar,
Noite alta, noite escura, noite morta,
Sou o vento que geme e quer entrar,
Sou o vento que vai bater-te à porta...
Vivo longe de ti, mas que me importa?
Se eu já não vivo em mim! Ando a vaguear
Em roda à tua casa, a procurar
Beber-te a voz, apaixonada, absorta!
Estou junto de ti, e não me vês...
Quantas vezes no livro que tu lês
Meu olhar se pousou e se perdeu!
Trago-te como um filho nos meus braços!
E na tua casa... Escuta!... Uns leves passos...
Silêncio, meu Amor!... Abre! Sou eu!...
Retirado de:
"Florbela Espanca
Sonetos"
BERTRAND EDITORA