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Preconceito? Talvez. Mas
a regra do jogo é clara. O visual pode ajudar ou atrapalhar
sua carreira. Portanto, cuidado com a aparência
Por Adriana Fernandez Imagine a situação: o grande dia de Paulo, um administrador de empresas, finalmente chegou. Numa sala de cadeiras pretas e paredes bege ele espera pela tão so-nhada entrevista de emprego. Justamente aquela que vai levá-lo a uma empresa de primeira linha e, conseqüentemente, a maiores chances de ascensão profissional. A boca fica seca, as mãos suam, os pés balançam sem parar. Ele tenta se acalmar pensando racionalmente. Tem todos os pré-requisitos para o cargo. Tem bastante experiência na área, ótimos relacionamentos e trata de estar sempre atualizado. Não há motivos para preocupação -- provavelmente ele é um dos mais indicados para a vaga. Quando chega a hora da entrevista, Paulo consegue entrar na sala confiante e exibir desenvoltura em suas colocações. Uma hora depois, volta para casa aliviado. Saiu-se muito bem, acredita. Nesse mesmo instante, o gerente de recursos humanos que o entrevistou está fazendo anotações sobre ele: o candidato tem boa cultura, potencial de crescimento, conhecimentos técnicos. Em outra parte de seu relatório, entretanto, aponta: sapatos sem engraxar, cabelo desalinhado, unhas sujas e mal cortadas, gravata em cores berrantes, terno amassado. Paulo nem imagina, mas, por não ter feito uma reengenharia no visual, está em maus lençóis. Agora pense: em algum momento da sua carreira você compareceu a uma entrevista sem se olhar de forma minuciosa no espelho? Se você cruzasse com alguém com a "elegância" do empresário Antonio Ermírio de Moraes na rua, lhe daria crédito? Antonio Ermírio é um talento para ganhar dinheiro e pode se dar ao luxo de não se preocupar com isso. Mas e você? É provável que já tenha cometido, na sua carreira, alguma das gafes listadas no parágrafo anterior sem nem perceber. Infelizmente, isso pode ter sido um fator decisivo na hora do desempate entre você e outro candidato. Não, cuidar do visual não é uma bobagem (ao menos para quem pretende ser alguém). E, no momento do cara a cara com um entrevistador, o que importa não é só o seu conteúdo, por mais rico que seja. Sua apresentação é tão importante quanto decisiva. No começo deste ano, o vice-presidente de uma empresa americana de serviços de informática veio ao Brasil duas vezes para recrutar jovens com prática que quisessem trabalhar nos Estados Unidos. Ele oferecia salários que começavam em 55 000 dólares anuais. Na primeira vez levou 10 pessoas. Na segunda, mais 12. Uma das candidatas, uma moça que tinha todas as credenciais para ser escolhida, acabou sendo barrada porque estava usando um vestido muito curto. Houve quem tentasse interceder por ela alegando que o clima local precisava ser considerado (a história se passou em Fortaleza, onde a seleção foi feita), mas não adiantou. "Esse não é um vestido apropriado para um ambiente de trabalho", disse o homem. E assim a moça de Fortaleza perdeu uma oportunidade que certamente iria mudar sua vida. Dress for sucess" (ou "vista-se para o sucesso") - esse é o lema de John Rosica, diretor de uma empresa de recrutamento e seleção internacional localizada no Vale do Silício, costa oeste americana. Sendo a região um verdadeiro celeiro de empregos do setor tecnológico, com milhares de postos disponíveis e recrutando loucamente no exterior, vale a pena levar o lema em consideração. "Raramente se tem uma segunda chance para causar uma boa primeira impressão", diz Robert Wong, diretor da Korn Ferry International, empresa de headhunting responsável pela contratação de executivos do alto escalão. Como não errar? Infelizmente um bê-á-bá do que é certo ou errado com relação à vestimenta no mundo corporativo não existe, até porque as empresas são diferentes entre si. Todos os especialistas (em moda e em recrutamento) apontam o bom senso como a melhor arma para se defender dos pequenos escorregões. O jeito de se produzir depende da sua área de atuação, da idade e, principalmente, da cultura do lugar onde você quer trabalhar. "Ninguém vai errar por adotar um certo grau de formalidade", afirma Guilherme Velloso, diretor da PMC Amrop International, outro headhunter. "Mas isso não funciona como receita de bolo, ou seja, não vale para todos os casos." O exemplo do técnico em processamento de dados Gilberto Salomão Jr., 23 anos, foi exceção à regra. No ano passado ele se candidatou a uma vaga para trabalhar no setor de treinamento de instrutores da S.O.S. Computadores, uma rede de escolas de computação com 65 unidades em São Paulo. Como também é músico e toca numa banda de heavy metal, quando compareceu à entrevista Salomão tinha longas madeixas - que, segundo ele, nunca haviam lhe causado problema em empregos anteriores (nem mesmo no último, como instrutor em uma das filiais da rede). "Eu tomava o cuidado de ir sempre com o cabelo limpo e preso", afirma. Mas, quando surgiu uma oportunidade real de ascensão profissional, o visual de Salomão tornou-se um empecilho. A primeira impressão de sua entrevistadora, Regina Gaia, gerente de RH da empresa, não foi das melhores. "Ele parecia um roqueiro que tinha acabado de sair de um bar", diz Regina. Ela lembra, aliás, que só foi adiante com a entrevista por não se tratar de uma pessoa preconceituosa. Durante a conversa, Regina percebeu que ele conseguia conciliar bem a vida pessoal com a profissional. No final do bate-papo, ela chegou à conclusão de que Salomão era sim a pessoa perfeita para a vaga. Só que tinha o tipo físico menos indicado. Colocou suas observações no relatório e Salomão foi contratado. Além da obrigatoriedade de se vestir formalmente, ele recebeu orientação do seu chefe para livrar-se, claro, do cabelão. "Já tinham me perguntado se eu concordaria em cortar o cabelo", diz Salomão. "Diante das perspectivas, decidi imediatamente e não me arrependo." O ritual de corte, segundo ele, foi doloroso, com despedida formal, a banda tocando e Salomão chorando. Hoje, passado um ano, Regina orgulha-se da escolha acertada. "Ele atendeu às nossas expectativas, tem potencial e busca o aprimoramento contínuo", diz ela. O caso de Salomão teve final feliz. O mercado, entretanto, não costuma ser tão condescendente. "O profissional deve tentar conhecer a cultura da empresa e se apresentar vestido de acordo", afirma Simon Franco, da Simon Franco Recursos Humanos, outra empresa de headhunting baseada em São Paulo. Mas Franco faz uma ressalva importante: "Desde que isso não violente o profissional". Segundo ele, o contrato de trabalho deveria ser visto como uma relação em que ambas as partes têm a ganhar. "Se as mudanças no seu estilo pessoal são muito grandes, talvez essa não seja a empresa mais adequada para você", diz. Foi o que aconteceu na Brahma tempos atrás, de acordo com o relato de Mauricio Luchetti, diretor de gente e qualidade. Com 9 000 funcionários e 29 fábricas, a cervejaria tem a informalidade como regra em tudo, inclusive no vestir. Por causa disso, aconteceu o incomum: um candidato a uma vaga na área de informática acabou recusando o lugar, alegando que não conseguiria deixar de usar gravata. De fato, numa companhia onde o espírito do casual day é princípio básico e a dupla camisa e calça jeans é o uniforme geral - inclusive do presidente -, ia ser no mínimo esquisito um funcionário circulando diariamente pelos corredores da empresa em trajes formais. "Mas não temos nenhuma espécie de preconceito com quem vem aqui fazer uma entrevista vestindo terno", diz Luchetti. O ar informal e uma certa criatividade no vestir são coisas permitidas,
e até bem-vindas, em áreas como marketing e publicidade.
Nesses casos, um toque pessoal pode fazer toda a diferença. Desde
uma gravata mais chamativa usada com bossa a um terno de corte moderno.
"Hoje todos podem se vestir bem", afirma Fernando de Barros, um dos experts
no assunto, editor de moda da revista Playboy e autor do livro Elegância:
Como o Homem Deve se Vestir (Editora Negócios). "Falta de dinheiro
não é mais desculpa, pois há informação
e boas opções de compras em todas as faixas de preço."
Barros acrescenta que mesmo as roupas mais baratas estão com melhor
caimento, porque o corte é computadorizado. O que muda entre um
terno de griffe de
É claro que há setores do mercado de trabalho em que a aventura pára na porta de entrada. Em muitas instituições, o tradicionalismo na aparência impera. A financeira é uma delas. Terno escuro, gravatas discretas, sapatos impecáveis e cabelos curtos e bem penteados são imprescindíveis. E barba ou bigode podem ser encarados como pontos desfavoráveis. "A roupa não faz o homem, mas que ajuda, ajuda", diz Robert Wong. Wong cita um teste publicado em uma revista americana para mostrar como trajes formais e escuros são associados a pessoas de respeito. Imprimiu-se uma foto de dois homens de corpos muito parecidos, mas com rostos cobertos, debruçados sobre uma mesa, analisando papéis. Um deles vestia terno azul e o outro um paletó xadrez e calça bege. Era uma foto oficial e perguntava-se quem era Ronald Reagan. A esmagadora maioria dos leitores ficou com o terno escuro -- e errou. O presidente americano estava num passeio e apenas recebeu um de seus assessores para assinar um documento. As multinacionais, principalmente as americanas e européias, adotam códigos bem definidos para a vestimenta. Nos Estados Unidos é praticamente impossível encontrar uma secretária que não esteja usando tailleur. "No Brasil elas tendem a se tropicalizar, a ficar mais maleáveis", afirma Simon Franco. Na Hoechst Marion Roussel, por exemplo, uma fusão de indústrias farmacêuticas de origem alemã, americana e francesa, a forma de se vestir obedece a padrões globais. Para os homens prevalece o terno, sobretudo a partir do nível gerencial. As mulheres usam tailleurs, calças ou vestidos. "Os homens mais jovens às vezes ousam um pouco e arriscam uma gravata colorida, mas em geral não passam muito disso", afirma Luiza Vincioni, gerente de RH. Na opinião de Luiza, tudo o que chama a atenção significa que está fora do usual. "As pessoas têm que perceber quais são os limites e aceitar os nossos padrões", diz. Por mais que a corporação tente ser tolerante com o estilo pessoal de cada um, Luiza confessa que casos de exagero acontecem. As moças, sobretudo as recém-formadas, costumam pecar no comprimento das saias que usam no verão. "Às vezes somos obrigados a conversar e pedir que a pessoa não exagere. Sabemos que faz calor, mas trabalhar com uma saia na altura de um short não é possível", afirma. Na Hoechst, casos assim são resolvidos um a um, em conversas reservadas. Para as mulheres que têm dúvidas quanto aos limites dos trajes no ambiente de trabalho, Velloso, da PMC, sugere que se adote uma regra prática e de eficácia indiscutível: a regra do "pouco": pouca maquiagem, pouco perfume, pouco decote. No caso feminino, paira sempre uma dúvida na hora de decidir o que usar numa entrevista de emprego: saia ou calça comprida? "Tanto faz", diz a consultora de moda Glória Kalil, autora do livro Chic: Um Guia Básico de Moda e Estilo (Editora Senac), que fala, entre outros temas, sobre roupas apropriadas para o trabalho. Para Glória, a candidata deve ir vestida de forma que a pessoa que vai fazer a entrevista já a veja ocupando o posto. "Você tem que lembrar que o que está em evidência é a eficiência, a capacidade e a inteligência, não os dotes físicos", continua ela. Segundo seus conselhos, quem optar pela saia deve usá-la logo acima dos joelhos. Por precaução, no caso de a empresa ser muito formal, não custa telefonar e averiguar se a calça comprida deve ser deixada de lado. "Mas não há lugar onde um terninho preto com blusa branca não possa entrar", diz Glória. "Ainda mais se acompanhado por um sapato bicolor, que é elegantérrimo." Existe um quesito, porém, que vai além da diferença
entre os sexos, além da elegância e até mesmo além
da competência do candidato: o asseio. Os recrutadores reparam em
tudo, principalmente nisso. Cabelos lavados, bem penteados e cortados,
barba feita, unhas limpas. Roupas impecáveis, sem manchas, e sapatos
engraxados. "A higiene conta na escolha de candidatos em qualquer posição",
afirma Luiza Vincioni, da Hoechst. (Higiene é coisa básica.
Não deveria nem ser preciso falar sobre isso.) "Uma contratação
é como um casamento. Ambas as partes têm que se gostar", diz
Simon Franco. É fundamental, portanto, caprichar ao máximo
no primeiro encontro, sem tentar querer ser uma pessoa que você não
é. Assim, quem sabe, a relação seja duradoura e renda
bons frutos.
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