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Democracia Plebiscitária é um ensaio, que pretende afrontar a necessidade de uma reflexão sobre temas provocativos da atualidade política, incluindo:
a) o enquadramento político do debate recente sobre as formas de governo neste país, numa crônica da conjuntura - de um tempo que já apresenta sinais de esgotamento para o qualificativo de transição democrática, muito embora persistam irresolutos alguns dos desafios, que esse processo sinaliza;
b) o resgate da problemática e dos conceitos subjacentes à teoria democrática, e que emergem tão somente no efetivo exercício da cidadania; os quais, embora relevantes, restam obscurecidos pela tradição conservadora da academia política;
c) os desdobramentos práticos dessa análise, para a consolidação da democracia, no contexto do sistema presidencialista e da sua reforma.
O escopo desses objetivos é desenvolvido ao longo das quatro Partes, em que se divide a obra, numa seqüência de conteúdos, que introduzem uma abordagem da engenharia institucional da consolidação democrática.
A Parte I, reconhece e afirma a imbricação desse trabalho teórico, desenvolvido ao longo de todo o texto, com a estrutura de valores e convicções políticas, de alguma forma, subjacentes à própria biografia do autor. Na seqüência dos Capítulos que a integram, explicitam-se conteúdos relevantes para uma fundamentação teórica da política democrática.a) O capítulo 1 - uma crônica das vicissitudes da engenharia institucional em nosso tempo, identifica alguns obstáculos que o tema e a perspectiva de uma reforma política têm enfrentado, em razão: a) das características do Estado brasileiro; b) do processo de transição do autoritarismo; e c) de alguns comportamentos e atitudes recorrentes da elite política nacional. Neste contexto, critica-se uma concepção cíclica do movimento social e sua conseqüência na estruturação do pensamento conservador.
b) Os capítulos 2 e 3, constituem um esforço para elaborar um marco teórico, a sua vez crítico de uma abordagem formalista de ciência política e comprometido com uma concepção substantiva da democracia. Têm-se por suposto a imbricação da teoria democrática a valores, razão pela qual essa reflexão aborda o tema da igualdade, liberdade e fraternidade. A noção de níveis diferenciados - da estrutura política e do discurso sobre a mesma - permite superar, neste enfoque, o risco inerente às opções maniqueístas do coletivismo e do anarquismo que, privilegiando a igualdade ou a liberdade, acabam por aniquilar a possibilidade de realização histórica de ambos estes conceitos.
c) O capítulo 4, introduz um estudo de fundo, sobre o desprezo aos valores democráticos e suas manifestações, no afrontamento político do cotidiano. Denuncia o processo psicossocial do autoritarismo, que subjaz à degradação dos métodos do combate na política e ao seu desprestígio. Para os mais avisados, a análise adquire endereço certo, na figuração das experiências recentes e ingratas de administradores como Fernando Collor (na Presidência da República) e Alceu Collares (no Governo do Estado do Rio Grande do Sul).
d) O capítulo 5, contextualiza o recurso ao princípio da legalidade, como um desafio tático, e conceitua o pluralismo - conseqüência prática da limitação do poder - como dimensão estratégica de uma política democrática. Na sua formulação concreta, são identificados quatro métodos de controle sobre a concentração do poder social, que a teoria política da democracia tem postulado nos conceitos: do governo republicano, do constitucionalismo, da divisão dos poderes e do federalismo.
Ressalte-se, como elemento central nesta abordagem, o reconhecimento do princípio da fraternidade, como uma categoria essencial da teoria política. No contexto da transição democrática, ainda em curso, as "Campanhas da Fraternidade" da CNBB e o testemunho de amor solidário, deste profeta de um cotidiano intolerável, que é o Betinho, têm exposto à consciência nacional, a situação limite de milhões de brasileiros, submetidos à desigualdade absoluta da fome e da miséria. Triste ciência e vã filosofia aquela que viesse a postular o enquadramento burocrático desse problema, como uma abstrata responsabilidade do poder público. Tangenciariam a mesma lógica de acomodação e de exclusão, que transformou, em décadas passadas, o desenvolvimento e a segurança da sociedade numa questão de Estado, sob o influxo dos autoritarismos de vário matiz.
A Parte II , contextualiza a propositura de quatro teses irreverentes que explicitam os desdobramentos de uma estratégia para a engenharia da construção democrática. Neste particular, o texto avança em território inexplorado e, sobretudo, não convencional. Seguramente, desvela tabus, sinaliza carências e aprofunda uma brecha para a reflexão, sobre as bases de uma nova ordem democrática, ainda não clarificada pelo pensamento político contemporâneo. Esta temática é introduzida pelo capítulo 6. E, seus desdobramentos ganham espaço nos capítulos 7 a 10, que se constituem, efetivamente, no núcleo de toda a obra, abordando com sistematicidade as implicações práticas de:a) retornar ao ancilar instituto da democracia grega - o ostracismo - visualizando-o, como instrumento para a cobrança da responsabilidade política dos incumbentes, no sistema presidencialista;
b) quebrar o monopólio do poder constituinte, que o Congresso nacional tem exercido enquanto uma corporação política, sugerindo-se alternativas para impedir-se a virtual expropriação da soberania, que resulta do exercício solitário da legislação em causa própria, por qualquer instância do poder político.
c) sinalizar os impedimentos constitucionais, que constrangem a responsabilidade do Congresso pela formulação de políticas públicas, confrontando-os com a defesa intransigente de um sistema efetivo de checks and balances ao exercício do poder de Estado, marcado pela supremacia política do Congresso;
d) denunciar o pseudo-federalismo brasileiro, que nunca passou de um mero esforço de descentralização administrativa, para recuperar o significado político desse conceito na postulação de uma nova organização política da União, de corte confederativo.
No desenvolver dessa temática, vislumbra-se a essência de uma contribuição teórica ao estudo da política neste país, que não se pretende isenta a críticas e muito menos reivindica a certeza de um veredicto final sobre os juízos de valor que emite. O que este ensaio efetivamente se propõe, e se consubstancia na Exortação à Ação Política, no capítulo 11, é um desafio ao quadro político-administrativo e intelectual deste país. Traz ao debate questões de fundo, do processo de institucionalização democrática, qualificadas para dele exigir, no mínimo, a consideração de não passarem despercebidas.
As experiências dolorosas do exercício delituoso do poder de Estado, da insensibilidade corporativa dos quadros legislativos, do monopólio burocrático das decisões públicas, cujos vetores são investigados ao longo dessa análise, justificam, pela sua atualidade e relevância, essa pretensão. Da mesma forma, a sustentam os desafios representados pelas desigualdades regionais e pelos anseios de emancipação decorrentes, que o argumento desse texto busca equacionar. Os ideais federalistas e municipalistas - com sua conseqüência perversa, no processo de balkanização da organização político-territorial e numa, não-aleatória, emergência de movimentos separatistas na história pátria - são reconhecidos no conteúdo das preocupações teóricas e das respostas práticas que integram este ensaio.
A Parte III trata de visualizar o cenário do confronto político, identificando os obstáculos à reforma institucional e esboçando um plano tático para a sua sustentação. O que se trata de investigar, são as determinações do comportamento dos atores políticos, que explicam a recorrência de um elenco de dificuldades para a consolidação democrática, que têm sido consensualizadas, como tais, pelos analistas; e que, não obstante, persistem nas suas manifestações, renitentes e resistentes a quaisquer tentativas de solução.
a) O capítulo 12 tematiza o contexto de uma estrutura de representação, em que o quadro de referência para a ação política é o indivíduo, e a moral, uma questão de circunstância. O argumento aqui trabalhado, permite compreender o mecanismo insidioso, que tem transformado cada homem numa ilha de autojustificação, no cenário da política brasileira. Avança, também, uma denúncia sobre os fatos e atos da vida pregressa desta Nação, procurando demonstrar como a ditadura mercenarizou as bases de sustentação do Estado brasileiro. E introduz o tema de um remanejo necessário, no sistema geral de incentivos à atividade política, que tem nutrido o crescimento fisiológico da elite no poder.
b) O capítulo 13 descortina sete pontos (que não se pretendem exclusivos e nem exaustivamente abordados) para uma sustentação tática da mudança institucional. A razão dessa incursão - que, de per si, exigiria uma ou várias outras obras, de igual fôlego, e correspondente esforço de pesquisa e sustentação empírica - foi a intuição, que as grandes linhas de intervenção, propostas pelo núcleo estratégico da análise, na parte II desta obra, correriam o risco de emascular-se em manobras de efeito e serem digeridas pelo sistema corrupto do ancien régime, se desprovidas de uma sustentação tática, razoavelmente bem articulada.
c) O capítulo 14 retoma como dado, posto pela decisão plebiscitária de abril de 1993, o objetivo estratégico, da construção de um sistema presidencialista mais democrático neste país. E faz uma exortação, à necessidade de reflexão e ação, no âmbito das quatro teses, sob que se visualiza a utopia positiva da sua consolidação - qual seja a institucionalização do presidencialismo como fórmula política republicana, constitucionalista, provida de freios e contrapesos ao exercício tirânico do poder e, na sua origem, federalista. Com humildade, reconhecem-se as dificuldades e limites dessa pretensão, e com alguma audácia se desafia os eleitos de 1994 para as tarefas do seu afrontamento político.
A Parte IV agrega um análise retrospectiva da conjuntura política recente, buscando os elementos de convicção, necessários ao exercício pedagógico da consciência crítica, para a sustentação da vontade para a mudança.
a) O capítulo 15 é uma crônica do vazio, aberto pelo processo constituinte, no plano de uma efetiva e consistente reforma política. Oportuniza, também, uma caricatura do plebiscito de abril de 1993 e da tentativa de revisão constitucional pelo Congresso de 1990. Ressalta, pelo surrealismo da interpretação, a sua inconsistência e desencanto.
b) O capítulo 16 inclui a transcrição de conferência, que o autor pronunciou em 1993, denunciando o processo plebiscitário em curso. Este documento se agrega ao texto principal da obra, como o contra-exemplo do que se pretende construir. A pequena história desse grande equívoco - o plebiscito de abril - desvela o que, a todo custo, será necessário evitar no caminho a frente da consolidação democrática. Algo que, inadvertidamente, tem-se constituído na marca registrada da institucionalização política neste país, e que pode resumir-se numa trilogia de conhecidas mazelas do nosso fazer político: a inconsistência do ordenamento jurídico-positivo, sacramentando a assintonia das intenções e das ações de governo; o mimetismo acrítico e casuísta, introduzindo a fraude à cidadania, como prática política cotidiana; a precariedade do consenso, como fermento da crise institucional endêmica, que obstaculiza o desenvolvimento e ameaça a democracia.
Uma observação final é pertinente, quanto ao método de apresentação. Uma colagem de citações abre o desenvolvimento de cada capítulo ou seção, ao longo de toda a obra. De um lado, esse recurso pretende dar testemunho da vocação, que a biografia acrescenta à análise. De fato, é preciso conhecer, nas suas entranhas, o monstro, para oferecer-lhe o bom combate e legitimar, assim, o desafio que se propõe à sociedade. De outro lado, a atualidade de Maquiavel, nos temas e enfoques de Democracia Plebiscitária, evoca, para o desconforto da elite que fustiga, e do preconceito cultivado na academia, o potencial teórico de uma tradição de pensamento, que remonta às raízes clássicas do fazer política como condição essencial do seu conhecimento. Eis que o existencializa, a sua vez, como proximidade e distanciamento - na dialética de um profundo respeito à dignidade da res publica - e, assim, como fato político.
O homem, sendo um animal político - na compreensão essencial de Aristóteles - só por isso, e nessa condição, é capaz de conhecer o poder e de, assim, exercê-lo para a sua emancipação.
[AYDOS, Eduardo Dutra. Democracia Plebiscitária - Utopia e Simulacro da Reforma Política no Brasil. Porto Alegre/Canoas, Ed. UFRGS/La Salle, 1995.