FESTIVAL DO RIO 99
críticas dos filmes em exibição
BUENA VISTA SOCIAL CLUB, de Wim Wenders
Alemanha/EUA, 1999
Quem teve a oportunidade de presenciar no início do ano o show que dá título ao filme, ambos descendentes de um CD gravado em 97, sabe que pouco precisa ser dito do encontro de músicos cubanos tradicionais que foi "patrocinado" pelo americano Ry Cooder. O nível destes músicos, a qualidade do repertório, a emoção presente na sua ressurreição (no geral são pessoas com mais de 70 anos, vários que já estavam "aposentados"). Então, ir assistir este filme é combinar e separar duas coisas diferentes, mas que de difícil leitura como entidades independentes: o encontro musical da ideologia do CD/filme. No geral, a emoção de cada número musical é tão grande que se perde conceitos estéticos do filme especificamente. No entanto, basta trazer à memória o recente e magistral Year of the Horse de Jarmusch (sobre Neil Young) para saber que boa música deve ser complementada por direção inspirada para fazer um bom filme.Neste quesito, Wenders deixa a desejar. Seu filme parece pouco mais do que qualquer documentário promocional para a TV. Limita-se a mesclar cenas do show com perfis rápidos de cada um dos envolvidos, em cenas bastante batidas de Havana e definições brilhantes como: "Cuba é a meca da música para os percusionistas" ou "não há nada como aprender com os cubanos" ou ainda "Ry Cooder foi um gênio por ter esta idéia". Após a cena inicial, que promete, com o lendário Compay Segundo do alto de seus 90 anos passeando por Havana em busca do passado, o filme cai na mesmice. O projeto todo tem sido questionado com macumba para turista, como lucro em cima destes cubanos ingênuos, como apresentando a face mais exótica do son cubano. Ingênuos são os que defendem tal idéia pois, querendo defender os cubanos, os debilitam ao ponto de se acharem incapazes de julgar seu destino. Não parece no filme que estejam sendo usados. Há uma assumida simbiose: assim como Ry Cooder assume que é seu projeto que mais vendeu, os cubanos sabem que foram retirados do esquecimento (inclusive interno no país, diga-se) para uma inesperada sobrevida. E, no meio tempo, proporcionando momentos antológicos de música pelo mundo, o que é tudo que se pode esperar de um músico. Da mesma forma, o deslumbre dos cubanos com Nova York (que podia ser considerada uma imagem parcial) é contrabalançado com a cana final do grupo elevando a bandeira de Cuba no encerramento de um show no Carnegie Hall. Não parece haver nenhuma manipulação política, pelo contrário, Cuba é pintada com cores bastante simpáticas, e há uma cena (a melhor do filme) especialmente divertida na qual os cubanos olham uma vitrine novaiorquina com réplicas em miniatura de famosos e não lembram os nomes de Marilyn Monroe ou de John Kennedy, um golpe certo na empáfia americana (quem precisa mesmo deles para viver??).
O que há de fato é um show fantástico, músicas belíssimas, personalidades envolventes, que o alemão cintura dura não conseguiu compreender e aproveitar no máximo de sua potência. Um filme meia-bomba para um show que foi tudo menos isso.
Eduardo Valente