Astrologia, fases lunares e desastres marítimos
A tese central da Astrologia é que os corpos celestes influem sobre os assuntos terrenos. Não há dúvidas de que as influências astrais existem: basta considerar as marés. Mas é totalmente duvidoso que tais influências possam determinar o caráter e a sorte de uma pessoa, e estender-se a catástrofes e desastres. A Lua em particular tem sido associada com o comportamento anormal. Um caso extremo seria o lobisomem. A própria palavra "lunático" deve sua origem aos supostos efeitos nefastos da Lua.
Tem sido realizadas provas estatísticas para comprovar essas afirmações, sempre com resultado negativo. Podemos encontrar em diversas revistas céticas muitos artigos que demonstram a falsidade da astrologia e das influências lunares anormais. Kelly, Saklofske e Culver (1990), por exemplo, não encontraram nenhuma correlação entre as fases da Lua e os acidentes marítimos em escala mundial. Seu estudo é limitado, como eles mesmos admitem, devido a incluir um número relativamente pequeno de cada classe de desastre: 89 desastres marítimos entre 1854 e 1987.
Nessa investigação foram estudados somente os desastres marítimos, mas foram incluídos mais casos. Nash (1976) catalogou os desastres mundiais, onde "desastre" se define como um acidente com 20 ou mais vítimas fatais. De seu livro, escolheu 1457 desastres marítimos entre 1523 e 1976. Foram excluídos os afundamentos causados por ações inimigas em guerras, porque as operações militares navais freqüentemente são planejadas levando em conta a luz da Lua e as marés. O ataque a Pearl Harbor ocorreu quando a luz da Lua era suficiente para permitir operações noturnas (Prange, 1981). Incluir naufrágios ocorridos em guerras introduziria um desvio óbvio nos resultados. Foi necessário modificar as datas de 26 dos desastres devido à diferença entre os calendários gregoriano e juliano. Todos esses afundamentos, exceto um, envolvem navios ingleses ou espanhóis. A Espanha adotou o calendário gregoriano em 1582; a Inglaterra o fez em 1752. Todos os acidentes anteriores a esses anos tiveram suas datas corrigidas, com exceção de um navio holandês cujo naufrágio se deu em 15 de agosto de 1654, pois os estados católicos da Holanda adotaram o calendário gregoriano entre 1582 e 1583 e os estados protestantes entre 1700 e 1701. Assumi que a data era juliana e a corrigi, mas as conclusões dessa investigação dependem dessas 26 datas estarem corretas.
Um total de 1457 desastres em 454 anos representa 1 desastre a cada quatro meses, mas a distribuição não é uniforme: somente 78 ocorreram antes de 1800 e todos os demais ocorreram depois. Levando isso em conta, a distribuição média está mais próxima de 1 desastre a cada mês e meio. Talvez a explicação mais satisfatória para a diferença pré e pós 1800 seja um efeito de seleção, melhores registros e informação sobre os desastres ocorridos na era moderna, não uma verdadeira variação da distribuição. A análise espectral é uma poderosa técnica estatística para detectar periodicidades em dados estatísticos. A densidade de desastres é demasiadamente baixa para aplicar a análise espectral para encontrar correlações com as fases lunares, mas é mais do que suficiente para buscar possíveis correlações com os planetas.
Segundo a astrologia, alguns planetas têm efeitos maléficos e outros têm efeitos benéficos. Urano, por exemplo, é um planeta malévolo associado particularmente com desastres (Heindel, 1928). Deveria ser evidente uma correlação com o período orbital de 84 anos de Urano ou com seu período sinódico de 370 dias (o planeta, visto da Terra, volta à mesma posição em relação ao Sol). Algumas configurações de planetas chamadas "aspectos" também podem ser benéficas ou maléficas. A conjunção entre Saturno e Urano, um aspecto de influência especialmente segundo os astrólogos, que se repete a cada 45 anos, deveria ser também evidente.
Infelizmente para a astrologia, o espectro das datas dos desastres marítimos não evidencia nenhuma periodicidade. O componente principal do espectro, cinco vezes mais forte que o mais forte componente secundário, representa uma constante ("ruído branco" na terminologia da análise estatística). Nenhum dos componentes secundários exibe sequer uma periodicidade mínima. Se não assumirmos que as influências maléficas dos planetas poupam os navios (algo difícil de defender) temos que concluir que não há evidências para apoiar a astrologia no que se refere a desastres marítimos. As "más vibrações cósmicas" não afundaram o Titanic.
Para buscar possíveis correlações entre as fases da Lua e os desastres marítimos, foi associada a data de cada acidente com o dia correspondente ao ciclo sinódico lunar (o ciclo das fases da Lua) para montar o gráfico cartesiano. O ciclo sinódico lunar médio é de 29,53 dias. A figura ao lado mostra a freqüência de desastres com a fase lunar. Dos 5642 ciclos lunares estudados, 2650 foram de 29 dias e 2992 de 30 dias. Deve-se levar isso em conta quando se calcula a estatística x² com todas as fases. Se não, o dia 29 do ciclo conteria demasiados desastres e o dia 30 insuficientes. Para muitas pessoas os supostos efeitos nefastos da Lua se manifestam unicamente por volta da lua cheia (o lobisomem, por exemplo), então a primeira estatística se calculou para os cinco dias antes e depois do plenilúnio. Com n = 435 os dados são aleatórios e não há nenhuma correlação entre a Lua cheia e os desastres marítimos. Quando consideramos todas as fases lunares encontramos que com n = 1457, x² = 36,12, p = 0,170. Ainda que a probabilidade de que a distribuição seja aleatória seja mais baixa, é suficientemente alta para rechaçar a hipótese de uma associação da Lua com os desastres marítimos. De qualquer maneira, era de esperar que houvesse desvios da aleatoriedade. Tomamos o ciclo lunar como exatamente de 29 ou 30 dias. Não levamos em conta o momento exato do acidente durante o dia, e existe também um efeito de seleção. Tudo isso, e possivelmente outros efeitos, causam desvios da aleatoriedade. Mas tampouco se encontra evidência alguma de um efeito lunar. A Lua não afundou o Titanic.
Podemos concluir que as configurações planetárias e as fases da Lua não têm nada a ver com os desastres marítimos. Se poderia estender esse estudo para abarcar outros tipos de desastres: acidentes aéreos, terremotos, inundações e mais, porém dados os resultados negativos obtidos até então, valeria a pena o esforço?
O Dr. Richard Branham Jr. é chefe da
área de Mateméticas do CRICYT, Mendoza, Argentina e Membro do
Conselho Consultor do CAIRP
subir
Publicado originalmente em "El Ojo Escéptico" de Março
de 1995.
Toda a responsabilidade pela tradução é de Mauro Roberto de
Pennafort.
Livros:
Heindel, M., (1928). Simplified
Scientific Astrology, No. Hollywood, Calif: Wilshire, pp 151-152.
Kelly, I. W., Saklofske, D. H. & Culver, R., (1990).
Worldwide Disasters and Moon Phase. The Skeptical Inquirer, 14 (3),
298-301.
Nash, J. R., (1976). The Darkest Hours. Chicago: Nelson-Hall.
Prange, G. W., (1981). At Dawn We Slept. New York: McGraw Hill, p.
365.