REFLETIR E PLANEJAR: o princípio das mudanças Zilá A.P. Moura e SILVA Diagnóstico feito, conhecida a criança, a questão do planejamento foi outro problema a ser resolvido. Primeiro foi o porquê planejar. Depois foi o como fazê-lo. Planos? Planilhas? Por onde começar? A Proposta Pedagógica para a Educação Pré-escolar apresentada pela CENP (*) em 1990 foi o começo. Compreender que, numa perspectiva mais geral, o objetivo maior da pré-escola é "oferecer à criança o passo inicial na construção de seus conhecimentos sistematizados, podendo definir a trilha na busca de sua condição de cidadão" (SP, 1990:11) facilitou a compreensão de que o eixo para o trabalho pedagógico deveria ser o desenvolvimento sócio-afetivo, o desenvolvimento motor e o desenvolvimento cognitivo da criança de forma integrada. E, levando em consideração que: "- a escola não é o único lugar onde se processa aprendizagem; - a aprendizagem tem relação com as experiências vividas; - a criança aprende quando tem oportunidade de interagir com as pessoas, com as coisas deste mundo e com os fenômenos que nele acontecem; - nos primeiros anos de vida verificam-se profundas modificações no ser humano, não apenas quanto ao crescimento físico, biológico, no desempenho de cada segmento do seu corpo, mas também em relação à sua capacidade de operar mentalmente. Tais modificações decorrem das condições físicas e de saúde, mas decorrem também das oportunidades de vida e de aprendizagem." (id., p.13), nas discussões que aconteceram em 1993 foram levantados alguns pressupostos, não mais empíricos, mas com base em leituras realizadas por alguns grupos, que passaram a nortear o trabalho em sala de aula. Concluímos que a metodologia da educação pré-escolar não deveria adotar os princípios rígidos do ensino formal tradicional, mas também não poderia se sujeitar ao improviso ou ao espontaneísmo com vinha acontecendo em muitos casos. Alguns princípios foram estabelecidos para nortear o planejamento. - O desenvolvimento cognitivo deve ser parte de um processo de criação de novas relações e desafios que favoreçam diferentes maneiras de perceber a realidade. - A criança precisa de limites para sentir-se segura e protegida, precisa de espaço para se sentir livre e agir, acertando ou errando, mas, acima de tudo, deve ser considerada o agente único de seu próprio desenvolvimento. - O desenvolvimento sócio-afetivo depende do respeito ao contexto particular da criança, das relações que consegue desenvolver com os adultos e com outras crianças e tanto será mais consistente quanto tiver como base o afeto, a compreensão, a confiança, o respeito, a facilitação de sua independência e o desenvolvimento de seu senso crítico. - Inventando problemas e soluções interessantes a partir de sua própria iniciativa e do conteúdo de suas idéias, ao mesmo tempo em que analisa e avalia os resultados de suas ações a criança toma as rédeas de seu desenvolvimento e alça vôo na direção da vida adulta. A discussão destas questões foi tornando cada vez mais claros os caminhos da tarefa de educar e levou a conclusão de que a definição de conteúdos e/ou atividades a serem desenvolvidas na pré-escola deve se condicionar à definição de práticas que possibilitem a formação integral da criança de forma a conduzi-la ao domínio do meio físico e social, atendendo a objetivos como: - desenvolver sua capacidade de observar e de distinguir precisamente os objetos, seus atributos, propriedades e relações; - dominar as noções de espaço, tempo e suas interações. - vivenciar situações em que possa problematizar a realidade, formular hipóteses, analisar dados, estabelecer e criticar conclusões; - situar-se na realidade física e social utilizando seus recursos pessoais; - enriquecer seus conhecimentos através de experimentação direta e da aprendizagem do real, de forma a possibilitar a ela a construção e reconstrução de seus próprios conceitos a partir da constante exploração intelectual do meio. Temas como vegetais, animais, minerais e objetos do mundo em geral, através da experimentação curiosa, observação direta e levantamento de hipóteses poderiam ajudar nessa tarefa. As noções desenvolvidas em todos os momentos deveriam ter como ponto de referência a realidade vivida pelo aluno: as pessoas com as quais a criança vive em casa e na escola (relações sociais); local onde a criança se movimenta - sua casa, a rua, o bairro, a escola e outros (espaço); os objetos com os quais a criança tem contato, inclusive a TV que lhe mostra o mundo sob outros ângulos e pode suscitar questionamentos sobre vários assuntos (relações com o mundo). A noção de tempo seria elaborada através da vivência intuitiva do tempo. Medição e contagem (hora, dia, semana, mês, ano), os diferentes períodos do dia (manhã, tarde, noite); o ontem, o hoje e o amanhã passam a ser desenvolvidos de forma sistemática, possibilitando aquisições que vão se consolidando progressivamente até permitir recuos a um passado mais distante e hipóteses sobre o futuro. O espaço social também deverá ser compreendido a partir de reflexões sobre a realidade em que a criança vive, propiciando a compreensão do espaço produzido pela sociedade, suas contradições e desigualdades, dos fatos noticiados pelos meios de comunicação (acidentes nucleares, descobertas científicas, eleições, questões indígenas, mudanças econômicas, escândalos políticos etc.) sempre que a criança manifestar interesse. E ela manifesta sempre, pudemos observar. Com isso a professora entendeu que deverá estar sempre atualizada e sintonizada com a realidade que não se reduz à comunidade dos alunos e que cabe a ela estar sempre se questionando sobre a experiência deste alunos e sobre os fatos observados por ele. E principalmente, que deve ser capaz de sair do senso comum e tornar-se sujeito de seu tempo e de seu país. De que maneira registrar suas idéias para sedimentar as intenções? Se em forma de planos, planilhas, quadros, na verdade não é muito importante. O "modelo" é pessoal. O que importa no processo, de fato é a abertura a novas experiências, a flexibilidade e a consciência dos resultados que determina a capacidade de administrar sua própria autonomia didático-pedagógica. Para isso havia necessidade de encontrar uma forma diferenciada de planejar, que não fosse linear, mas que garantisse a inter-relação entre os aspectos definidos no conteúdo e as respostas possíveis e prováveis apresentadas pelas crianças. Talvez um sistema de redes conceituais fosse uma forma adequada para registrar esse planejamento. Ainda não temos um padrão definido com clareza, mas sentimos que uma questão é fundamental: a professora nunca deve deixar de registrar os resultados de seu trabalho. Só assim ela poderia retomar seus caminhos corrigindo o caminhar quando isso se tornasse necessário. Tanto quanto ocorre com a criança, os registros do professor lhe permitem efetuar uma avaliação efetiva e socializar/publicar aqueles aspectos significativos de sua prática que podem ser utilizados como referência em novos projetos e pesquisas. Em nossa prática, além dos registros escritos feitos pelo próprio professor, os registros em vídeo foram muito úteis para as discussões realizadas nos grupos.
BIBLIOGRAFIA ALVES, Nilda (org.). Currículos e Programas - como vê-los hoje? Cadernos CEDES, São Paulo: CEDES/Cortez (13), 1984. PEY, M.Oly. Reflexões sobre a prática docente. São Paulo:Loyola, 1984. REDIN, Euclides. Pré-escola, para quê?, in: Pré-escola e a criança, hoje, Idéias, nº 1, São Paulo:FDE, 1988. SÃO PAULO (Estado) Secretaria da Educação, Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas. Pré-escola hoje: uma proposta pedagógica. São Paulo: SE/CENP, 1988. __________ Proposta pedagógica para a educação pré-escolar. São Paulo: SE/CENP, 1990. THIESSEN, Maria Lúcia & BEAL, Ana Rosa de Oliveira. Pré-escola, tempo de educar, São Paulo:Ática, 1986.
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