No INTERESSE DA CREDIBILIDADE, a dialética da PREVISIBILIDADE e CONSEQÜÊNCIA do comportamento político.

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O enfoque interdisciplinar de Salvador A.M. Sandoval

As categorias de Sandoval na ciência política e o paradigma cientificista em crise

Implicações do enfoque da Credibilidade no afrontamento político

Numa abordagem, que se demonstrará convergente ao modelo paradigmático, e articulando conceitos da psicologia, sociologia e política, que se debruçam sobre uma realidade que é, por natureza, transdisciplinar, Salvador A. M. SANDOVAL [1997:18], esboça um marco teórico que, ao transgredir os interditos de fronteira entre essas três disciplinas, abre espaço para uma reconstrução de significados, capaz de explicitar os elementos constitutivos de uma primeira via de acesso ao entendimento do fenômeno político.

O enfoque interdisciplinar de Salvador A.M. Sandoval

SANDOVAL visualiza a necessidade de se integrar, no campo dos estudos de comportamento político, uma perspectiva construtivista e interacionista, que permita articular seu significado para a mudança social e individual e assim, também, seus determinantes psicossociais. Nessa perspectiva, propõe-se caracterizar os comportamentos políticos, conforme as seguintes dimensões: 1) o locus do comportamento (os espaços públicos ou privados) e 2) o tipo de comportamento individual ou coletivo. [SANDOVAL, 1997:20]

Ao formalizar o espaço de propriedades resultante da interação dessas variáveis, SANDOVAL nos oferece um ponto de partida para a configuração paradigmática dos elementos constitutivos do INTERESSE DA CREDIBILIDADE do comportamento político, que corresponde na epistemologia da ciência política ao conceito geral e sintético do Interesse da Compreensão Participativa do Discurso - Pístis. [Reproduzimos no Quadro VI o diagrama do comportamento político proposto por este autor.] .

Quadro VI: Determinações do Comportamento Político: Locus do Comportamento [SANDOVAL, 1997:20].

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As categorias de Sandoval na ciência política e o paradigma cientificista em crise

A transcodificação do esquema teórico de SANDOVAL para o modelo paradigmático da epistemologia de síntese, como efetivada no diagrama do Quadro VII, é quase-óbvia. O quadrante do COMPORTAMENTO INDIVIDUAL [do Cidadão e do Indivíduo] articula as categorias da Primeiridade na lógica triádica de inspiração peirceana; o quadrante do COMPORTAMENTO COLETIVO [do Ator Coletivo e do Ator Social] articula as categorias da Secundidade; os conceitos da CONSTRUÇÃO DOS ESPAÇOS PÚBLICO e PRIVADO, correspondem, à dialética habermasiana do FAZER e do AGIR COMUNICATIVOS, respectivamente.

Para corresponder às categorias da Terceiridade, interpolamos no esquema de SANDOVAL os conceitos de SOCIALIZAÇÃO e PARTICIPAÇÃO POLÍTICAS. Poderíamos ter utilizado aqui os conceitos de "participação individual" e de "participação coletiva" [explicitamente propostos por SANDOVAL, 1997:19]. Preferimos, no entanto, utilizar aqui os conceitos clássicos de ciência política, em virtude da sua melhor adequação à dialética da dupla tríade do comportamento político.

De fato, nas categorias da Terceiridade, como expressão da tríade do agir e do fazer comunicativos, torna-se relativamente impróprio falar de "participação individual": de um lado, toda participação política é implicitamente social; de outro, toda individualidade se reconhece no coletivo, socializando-se como condição da sua própria afirmação. Assim, parece-nos que a ênfase que SANDOVAL pretendeu apontar, sobre o caráter personalíssimo da intervenção política dos indivíduos, ficaria melhor figurado pelo conceito de SOCIALIZAÇÃO POLÍTICA - que denota a internalização das normas e valores sociais pelos indivíduos; da mesma forma, a ênfase pretendida por SANDOVAL para a caracterização da intervenção política dos atores coletivos, parece-nos restar bem caracterizada pelo conceito próprio de PARTICIPAÇÃO POLÍTICA.

Quadro VII: Categorias de SANDOVAL no modelo paradigmático: dialética triádica da CREDIBILIDADE e locus do COMPORTAMENTO POLÍTICO.

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O paradigma cientificista em crise e as tentativas de oferecer-lhe uma alternativa - ao se refletirem na ciência política contemporânea - têm cavado um fosso quase intransponível entre os estudos quantitativos e qualitativos do comportamento político. De um lado, sacrifica-se a qualidade dos conceitos à sua instrumentação para a previsão probabilística do comportamento futuro. Assim, por exemplo, têm-se reconhecido sentido ao conceito de "identidade partidária", enquanto permite prever resultados em eleições futuras; descartando-se-o do respectivo horizonte teórico quando, repetidamente, registra insignificância estatística nos resultados de pesquisa. Nessas abordagens, o que é empiricamente insignificante torna-se teoricamente irrelevante - o que se constitui numa conclusão falaciosa e, muitas vezes, injustificável.

De outro lado, a derivação arbitrária e atribuição ad hoc de causas estruturais ao sucesso ou insucesso de partidos em eleições, ou de movimentos sociais na consecução objetivos, têm se constituído na principal falácia de abordagens qualitativas do fenômeno político, que não resistem à objeção da sua infalsificabilidade. Sem pretender polemizar esse conceito e nem subscrever o seu rigor e crucialidade como critério de demarcação do conhecimento "científico" [POPPER, 1959], é lícito questionar-se o fato que nestas abordagens, o que parece teoricamente relevante haverá de ser sempre reafirmado como fator explicativo, mesmo contra a evidência empírica da sua insignificância causal.

Diante de tais estímulos, à esterilidade teórica de um lado, e ao sectarismo político de outro, a academia de ciência política contemporânea tem cultivado uma postura de generosas e mútuas concessões. Isso mesmo que, podendo representar um modus vivendi no bojo da crise paradigmática, corre o risco de eventualmente acumular, em cima do muro das suas indefinições, o pior dos dois extremos no descrédito da sua própria condição. Situação essa que, de alguma forma, se reflete: de um lado, na redução do campo de expectativas sociais que incidem na explicação do fenômeno político, às previsões dos institutos de opinião que informam o FAZER político como ferramenta de marketing eleitoral; e de outro lado, nas justificações fundamentalistas das escolhas políticas, baseadas na extrapolação de conclusões empíricas a partir de quaisquer discursos sobreviventes - sejam esses do Capital, da Bíblia ou do Alcorão, que têm informado, contemporaneamente, o AGIR político de grupos e partidos na exploração do ressentimento das massas.

Implicações do enfoque da Credibilidade no afrontamento político

A perspectiva de nosso enfoque do INTERESSE DA CREDIBILIDADE, nas análises de COMPORTAMENTO POLÍTICO, impacta diretamente na confrontação dessas atitudes [Nota 11]. O conceito que utilizamos - CREDIBILIDADE - foi cunhado recentemente pela análise de sistemas para designar uma qualidade complexa dos cenários [representações ou hipóteses relativas a estados futuros de um sistema], que articula consistentemente expectativas sobre a sua CONSISTÊNCIA e IMPORTÂNCIA, PROBABILIDADE de ocorrência e potencial de REITERAÇÃO.

Sendo a CONSISTÊNCIA de um cenário, a clareza dos nexos que estabelece entre o estado presente e um estado futuro do sistema; a PROBABILIDADE, refere ao grau de expectativa de sua confirmação ou ocorrência; a IMPORTÂNCIA, combina uma apreciação da relevância dos acontecimentos previstos no interesse dos seus protagonistas, com o grau de controle que se dispõe sobre os fatores que condicionam a probabilidade da sua confirmação; e o potencial de REITERAÇÃO, identifica a possibilidade e as condições de recorrência dos acontecimentos previstos e, afinal, do próprio cenário como fator relevante de explicação do fenômeno político.

Face ao critério quantitativista da PROBABILIDADE, a CONSISTÊNCIA e a IMPORTÂNCIA de um cenário, são dimensões complementares e, mesmo, alternativas da CREDIBILIDADE. Um acontecimento político altamente provável, via de regra tem alta CREDIBILIDADE; mas o inverso não é necessariamente verdade. Ao mesmo tempo, o potencial de REITERAÇÃO de um cenário constitui um complemento da sua IMPORTÂNCIA, pela amplificação possível das suas conseqüências.

Assim, um acontecimento político muito pouco provável, uma vez articulado num cenário consistente [que o justifique por uma seqüência de fatos possíveis, os quais, a sua vez, sejam e passíveis de reiteração em diferentes tempos e espaços da vida social, ou cuja conseqüência afete drasticamente a vida dos atores políticos envolvidos], como é o caso da formação de alianças eleitorais vencedoras [mesmo aquelas que reúnem forças políticas ideologicamente contraditórias] e as correspectivas ações e reações dos atores políticos envolvidos ou atingidos, poderá registrar elevada CREDIBILIDADE. Essa que, por sua vez, aumenta na medida em que se tenha pouco controle sobre as variáveis [comportamentos ou atitudes, ações ou reações] determinantes da sua probabilidade.

Nesse enfoque, o INTERESSE CREDIBILIDADE, articula de forma cumulativa e complementar, quatro campos de investigação que pesquisam: a ocorrência de uma dada manifestação da subjetividade estudada - como atitude ou comportamento - caracterizada em nosso modelo pelos conceitos da VOZ [HIRSCHMANN], CONGRUÊNCIA [ECKSTEIN], LEALDADE [HIRSCHMANN,1973] e RELEVÂNCIA [DOWNS/RIKER].

O Quadro VIII a seguir, formaliza a incorporação do esquema teórico proposto por SANDOVAL no paradigma sintético, explicitando a sua correspondência com o conceito emergente, na epistemologia da ciência política, do INTERESSE DA CREDIBILIDADE do comportamento político, através das categorias que articulam os diferentes enfoques da divisão estrutural dos ESTUDOS DE COMPORTAMENTO POLÍTICO.

Quadro VIII: Categorias de SANDOVAL no modelo paradigmático: divisão estrutural dos estudos de COMPORTAMENTO POLÍTICO.

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Nota 11 - O conceito de CREDIBILIDADE aqui utilizado remonta às origens do pensamento político, na fórmula de PÍSTIS = a fé, como confiança na palavra que vai de um homem a um Deus - como confiança, portanto, na relação que articula um cidadão às instituições da cidade - e tem sido, contemporaneamente, resgatada pela análise, como variável relevante nos estudos de comportamento político. Uma abordagem do estado da arte nesse campo é propiciada por BAQUERO e CASTRO, 1996, em artigo sobre "A erosão das bases democráticas: um estudo de cultura política", onde registram que: "Uma das variáveis apontadas ao longo do tempo, como sendo fundamental para a consolidação democrática, é a confiança que os cidadãos depositam nas instituições políticas. A análise dessa dimensão proporciona subsídios para compreenderem-se os mecanismos de ‘inputs’ do sistema político. Dito de outra forma, trata-se de estudar em que medida os entrevistados confiam nas instituições políticas ou acreditam que elas podem de alguma maneira resolver os problemas concretos da população". [BAQUERO e CASTRO, 1996:27] Retorna ao texto

         

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