O Bebê de Rosemary

(Rosemary's Baby)


Direção: Roman Polanski
Roteiro: Roman Polanski (baseado no roteiro homônimo de Ira Levin)
Elenco: Mia Farrow, John Cassavetes, Ruth Gordon, Sidney Blackmer, Maurice Evans, Ralph Bellamy, Charles Grodin, Angela Dorian.
EUA, 1968

Este primeiro filme de Polanski rodado nos EUA compõe, com Repulsa ao Sexo (Inglaterra, 1965) e O Inquilino (França, 1976), uma muito nítida "trilogia do apartamento". Em todos eles, o apartamento é o palco privilegiado para a exposição dos delírios persecutórios do protagonista, importando menos a realidade das ameaças que a intensidade que a intensidade da paranóia.

Mia Farrow

Neste caso, a protagonista Rosemary (Mia Farrow) é a jovem recém-casada que se descobre vítima de uma seita satânica empenhada em fecundar em seu ventre um filho do Diabo. Da conspiração fariam parte seu médico, seus vizinhos e seu próprio marido, o ator desempregado Guy Woodhouse (John Cassavetes).

Enquanto Guy luta por um lugar ao sol como ator, Rosemary decora o apartamento, assediada pelos solícitos e estranhos vizinhos, os velhos Minnie e Roman Castevet. Mas Guy vende sua alma ao demônio em troca do sucesso profissional e, no dia em que consegue um papel na Broadway, Rosemary sonha que está sendo violentada pelo diabo. Ela engravida de fato e passa a suspeitar de uma conspiração dos vizinhos e do marido.

Esse enredo simples, extraído do best-seller homônimo de Ira Levin, tornou-se nas mãos de Polanski um marco do moderno cinema de horror e o maior sucesso de bilheteria do cineasta, graças a um punhado de sacadas brilhantes. Uma delas foi ressaltar o contraste entre o arcaísmo da crença no demônio e a modernidade da vida urbana (a ação se passa em Nova York, em 1968). Outro achado foi utilizar a linguagem do suspense à la Hitchcock para narrar um episódio de terror explícito, com uma intervenção do sobrenatural normalmente ausente do filmes do mestre. Hoje essa mistura se banalizou, mas na época era novidade, e só foi possível graças à compreensão e flexibilidade do produtor William Castle, um experiente realizador de fitas B de terror.

A escolha do elenco também foi um achado. Mia Farrow, à parte seu talento excepcional, tinha a compleição física que a fragilidade do personagem exigia e o rosto vulnerável e indefeso diante do mal. Jane Fonda, a primeira opção cogitada, acabou rejeitada por Polanski pelo previsível desacerto entre sua imagem de sensualidade e saúde e as características do personagem. Outra atuação notável é a de Ruth Gordon, que acabou ganhando o Oscar de coadjuvante por sua caracterização de Minnie Castevet - a vizinha simpática que na verdade é uma serva do Demo.

Some-se a isso o perfeito domínio técnico, que o próprio Polanski diz ter atingido com este filme, e entende-se facilmente por que O Bebê de Rosemary influenciou toda a produção de terror das décadas seguintes, em especial o filão demoníaco que inclui O Exorcista (1973) e A Profecia (1976), entre inúmeros outros.

Sucesso de bilheteria e de crítica, o filme que tornou Polanski famoso mundialmente conta também com um folclore e um fascínio extra-cinematográficos. O corte rente do cabelo de Mia Farrow, obra do cabeleireiro Vidal Sassoon, causou sensação na época e virou moda, juntamente com as pantalonas de boca larga.

Num âmbito menos mundano, duas coincidências (?) marcam a sina agourenta do filme. Um ano depois de seu lançamento, a bela esposa de Polanski, Sharon Tate, foi assassinada brutalmente por um bando de adoradores do diabo liderados por Charles Manson. E em dezembro de 1980, à porta do mesmo edifício Dakota em que Rosemary deu à luz seu bebê, o beatle John Lennon foi assassinado a tiros por um lunático. Vade retro, Satã.


José Geraldo Couto
Revista Set (agosto de 1989) - adaptado




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