MARTINS DOS SANTOS
APONTAMENTOS DE
HISTÓRIA DE PORTUGAL
BRAGA - 1999
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O território de Portugal, antes da independência, fazia parte do Reino de Leão, que ocupava o nordeste da Península Ibérica, ao tempo ligado ao Reino de Castela, pois o mesmo monarca era o soberano dos dois reinos vizinhos. Castela, porém, não tinha fronteiras com Portugal.
Entre o ano 1090 e 1095, o rei estabeleceu ali dois condados com administração autónoma, o de Galiza e o de Portugal, que foram entregues a dois dos seus genros, primos e ambos oriundos da Casa de Borgonha (Dijon, França), D. Raimundo, na Galiza, e D. Henrique, em Portugal.
Os dois genros morreram antes do sogro comum. A condessa da Galiza, D. Urraca, ficou a ser a rainha de Leão e Castela, e queria que sua irmã D. Teresa, condessa de Portugal, se considerasse sua súbdita, e isso ela não o aceitou, pois considerou-se desde logo independente.
O filho de D. Henrique e D. Teresa, D. Afonso Henriques, com o apoio do Papa Inocêncio II, conseguiu que D. Afonso VII, rei de Leão e Castela, seu primo, em 1143, reconhecesse a independência de Portugal. Nessa altura as duas irmãs tinham já falecido.
PRIMEIRA DINASTIA
DA CASA DE BORGONHA
Damos habitualmente a este monarca a denominação de D. Afonso Henriques, por ser filho do Conde D. Henrique.
Antes de ser reconhecido como rei, em 1143, teve de lutar com sua mãe e com seu primo, D. Afonso VII, de Leão e Castela.
Dedicou-se com grande empenho ao alargamento do território, conquistando terras aos mouros, que ocupavam parte da Península Ibérica, também por conquista, havia mais de quatrocentos anos. Esta actividade mereceu-lhe o cognome de Conquistador. Ocupou Lisboa (auxiliado pelos cruzados), Santarém, Sintra, Almada, Palmela, Alcácer do Sal, Évora e Beja.
Tal como os seus sucessores, aproveitou os serviços das ordens monástico-militares, para combater os sarracenos e para desenvolver a riqueza do País, que se baseava na agricultura. As mais famosas foram a Ordem do Templo (depois de Cristo), com sede em Tomar, a Ordem de Santiago, com sede em Palmela, a Ordem de Calatrava, com sede em Avis, e a Ordem do Hospital (ou de Malta), com sede no Crato.
Protegeu a fundação de diversos mosteiros, a maior parte deles na região entre os rios Minho e Mondego, sobretudo beneditinos e do ramo cisterciense; seu pai dera preferência ao ramo cluniacense. No seu tempo construiu-se o importante Mosteiro de Alcobaça, um dos mais célebres monumentos religiosos de Portugal, a sua igreja é a maior do País.
Fez casamento com uma princesa italiana, D. Mafalda de Sabóia e Piemonte.
Governou desde 1128 até 1185.
Continuou a actividade de seu pai, procurando alargar o território português. Conquistou também diversas cidades, sendo a mais importante a de Sines, no Algarve.
O seu principal objectivo, como governante, foi aumentar a população, oferecendo vantagens aos cruzados que passavam pelos nossos portos, para aqui se fixarem. Isso explica que seja conhecido com o cognome de Povoador. Alguns escritores brincam com isso, devido a ter bastantes filhos, tanto legítimos como ilegítimos, aumentando a população com os descendentes.
Três das suas filhas (D. Mafalda, D. Sancha e D. Teresa) distinguiram-se como freiras muito virtuosas, tendo sido beatificadas, são consideradas santas. D. Teresa foi ainda durante algum tempo rainha de Leão.
No tempo de D. Sancho começaram grandes lutas políticas entre o rei e os principais fidalgos contra alguns bispos portugueses, que se prolongaram durante quase cem anos; no fundo, estava em causa a cobrança dos impostos, consequentemente a preponderância da influência política e económica, que nesse tempo estava muito nas mãos do clero; os reis pretendiam subtrair-lha.
Casou com a princesa D. Dulce de Aragão e Catalunha (regiões da parte oriental da Espanha).
Governou Portugal desde 1185 até 1211. Antes de ser rei seu pai tinha-o já associado à administração do território.
A História de Portugal dá-lhe o nome de Gordo por ser, realmente, muito obeso.
Continuou a política de seu pai e seu avô, conquistar terras e aumentar a população. Ocupou pela última vez diversas cidades que os mouros tinha reconquistado, sendo a mais famosa a de Alcácer do Sal. À semelhança do que eles tinham feito, aproveitou-se do auxílio que os combatentes da Cruzadas do Oriente lhe puderam prestar na guerra contra os mouros.
Continuou a luta contra o alto clero, sobretudo os bispos; e também teve lutas com os irmãos, sobretudo com as irmãs, não querendo entregar-lhes os bens que seu pai lhes legara para sua manutenção, pretendendo juntar nas mãos do monarca todos os poderes e todas as riquezas que fosse possível reunir. Por causa disso teve até guerra com o rei de Leão, seu cunhado. Começava já o período do absolutismo régio.
Procurou fazer o inventário de todos os bens da coroa, as chamadas "Inquirições", para retomar os que haviam sido abusivamente subtraídos e evitar a usurpação futura.
Casou com a princesa D. Urraca de Castela e governou o País de 1211 a 1223, portanto durante doze anos.
Damos a este rei o epíteto de Capelo porque sua mãe, que era muito devota, durante uma doença, fez a promessa de o vestir com o hábito de frade, parece que franciscano. Uma banalidade!
Era ainda muito novo quando subiu ao trono. Depois de D. Afonso Henriques, foi o rei que mais alargou as fronteiras de Portugal. Ocupou Mértola, Alcoutim, Castro Marim, e outras terras, seguindo o rio Guadiana, que lhe dava protecção a leste.
Os bispos continuaram a luta que vinha dos reinados anteriores e fizeram graves acusações ao Papa (acreditando-se que a maior parte delas eram injustas ou pelo menos muito exageradas). Inocêncio IV, em 1245, tirou-lhe o governo de Portugal e entregou-o a seu irmão Afonso, que residia em Bolonha, na França de hoje. Na mesma ocasião destituiu também o imperador da Alemanha, Frederico II.
Isso ainda ocasionou lutas intestinas durante três anos, pois D. Sancho II tinha alguns partidários fiéis. No entanto, saiu de Portugal e retirou-se para a cidade de Toledo, capital de Castela, onde morreu.
Diz uma lenda que o alcaide de Coimbra foi expressamente a Toledo e fez desenterrar o rei, para se certificar de que tivesse morrido, e só no regresso entregou a cidade!
D. Sancho II casou com uma fidalga castelhana, já viúva, D. Mécia Lopes de Haro, que por causa da guerra também saiu de Portugal, mas não acompanhou o marido, não sabemos bem o motivo. D. Sancho II foi rei desde 1223 a 1248.
Como não teve filhos, o sucessor foi seu irmão Afonso. Foi o primeiro caso de sucessão régia anormal em Portugal. Adiante encontraremos outros.
Recebeu esta denominação por ter sido Conde de Bolonha, na França actual, como marido da titular nobiliárquica, D. Matilde de Bolonha e Dammartin.
Custa a entender a posição do alto clero, pois a esposa do rei, D. Matilde, não quis vir para Portugal e ele criou a situação anormal de "bigamia", fazendo contrato nupcial com a princesa D. Beatriz de Castela, que ao tempo tinha menos de dez anos de idade e veio logo para Portugal (embora não fizessem vida marital). E, por estranho que pareça, segundo o que se acredita, os bispos não lhe fizeram qualquer oposição!
Como curiosidade, diremos que seu sogro era muito mais novo do que ele, uns dez ou onze anos.
Continuou a política dos reis anteriores, que se resumiu em conquistar terras aos mouros (foi este rei que terminou a ocupação do Alentejo e do Algarve), em desenvolver a riqueza agrícola de Portugal e em fazer as pazes com os bispos, podendo dizer-se que as lutas com o clero quase acabaram no seu reinado.
Procurou ampliar a cultura intelectual, tendo criado condições favoráveis à actuação dos trovadores provençais, que ele apreciava e protegia.
A rainha D. Beatriz notabilizou-se pelas suas excepcionais qualidades. D. Afonso III ocupou o trono português, como rei, desde 1248 até 1279.
Recebeu esta denominação, Lavrador, devido a ter prestado grande dedicação ao desenvolvimento da agricultura. Realmente, o seu principal empenho foi aumentar a riqueza do País, que ao tempo se baseava nos produtos do campo.
Entre as suas medidas mais notáveis conta-se a sementeira do pinhal de Leiria, propriedade real.
Começou a interessar-se também pelo desenvolvimento do comércio marítimo e aperfeiçoamento dos processos de navegação. Contratou marinheiros italianos para virem trabalhar em Portugal e fez convénios comerciais com outros monarcas.
Também a instrução lhe mereceu grande cuidado. O interesse pela cultura foi intensificado já no tempo de seu pai, que tinha contactado com meios mais avançados e procurou logo fazer com que em Portugal houvesse gente instruída. Todavia, foi D. Dinis que, em 1290, com o apoio do Papa, criou a primeira universidade portuguesa, a famosa Universidade de Coimbra. Começou a usar-se a língua portuguesa nos documentos escritos.
No seu tempo foi extinta a Ordem do Templo e criada a Ordem de Cristo.
D. Dinis casou com a princesa D. Isabel de Aragão, sendo ela ainda muito criança. Deixou nome pelas suas excepcionais virtudes, sobretudo pelo interesse que lhe mereceu a paz. Portugal conhece-a por Rainha Santa e também por Rainha Santa Isabel.
Sendo bom rei, D. Dinis era menos escrupuloso neste ponto, lançou-se em guerras por motivos que parecem pouco justificativos, pois teve lutas com o irmão e com o filho; no entanto, deveriam ter tanta culpa como ele.
Ocupou o trono desde 1279 a 1325.
A História deu-lhe este cognome, Bravo, por ter mostrado grande valor guerreiro na batalha que os exércitos de diversos reis cristãos travaram contra as tropas sarracenas, nas margens do rio Salado, no sul da Espanha. Alguns autores dão-lhe outro nome, chamam-lhe batalha de Tarifa.
No princípio do reinado teve dura luta com um seu irmão bastardo que pretendia ocupar o trono.
O facto mais notável do seu reinado foi o da condenação à morte, pelo rei, e a execução de D. Inês de Castro, não sendo propriamente atitude ou iniciativa judicial, foi mais uma medida administrativa ou governativa. Sofreu a morte em atenção às chamadas razões de Estado, por motivos que muito se parecem com os conluios políticos...
Promoveu o progresso de Portugal, sobretudo no aspecto comercial, melhorando a frota marítima e fazendo tratados de comércio com alguns reis estrangeiros, nomeadamente os da Grã-Bretanha. Há quem afirme que os portugueses começaram neste tempo as viagens marítimas de longo curso, tendo atingido o arquipélago das Canárias, mas isso não está suficientemente documentado.
Casou com a princesa D. Beatriz de Castela, que mostrou ser senhora de grandes qualidades, como aconteceu com as outras duas rainhas que a antecederam.
Governou Portugal desde 1325 a 1357.
Este rei tornou-se particularmente conhecido devido ao que se passou com a fidalga com quem casou, D. Constança de Castela, e com D. Inês de Castro com a qual jurou ter casado em segredo (e isso deve ter sido fantasiado).
Para contrair matrimónio com D. Constança, D. Pedro teve de enfrentar a má-vontade de seu sobrinho, o rei D. Pedro I de Castela, que a não queria deixar vir para Portugal. Ainda em vida de D. Constança, que morreu cedo, prendeu-se de amores com aquela dama de honor; seu pai D. Afonso IV mandara matá-la por razões de Estado, e tal facto ocasionou uma guerra civil.
O episódio terminou com a troca de exilados, feitos prisioneiros, entre os dois monarcas do mesmo nome e de feitio muito parecido, tio e sobrinho, e a execução horrendamente bárbara de dois implicados na morte de D. Inês de Castro. Ainda se lhe aponta a tétrica cerimónia do beija-mão ao cadáver, que muitos consideram lendária.
Este caso levou o rei D. Pedro a mandar construir dois belos monumentos mortuários, um para D. Inês e outro para ele; encontram-se na igreja do mosteiro de Alcobaça, e são os mais perfeitos exemplares da arte tumular portuguesa.
A vingança exercida contra os prisioneiros e outros actos de castigo de criminosos fizeram com que lhe fosse dado o cognome de Justiceiro, que alguns autores substituem por Cruel.
D. Pedro sofria de perturbações psíquicas, tendo por vezes grandes insónias e comportamento estranho. Costumava juntar-se aos plebeus, acompanhando-os nas suas danças e cantares, confraternizando com eles nas ruas e praças lisboetas.
Prosseguiu a obra dos seus antecessores, procurando desenvolver a economia nacional, aumentando a riqueza do País.
Foi rei desde 1357 a 1367, portanto durante dez anos.
Interessou-se muito pelo fomento da riqueza nacional, prestando especial atenção aos problemas da agricultura e da marinha, que protegeu com a instituição dos nossos primeiros organismos de seguro e previdência.
Cometeu o grave erro de se intrometer demasiadamente nos negócios políticos da Castela, que estava já unificada com Leão, ambicionando tornar-se seu rei. Isso nos arrastou por três vezes para a guerra, que sempre nos foi desfavorável.
Nos diversos tratados de paz, foi considerado por várias vezes o problema do seu casamento, sempre frustrado. Veio a ligar-se com uma senhora portuguesa, já casada, D. Leonor Teles, afirmando que se matrimoniaram em segredo (e isso causou grande descontentamento no povo de Lisboa, com manifestações que o rei reprimiu com a morte dos seus promotores).
No seu tempo, Portugal assinou um tratado de amizade e cooperação com a Grã-Bretanha, ainda hoje em vigor, que passa por ser o de maior durabilidade em todo o mundo, a aliança inglesa.
A sua reconhecida beleza física fez com que os historiadores o chamassem Formoso (havendo até alguns a classificá-lo de Inconstante, e Luís de Camões chamou-lhe "brando, remisso e sem-cuidado").
Foi atacado por uma doença que poderia ser a tuberculose e morreu sendo ainda muito novo.
Governou Portugal de 1367 até 1385. Poucas semanas antes de morrer, sua filha D. Beatriz, ainda criança de uns doze anos, casara com o rei D. João I de Castela, e isso arrastou o País para nova guerra, com a vitória de D. João, Mestre de Avis, que garantiu a continuação da independência.
PRIMEIRA DINASTIA
SUAS CARACTERÍSTICAS
Luta contra os leoneses e contra os mouros, tendo em vista a consolidação da independência e o alargamento do território.
Resistência dos bispos aos monarcas e consequente oposição, com o objectivo de alargarem a influência e o poderio.
Aproveitamento das congregações religiosas e das ordens militares para fortalecimento da posição política.
Guerra entre reis e seus próximos parentes, algumas vezes filhos bastardos, por motivo da sucessão no governo.
Preocupação pelo desenvolvimento nacional, através do povoamento, agricultura, pesca e comércio.
Começo das preocupações quanto à difusão da cultura, primeiro com as escolas conventuais, depois com a Universidade.
Quando morreu D. Fernando, sua filha D. Beatriz, muito criança ainda, estava já casada em Castela. Por esse motivo, assumiu o governo do reino sua viúva D. Leonor Teles.
Esta senhora dava exagerada aceitação a um fidalgo da Galiza, e isso desagradava muito aos habitantes de Lisboa.
O Mestre de Avis, D. João, filho bastardo de D. Pedro I, assassinou-o. Vendo-se em perigo, a rainha viúva saiu de Lisboa e foi para Castela.
O povo escolheu o Mestre de Avis, D. João, para administrar o reino e tratar da defesa contra as tropas castelhanas, que em breve invadiram Portugal.
O principal chefe guerreiro deste período foi D. Nuno Álvares Pereira, que obteve diversas vitórias — Atoleiros, Aljubarrota e Valverde. Foi na batalha de Aljubarrota que Portugal consolidou a sua independência, separado de Castela.
Houve um jurista que muito se distinguiu pela acção desenvolvida, João das Regras ou João das Leis, sendo ele quem preparou a aclamação do Mestre de Avis, que ascendeu ao trono e ficou a ser o rei de Portugal.
Para se decidir sobre tão importante problema, foram convocadas as Cortes de Coimbra, sendo no final delas que D. João de Avis foi aclamado rei e pôde subir ao trono.
(João das Regras demonstrou que D. Beatriz era filha ilegítima, pois D. Fernando não poderia ter casado com D. Leonor Teles; demonstrou ainda que os dois filhos de D. Inês de Castro, D. João e D. Dinis, também eram ilegítimos, porque D. Pedro, apesar de o afirmar sob juramento, não casou com ela; sendo forçoso escolher um filho bastardo para rei, o Mestre de Avis era o que mais convinha, o que melhores provas tinha dado, o que oferecia maiores garantias. Não deixa de ser estranho que o clero não interferiu decisivamente numa questão que tinha muito de natureza religiosa).
SEGUNDA DINASTIA
DA CASA DE AVIS
Consolidou a sua posição no trono e, consequentemente, firmou a autonomia nacional portuguesa com a guerra que travou contra o rei de Castela, marido de D. Beatriz de Portugal, também chamado D. João I.
Confirmou a aliança de D. Fernando com o duque de Lencastre, da Inglaterra, que sustentava direitos sobre a coroa de Castela, recebendo valioso auxílio na Guerra da Independência.
Para comemorar a mais importante batalha e o maior triunfo, mandou construir o Mosteiro de Santa Maria da Vitória, vulgarmente designado por Mosteiro da Batalha, onde hoje existe a cidade deste nome, perto de Aljubarrota, local da peleja. Ali está sepultado com boa parte da sua família.
Iniciou a expansão ultramarina nacional, com a conquista de Ceuta e com o descobrimento da Madeira e dos Açores. Isso, de certo modo, dava continuidade à tradição portuguesa, prosseguindo a luta contra os mouros no norte de África e dando maior expansão às actividades náuticas.
Contraiu matrimónio com D. Filipa de Lencastre, em resultado da aliança inglesa; outra irmã de D. Filipa veio a ser rainha de Castela. Esta rainha-cônjuge de Portugal foi talvez, entre todas, a que mais se salientou — pelas suas grandes virtudes e pelas invulgares qualidades dos seus numerosos filhos, "ínclita geração, altos infantes", D. Duarte, D. Pedro, D. Henrique, D. Fernando, D. João e D. Isabel.
Foi dada a D. João I a honrosa denominação de "Rei de Boa Memória" pela sua administração modelar, por ser monarca muito prestigioso e individualidade dotada de grande mérito. Era invulgarmente culto, chegou a escrever livros muito interessantes, tratando temas intelectuais e actividades a que se dedicavam as famílias da nobreza, nomeadamente a caça e a equitação.
Governou Portugal, como rei, desde 1385 a 1433.
Teve um reinado muito curto, e cheio de contratempos que muito o fizeram sofrer.
Continuaram as tentativas de expansão portuguesa, por via marítima, tendo sido atingidos na costa ocidental da África o Cabo Bojador e a Angra dos Ruivos.
Tentou-se a conquista da cidade de Tânger, importante praça forte de Marrocos, onde o exército português foi vencido, tendo seu irmão D. Fernando ficado prisioneiro dos mouros na situação de escravo; ficou sendo conhecido por Infante Santo.
Tomou medidas de fortalecimento do poder real, dando seguimento a iniciativas de seu pai. Estava então a começar a radicar-se com vigor o absolutismo régio.
Portugal foi atingido por algumas epidemias, que fizeram muitas vítimas, tendo falecido o próprio monarca.
Era muito culto, com os estudos feitos adquirira grande ilustração intelectual. Assim se explica que seja ainda hoje conhecido por Eloquente, mas talvez fosse mais exacto dar-lhe o título de Erudito
Escreveu alguns livros de feição filosófica, a que se atribui os títulos de "Leal Conselheiro", "Arte de Bem Cavalgar" e "Livro das Misericórdias".
Casou com a princesa D. Leonor de Aragão, que por sua morte ficou a governar o País, tendo criado descontentamento entre a nobreza de Portugal, que evoluiu para tragédia a que faremos referência no reinado de D. Afonso V, filho do casal. Todavia não pode atribuir-se a D. Leonor toda a culpa do facto, pois outros a tiveram em maior grau.
D. Duarte foi rei de 1433 a 1438, durante curtos cinco anos.
Era muito pequeno quando seu pai faleceu, pelo que ficou a governar sua mãe e depois seu tio D. Pedro. A nobreza de Portugal entrou em luta; o rei, já então a governar, não soube ou não quis evitá-la, antes se intrometeu estupidamente nela, chegando a lutar com as forças de D. Pedro, seu sogro, que sucumbiu ingloriamente no combate de Alfarrobeira, em 1449. Só as intrigas da corte podem fazer admitir a vileza do procedimento de alguns fidalgos.
Ainda teve a presunção de se apoderar da coroa castelhana, pensando em casar com a filha do monarca falecido, sua sobrinha; para tal entrou em guerra com os Reis Católicos, que terminou com o desaire sofrido pelas suas tropas na batalha de Toro.
D. Afonso V recebeu o epíteto de Africano por no seu tempo haverem sido ocupadas diversas localidades em Marrocos, sendo as mais importantes Alcácer Ceguer, Arzila e Tânger.
Prosseguiu a expansão marítima, mas tal empresa ficou mal esclarecida, ao tempo havia enorme cuidado em que os acontecimentos não fossem conhecidos; por isso os ignoramos ainda hoje. A exploração dos mares do litoral atlântico africano era feita em dependência de contratos de comércio, e talvez isso explique que se não tenham divulgado nomes nem realizações, que efectivamente existiram. Podemos afirmar que se atingiu o arquipélago de Cabo Verde, a Guiné, São Tomé e Príncipe, o Rio do Ouro, a Costa do Marfim, a Costa da Mina, a Serra Leoa.
No seu reinado, por iniciativa do Regente D. Pedro, foi feita a compilação das leis antigas, constituindo as Ordenações Afonsinas.
Casou com sua prima D. Isabel de Lencastre, filha de D. Pedro, morto em Alfarrobeira. Sua filha D. Joana notabilizou-se pelas suas virtudes e foi beatificada — é a Princesa Santa Joana de Aveiro, também conhecida por Santa Joana de Portugal.
O seu reinado começou em 1438 e terminou em 1481.
D. JOÃO II — (PRÍNCIPE PERFEITO)
No seu reinado realizaram-se as últimas grandes tentativas de exploração marítima, pois havia interesse em chegar depressa à Índia, a grande fonte produtora das especiarias. Podemos referir três expedições de grande importância, as duas viagens de Diogo Cão, que descobriu a costa de Angola e subiu o rio Zaire, e a de Bartolomeu Dias, que dobrou o Cabo da Boa Esperança, Cabo das Tormentas ou Cabo das Tempestades.
Para obter informações sobre a Índia, mandou ali dois emissários muito competentes, Pêro da Covilhã e Afonso de Paiva; nunca mais regressaram, mas ainda forneceram indirectamente algumas notícias de interesse.
Em consequência dos descobrimentos marítimos, feitos especialmente pelos portugueses e espanhóis, foi assinado em 1494, o Tratado de Tordesilhas, que dividiu entre os dois povos as terras já descobertas ou ainda a descobrir.
A nobreza do País continuava a habitual rebeldia, e o rei fez executar alguns dos seus membros, mesmo seus próximos parentes, incluindo um seu cunhado, irmão da rainha, o Duque de Bragança, que foi decapitado. Afirma-se que o próprio rei assassinou outro seu primo, o Duque de Viseu.
Foi cognominado Príncipe Perfeito por ter exercido bom governo e ter aumentado a prosperidade de Portugal; os historiadores de hoje não lhe dariam já tal epíteto.
Casou com D. Leonor de Lencastre, uma das suas primas, como ele neta de D. Duarte. Do casal nasceu um filho, D. Afonso; morreu num desastre de equitação, em 1491; tinha dezasseis anos mas estava já casado com D. Isabel de Castela e Aragão. Este facto motivou a terceira sucessão régia anormal, pois o rei tinha um filho bastardo e não quis que fosse rei.
D. João II reinou de 1481 a 1495, portanto catorze anos.
Este monarca era irmão da rainha D. Leonor e primo do rei D. João II. Antes de ser rei teve a dignidade de Duque de Beja.
Foi chamado Venturoso porque ascendeu ao trono sem se prever (pela morte de D. Afonso e por D. João II não querer que seu filho bastardo fosse rei) e porque teve o reinado mais brilhante de toda a nossa História.
Vasco da Gama atingiu a Índia em 1498, comandando uma frota já preparada pelo seu antecessor.
Pedro Álvares Cabral descobriu o Brasil em 1500. A armada dirigia-se à Índia, tendo atingido o Brasil por desvio de rota programado. Não foi este o último descobrimento, mas dos posteriores já pouco se costuma falar.
A propósito, podemos recordar que descobrimos ainda as ilhas de Ascensão e Santa Helena, certas zonas da costa dos Estados Unidos e do Canadá, e diversas ilhas da Oceania.
Para comemorar o descobrimento do caminho marítimo para a Índia, D. Manuel edificou o majestoso Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa; foi assim chamado por ter sido entregue à Congregação de S. Jerónimo.
Construiu-se igualmente a Torre de Belém, que deveria ser uma fortaleza mas veio a ser uma das nossas mais interessantes construções arquitectónicas. Vulgarizou-se uma forma de decoração que nós conhecemos um tanto ou quanto inexactamente por Estilo Manuelino — pois não chega a ser um estilo definido.
Com o ouro do primeiro tributo cobrado ao potentado de Quíloa, na costa africana do Índico, foi construída a famosa Custódia de Belém, que passa por ser o mais perfeito exemplar da joalharia portuguesa e se diz ter sido executada por Gil Vicente, certamente o que se distinguiu no teatro.
Iniciámos a ocupação territorial na Índia, conquistando entre outras as cidades de Ormuz, Goa, Malaca, etc.
Notabilizaram-se aqui, na Índia, muitas individualidades portuguesas, sendo as principais Vasco da Gama, Francisco de Almeida, Afonso de Albuquerque e João de Castro.
Foi feita nova compilação de leis, actualizando a anterior, tendo recebido a denominação de Ordenações Manuelinas.
Neste período começou a empregar-se em Portugal a nova e revolucionária invenção, a imprensa, utilizada sobretudo para a edição de livros devotos, em boa parte com a protecção de sua irmã, a rainha-viúva, D. Leonor (por antonomásia chamada "Princesa Perfeitíssima").
D. Leonor, viúva de D. João II, fundou a instituição chamada Irmandade de Nossa Senhora da Misericórdia.
A mesma senhora incentivou a arte de Gil Vicente, apoiando a sua criação teatral e as suas qualidades histriónicas. E foi no tempo deste soberano que Garcia de Resende elaborou o seu famoso Cancioneiro Geral.
D. Manuel umas vezes protegeu e outras vezes perseguiu os mouros e judeus, sendo levado a isso pelo seu relacionamento familiar com os Reis Católicos, devido aos seus sucessivos casamentos com princesas espanholas.
Casou realmente três vezes, sempre na situação de rei e com princesas castro-aragonesas:
— a primeira esposa era D. Isabel de Castela e Aragão, viúva de seu sobrinho D. Afonso, atrás referido;
— a segunda esposa foi D. Maria de Castela e Aragão, as duas filhas dos Reis Católicos;
— a terceira era D. Leonor da Áustria, filha de D. Filipe I e de D. Joana-a-Louca e irmã do imperador Carlos V e de D. Catarina, rainha de Portugal, a seguir mencionada..
Ocupou o trono português desde 1495 até 1521, portanto durante vinte e seis anos.
D. JOÃO III — (PIEDOSO)
No tempo deste monarca começou a decadência nacional; no reinado de D. Manuel, o prestígio de Portugal tinha atingido o apogeu e agora, por razões diversas, entrava em declínio. O esforço feito, quanto a exigências de pessoal, causou o amolecimento, a astenia; e a abundância de riquezas fáceis e rapidamente adquiridas provocou o comodismo.
Verificando-se que as praças marroquinas não ofereciam vantagens e exigiam sacrifícios, começaram a ser abandonadas, e entre elas Safim e Azamor. Fez-se o primeiro recenseamento da população portuguesa, com a finalidade de se saber com a possível exactidão quantas pessoas tinha o nosso País.
Estabeleceu-se um importante tratado com a Espanha, o de Saragoça, que tratava da posse das ilhas Molucas, que Portugal também disputava. Fizeram-se os primeiros contactos perduráveis com as terras do Extremo Oriente, as gentes chinesas e japonesas.
Foi fundada a Companhia de Jesus, grande baluarte católico que se opunha à difusão do protestantismo, tendo o seu primeiro convento sido instalado em Lisboa, junto da actual igreja de S. Roque. Estabeleceu-se o Colégio das Artes, em Coimbra, como instituto de preparação para o ingresso no ensino universitário.
Introduziu-se a Inquisição em Portugal, pedido que o Papa não queria atender. Efectuaram-se os primeiros autos de fé. Foi publicada a primeira lista de livros proibidos e editaram-se obras muito importantes — Gramática, de João de Barros, Menina e Moça, de Bernardim Ribeiro.
D. João III, antes de ser rei, teve casamento tratado com a princesa espanhola D. Leonor, que veio a casar com seu pai. Casou com uma sua irmã, D. Catarina de Castela e Aragão.
É chamado Piedoso por ser mesmo muito devoto. Foi rei de Portugal desde 1521 a 1557, ao longo de trinta e seis anos.
Encontramos aqui mais um caso de sucessão régia anormal, porque D. Sebastião era neto de D. João III e de D. Catarina da Áustria. Seus pais foram o príncipe D. João e a princesa D. Joana, filha do imperador Carlos V. Nasceu após o falecimento do seu progenitor e é uma das razões para ter o epíteto de Desejado. Apontaremos outra razão no final destas anotações.
Como tinha só uns três anos de idade quando herdou o trono, governaram o País primeiro sua avó D. Catarina e depois seu tio-avô o Cardeal D. Henrique, o seu sucessor no trono.
Foi criada a Universidade de Évora, por iniciativa dos jesuítas e com o patrocínio de D. Henrique, que durante bastante tempo foi arcebispo desta cidade.
Fez-se a edição das obras de Gil Vicente, Garcia de Orta e Damião de Góis, e de os Lusíadas, epopeia de Luís de Camões.
Ao arrepio do que seu avô D. João III tinha feito, pretendeu estabelecer um império cristão português em Marrocos, tendo organizado um grande exército para invadir e ocupar esse território, integrando-se ele mesmo nos quadros do comando. Por erros diversos, e porque a empresa era demasiado temerária, as tropas lusitanas foram derrotadas em Alcácer Quibir; o rei desapareceu durante a batalha, nunca se encontrando o seu corpo e nem se registou o seu nome entre os cativos. O portugueses esperaram o seu regresso, criando-se assim o SEBASTIANISMO, que sustentava a crença de que voltaria um dia, numa manhã de nevoeiro. É a segunda razão para ter o cognome de Desejado.
Pensou-se no casamento com diversas princesas e mais insistentemente com D. Isabel Clara Eugénia, filha de D. Filipe II, rei de Espanha, mas nenhum destes projectos se realizou.
Governou Portugal durante dez anos, de 1568 a 1578, embora o seu reinado se estenda por vinte e um anos, com início em 1557.
Encontramos aqui mais outro caso de sucessão régia anormal em Portugal, pois D. Henrique era tio-avô de D. Sebastião.
Espalhando-se a notícia do desastre da batalha de Alcácer Quibir, foi aclamado rei e começou a governar. Ele tinha sido durante muito tempo regente do reino, durante a menoridade.
O seu curto reinado corresponde a um período de transição entre dois monarcas efectivos, em que ele foi "soberano interino".
Para se decidir quem poderia ser o seu sucessor, reuniram-se cortes em Almeirim, que nada resolveram. Alguns autores atribuem a culpa a D. Henrique, que a não teve, porque estava já muito doente, por vezes até sem o pleno uso dos sentidos, mesmo em estado de coma; veio a falecer dessa crise de saúde.
Era ainda muito novo quando foi nomeado arcebispo de Braga, de onde transitou para Évora e daqui para Lisboa, acumulando o cargo de regente do reino; voltou a ser arcebispo de Évora, deixando o lugar vago para ser aclamado rei. Nessa altura tinha já sido nomeado cardeal, contava sessenta e seis anos de idade e era muito doente.
O curto reinado do cardeal-rei D. Henrique não regista nenhum facto saliente. A grande preocupação nacional, tanto dos governantes como mesmo de muitos particulares, era pagar o resgate dos prisioneiros de guerra. Foi chamado Casto por ser um destacado eclesiástico e a isso comprometido voluntariamente.
Governou o País menos de dois anos, de 1578 a 1580.
(A posição dos pretendentes ao trono, que decididamente o disputaram, todos descendentes de D. Manuel I, era a seguinte:
—D. Isabel (3º filho)>D. Filipe de Espanha,{futuro rei};
—D. Beatriz (4º filho)>Manuel Felisberto>Carlos de Sabóia;
—D. Luís (5º filho)>D. António, Prior do Crato;
—D. Duarte (10º filho)>D. Maria de Parma>Rainúncio de Parma;
—D. Duarte (10º filho)>D. Catarina >D. Teodósio >D. João IV, rei).
SEGUNDA DINASTIA
SUAS CARACTERÍSTICAS
Período de expansão, continuando a luta contra os mouros, em Marrocos, e descobrindo novas terras, pelo mar.
Aumento da importância da actividade comercial, atraindo a Lisboa mercadorias raras e caras, com lucros muito volumosos.
Aproveitamento agrícola das terras encontradas, desenvolvendo as culturas mais rendosas, sobretudo a açucareira.
Fixação de contingentes humanos, portugueses ou estrangeiros, nos novos locais de colonização.
Interesse pela manutenção da pureza da fé cristã em Portugal e sua expansão pelo mundo, a partir dos lugares ocupados.
Crescimento das riquezas, sobretudo as fiduciárias, com o correspondente aumento do luxo e amolecimento de costumes.
Manifestação da mentalidade humanista, ao lado da intransigência religiosa católica contra as ideias protestantes.
Pouco depois de morrer D. Henrique, o rei de Espanha, D. Filipe II, invadiu Portugal com um poderoso exército.
D. António, Prior do Crato, o preferido pela maior parte dos portugueses, foi aclamado rei mas começou por sofrer logo grande derrota junto de Lisboa, na batalha de Alcântara.
Chegou ainda a cunhar moeda em seu nome e teve por si, durante algum tempo, as ilhas dos Açores. Era apoiado por alguns países europeus que combatiam a Espanha. Desenvolveu actividade política e militar, do estrangeiro, pelo menos até 1589.
D. Catarina de Bragança era, pelas leis, quem tinha melhor direito e maior razão, mas não sustentou as suas pretensões com grande energia, não eram muitos os que a defendiam, parece que por não simpatizarem com seu marido.
D. Filipe (I de Portugal e II de Espanha), logo que lhe foi possível, convocou cortes em Tomar, pelas quais foi aclamado rei.
Portugal continuava a ser um país separado da Espanha, portanto independente, e regido por um Conselho de Governadores ou por um Vice-Rei. Com este título notabilizaram-se duas personagens muito famosas, uma quase no começo — o Vice-Rei de Portugal, Cardeal-Arquiduque Alberto da Áustria, que veio a ser genro de D. Filipe, e a Vice-Rainha de Portugal, D. Margarida de Áustria, no final do período, pois ocupava o lugar quando se deu a Restauração, em 1640.
TERCEIRA DINASTIA
DA CASA DE ÁUSTRIA
O reinado de D. Filipe I pouco tem a registar, bastando dizer que o seu primeiro cuidado foi eliminar os focos favoráveis a D. António, sendo o principal o das ilhas dos Açores. Foi chamado Prudente por ter exercido política muito eficiente e cautelosa.
Diz-se dele que ao mesmo tempo herdou e conquistou o trono de Portugal, devido a ter mantido as suas posições com o vigoroso apoio dos soldados espanhóis. Temos de reconhecer, no entanto, que também em Portugal teve bastantes partidários, praticamente todos aqueles que não seguiram D. António.
Os duques de Bragança, muito estranhamente, desinteressaram quase totalmente do problema sucessório, pertencendo-lhes o mais lídimo direito, face às leis que regulavam a sucessão real.
Procurou manter a magnificência da corte portuguesa e até se interessou pela resolução favorável de muitos problemas governamentais, tanto em Portugal como nas conquistas lusas da América do Sul, da África, da Ásia e da Oceania.
Criou em Lisboa uma escola profissionalizante. a que se deu a designação de Aula do Risco, que começou a funcionar em 1594. Deu incentivo a alguns estudiosos da História de Portugal, tendo sido publicada grande parte, quase a totalidade do repositório intitulado Monarquia Lusitana.
Era filho de D. Carlos I de Espanha (o imperador Carlos V) e de D. Isabel de Portugal. Casou quatro vezes, mas nenhuma das cônjuges foi nossa rainha, faleceram todas antes de ele se firmar no trono português. Pela sua ordem foram estas as suas esposas:
— D. Maria de Portugal, filha de D. João III e de D. Catarina;
— D. Maria Tudor, rainha da Inglaterra;
— D. Isabel de Valois, da França;
— D. Ana Maria da Áustria, sua sobrinha, filha de Maximiliano II.
Foi rei de Portugal desde 1580 a 1598.
Era filho do rei anterior e de sua última esposa, D. Ana Maria da Áustria.
Os três monarcas espanhóis também reis de Portugal foram piorando cada vez mais o sistema de governação, para o que contribuíram as condições gerais, francamente degradantes.
Este soberano foi designado por Pio devida a ser muito devoto. Podemos recordar que era decidido defensor da perseguição aos hereges, mouros e judeus. Alguns historiadores espanhóis chamam-lhe Apático. Os dois cognomes completam-se e definem a sua personalidade.
No seu tempo foi publicada a terceira compilação de leis portuguesas, feita por iniciativa de D. Filipe I, que vigorou durante longo período e foi conhecida por Ordenações Filipinas.
Os inimigos da Espanha apoderaram-se de diversos pontos que até então tinham estado nas mãos dos portugueses, na América do Sul, na África e no Oriente, tendo-se perdido alguns e recuperado outros pela força das armas. Podemos recordar as perdas sofridas em Ceilão, na China e no Japão. No entanto, os corajosos e audazes bandeirantes conseguiram empurrar para muito longe a linha definida no Tratado de Tordesilhas, ocupando o Maranhão e aumentando enormemente a superfície brasileira.
No seu tempo regista-se a publicação de diversos trabalhos literários de grande importância, as obras de Duarte Nunes de Leão, Francisco de Andrade, Fernão Mendes Pinto e outros.
Visitou Portugal no final do seu reinado, em 1619, e quis assistir aqui a touradas e autos de fé. As nossas autoridades sabiam que os apreciava e quiseram lisonjeá-lo! Mau gosto, tanto de um lado como do outro!
Casou com D. Margarida da Áustria, também conhecida por Margarida de Gratz ou Graetz, de quem nasceu o seu sucessor.
Governou Portugal e a Espanha desde 1598 até 1621.
Em Portugal é vulgarmente chamado Grande, tendo havido já quem lhe desse o nome de Opressor. Os historiadores espanhóis costumam designá-lo por Alegre. Um conhecido escritor da Espanha, André Manjón, afirmou dele que "quando morreu andava a aprender a governar bem".
No seu reinado continuámos a perder diversas cidades, portos e praças de guerra, em diversos pontos do globo. Alguns lugares foram perdidos para sempre, embora outros tenham sido recuperados pela força das armas, como aconteceu em Pernambuco, São Salvador e outras localidades, no Brasil.
Em 1637 houve tumultos no Alentejo, contra a política seguida pelo governo de Madrid. Pouco depois, em 1 de Dezembro de 1640, efectuou-se o movimento restaurador da independência e Portugal passou a ter rei próprio, D. João IV, neto da candidata ao trono em 1580, D. Catarina de Bragança.
A revolta da Catalunha, que também lutava pela independência, favoreceu indirectamente a posição portuguesa, pois aliviou a pressão exercida contra o nosso País. Em boa parte, a conjura do 1º de Dezembro foi feita também para que as nossas forças não fossem combater os revoltosos catalães.
Diversos países europeus andavam então em luta aberta contra a Espanha, a chamada Guerra dos Trinta Anos, e também isso nos beneficiou em larga escala.
D. Filipe III (IV da Espanha) casou com D. Isabel de Bourbon, filha do rei da França. Depois de viúvo, não sendo já rei de Portugal, casou em segundas núpcias com D. Maria Ana da Áustria, a mãe do seu sucessor, que já não foi nossa rainha.
Foi rei de Portugal desde 1621 a 1640.
Foi rei da Espanha desde 1621 a 1665.
TERCEIRA DINASTIA
SUAS CARACTERÍSTICAS
Descontentamento provocado pelo novo sistema de governo e a saída de Lisboa para Madrid, do centro de decisões.
Saudosismo do passado, francamente progressivo e atribuição das causas de decadência à realidade de momento.
Sonho esperançoso da recuperação da glória nacional pela restauração do antigo sistema administrativo.
Revolta perante atitudes de exagerado autoritarismo em que todos as conveniências se encaminhavam para a Espanha.
Incentivo de insurreição e sublevação por motivo da subordinação das forças nacionais aos projectos ibéricos.
Revigoramento da vitalidade portuguesa pela emulação dos numerosos adversários que a Espanha contava na Europa.
Reacção contra a política de aniquilamento praticada pelos principais responsáveis da governação.
QUARTA DINASTIA
DA CASA DE BRAGANÇA
Subiu ao trono de Portugal em resultado da Revolução do dia 1º de Dezembro de 1640. As condições que a Espanha enfrentava, no cenário europeu, permitiram que a guerra não fosse muito violenta, pois no tempo deste rei houve apenas uma batalha de certa importância, a que se travou na região de Montijo, em território espanhol, sinal de que foram os portugueses os invasores. Foi-lhe dado o epíteto de Restaurador por ser ele o monarca que deu realidade à recuperação da vida nacional.
Embora todo o País quisesse a separação da Espanha, houve ainda algumas manifestações de revolta, de que se destacou a do marquês de Vila Real e do duque de Caminha, seu filho, que foram executados.
Continuaram os ataques dos inimigos da Espanha a diversas cidades do Ultramar, nomeadamente Angola e Brasil, obrigando-nos a fazer grande esforço para conservar umas e recuperar outras. Houve-as que se perderam, como aconteceu a Malaca e como antes ocorrera com Ormuz e outras praças de guerra. Podemos recordar que, em 1641, os holandeses ocuparam Luanda, Benguela e São Tomé, que recuperámos meia dúzia de anos mais tarde, em 1648.
D. João IV era neto de D. Catarina, Duquesa de Bragança, e filho de D. Teodósio, Duque de Bragança. Casou em Espanha com D. Luísa Francisca de Gusmão, filha do Duque de Medina Sidónia. Esta senhora mostrou ser muito corajosa, apoiando o marido e incentivando-o a que aceitasse a coroa. Diz-se desta senhora que em sua opinião "valia mais ser rainha uma hora do que duquesa toda a vida" ou então que "era preferível morrer reinando do que viver servindo".
Uma das suas medidas mais famosas foi proclamar Nossa Senhora da Conceição (Imaculada Conceição) padroeira de Portugal. D. João IV governou o País desde 1640 a 1656.
Foi rei de Portugal devido ao falecimento prematuro de seu irmão D. Teodósio, legítimo herdeiro do trono. Era notoriamente diminuído, sofrendo de grave deficiência física e mental, verdadeiro mentecapto, por isso se admite ser um "rei espúrio". Durante a menoridade governou como regente do reino sua mãe D. Luísa de Gusmão; depois, exerceu o poder, com eficiência mas com exagerado autoritarismo, o primeiro-ministro e escrivão de puridade, Conde de Castelo Melhor.
Duas anotações salientes enchem o seu reinado. A primeira refere-se às vitórias que o exército português obteve contra as tropas espanholas. Realmente, ganhámos as batalhas de Elvas, Ameixial, Castelo Rodrigo e Montes Claros, o que consolidou a independência de Portugal. Isso explica que este rei seja conhecido como Vitorioso. A Guerra da Restauração terminou com o tratado de paz assinado em 1668.
A segunda anotação relaciona-se com o seu casamento e o processo de nulidade subsequente. Os especialistas em direito canónico sustentam que as condições do rei não lhe permitiam fazer casamento válido; a anulação fundamentou-se em que nunca chegou a ser consumado. Levaram-no a fazer casamento político!
A sua esposa foi D. Maria Francisca Isabel de Sabóia, da alta nobreza da França, filha do Duque de Nemours. Em face do desencanto apresentado por D. Afonso, D. Maria Francisca prendeu-se logo aos atractivos do irmão, D. Pedro, futuro rei.
Um golpe de Estado afastou D. Afonso VI, que viveu ainda longos anos como prisioneiro em alguns palácios, arredou do País o Conde de Castelo Melhor e entregou o poder a D. Pedro. Logo que foi declarada a nulidade matrimonial, este fez imediatamente o seu casamento com D. Maria Francisca Isabel de Sabóia.
O reinado de D. Afonso VI estende-se desde a data do falecimento de seu pai, em 1656, até ao ano da sua morte, em 1683. No entanto, o governo pessoal não chegou a existir e o governo nominal vai até 1667.
Foi-lhe dado o epíteto de Pacífico pelo simples facto de ser ele a assinar a paz com a Espanha.
Poderia contestar-se a validade do cognome, pois logo a seguir, e na aparência desnecessariamente, entrou noutro conflito, a Guerra da Sucessão da Espanha.
Fez ainda outro famoso convénio, este comercial, com a Grã-Bretanha, o Tratado de Methwen. É apontado como grandemente favorável à divulgação do vinho do Porto e altamente prejudicial à incipiente indústria nacional.
Neste período foram encontradas as grandes reservas de ouro, diamantes e esmeraldas, no Brasil, o que veio criar condições económicas favoráveis e enriquecer artisticamente o País, com o que se chama Estilo Barroco, de que temos inúmeros espécimes em igrejas e palácios.
Foi no tempo de D. Pedro II que se reuniram pela última vez as cortes, à maneira antiga, que aliás não chegaram ao fim dos seus trabalhos por o rei as dissolver, sob a acusação de que pretendiam deliberar em assuntos que não eram da sua competência. A próxima reunião dos representantes do povo só veio a ocorrer já no período do liberalismo. Diz-se que o absolutismo régio em Portugal veio de D. Pedro II, mas em verdade tinha começado muito antes, pelo menos em D. João II.
Depois do falecimento de D. Maria Francisca Isabel de Sabóia, o rei contraiu segundas núpcias com D. Maria Sofia Isabel de Neuburgo, filha do conde do Reno, o "Eleitor Palatino", de quem nasceu o sucessor do trono.
D. Pedro II governou Portugal desde 1667 e foi rei de 1683 a 1706, data da sua morte. Em boa lógica o seu reinado deveria ter começado logo em 1656, quando faleceu seu pai, D. João IV, evitando assim mais uma sucessão régia anormal e um processo de casamento um tanto escabroso.
Os reinados de D. Manuel I e de D. João V foram os mais brilhantes da História de Portugal. Tiveram para isso motivos muito semelhantes. D. Manuel I dispôs das volumosas riquezas que o erário régio auferia do comércio das especiarias, sobretudo com a Índia, e D. João V desfrutou os recursos provenientes da exploração aurífera, no Brasil.
O primeiro relacionou o seu nome com uma gloriosa manifestação artística, o Estilo Manuelino, e o segundo criou condições para que se radicasse e desenvolvesse o que chamamos Estilo Barroco Joanino.
Quanto a realizações estéticas ou utilitárias, devemos salientar a construção do imponente Convento de Mafra e do Aqueduto das Águas Livres, este para abastecer de água potável a capital portuguesa. Poderíamos referir ainda a construção da Torre dos Clérigos e respectiva igreja, no Porto, e do Palácio Real de Queluz.
Interessou-se muito pelo desenvolvimento da cultura, segundo os moldes do tempo. A organização mais célebre então formada foi a Academia Real da História, que congregava pessoas de grande cultura e de alto nível social. A actividade editorial nesse tempo desenvolvida demonstra que havia entre as camadas sociais de maior destaque verdadeiro interesse pelo problemas intelectuais, segundo os moldes da época, como naquele tempo eram apreciados.
Negociou o fim da Guerra da Sucessão da Espanha, mas logo a seguir tomou parte numa campanha contra os turcos, a pedido do Papa Clemente XI, tornando-se famosa a batalha naval de Matapan, em que participou a nossa marinha.
Descontando estas intervenções bélicas, o reinado de D. João V corresponde a um dos mais prolongados períodos de paz de que Portugal gozou ao longo de toda a sua História.
A reunião das cortes de que se falou em D. Pedro II teve o objectivo principal de aceitarem este príncipe como sucessor régio; segundo a jurisprudência da época, não sendo descendente directo (a linha sucessória havia sido interrompida em D. Afonso VI) precisava de que as cortes o aceitassem como herdeiro do trono (Encontramos situação idêntica em D. Dinis e D. Carlos).
O cognome pelo qual ficou sendo conhecido, Magnânimo, veio-lhe da sua obsessão pelas grandezas e pelas honrarias.
Era muito cioso das prerrogativas régias, pretendia ser tratado com tanta deferência como qualquer outro monarca.
Fez com que o prelado de Lisboa fosse sempre cardeal e o núncio apostólico em Portugal elevado ao cardinalato antes de terminar as suas funções; não sendo uma vez atendido nisso pelo Papa, chegou a cortar relações diplomáticas com a Santa Sé.
Pensou ainda em que houvesse em Lisboa dois antístites titulares, sendo um cardeal e o outro arcebispo.
Conseguiu que a catedral de Lisboa fosse elevada à dignidade de sé patriarcal e que os seus cónegos usassem insígnias semelhantes aos da corte papal.
Obteve para Portugal o privilégio de os sacerdotes rezarem três missas no Dia de Finados, que só mais de século e meio depois foi estendido a toda a Cristandade.
Para se poder equiparar aos monarcas espanhóis, que eram chamados Católicos e ao da França, este denominado Cristianíssimo, requereu e obteve do Papa Bento XIV o título e tratamento de Fidelíssimo.
Casou com D. Maria Ana da Áustria, princesa da família imperial, prova de que Portugal era então um reino altamente prestigiado; foi uma rainha de grandes qualidades.
D. João V reinou durante o dilatado período cronológico que vai de 1706 a 1750.
O reinado de D. José confunde-se com o governo de Sebastião José de Carvalho e Melo. Damos-lhe o cognome de Reformador por se dizer que no seu tempo foram introduzidas profundas alterações na forma de governar. Na realidade, não foram tantas nem tão radicais como muitos julgam. A maior foi ter havido um primeiro-ministro que parece substituir o rei, quando apenas houve uma quase perfeita sintonia e harmonia de mentalidades entre o soberano e o governante efectivo.
Sebastião José (Marquês de Pombal) teve no início da sua carreira o apoio da esposa de D. João V, que simpatizou com sua mulher, por também ser como ela de nacionalidade germano-austríaca.
Logo nos primeiros anos do reinado ocorreu o terramoto de Lisboa (1-11-1755), que deu ao ministro o domínio da máquina governativa. Tomou acertadas medidas de protecção aos sinistrados e de inteligente reconstrução da capital.
Houve alguns anos depois uma tentativa de regicídio, aproveitando o pretexto para abater a nobreza, tratando barbaramente os acusados (por certo menos culpados do que o que deles se disse), e combater injustamente os jesuítas (segundo o que outros países europeus quiseram que se fizesse).
Os nobres implicados (Távoras) foram executados com requintes selvagens. Os jesuítas foram expulsos tanto de Portugal como das missões ultramarinas. A Universidade de Évora, mantida pela Companhia de Jesus, foi encerrada, assim como todas as outras escolas sustentadas pelos inacianos. Um deles, o missionário italo-brasilíco P. Gabriel Malagrida, foi morto como herege num repugnante e condenável auto de fé.
Fundou a Aula do Risco, para o estudo da engenharia. Para melhor preparação da aristocracia nacional, para a educação dos filhos da fidalguia, criou em Lisboa o Real Colégio dos Nobres.
Reformou o esquema pedagógico da Universidade de Coimbra, em moldes que se reconheceu serem pouco sensatos.
Instituiu em Lisboa a Junta do Comércio. Para favorecer a produção e a comercialização do vinho do Porto, organizou a Companhia-Geral da Agricultura das Vinhas do Alto-Douro.
Criou a Capitania-Geral de Moçambique. Estabeleceu o Tribunal da Relação do Rio de Janeiro. Promoveu-se a colonização de Angola com emigrantes europeus.
Organizaram-se grandes empresas comerciais brasileiras, a Companhia do Grão-Pará e Maranhão e a Companhia de Pernambuco e Paraíba, mas não deram os frutos que delas se esperavam. Houve ainda outras, noutros lugares.
Os índios do Brasil foram declarados livres, sendo proibida a sua redução à escravidão. Tomaram-se medidas tendentes a dificultar o tráfico esclavagista e até a transferência de escravos, pois adquiriam a liberdade os que entrassem no território de Portugal. Também se decretou a extinção da distinção entre cristãos-velhos e cristãos-novos (descendentes dos judeus).
Sob o aspecto bélico, podemos salientar que a rejeição do Pacto de Família, aliança dos Bourbons contra a Inglaterra (a nossa rainha D. Mariana Vitória era irmã do rei de Espanha), nos arrastou para a guerra, sendo o País invadido pelas tropas franco-espanholas, a "Guerra Fantástica". Localiza-se aqui a famosa anedota de Pombal, quando disse ao embaixador da Espanha que "para tirar um morto de sua casa são precisos quatro homens vivos".
Foi fundida com técnica de engenheiros nacionais (em peça única e num só jacto), e solenemente inaugurada no Terreiro do Paço, em Lisboa, a estátua equestre de D. José. Afirma-se ser a mais perfeita estátua de bronze de Portugal e uma das melhores do mundo.
D. José casou com a já referida D. Mariana Vitória, filha de D. Filipe V e irmã de D. Fernando VI e D. Carlos III, reis da Espanha. Governou Portugal desde 1750 até 1777.
Se não considerarmos os diversos casos de regência do reino, assim como o governo de D. Teresa, a rainha D. Maria I foi a primeira senhora a governar Portugal. Aconteceu isso porque D. José teve quatro filhas e nenhum filho varão.
Regista-se aqui um caso raro ocorrido em duplicado. D. Maria I casou com seu tio D. Pedro III e sua irmã D. Maria Benedita consorciou-se com o sobrinho D. José (que não sucedeu a esta rainha por motivo de falecimento prematuro.
Logo que subiu ao trono, procurou emendar erros que vinham do reinado anterior, dando liberdade a muitos presos, grande parte jesuítas, injustamente encarcerados (o mais notável dos detidos deverá ser o bispo de Coimbra, D. Miguel da Anunciação, encarcerado durante mais de oito anos e que D. José ainda mandou soltar na véspera da sua morte). Foi o que se chamou "Viradeira".
Neste reinado foi fundada a prestigiosa Academia Real de Ciências de Lisboa, que congregava os maiores intelectuais portugueses. Ao seu lado, podemos colocar a Academia Real da Marinha, entidade destinada a promover a preparação e a dar apoio aos que pretendiam seguir a carreira naval. Instituiu-se também a Casa Pia, para dar abrigo e promover a educação das crianças desvalidas ou abandonadas, ao tempo muito numerosas (recordemos que era frequente, mesmo habitual, encontrar "enjeitados").
Instituiu-se a Biblioteca Pública de Lisboa, organismo que se transformou com o tempo e a evolução da sociedade no que hoje designamos por Biblioteca Nacional.
Um grupo de capitalistas, com apoio oficial, lançou-se à construção de Teatro de São Carlos, em Lisboa, e outros tomaram a iniciativa de edificar o Teatro de São João, no Porto. Tiveram estes nomes para homenagear os futuros monarcas, D. Carlota Joaquina e D. João VI.
D. Maria I viveu num tempo calamitoso, de grandes transformações, profundas e inesperadas. Acompanhou o desenrolar da Revolução Francesa e as modificações que ela motivou. Também sofreu desgostos familiares, a morte do marido e logo a seguir a do filho primogénito. Sendo muito impressionável, talvez isso a tenha influenciado, tendo perdido o uso da razão (realidade que a acompanhou nos últimos vinte e cinco anos de vida; este transtorno psíquico manifestou-se sobretudo depois da morte do seu primogénito, D. José). Por tal motivo, o governo de Portugal passou a ser desempenhado pelo outro filho e sucessor, com a designação de "Príncipe-Regente".
Encontramos por vezes escritores que menosprezam as qualidades de D. Maria I, firmando-se na demência de que veio a sofrer. Estudos mais serenos levam a pensar que era muito inteligente e sensata, fisicamente até bastante bonita. Temos de aceitar a loucura, mas não a idiotia — coisas bem diferentes!
A História chama-lhe Piedosa por ter sido realmente muito devota (talvez até mais do que o conveniente, não sendo dela toda a culpa, integrava-se na mentalidade da época). Deu prova de religiosidade fazendo construir a Basílica da Estrela, dedicada ao Coração de Jesus, devoção no tempo em expansão.
A última fase do seu reinado acumulou acontecimentos bélicos e políticos muito lastimáveis.
Exactamente no período em que se manifestou mais acentuadamente a doença da rainha, ocorreu na região de Minas Gerais, no Brasil, o movimento conhecido na História por "Inconfidência Mineira" (que tinha em vista a proclamação da independência do país ou pelo menos a da região aurífera). Como consequência disso, um dos implicados, José Joaquim da Silva Xavier, por alcunha o "Tiradentes", foi executado e os demais condenados a pena de degredo nas possessões africanas, Angola e Moçambique. (Afirmam alguns estudiosos que havia a intenção de que todos fossem degredados e que só a pouca habilidade {e teimosia} do Tiradentes o levou ao cadafalso).
Enfrentámos a "Campanha do Roussilhão", logo seguida pela "Guerra das Laranjas", e pouco depois pela "Guerra Peninsular", que costumamos designar por Invasões Francesas.
A corte decidiu deslocar-se para o Brasil, fixando-se no Rio de Janeiro (e isso prende-se de perto com a futura e bastante próxima proclamação da independência brasileira).
A primeira invasão francesa foi comandado por Junot; ocupou Lisboa em Novembro de 1807, e ficou a governar Portugal em nome de Napoleão Bonaparte, imperador dos franceses.
A segunda invasão atingiu o Porto, em 29 de Março de 1809, e ocorreu então o grande "desastre da ponte das barcas" (a passagem do Douro fazia-se por um passadiço de madeira sobre barcaças, que quebrou; e a multidão, empurrando-se para fugir aos franceses, atirou ao rio milhares de pessoas).
A terceira invasão entrou pela Guarda, dirigindo-se a Lisboa por Coimbra; travou-se a "batalha do Buçaco", em fins de Setembro de 1810, derrotando os franceses, que prosseguiram até Torres Vedras, mas não atingiram a capital.
Como a corte estava no Brasil, o governo de Portugal foi confiado a um Conselho de Regência (em que os oficiais ingleses tinham a supremacia, e isso causou enorme descontentamento, que se traduziu em diversas atitudes e provocou várias reacções, em regra contrárias à influência exercida pelos militares britânicos).
D. Maria I governou o País desde 1777 a 1792; de 1792 a 1816, data da sua morte, ocorrida no Rio de Janeiro, governou seu filho D. João.
Iniciaremos estes apontamentos dizendo que o epíteto dado a este rei teve como motivo a facto de ele, habitualmente, comutar a pena de morte a todos os condenados que a solicitaram. Há estudiosos que afirmam nunca ter negado a concessão desta graça.
No entanto, pode registar-se que em Lisboa houve em 1817 uma conspiração que terminou pela discutível execução do general Gomes Freire de Andrade e de mais alguns revoltosos (os historiadores ainda hoje dão informações divergentes sobre este acontecimento).
O reinado de D. João VI não ficou marcado por realizações materiais de grande vulto. A ocorrência mais destacada talvez seja o seu retorno a Lisboa, depois de quase uma dúzia de anos de permanência no Brasil. Isso permitiu que a administração portuguesa voltasse a uma certa normalidade.
Em 1820, eclodiu uma revolta popular no Porto que teve como consequência quase imediata a instauração do sistema liberal e pouco depois do regime constitucional, a partir de 1822.
Ainda no seu tempo, o seu filho primogénito D. Pedro proclamou a independência brasileira, de que ficou a ser o chefe com o pomposo título de "imperador" (veio a ser reconhecida por Portugal em 1825, ainda durante a vida de D. João VI, que reservou para si a dignidade imperial — atitude simbólica, sem efeitos práticos nem determinantes políticos destacados).
Já dissemos que contraiu matrimónio com D. Carlota Joaquina, filha de D. Carlos IV e irmã de D. Fernando VII, de Espanha (esta rainha prendia-se muito à actividade política e a sua acção teve repercussões bastante importantes).
Tendo começado a governar em 1792, como regente do reino, em 1799 passou a fazê-lo em seu nome, como "príncipe-regente"; de 1816 a 1826, ocupou o trono como rei de Portugal.
Quando faleceu o rei D. João VI, em Março de 1826, este príncipe ocupava o trono do Brasil (pelo que não podia ser rei de Portugal, impediam-no tanto as leis portuguesas como as brasileiras, mas encontrou solução para o dilema, abdicando em sua filha D. Maria da Glória; considerou que era portuguesa por ter nascido antes da independência brasileira, sendo por tal motivo que não pôde abdicar no filho varão D. Pedro). Determinou que seu irmão mais novo D. Miguel ficasse a governar na qualidade de regente do reino (casaria no momento oportuno com a pequena rainha, sua sobrinha, então com sete anos de idade).
Logo a seguir encarregou uma comissão de juristas, orientada por um inglês, de elaborar uma "Carta Constitucional" destinada a Portugal, tendo executado a tarefa em curtas semanas (Saliente-se que, apesar da sua origem espúria, se considera a mais perfeita constituição portuguesa, a que mais tempo vigorou, mais de oitenta anos).
Portugal ficou a ser governado durante algum tempo por sua irmã, D. Isabel Maria, que na devida ocasião entregou o governo ao príncipe D. Miguel.
Em Abril de 1831, tomou a decisão de abdicar o trono brasileiro em seu filho D. Pedro, e veio à Europa combater D. Miguel, já então alçado como rei de Portugal. Preparou um exército na Inglaterra, concentrou-o nos Açores, desembarcou ao norte do Porto e deu início a uma guerra civil que durou de Julho de 1832 a Maio de 1834, terminando com a derrota de D. Miguel.
A mais importante decisão de D. Pedro, logo que findou a guerra, foi a injusta expulsão das ordens religiosas, em boa parte favoráveis a D. Miguel. Pouco tempo de vida teve, pois veio a falecer, vitimado pela tuberculose, nos fins de Setembro desse mesmo ano, no Palácio Real de Queluz. (Podemos dizer que foi um rei especulativo, pois não chegou a governar, embora a sua influência no País tenha sido grande).
D. MIGUEL I — (TRADICIONALISTA)
Ainda em vida de seu pai, D. João VI, e segundo parece por instigação de sua mãe, D. Carlota Joaquina, tinha já tomado atitudes anti-liberais, nos movimentos conhecidos pelos nomes de Vilafrancada (Vila Franca de Xira) e Abrilada (Abril de 1824).
Tomou conta do governo de Portugal, como regente do reino, por indicação de D. Pedro. Reuniu as cortes, segundo os antigos moldes, e foi aclamado rei.
O seu governo caracterizou-se por ferozes medidas de perseguição aos liberais, tendo cometido muitos desmandos, que de certo modo lhe tiraram a legitimidade governativa.
Sustentou a guerra civil durante quase dois anos, sofrendo algumas derrotas militares, pelo que se viu obrigado a assinar a Convenção de Évora-Monte e a sair de Portugal, tendo passado o resto da sua vida no exílio, o longo período de trinta e dois anos (alguns estudiosos sustentam que, em face das leis, pertencia-lhe o trono, todavia, a experiência de governo que teve ocasião de manifestar tirou-lhe toda a legitimidade).
D. Miguel governou Portugal de 1827 a 1834.
Casou com D. Adelaide de Lowenstein Rosemberg, estando já no exílio, pelo que esta senhora nunca foi rainha de Portugal.
Salientemos, no entanto, que tendo sido extinta a linha sucessória de D. Maria II, a quem a seguir nos vamos referir, a pretensão ou candidatura ao trono de Portugal concentrou-se na sua descendência, atendendo à ordenação seguinte:
D. Miguel I(até 1866)>D. Miguel II (1866-1927)>
D. Duarte Nuno (1927-1976)>D. Duarte Pio (desde 1976).
Nasceu no Rio de Janeiro em Abril de 1819, sendo filha da imperatriz do Brasil, D. Maria Leopoldina da Áustria, primeira esposa de D. Pedro; a segunda foi D. Amélia de Beauarnais.
Já vimos em que condições ascendeu ao trono de Portugal, tendo sido a nossa segunda soberana reinante.
Todo o seu governo foi muito agitado por convulsões políticas, guerras e revoluções.
A Carta Constitucional foi substituída durante curto prazo por outra constituição. (Os partidos políticos, em regra três, combatiam-se ferozmente; apesar de muitos dos seus responsáveis serem pessoas respeitáveis, a actuação partidária denotava um primitivismo detestável).
Os principais movimentos revolucionários foram a Revolução de Setembro de 1836 (que aboliu a Carta Constitucional), a Belenzada (a contrariar a anterior), a Revolta dos Marechais (Saldanha e Terceira, em favor da Carta), a Revolta de Costa Cabral (restaurando-a) e finalmente a Regeneração (revolta do marechal Saldanha), em 1851, que pôs fim a tão triste série.
As incidências bélicas mais salientes foram a Revolução Popular da Maria da Fonte (por terem sido proibidos os enterramentos nas igrejas) e a Revolta da Patuleia (devido a uma mudança de governantes) que na prática estão em estreita sequência, em 1846 e 1847, tendo terminado pela intervenção estrangeira com a Convenção de Gramido.
D. Maria II tornou o ensino primário obrigatório e gratuito, criou os liceus distritais, fundou a Escola Médico-Cirúrgica e a Escola Politécnica (uma de cada designação em Lisboa e no Porto) e ainda o Conservatório Nacional de Música, Dança e Teatro, em Lisboa.
Construiu-se na capital a importante casa de espectáculos conhecida pelo seu nome, o Teatro Nacional de D. Maria II.
Foi-lhe atribuído muito justamente o cognome de "Educadora", pois o mereceu por dois motivos diferentes, por todos reconhecidos:
— pelo grande cuidado posto na educação moral e instrução intelectual dos seus filhos;
— pelo interesse que dedicou ao projecto da elevação do nível cultural do seu povo, com particular incidência sobre a infância e juventude.
O nome desta senhora leva-nos a salientar pormenores curiosos da sua vida.
Foi elevada ao trono com sete anos e com essa idade perdeu sua mãe.
Com quinze anos iniciou o seu governo, no final da guerra. Contraiu o seu primeiro consórcio com D. Augusto de Leuchtemberg (irmão da sua madrasta, e dele ficou viúva antes de fazer dezasseis anos, exactamente no dia em que se completavam dois meses de vida matrimonial).
Poucos dias depois de completar dezassete anos, consorciou-se com o rei D. Fernando II (D. Fernando Saxe-Coburgo-Gotha), e dele teve numerosos filhos, em outros dezassete anos de casada.
Faleceu com trinta e quatro anos de vida. Veio ao mundo em 1819 e expirou em 1853.
Pode, pois, dizer-se que teve vinte e sete anos de reinado (1826-1853) mas apenas dezanove anos de governo (1834-1853).
Foi o soberano português que congregou em torno do seu nome maiores simpatias, sendo por todos reconhecidas as suas inegáveis qualidades e invulgares virtudes.
Teve um reinado de curta duração, de certo modo semelhante ao de D. Duarte. Alimentava na população portuguesa muitas expectativas de que ele viesse a ser um monarca excepcional, pelo que foi ainda em vida chamado Esperançoso.
No seu tempo inaugurou-se o primeiro troço de caminho de ferro, de Lisboa à estação de Carregado (na distância de trinta e seis quilómetros, preparando a ligação com o Porto e mais tarde com outras cidades de Portugal e da Espanha).
Também foi no seu reinado que se estabeleceu a primeira carreira regular de vapores entre os portos de Portugal e os de Angola, preponderantemente entre Lisboa e Luanda.
Estando muito interessado, desde havia vários anos, na campanha de repressão ao tráfico esclavagista, Portugal sofreu grande afronta do governo francês, que devia apoiá-la. (Tendo sido apanhado pelas nossas autoridades de Moçambique o barco negreiro "Charles et George", pertencente a uma empresa da França, foi aprisionado, segundo estava decidido. O governo deste país colocou-se abertamente ao lado dos esclavagistas, exigiu a libertação do navio e o pagamento de elevada indemnização).
Ainda em relação com a África, e mais concretamente com Angola, foram realizadas diversas expedições científicas, de que podemos destacar as de Silva Porto, Frederico Welwitsch. Ladislau Magyar e outros.
Para dar incremento e maior expansão à economia nacional, organizaram-se algumas amostras públicas, tornando-se famosa a Exposição Industrial do Porto.
Enriqueceu os estudos de nível universitário com a criação do Curso Superior de Letras (corrigindo neste pormenor um erro da reforma pombalina).
Para o seu funcionamento atribuiu-lhe volumosa verba tirada do seu "fundo civil".
Estabeleceu um curso e um conjunto de disciplinas que lembram uma Faculdade de Filosofia e História.
O rei era muito culto, em consequência da primorosa educação recebida e dedicava-se a escrever. (Os seus trabalhos literários foram publicados pela Academia de Ciências de Lisboa, entre 1923 e 1930, constituindo cinco volumes).
Portugal foi atingido por duas temerosas epidemias, a cólera-morbo e a febre amarela, que causaram milhares de vítimas (o monarca deu prova de grande coragem e alto espírito humanitário na visita aos hospitais e no auxílio aos carecidos).
Embora por outras enfermidades, a família régia foi também dizimada (chegando a espalhar-se o boato de ter havido actos criminosos, inclusive o envenenamento, que estudos sérios vieram a negar; sabemos que o rei e seus irmãos foram contagiados pelas águas de Vila Viçosa, que fizeram ainda outras vítimas). Podemos enumerar aqui a negra lista dos falecimentos dos principais membros da família real:
— Em 17 de Julho de 1859, a rainha D. Estefânia, de uma angina;
— Em 06 de Novembro de 1861, o infante D. Fernando, de tifo;
— Em 11 de Novembro de 1861, o rei D. Pedro V, também de tifo;
— Em 27 de Dezembro de 1861, o infante D. João, de igual ataque.
D. Pedro V contraiu matrimónio em 18 de Maio de 1858, com a princesa D. Estefânia de Hohenzollern-Sigmaringen, senhora dotada com qualidades raras; os dois cônjuges amavam-se apaixonadamente (caso muitíssimo raro em famílias reais), tendo feito vida conjugal durante o curto período de catorze meses.
Nasceu em 16 de Setembro de 1837. Subiu ao trono com dezasseis anos, em 1853. Casou com vinte, completos, mas estava já viúvo aos vinte e dois anos. Faleceu aos vinte e quatro e, consequentemente, teve oito anos de reinado.
Este rei recebeu trono devido a seu irmão D. Pedro V ter falecido sem deixar descendência (ao princípio encontrou ambiente desfavorável, por motivo da estupefacção causada pelo falecimento próximo dos seus três irmãos, mas depois veio a conquistar as simpatias da população, que reconheceu as suas grandes qualidades).
Era mais intelectual do que político. Fez primorosa tradução e rica edição de boa parte da obra de Shakespeare (manifestava assim os frutos da esmerada educação que recebera, mais erudita de que política, pois não se podia prever que alguma vez viesse a reinar; no seu tempo esteve em projecto de organização um agrupamento político, que se pensava denominar "Vida Nova", formado por intelectuais célebres, mas não chegou a constituir-se; reuniam-se frequentemente em jantares e tertúlias; como o projecto se frustrou, reconhecendo-se o fracasso da iniciativa, o grupo passou a ser conhecido por "Vencidos da Vida", nome que eles próprios lhe atribuíram; praticamente pertenciam todos à "Geração de 70"; D. Luís viveu um período de certo brilho literário — Júlio Dinis, João de Deus, Camilo e Eça — e artístico — Soares dos Reis, Teixeira Lopes, Malhoa, Columbano, Estação do Rossio e Palácio do Buçaco, estilo neogótico).
Os antigos partidos políticos foram remodelados; apareceram até dois agrupamentos inclinados à dissidência, o Partido Socialista e o Partido Republicano. Quanto aos outros, de ideologia monárquica, entrou-se na fase conhecida por rotativismo, sucedendo-se no governo o Partido Histórico e o Partido Regenerador.
Durante o reinado de D. Luís, foi publicado o primeiro Código Civil Português. Dilatou-se a rede ferroviária nacional. Aboliu-se definitivamente a pena de morte e a escravatura.
Foi, no entanto, na África que mais se fez sentir a vitalidade nacional. Efectuou-se a notável Conferência de Berlim, considerada o marco da verdadeira História da África, em sentido moderno e actual.
Promoveram-se muitas e frutuosas expedições científicas (Serpa Pinto, Brito Capelo, Roberto Ivens, Henrique de Carvalho), fundaram-se cidades novas, consolidou-se o domínio português.
Fizeram-se tratados em que foram estabelecidas novas fronteiras africanas (tornando-se famoso o "mapa-cor-de-rosa", que previa a união territorial de Angola com Moçambique; contudo, o grande interesse manifestado colidiu com as ambições estrangeiras, nomeadamente da Grã-Bretanha, e Portugal sofreu a enorme afronta de ter de aceitar o "ultimato inglês"; o nosso Hino Nacional evoca esse acontecimento).
D. Luís casou com uma princesa italiana, D. Maria Pia de Sabóia (filha de Vítor Manuel, rei do Piemonte e unificador da Itália, senhora de grandes qualidades, extremamente generosa, que se apresentava sempre que surgissem calamidades ou catástrofes, onde pudesse exercer a caridade).
Tendo sido elevado ao trono em 1861, veio a falecer em 1889, portanto com vinte e oito anos de reinado. Recebeu o cognome de Popular pela simplicidade com que se apresentava, havendo autores que lhe deram o epíteto de Bom, porque realmente o era.
Iniciou o seu governo com a agitação causada pelo "ultimato inglês de 1890", que veio causar ou pelo menos agravar a crise política, económica e social.
Apesar disso, prosseguimos em África, Angola e Moçambique, a tarefa da consolidação da soberania portuguesa (pacificação das insurreições, desenvolvimento de diversas campanhas e cuidando de criar condições de progresso).
Manifestou-se a acção de diversos estudiosos em diferentes sectores, contando-se cientistas famosos e eruditos abalizados (continuou a efectuar-se o estudo sistematizado da fauna e flora dos territórios ultramarinos, com resultados surpreendentes e extremamente valiosos).
Desenvolveu-se a indústria nacional (instalando diversas actividades, destacando-se algumas fábricas de cimento e afins, incentivando a cerâmica tradicional e dando-lhe aspecto mais primoroso, podendo destacar-se o que Bordalo Pinheiro fez em Caldas da Rainha, criando fama e nome ainda perdurável).
D. Carlos era um artista e um cientista (mais artista e cientista do que político, em que também foi individualidade notável).
Desenvolveu intensa pesquisa oceanográfica (actuando como verdadeiro sábio, encontrou três espécies novas para as costas de Portugal e uma nova para a História Natural, que recebeu o seu nome — Odontaspis Nasutus Bragança n.sp; a sua colecção ictiológica, que primeiro esteve no Palácio das Necessidades, foi depois integrada no acervo do Museu da Marinha).
Foi pintor de mérito (tendo tomado parte em importantes exposições de arte, produzindo trabalhos de grande valor expressivo).
Interessava-se também pela exploração agrícola (de forma moderna e rentável, conseguindo que as suas terras produzissem em valores económicos apreciáveis).
Era bom desportista (nas modalidades então mais em voga na alta sociedade, no ténis, no golfe, nos desportos náuticos, e também mostrou ser grande apaixonado pela actividade venatória, a caça).
Na política interna, teve de sofrer os ataques dos partidos que combatiam o regime, os que defendiam a proclamação republicana (registou-se no Porto, em 31 de Dezembro de 1891, portanto logo no início do reinado, a primeira grande manifestação republicana, uma intentona para destruir a Monarquia, mas talvez mais o desprestigiassem, com o seu comportamento duvidoso, os monárquicos desonestos do que os republicanos dignos).
D. Carlos contraiu núpcias, em 1886, com D. Amélia de Orleães, cujo nome completo era Maria Amélia Luísa Helena (foi a nossa última rainha; faleceu na sua pátria de origem, a França, por motivo do exílio de Portugal, em 1951).
No dia 1 de Fevereiro de 1908, quando a família real regressava de Vila Viçosa, foi vítima de criminoso atentado, tendo sido morto pelas balas de um facínora e com ele o príncipe real D. Luís Filipe, que então contava vinte anos de idade, praticamente o tempo de duração do seu reinado.
A tragédia que lhe causou a morte proporcionou que lhe chamassem "Mártir", ou "Martirizado" e também por vezes "Desventurado".
(Repetiu-se com D. Carlos o que acontecera com D. Dinis e com D. João V — sucedeu a seu pai mas o penúltimo rei era seu tio. Só que neste caso não houve impedimento da sucessão).
Tendo nascido em 1863, casou em 1886, foi aclamado rei em 1889, e morreu em 1908.
(O rei D. Manuel II, o último monarca da dinastia brigantina, e D. Henrique, o último soberano da dinastia de Avis, tiveram praticamente igual tempo de governo e foram os mais curtos da Monarquia Portuguesa. D. Manuel reinou menos de três anos e o Cardeal-Rei menos de dois anos).
Pode dizer-se que nada há a registar no reinado de D. Manuel II (a não ser que se diga que houve em todo ele intensa actividade da propaganda republicana, chegando a abusos inaceitáveis, como a ostensiva glorificação do regicida).
Mostrou ser um príncipe magnânimo, disposto a perdoar. Pretendia criar clima de entendimento e tranquilidade, mas os adversários políticos não quiseram colaborar com tais intenções.
No dia 4 de Outubro de 1910, eclodiu em Lisboa uma sublevação que ao princípio mostrou fracassar. Mas o apoio dado pelos populares inverteu a situação e no dia seguinte, 5 de Outubro, foi proclamada a República Portuguesa.
O rei D. Manuel e a família real — incluindo as duas rainhas viúvas, D. Maria Pia (já muito idosa e com deficiências mentais, que foi para a Itália, a sua pátria, onde faleceu exactamente nove meses depois) e D. Amélia de Orleães, assim como seu tio o infante D. Afonso Henriques — deixaram Portugal, a caminho do exílio.
Apesar do que aconteceu, pode afirmar-se que era grande a popularidade do rei D. Manuel II, claramente demonstrada na sua visita ao Porto em Novembro de 1908, e nas comemorações do centenário da batalha do Buçaco, em Setembro de 1910, oito dias antes da sua saída do País e fim do seu reinado.
Em 1913, fez o seu casamento com D. Augusta Vitória de Hohenzollern-Bragança (como ele bisneta de D. Maria II), que não chegou a ser por tal motivo rainha de Portugal.
Durante a Grande Guerra, prestou auxílio humanitário aos que dele careciam, apoiando os serviços mantidos pela Cruz Vermelha Portuguesa.
Tendo fixado a residência na Inglaterra, ali faleceu, em Twickeenham, no ano de 1932; havia nascido em 1889.
Enquanto infante de Portugal, usou o título de Duque de Bragança (acontecera a mesma circunstância com o seu homónimo D. Manuel I, que como ele subiu ao trono em consequência de uma morte trágica).
À semelhança de seu pai e seu avô, interessava-se muito pelos assuntos intelectuais, determinando que os seus haveres fossem destinados, após a morte de sua mãe e de sua esposa, para a manutenção de um organismo cultural, a Fundação da Casa de Bragança (e tanto D. Amélia como D. Augusta Vitória voluntariamente prescindiram de tais valores, antecipando a actividade programada).
Ainda dentro deste princípio, elaborou uma obra de pesquisa de muito mérito, que foi editada em três volumes de cerca de oitocentas páginas cada um (o primeiro impresso em 1929, o segundo em 1932, o terceiro em 1935, e reimpressos em fac-símile em 1995; anteriormente havia publicado um catálogo sobre o mesmo tema e quase igual denominação). Deu-lhe o extenso título de:
"LIVROS ANTIGOS PORTUGUESES"
1489-1600
da Biblioteca de Sua Majestade Fidelíssima
descritos por S. M. El-Rei D. Manuel II
QUARTA DINASTIA
SUAS CARACTERÍSTICAS
Iniciou-se com duas guerras seguidas, que absorveram a maior parte da nossa capacidade de resistência.
Tivemos um período de euforia com a exploração das riquezas auríferas do Brasil.
Registamos um período de exagerado autoritarismo, em relação com a difusão do cesarismo e do despotismo iluminado.
Promoveu-se o aniquilamento da aristocracia, com a execução dos fidalgos que se opusessem ao poder régio.
Tentou-se dominar o sector eclesiástico, combatendo as ordens religiosas e difundindo o anticlericalismo.
Decisiva influência do enciclopedismo e da mentalidade racionalista, espalhados pelos intelectuais e invasores franceses.
Fez-se a experiência da valorização excessiva da burguesia, sob o aspecto de luta pela liberdade política e religiosa.
A dinastia divide-se em duas partes distintas, separadas por guerras, as invasões francesas e as lutas liberais.
Enfrentaram-se em luta de aniquilamento os tradicionalistas para conservarem vantagens e os liberais para as conquistarem.
Desenvolveu-se grande esforço para promover o progresso e desenvolvimento do País, que as revoluções entravavam.
O nível cultural teve satisfatória elevação, podendo registar-se muitos e prestigiosos nomes, em todos os ramos.
Em paralelo com o território do reino, procurou-se também levar a civilização às populações das conquistas de além-mar.
A oposição política fez-se sem respeito pela dignidade das pessoas, cometendo-se crimes graves, inclusive assassinatos.
PERÍODO REPUBLICANO
— JOAQUIM TEÓFILO FERNANDES BRAGA
interino (1910-1911)
— MANUEL DE ARRIAGA BRUM DA SILVEIRA
eleito, renunciou (1911-1915)
— JOAQUIM TEÓFILO FERNANDES BRAGA
interino (1915-1915)
— BERNARDINO LUÍS MACHADO GUIMARÃES
eleito, deposto (1915-1917)
— SIDÓNIO BERNARDINO CARDOSO DA SILVA PAIS
interino, assassinado(1917-1918)
— JOÃO DO CANTO E CASTRO DA SILVA PAIS
interino (1918-1919)
— ANTÓNIO JOSÉ DE ALMEIDA
eleito, cumpriu (1919-1923)
— MANUEL TEIXEIRA GOMES
eleito, renunciou (1923-1925)
— BERNARDINO LUÍS MACHADO GUIMARÃES
eleito, deposto (1925-1926)
— JOSÉ MENDES CABEÇADAS JÚNIOR
interino (1926-1926)
— MANUEL DE OLIVEIRA GOMES DA COSTA
interino (1926-1926)
— ANTÓNIO ÓSCAR FRAGOSO CARMONA
eleito,cumpriu(1926-1951)
— FRANCISCO HIGINO CRAVEIRO LOPES
eleito,cumpriu (1951-1958)
—AMÉRICO DEUS RODRIGUES TOMÁS
eleito, deposto (1958-1974)
— ANTÓNIO SEBASTIÃO RIBEIRO DE SPÍNOLA
interino (1974-1974)
— FRANCISCO DA COSTA GOMES
interino (1974-1976)
— ANTÓNIO DOS SANTOS RAMALHO EANES
eleito,cumpriu (1976-1986)
— MÁRIO ALBERTO NOBRE LOPES SOARES
eleito,cumpriu (1986-1996)
— JORGE FERNANDO BRANCO SAMPAIO
eleito, em exercício (1996- ......)
PRIMEIRA REPÚBLICA (DEMAGÓGICA)
O período preenchido pela Primeira República, de 1910 a 1926, deixou-nos entre outros os tópicos seguintes:
— Promulgação da Constituição Republicana Liberal;
— Lei da Separação do Estado e Igreja, com a confiscação dos bens eclesiásticos;
— Diversas revoluções e contínuas mudanças de governo;
— Incursão monárquica de Paiva Couceiro, organizada na Espanha em 1912 e sua derrota em Chaves;
— Entrada de Portugal da Grande Guerra, combatendo ao lado dos Aliados;
— Continuação das campanhas africanas de pacificação do gentio sublevado;
— Assassinato de Sidónio Pais, na estação ferroviária do Rossio, em Dezembro de 1918;
— Viagem aérea de Lisboa ao Rio de Janeiro, realizada por Gago Coutinho e Sacadura Cabral em 1922;
— Participação nas comemorações do primeiro centenário da independência do Brasil, no mesmo ano.
SEGUNDA REPÚBLICA (CORPORATIVA)
O período abrangido pela Segunda República, de 1926 a 1974, ficou assinalado por:
— Reforma do sistema administrativo tendo em vista a consecução do equilíbrio orçamental;
— Promulgação da Constituição Republicana Corporativa, aprovada por plebiscito em 1933;
— Oposição ao Comunismo, sobretudo a partir da Guerra Civil de Espanha;
— Neutralidade actuante durante a Segunda Guerra Mundial;
— Comemoração do Duplo Centenário da Independência e da Restauração, em 1940 (Exposição do Mundo Português);
— Os presidentes Óscar Carmona, Craveiro Lopes e Américo Tomás visitam os territórios do Ultramar;
— Sustentação da luta contra a independência dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa.
TERCEIRA REPÚBLICA (DEMOCRÁTICA)
O período decorrido desde a instauração da terceira República, iniciado em 1974, ficou marcado por:
— Independência estouvada dos territórios ultramarinos;
— Favorecimento ostensivo dos movimentos comunistas;
— Abandono dos interesses dos cidadãos retornados;
— Desistência da defesa dos direitos dos goeses;
— Péssima negociação da autonomia de Timor;
— Entrega gratuita e incondicional de Macau à China;
— Melhoria estrutural das condições económicas do País;
— Correcção das distonias sociais e carências nacionais;
— Entrada de Portugal na União Europeia;
— Utilização claudicante dos recursos daí provenientes;
— Promulgação da Constituição Política (Democrática) da República Portuguesa.