Ministério Público da União
Ministério Público do Distrito Federal e Territórios

13ª e 14ª Promotorias de Justiça Criminal de Brasília

 

VIGIAR E PUNIR - História da violência nas prisões (Surveiller et punir)*

 MICHEL FOUCAULT 

por Rogério Schietti Machado Cruz
Promotor de Justiça do MPDFT




O Autor

MICHEL FOUCAULT, pensador e escritor francês contemporâneo, nasceu em 1926 e morreu em 1984. Formado em Filosofia e Psicopatologia, foi discípulo de Louis Althesser. Concentrou sua inteligência na reflexão de graves problemas do ser humano e da sociedade. Notabilizou-se por obras tais como História da Loucura (1961) e a que ora apresentamos (Vigiar e Punir), publicado em 1975.

O Livro

Com originalidade e profundo senso crítico, o autor aborda o secular problema da resposta social ao crime, mostrando a evolução humana na forma de tratar o criminoso e o crime.
O livro é dividido em quatro partes: SUPLÍCIO, PUNIÇÃO, DISCIPLINA e PRISÃO.
Para aqueles estudiosos das ciências criminais que não concentram seus neurônios apenas na dogmática ou no direito positivo, vale a pena a leitura deste interessantíssimo livro.
O autor relata, com fidelidade, inúmeras espécies de suplícios comuns em tempos não muito distantes do nosso, fomentando-nos reflexões inquietantes.
Uma delas é inevitável: se, há duzentos anos atrás alguns dos países então ditos "civilizados" admitiam como válida a tortura como meio de obter-se a confissão, e como procedimento usual a inflição de terríveis sofrimentos físicos e morais ao condenado, como a sociedade do século XXII reagirá diante das nossas atuais prisões? Embora muito mais humanas do que as do período pré-revolução francesa, não se pode negar que ainda se apresentam como depósitos insalubres e cruéis de presos, com escassa potencialidade para a pretendida reabilitação social do condenado.
Seguem alguns trechos do livro, que mostram o estilo e o predominante enfoque do autor sobre a forma de punição de outrora.

"Na França, como na maior parte dos países europeus - com a notável exceção da Inglaterra - todo o processo criminal, até à sentença, permanecia secreto; ou seja opaco não só para o público mas para o próprio acusado. O processo se desenrolava sem ele, ou pelo menos sem que ele pudesse conhecer a acusação, as imputações, os depoimentos, as provas. Na ordem da justiça criminal, o saber era privilégio absoluto da acusação. "O mais diligente e o mais secretamente que se puder fazer", dizia, a respeito da instrução, o edito de 1498. De acordo com a ordenação de 1670, que resumia, e em alguns pontos reforçava, a severidade da época precedente, era impossível ao acusado ter acesso às peças do processo, impossível conhecer a identidade dos denunciadores, impossível saber o sentido dos depoimentos antes de recusar as testemunhas, ... impossível ter um advogado, seja para verificar a regularidade do processo, seja para participar da defesa."

" O interrogatório é um meio perigoso de chegar ao conhecimento da verdade, por isso os juízes não devem recorrer a ela sem refletir. Nada é mais equívoco. Há culpados que têm firmeza suficiente para esconder um crime verdadeiro ...; e outros, inocentes, a quem a força dos tormentos (tortura) fez confessar crimes de que não eram culpados".

" Uma que matara sua senhora é condenada a ser levada ao lugar do suplício numa carroça "usada para retirar as imundícies em todas as encruzilhadas"; lá haverá uma forca a cujo pé será colocada a mesma poltrona onde estava sentada a senhora Laleu, sua patroa, quando foi assassinada; e sendo colocada lá, o executor da alta justiça lhe cortará a mão direita e em sua presença a jogará ao fogo, e lhe dará imediatamente depois quatro facadas com a faca utilizada por ela para assassinar a senhora Laleu, a primeira e a segunda na cabeça, a terceira no antebraço esquerdo, e a quarta no peito; feito o que, será pendurada e estrangulada na dita forca até a morte; e depois de duas horas seu cadáver ser retirado, e a cabeça separada ao pé da dita forca sobre o dito cadafalso, com a mesma faca que ela utilizou para assassinar sua senhora, e a cabeça exposta sobre uma figura de vinte pés fora da porta da dita Cambrai, junto ao caminho que leva a Douai, e o resto do corpo posto num saco, e entorrado perto do dito poste, a dez pés de profundidade".

*Ed. VOZES, Petrópolis, 1996, 13ª edição, tradução de Raquel Ramalhete

 

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