Alargando a Glória de um Largo...

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 Seria desnecessário tecer loas a estas Arcadas e às histórias que sua presença e lembrança suscitam no âmago de cada um que as tenha por fonte de vida. Sem desmerecimento algum ao monumento centenário que, de certa (se não completa) forma, foi (e é) o centro desta Capital, eis que seu desenvolvimento se resume a três pontos básicos: o Pátio do Colégio, a vetusta Academia de São Paulo e a Avenida Paulista.
 Não. A se tratar aqui, apenas do presente. Desses últimos meses que privei na companhia de meus colegas, na presença diuturna nas páginas deste jornal de classe que, anos à frente, tornaremos à memória com admiração, surpresa e angústia.
 Admiração porque sobrevirão recordações da condição de calouros, estudantes, acadêmicos. Por aqui entramos triunfantes, carregando em nós mesmos a certeza de sermos os melhores, quaisquer que sejam o sentido e a interpretação que estas palavras ensejem. Cheios de sonhos, nos veremos preteritamente como pasmados, enebriados pela soberba que somente os ingênuos frente ao mundo podem clamar. E por esta, um dos Sete Capitais, confirmaremos a pequenez de atitudes que, passadas, recordamos com as saudades hipócritas de Raul Pompéia, na descrição das memórias atenéias de Sérgio. Sempre, sem dúvida, nos concedendo o beneplácito da auto-piedade, esta mesma que, ao raiar do próprio Outono, haverá de conduzir à referida admiração. Mudamos mas somos os mesmos.
 Surpresa por não termos nos dado conta dos haveres, do cabedal com que depararíamos. Obras raras e outras nem tanto, primorosas e outras um pouco, conhecidas e outras quase nada, todas elas fazendo parte da formação de cada um. Pessoas que agora encontramos todos os dias retornarão às mentes e merecerão, ainda que postumamente, nossa reverência, gente a quem silenciosamente ergueremos nossas preces por uma boa estada no lugar que ocupam, assento a que já nos estaremos preparando ou que alguns de nós, por desígnios mais fortes que a humana vontade, já terão tomado.
 Angústia por ver o tempo que passou e – lugar comum macerado e diluído – não volta mais. Por estarmos distantes daqueles que muito amamos ou odiamos, queríamos e desgostávamos, admirávamos e abominávamos. Por saber que sonhos foram frustrados, abortados, apartados de nós como o recém-nascido da mãe após o parto. Por ver que o mundo muito mudou, e do que vivemos, pouco sobrou que nos possa causar alegrias, pessimismo mundano que inundará as vidas daqueles que, conscientes do trabalho feito, encaram com surpresa um cosmo que não se reconhece.
 Mas serão, acima de tudo, lembranças boas, pois aos velhos se permite tudo, especialmente a que lhes foi bom. Bem ou mal sucedidos, seremos os antigos alunos do Largo, imbuídos do companheirismo, da amizade, do calor que todos nos contagiamos, lume eterno como o que aquece a reminiscência dos corpos jovens e frios no monumento aos mortos de 1932.
 A Faculdade do Largo não faz colegas ou companheiros. Faz irmãos. Irmãos na luta pelos direitos inerentes a cada ser humano, na concepção que cada indivíduo faz deles. Irmãos na luta pela Justiça, Diké imperiosa que senta a espada à cabeça do que se alhear à pessoal missão, e pondera com consideração aqueles que não se furtaram ao dever maior. Irmãos na amizade, pois se muitos a nós se afastaram, tantos continuam privando da companhia, relação que ao longo dos anos mais e mais se confirmou na busca da completude do ser, busca que é a maior que pode existir, por necessitar de si e do outro. Irmãos que o sangue não fez, mas que apenas o amor faz. O amor de saber-se vivo e acompanhado por tais ideais e gentes. Tantos contemplarão a mãe ou o pai dos próprios filhos, rememorando o primeiro toque de mãos na aula maçante, e verão o resultado da multiplicação humana consubstanciado graças a este lugar que ora vivemos.
 E quase moribundos, passeando pelo centro desta metrópole, entraremos especificamente num prédio. No pátio, olhos voltados ao céu, uma lágrima verterá, e o esforço de uma vida regrada por eternos valores se eximirá ternamente.
 



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