UM POUCO DE CULTURA CLÁSSICA...

 

O QUE OCORRE HOJE...

É verdade que há algum tempo atrás a cultura clássica era consumida com grande empenho. Nos tempos atuais, contudo, cada vez mais está restrita a pequenos círculos acadêmicos, usualmente no estudo de Filosofia e Letras Clássicas, até mesmo o ensino de História relega o manancial clássico a segundo plano. Parece que o homem de hoje não era o mesmo da época antiga (as idéias e situações são diferentes, mas o homem é essencialmente o mesmo).

Em épocas passadas, os referenciais clássicos era usados até o excesso e toda uma idealização da Antigüidade foi criada para o ávido mercado consumidor cultural do renascimento, arcadismo, parnasianismo, e todos outros movimentos adjuntos. Não elogio esses tempos, nem reprovo os atuais.

As novas gerações são impedidas do acesso a esse patrimônio. Muitas vezes, tomam a impressão de que são coisas chatas (fenômeno semelhante ocorre com as ciências exatas). Por desconhecimento, perde-se cultura. Por descaso do sistema educacional que descartou essa formação, seja acabando com o latim das escolas, seja deixando Literatura, Química, Física, por exemplo, no lixo curricular e didático atual, abordando conteúdos sem dar o menor estímulo ao aluno. Não é a toa que tanta decomposição cultural ocorre hoje no Brasil. E que Segure o Tchan quem discordar!

 

Mas essa cultura não desaparecerá. Ficará restrita a uma elite intelectual, que saberá aproveitá-la. Fica a situação pior, já que começa a ocorrer uma posse intelectual por parte de uma elite (que geralmente costuma ter mais recursos para se educar). Um abismo cultural soma-se a um abismo já sócio-econômico. Volto a frisar que não ocorre só com a Cultura, mas com Ciências. A chance de sair um Literato ou um Físico das classes mais pobres da população é o mesmo... mínimo. Não por falta de potencial dos mais pobres, pelo contrário, mas pela falta de educação. Ciência, tecnologia, cultura, formação - cada vez mais privilégios de poucos. Um problema da educação brasileira.

 

UMA EXPERIÊNCIA INSTRUTIVA...

No Politreco, tradicional e consagrado jornal publicado pelo Grêmio Politécnico da USP de 1982 a 1998, pude verificar que de fato a cultura clássica pode ser valorizada. Isso ocorreu com alunos de Engenharia, de Exatas, da Escola Politécnica, faculdade ponta da tecnologia brasileira, o que rejeita qualquer consideração de que isso só interessaria a alguém ligado às ciências humanas.

 

A Deusa Minerva é a deusa da Engenharia e símbolo da Escola Politécnica. Usando esse referencial clássico, no Politreco, escrevi a "epopéia" A FUNDAÇÃO DA ESCOLA POLITÉCNICA. A Fundação era uma história de humor em quatro capítulos que punha os engenheiros que fundaram a Politécnica, Antônio Francisco de Paula Souza e Francisco de Paula Ramos de Azevedo, como engenheiros que serviam nos exércitos dos gregos na lendária GUERRA DE TRÓIA. A partir dessa premissa, Minerva os inspira o cavalo que faria os gregos vencerem a guerra, tendo os dois engenheiros a responsabilidade de projetar e montar a armadilha dos troianos (o primeiro episódio começava com uma engraçada planta do cavalo desenhado segundo normas técnicas). Após a queda de Tróia, Minerva decide fundar a Escola Politécnica empolgada com o sucesso da engenharia. Ocorrem uma série de intrigas com outros deuses, já que Júpiter teme que com o ensino de engenharia a humanidade torne-se tão poderosa quanto as divindades e tente destroná-los (um pouco de ufanismo doméstico). Divertidas interações com as figuras mitológicas surgem quando Minerva leva os engenheiros ao Olimpo para convencer os outros imortais a permitir a fundação da Poli, e as inúmeras confusões que acontecem... mas não vamos contar aqui a história... A FUNDAÇÃO está cheia de ironias irreverentes contra os defeitos do ambiente universitário e os problemas politécnicos, misturando ufanismo pela melhor escola de engenharia do Brasil e uma sátira crítica contra seus desvios. O Grêmio Politécnico possui em seus arquivos cópias dos Politrecos que podem ser consultadas por quem desejar.

 

 O HOMEM AINDA É O MESMO

Foi muito interessante notar o sucesso estrondoso que a FUNDAÇÃO fez junto aos alunos. Em verdade, são muito poucos aqueles que não gostam da mitologia. Escrever de modo a não parecer que os tempos da antigüidade e sua riqueza cultural não são apenas páginas de um livro de História desinteressante do colegial. Levar a cultura de uma forma divertida, esse é o espírito, adequada ao homem de hoje sobre a produção do homem de ontem.

Quem já leu Sêneca? Este autor é um tipo de filósofo universal. Sêneca nos fala do distante Império Romano sob Nero, contudo é um autor tão atual! Atual porque falou do homem, que rigorosamente continua o mesmo desde a antigüidade. Muitos haverão de se identificar com por exemplo, o estado descrito no tratado "Tranqüilidade da Alma".

Daí este aborrecimento, este desgosto de si, este redemoinho de uma alma que não se fixa em nada, esta sombria impaciência que nos causa nossa própria inércia, principalmente quando coramos ao confessar as razões e o respeito humano recalca em nós nossa angústia... Daí a melancolia, a languidez, as mil hesitações de uma alma indecisa, que a semi-realização de suas esperanças prolonga na ansiedade e seu malogro na desolação; daí esta disposição para amaldiçoar seu próprio repouso, para lamentar-se por não ter nada a fazer e para invejar furiosamente todos os sucessos do próximo (pois nada alimenta a inveja como a preguiça desgraçada, e se desejaria ver todo mundo malograr, porque não se soube obter o êxito). Depois deste despeito pelos sucessos dos outros e deste desespero de não ser bem sucedido, começa o homem s irritar-se contra a sorte, a se queixar do século, a se recolher cada vez mais no seu canto e aí abriga sua dor no desânimo e no aborrecimento...

Catulo. Que apaixonado rejeitado do século XX não lerá esse poeta e não entrará em ressonância imediata com os dramas do poeta antigo pela sua Lésbia? Não deixaremos o leitor sem uma amostra:

A tal ponto o meu espírito se desviou, minha Lésbia, por tua culpa,

E ele próprio se arruinou, por sua fidelidade,

Que já não pode querer-te bem, ainda que te tornes a melhor mulher do mundo

Nem deixar de amar-te, seja o que for que fizeres.

Ou que homem não se deparou com o dilema que o historiador Salústio se deparou quando é obrigado a fazer um julgamento das obras e atitudes de outras pessoas:

Mas ainda que igual glória não siga ao escritor e ao autor das coisas, mais difícil me parece, contudo, o escrevê-las: não só porque as palavras devem corresponder aos fatos; mas, porque, se repreendes delitos, serás taxado de malevolência e inveja, se dos bons o grande esforço e glória referes, cada um acreditará de bom grado aquilo que julgar praticável, e o mais o terá por fabuloso.

Em épocas distantes, homens cujos dramas são pouco diferentes dos nossos.

 

NÃO É TAREFA ÁRDUA

Imagens da antigüidade já se incorporaram em nossas referênciais. Todos tem idéia (ainda que estereotipada) do que é um romano ou grego, de suas roupas e templos, quem não viu filmes clássicos como Ben-Hur, Qvo Vadis, Cleópatra e Spartacvs pelo menos uma vez? O legado dessa época se impregnou de uma forma tal que até mesmo em desenhos animados não é difícil encontrar referências, ainda que superficiais a antigüidade. O imaginário cultural já tem essas referências. Retomá-las e aprimorá-las não é difícil, difícil é apresentá-las acessíveis e interessantes. Um desafio para os profissionais de comunicação e para as supostas "vanguardas" culturais.

 

CONCLUSÕES - SE AS HÁ!

 A experiência do Politreco foi muito positiva. Ainda que se trate de um segmento culto da sociedade (universitários) não são ligados diretamente a esses referenciais, por estarem na área de Ciências Exatas e Tecnologia (apesar que pude notar que mesmo na área de Humanas muitas vezes relegam a antigüidade a segundo plano... uma lástima), a absorção da FUNDAÇÃO com suas referências comprovou que a cultura clássica não está condenada a ficar restrita a tomos empoeirados de professores universitários sexagenários mais empoeirados ainda.

 Mas sejamos científicos: receita não as tenho. Apenas posso comentar as impressões que tive com o Politreco. Conclusões, apenas estas. Fica um começo para pensarmos, como resgatarmos os tesouros da cultura clássica, que permearam toda a cultura ocidental para o homem do próximo milênio?

 Fica essa pergunta... pensemos nela...

 

 

 

 LISTA DE FIGURAS

Enchi o texto de figuras "clássicas". É bom dar nomes aos bois, desde o início: o poeta Horácio, o historiador Heródoto, logotipo do Grêmio Politécnico, a síbila de Esmirna pintada por Michelângelo na Capela Sistina, o general Aníbal, o imperador Marco Aurélio e finalmente o poeta Ovídio. Na página ?pessoal?, o triúnviro Marco Antônio. Na página sobre engenharia, os profetas pintados também por Michelângelo na Sistina, em ordem, Jeremias, Isaías e Daniel... pois o engenheiro não é o profeta da modernidade?

N a página principal há outras figuras, uma delas é o julgamento de Páris, a estátua de Augusto, A conjura de Catilina. A primeira é o profeta Amós de Aleijadinho. As tubulações é de um CD-ROM de uma grande fábrica brasileira de tubulações, mas como não é autorizado nem vou citar... mas eles não rpoibiriam mesmo...

 

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