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Dioniso é o único deus grego a quem o mito permite ter uma mãe mortal, e que introduziu o próprio culto na Grécia após o dilúvio. A razão disto é porque, historicamente, se trata de um mito mais recente, embora construído sobre o de uma divindade micênica do mesmo nome. Dioniso é feito de dois deuses morituros da vegetação, um vindo da Trácia (no nordeste da Grécia) e outro da Frígia (Ásia Menor ocidental). O culto do deus trácio supunha o estraçalhamento ritual do próprio deus em forma de um homem ou de um animal, e proporcionava grande alívio emocional aos adoradores. O mesmo sucedia ao uso ritual do vinho na Frígia e à repetida representação da sorte do deus numa forma primitiva de drama. O culto de Dioniso difundiu-se rapidamente na Grécia na Idade do Obscurantismo, aliviando as tensões de uma cultura da culpa. Mas um deus grego é tudo o que um homem desejaria ser, imortal e sem idade, de modo que não pode morrer. Dessarte, os mitos de Dioniso estão cheios de substitutos mortais, que sofrem seu nome, temas adequados da tragédia. A estória dele é a seguinte: Sêmele, filha de Cadmo, foi amada por Zeus em forma de um mortal e concebeu um filho, de modo que Zeus prometeu conceder-lhe o que ela pedisse. Grávida de seis meses, foi persuadida pela ciumenta Hera - ou induzida pela própria insensatez - a pedir que Zeus lhe aparecesse em sua verdadeira forma. A divindade dele fulminou-a como se fosse um raio. Mas Zeus arrancou o filho do fogo e costurou-o na própria coxa, onde ele permaneceu mais três meses; assim, Dioniso foi o Duas Vezes Nascido. A seguir, Zeus entregou o infante a Ino e Atamas, que o criaram como uma menina, para obviar à sorte invejosa, mas hera enlouqueceu-os. Hermes transformou Dioniso num cabrito e deu-o às ninfas de Nisa, e sob essa forma ele foi adorado. Ali Dioniso encontrou a vinha, fabricou o vinho e reuniu um bando de seguidores, com os quais percorreu a Europa, a Ásia e até a Índia. Aos que aceitavam concediam as bênçãos do vinho, mas enlouquecia os que rejeitassem. O velho e gordo Sileno perseguiu-o com sátiros, homens lascivos de orelhas e caudas de cavalos, ou chifres e cascos de bodes. Mênades e bacantes, possessas, manejavam serpentes e brandiam o tirso, um cone de pinheiro sobre uma vara, cultuando Dioniso em êxtase. Dioniso chegou à Trácia, onde Licurgo foi o primeiro a rejeitá-lo, encarcerando as bacantes e os sátiros. Dioniso refugiou-se no mar, junto de Tétis, mãe de Aquiles. Depois libertou magicamente os prisioneiros, e endoideceu Licurgo: tomando seu filho Drias por uma vinha, Licurgo podou-lhe os braços e as pernas para desbastá-lo. Dessa maneira a terra se tornou infértil. Os Trácios apresaram Licurgo, levaram-no para as montanhas, estraçalharam-no com a ajuda de cavalos, e lhe espalharam as carnes pelos campos, a fim de que estes produzissem frutos. Assim os Trácios renderam culto a Dioniso. Dioniso foi para Argos, onde as filhas de Preto não quiseram prestar-lhe homenagens, e ele as enlouqueceu. Elas puseram-se a vagar pelas montanhas, fazendo em pedaço os filhos pequeninos e comendo-os crus. Na Ática, Dioniso deu um vinhedo a Icário, que fabricou o vinho e o distribuiu aos pastores, desejando que todos os homens partilhassem das bênçãos do deus. os pastores, imprudentes, beberam o vinho puro, como se fosse água, e, desvairados, despedaçaram Icário. Tornando em si, reconheceram o poder do deus. A filha de Icário, que estivera com eles, enforcou-se num galho da árvore sagrada, honrando Dioniso. Ao conduzir seu grupo à Índia, Dioniso passou pela Frígia, cujo rei era Midas, o mais rico dos homens sobre a terra. Isso já lhe fora predito em sua primeira infância; enquanto dormia, formigas carregavam sementes de trigo para sua boca. em seus jardins as rosas cresciam espontaneamente, cada qual com sessenta pétalas e todas suavemente perfumadas. Sileno retirou-se para o meio delas e adormeceu. Midas iludira-a, misturando vinho e água de um poço, de modo que bebera copiosamente. Depois, Midas hospedou Sileno com liberalidade e aprendeu todos os mistérios de Dioniso, a quem o devolveu, prestando as honras devidas ao deus e esperando uma dádiva - que Dioniso lhe prometeu, fosse ela qual fosse. Desejando sempre aumentar suas riquezas, Midas pediu que tudo o que tocasse virasse ouro. Foi um disparate, pois os deuses não podem deixar de conceder exatamente o que lhes era solicitado, nem mais nem menos, e até a comida que Midas levava aos lábios se transformava em ouro. Quase morto de fome, Midas pediu a Dioniso que lhe retirasse a dádiva. Dioniso compadeceu-se dele e ordenou-lhe que se lavasse no rio Páctolo. Midas obedeceu-lhe as instruções e, imediatamente, o dom aurífero lhe foi retirado. Todas as areias do rio se transmudaram em pepitas de ouro, onde os frígios reuniram em velos. Assim se cumpriu a profecia das formigas. Dioniso regressou a Tebas e encontrou o túmulo da sua mãe desonrado, pois as irmãs dela apregoaram que o sobrinho era de origem mortal. Enlouqueceu-as como a todas as mulheres de Tebas, fazendo com que se dirigissem a Citéron, onde desbarataram as tropas enviadas por Penteu, neto de Cadmo, contra elas. Mas Penteu atirou na prisão o chefe das bacantes - dizem alguns que ele prendeu o próprio deus. Pois o chefe, subitamente libertado, incutiu no espírito ínquio de Penteu o ímpio desejo de espiar as mulheres. Envergando trajes femininos, Penteu subiu uma árvore; mas sua mãe o viu e fez o filho em pedaços, rendendo homenagem ao deus, e levou-lhe a cabeça ensangüentada, como um troféu, a Cadmo. Tardiamente as tebanas recobraram o juízo e reconheceram o deus. Mas Dioniso embarcou para a Ilha de Naxos num navio de piratas, que o amarraram e planejaram vendê-lo. De repente, o mastro transformou-se em videira, os remos se transformaram em cobras e o deus cresceu imensamente entre eles. os piratas atiraram-se ao mar e viraram golfinhos. Em Naxos, Dioniso incluiu Ariadne em seu triunfo e chamou sua mãe do meio dos mortos, dando-lhe o nome de Tione (a possuída). A seguir, foi para o Olimpo e todos os homens glorificaram o deus manifesto. Às vezes era chamado Liber (livre), porque o vinho liberta o espírito de qualquer cautela. Em Roma era chamado de Baco.