O QUÊ E O COMO ENSINAR: algumas questões Zilá A.P.M.SILVA 1. O CURRÍCULO DA PRÉ-ESCOLA: como deve ser? Antes de decidir por um modelo determinado de currículo, o Projeto Pedagógico da pré-escola precisa ser conduzido pelo grupo de profissionais que nela atua, por uma reflexão cuidadosa sobre quem é seu aluno e para o quê ele está sendo educado. Das respostas obtidas resultará um projeto que deverá ser coerentemente conduzido a partir de um dos três polos que seguem: objetivos, conteúdos ou atividades. Durante muito tempo nossa pré-escola desenvolveu seu trabalho de uma maneira ativista, isto é, o planejamento era feito em cima de um rol de atividades as quais nem sempre tinham relação entre si e assim era desenvolvido. Era o currículo por atividades que dividia até o tempo de trabalho da criança, definindo: a hora da novidade, do recorte, do desenho, da brincadeira no tanque de areia, da escrita, da matemática, da linguagem etc. Algum tempo depois se começou a planejar em cima de conteúdos, selecionando "núcleos temáticos" os quais se repetiam nas diversas salas de aula mesmo de níveis diferenciados. Assim, começava-se o ano com o estudo da família, ou da escola, passava-se para o carnaval, seguia-se a Páscoa (entre eles poderia aparecer um "estudo" dos animais ou outro que a professora julgasse significativo). Depois o dia das mães, festas juninas (e o esquema corporal também era "ensinado" entre alguns destes já citados, assim como meios de transporte, que eram conteúdo obrigatório), as férias; na volta destas, o dia dos pais, a primavera, as plantas e por aí afora, centrando o trabalho de sala de aula em assuntos nem sempre interessantes para a criança ou, no mínimo, artificialmente tornados interessantes. Finalmente se optou por elaborar o planejamento a partir de objetivos, estruturando uma linha de trabalho com base teórica construtivista e sócio-interacionista.(*) Nesse momento tivemos que romper com uma série de práticas, até então consideradas adequadas e passamos a nos preocupar com a compreensão delas, buscando outras tantas a partir de um fazer diferenciado, crítico, uma práxis efetiva. O porquê do trabalho e o como fazer estavam se tornando mais claros a cada dia, mas a escolha dos conteúdos ainda era um tanto difícil de determinar. Sabendo que o aluno vai redescobrir e construir princípios a partir do manuseio de objetos (de conhecimento) e do pensar sobre eles, exercendo um esforço voluntário e desenvolvendo uma necessária auto-disciplina que lhe permita interiorizar as ações, veio a dificuldade em definir tais objetos. Levando também em conta que a quantidade de conhecimento acumulado pela humanidade ultrapassa nossa capacidade de armazená-lo, como poderíamos redimensionar o currículo e os programas da pré-escola para fugir dos padrões há tanto tempo estabelecidos, preocupados com a quantidade de informações sem dar muita importância às formas de pensamento da criança ou à maneira como ela lida com tais informações? Pensamos que talvez nem fosse mesmo necessário definir conteúdos "a priori", já que as associações cognitivas e as generalizações podem ser estimuladas a partir de qualquer objeto ou de uma coleção deles. A aquisição dos conceitos, sua revisão constante, sua confirmação e ampliação decorrem, com certeza, muito mais do método de trabalho desenvolvido pelo aprendiz e da mediação do professor do que propriamente do conteúdo abordado. Nossa dúvida, entretanto, corria por conta da prática que, como já dissemos, estruturou uma seqüência programática que se repete na maioria das salas de pré-escola, como: a família, a escola, animais, plantas, meios de transporte, o circo, dia das mães, páscoa, carnaval, férias, temas recortados de uma realidade mais ampla, fragmentados, dificultando o estabelecimento de relações e a formação de categorias. Na maior parte dos casos parece que nos esquecemos de que, independentemente das comemorações do calendário (muitas vezes sem nenhum sentido para as crianças), há muitas coisas acontecendo pelo mundo e que, a partir delas podemos estar desafiando cognitivamente este aprendiz do mundo. É interrogando, duvidando, questionando, discutindo e avaliando seu mundo que a criança aprende a conhecê-lo. E não o faz sozinha, mas numa interação constante com os colegas, a professora da classe e a família, que deve ser envolvida nesse processo de crescimento e transformação. Tudo é novo e deve ser explorado. Muita coisa é desconhecida e deve ser conhecida e compreendida. Percebendo as regularidades que definem os sistemas dentro do universo de conhecimento e seus fatos essenciais, a criança vai construindo seus próprios sistemas de referência e aqueles conceitos aos quais nos referimos anteriormente. Com todo esse questionamento, não chegamos ainda a um acordo quanto ao conteúdo curricular. Conseguimos, entretanto, definir três grupos de conhecimento, tratando de relacioná-los com a criança para que, a partir deles, de maneira absolutamente integrada possamos ajudá-la a perceber as relações que existem na natureza e na sociedade e entender que o conhecimento humano, em qualquer área que se pesquise, nunca é isolado ou fragmentado, mas organizado e hierarquizado em categorias e subcategorias que se interdependem e se completam. Assim ficou: 1. A criança, ela mesma 2. A criança e a natureza 3. A criança e a sociedade Através destas categorias abrangentes pretendemos integrar temas variados que possam gerar discussões ou ser gerados a partir delas, de conversas rotineiras, pesquisas ou situações do dia-a-dia às quais a professora deverá estar sempre atenta. Nessa integração havemos de respeitar as etapas do desenvolvimento infantil, seus interesses e suas necessidades. Começar conversando sobre o que é conhecido mas não reduzir a experiência a isso e sim enriquecê-la por meio da mediação através da qual a professora levará a criança a lidar com os porquês, os como, os quando, os quem, os para que, os onde e todas as relações possíveis a partir do antes e do depois, do semelhante e do diferente, do próximo e do distante etc. Com isso se lida com o mágico, com o faz-de-conta, com as brincadeiras de imitar e, da mesma forma, com as classificações, seriações, quantificações, noções de medida e outras atividades de pensamento necessárias à construção do conhecimento. Observar, experimentar, visitar, explorar, pesquisar, construir, jogar, modelar, desenhar, escrever, recortar, pintar, conversar, ler, escrever, experimentar, declamar e muitas outras atividades poderão ajudar a sistematizar aquelas práticas e valorizar o conteúdo de uma forma concreta e não artificial. É possível a criança fazer uma viagem à lua quando ela já foi ao supermercado, ao correio, à praça e pensou sobre isso, conversando com seus colegas. Passear na floresta também é possível. Falar sobre a experiência (de sentir, pensar ou agir) é indispensável. Registrar (pelo desenho ou pela "escrita") é imprescindível. "Ler"o jornal, a revista ou o livro de histórias, "escrever" uma carta, um bilhete ou um livro... para contar o que foi visto, estudado, pesquisado, comparado, compreendido, construído e vai ser generalizado. Não importa qual seja o assunto. Há objetivos a atingir e estes precisam ficar muito claros. A criança precisa ser informada e aprender a se informar. O que é melhor para ela agora? Aprender conteúdos ou desenvolver atitudes, uma postura inquisidora e crítica diante de uma realidade s |