DZIGA VERTOV: MANIFESTOS (1919-1923)
O olho e a câmara
tornam-se um em O Homem da Câmara
Dziga Vertov iniciou os trabalhos como documentarista em junho de 1918, no cinejornal semanal Kinonedelia (algo como "cine-semanal"). Trabalhou em todos os filmes, ressaltando e assinalando alguns pontos que viriam a compor os conceitos do kinokismo. Escreveu e dirigiu quatorze filmes até o fechamento do jornal em dezembro de 1919, graças ao embargo europeu contra o cinema soviético, que dificultou a produção devido a falta de filme virgem.
"Nós: variações do manifesto" data de 1919, coincidindo com o fim do Kinonedelia. No entanto só foi publicado em 1922 na revista Kinofot, nº 1. O manifesto, uma espécie de carta de distinção, busca separar as aventuras americanas e o "cine-drama" alemão, do "verdadeiro kinokismo". Acusando a subserviência daqueles que utilizam a câmara para narrar a produção literária e o teatro, Vertov defende o "estudo preciso do movimento" como forma de obter o ritmo próprio da arte cinematográfica, seu mais alto grau. Ou seja, os momentos mais radicais deste escrito ("fugir do abraço do teatro do amante" e "virar as costas à música") dizem respeito menos às artes em questão do que à construção do cinema. Esta construção estaria atrelada ao que o manifesto chama "poesia das máquinas", isto é, longe das imperfeições do olho humano.
O segundo manifesto do grupo, Kinoks: uma revolução (1922) foi publicado pela primeira vez em 1923 no jornal LEF, fundado no mesmo ano pelo poeta Vladímir Maiakóvski. As siglas designam algo como "front de esquerda das artes" (no inglês, Left Front of Arts). Vertov demonstra maior precisão na escolha dos conceitos, funções e propostas do cine-olho. Este texto coincide com o ínicio de seus trabalhos no Kinopravda (algo como "cine-verdade"), cinejornal cujo nome fora decalcado de outra publicação lançada por Lenine. Entre junho de 1922 e dezembro de 1925, o Kinopravda editou vinte e três filmes dirigidos por Vertov, lançando mão das teorias do kinokismo, servindo como um verdadeiro laboratório de experimentação.
Ao contrário de "Nós", o fator montagem aparece melhor conceituado. A construção de um olhar a partir do cine-olho (kinoglaz), despojado dos "psicologismos" e imperfeições do olho humano, é o centro da proposta vertoviana. Um cinema "arte da montagem", complexa e potente máquina de representação do mundo, pelo qual superaríamos a incompetência em prol de um maior conhecimento de nós mesmos.
CONTRACAMPO homenageia Vertov e sua trupe, mas em tom de convocação: é prolífica a produção do grupo, tanto visual quanto textualmente. Nos aventuramos a traduzir uma pequena parte e a reeditar as traduções já existentes, por "amor à arte". Tal esforço prosseguirá na medida em que formos preenchendo nosso Banco de Textos. E aceitando colaborações.
Bernardo Oliveira
Nós: Variações do Manifesto (1922)
Kinoks: Uma Revolução (1923)
Vertov Inventor, por Bernardo Oliveira