Em Off

Página dedicada aos profissionais de imprensa.

Arquivo de atualizações Editoriais/2005

JANEIRO

ATUALIZAÇÃO N.º 249 - 10/01/2.005

Parabéns e obrigado, professora Adísia

                        Janeiro do corrente ano trás o alcance de uma marca que orgulha a todos os jornalistas. Há exatos 50 anos iniciava sua trajetória na profissão uma pioneira, a primeira mulher a trabalhar no jornalismo cearense e aquela que viria a ser a maior referência para todas as gerações de profissionais de imprensa: a cearense de Caridade Maria Adísia Barros de Sá. A professora Adísia tem sua história na profissão e na vida marcada pelo pioneirismo, correção, ética e compromisso com o jornalismo.

                        Em sua trajetória, desde o início, em janeiro de 1955, no jornal Gazeta de Notícias, já extinto, até hoje, acumula um sem número de marcos e ações que devem ser o norte de todo e qualquer profissional do jornalismo. Além da Gazeta, também trabalhou nos jornais O Estado, O Dia e O Povo, onde permanece até hoje. Paralelamente à carreira de jornalista, também abraçou o sacerdócio do magistério, tendo lecionado nos colégios Farias Brito, Santa Lúcia, Rui Barbosa e Justiniano de Serpa. Foi ainda professora da Universidade de Fortaleza, é professora titular aposentada das Universidades Federal e Estadual do Ceará. É livre docente, com grau de Doutor pela Universidade Federal Rural de Pernambuco e professora emérita da UFC.

                        Também exerceu a função de ombudsman emérita d’O Povo. Fundadora do Curso de Jornalismo da UFC, a professora Adísia também tem uma extensa folha de serviços prestados à categoria, tendo sido delegada do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado do Ceará (Sindjorce) na Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), onde integrou a Comissão de Ética e Liberdade de Imprensa. Foi a primeira ombudsman do jornal O Povo e do jornalismo cearense, tendo exercido a função por três vezes. Também integra a Associação Cearense de Imprensa (ACI). Adísia sempre foi sinônimo de combatividade e luta na defesa dos direitos dos jornalistas.

                        Impossível não se mirar no exemplo dessa notável profissional. Entre os fatos marcantes dos últimos anos de batente, podemos citar a forma corajosa como enfrentou empresas de comunicação e os próprios colegas de jornalismo, seja quando criticou a forma equivocada como os meios de comunicação trataram um assassinato de uma pré-vestibulanda num banheiro da Universidade de Fortaleza (Unifor), seja quando quebrou o muro do silêncio para expor à sociedade o drama vivido pelos funcionários do extinto jornal Tribuna do Ceará, instigando e condenando a forma omissa como a maioria dos demais veículos de comunicação e jornalistas se portou diante da longa agonia dos colegas, que passaram por privações e constrangimentos por causa do não recebimento de seus salários e direitos trabalhistas.

                        O trabalho da professora Adísia Sá está, definitivamente, consolidado em todas as gerações do jornalismo, inclusive nas que ainda estão por vir. Será sempre um referencial a ser tomado por todos que exercerem um jornalismo ético, correto e pautado apenas no compromisso com os leitores, telespectadores, ouvintes, com a democratização da informação. Sua pena e voz ecoaram durante todos esses 50 anos e continuarão ecoando pelos anos que virão. À professora Adísia Sá, mestra de todos os jornalistas brasileiros, exemplo de profissional e ser humano, mãe de todos os profissionais de imprensa cearenses o sítio Em Off rende todas as homenagens, genuflexo diante da maior jornalista do País.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 252 - 31/01/2.005

 Uma chaga nordestina

                        Mais uma vez o Nordeste é apontado como a Região onde a prostituição infantil, a exploração sexual de menores está mais presente no País. Abstraindo-se das questões e motivos sociais que tradicionalmente são utilizados para a tentativa de compreensão dessa anomalia, esse quadro é fruto de um complexo círculo, que envolve quase todos os setores da sociedade civil, conjuntamente com o descaso, omissão, irresponsabilidade e ilegalidade do Poder Público.

                        O mapa da exploração sexual, da prostituição infantil converge com o do turismo, que infelizmente é o principal responsável pelo incremento dessa atividade criminosa. Nas capitais nordestinas é grande o índice de exploração sexual de menores pelo fato dessas cidades receberem um tipo de turismo predador, que não interessa aos cidadãos de bem que nelas residem, mas apenas a um grupo que se locupleta desse crime.

                        O Nordeste brasileiro é vendido no exterior como um paraíso tropical, onde as belezas naturais saltam aos olhos e a beleza das nativas está ao alcance de quem pagar. Essa imagem vem sendo mantida e as ações para modificá-la são absolutamente inócuas. Mas afinal quem são os componentes dessa cadeia que lucra com a exploração sexual de nossos menores e das mulheres? Um esquema que envolve agências de turismo, hotéis, restaurantes, casas noturnas, motoristas de táxi, recepcionistas de hotéis, corretores de imóveis, guias turísticos, enfim, um grande número de setores da sociedade.

                        No âmbito do Poder Público, existe desde a conivência omissa de governadores e seu secretariado, bem como policiais civis e militares. A maioria dos chefes de Executivo do Nordeste fecha os olhos para essa atividade criminosa, temerosos e cedentes às pressões do trade turístico. Excetuando-se esporádicas e raras ações – muito mais encetadas para fazer um jogo de cena – não se tem notícia de ações mais efetivas no combate a esse tipo de crime. Folhetos e tentativa de educar quem para cá vem em busca apenas de extravasar seus instintos animalescos não surtirá efeito prático. Somente o braço longo e pesado da lei conseguirá isso, com um aparelho policial incumbido com toda a determinação para isso e um Judiciário que cumpra seu papel constitucional.

FEVEREIRO

 

ATUALIZAÇÃO N.º 253 - 14/02/2.005

Vergonha de ser brasileiro

                        O Brasil foi palco, no sábado, dia 12, de mais um crime que repercutiu em todo o mundo: o assassinato da freira norte-americana Dorothy Stang, de 74 anos, que foi morta a tiros por dois pistoleiros quando visitava um acampamento nas proximidades da Rodovia Transamazônica, em Anandu, no Estado do Pará. A freira desenvolvia há trinta e oito anos um trabalho com pobres e sem-terra, ensinando a como extrair da floresta seu sustento sem devastá-la. O assassinato repercutiu em todo o mundo, sendo notícia na imprensa internacional.

                        Infelizmente nosso País tem sido citado como um paraíso da pistolagem. As regiões Norte e Nordeste têm sido pródigas neste tipo de atividade criminosa, mas a prática é generalizada. Desde o final da década de oitenta, quando o seringueiro Chico Mendes foi assassinado os crimes de natureza de pistolagem passaram a ter uma visibilidade maior. E porquê crimes dessa natureza continuam tendo lugar em pleno século XXI? Por uma combinação de uma mentalidade atrasada e criminosa de querer impor idéias na base da força e um Judiciário que não pune exemplarmente quem deveria sê-lo.

                        A impunidade campeia pelos quatro campos do País, independentemente da natureza do crime cometido, sempre com a desculpa de prazos a serem respeitados, acúmulo de processos e uma velha lengalenga que os magistrados e operadores do direito têm decorado e na ponta da língua. A sociedade não aceita mais a postura autoritária, displicente e sem compromisso com a coletividade de uma parcela dos magistrados brasileiros. Muitos são os juízes e desembargadores que realmente se preocupam com os anseios da população e a correta aplicação das leis em favor dos cidadãos, mas essa maioria tem seu trabalho chamuscado pela minoria que não tem esses parâmetros em suas ações.

                        A única resposta que o governo e o Judiciário brasileiro podem dar ao mundo é a identificação dos responsáveis materiais e intelectuais pelo crime e puni-los com todo o rigor da lei, sem qualquer tipo de benevolência. Não se pode mais conviver com pessoas que têm a mentalidade criminosa de que a solução dos problemas está na violência. Na hipótese desse caso engrossar a extensa e revoltante lista dos crimes cujos autores permanecem impunes, adversamente de campanha veiculada recentemente pelo governo federal, será a vergonha de ser brasileiro.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 254 - 21/02/2.005

Derrota do povo

                        Com a vitória do deputado Severino Cavalcanti (PP-PE) na disputa pela presidência da Câmara Federal, muitas pessoas consideraram como uma grande derrota do governo Lula. O PT, partido do presidente, apresentou oficialmente a candidatura do deputado Luis Eduardo Greenhalgh, mas além dele havia o também petista Virgílio Guimarães, Jair Bolsonaro (PFL-RJ) e José Carlos Aleluia (PFL-BA). Severino foi eleito em segundo turno, que disputou com o candidato oficial do governo, recebendo 300 votos, curiosamente anos depois de Lula, quando ainda não era presidente, ter dito que existiam 300 picaretas com anel de doutor na Câmara Federal.

                        Indubitavelmente foi uma derrota para o governo e para petistas. Ela chegou devido a vários fatores, como arrogância, prepotência, inabilidade para compor com alas do próprio partido, etc. Veio também por causa da volatilidade da base governista, formada por fisiologistas, oportunistas, pessoas que o governo achava que tinha sob seu jugo. São deputados venais dentro de uma maioria parlamentar frágil e fictícia. Nem os ministros dos demais partidos, como Eunício Oliveira, Ciro Gomes, José Alencar e Mares Guia conseguiram com que seus correligionários sufragassem o nome do candidato oficial.

                        Faltou competência de quem tem a força da caneta e da máquina pública. Governantes anteriores nunca demonstraram escrúpulos de interferir, diretamente, no processo de escolha do presidente da Câmara e do Senado Federal. O governo não conseguiu, sequer, unificar suas candidaturas. Faltaram apenas sete votos para a disputa ocorrer entre os dois petistas. Aí foi um jogo baseado no samba do crioulo doido. O problema é que, embora a maioria dos parlamentares tenham percebido que a eleição de Severino foi um equívoco que pode custar caro ao Legislativo em todos os níveis, agora é tarde para qualquer tentativa de reparação.

                        Na verdade o maior derrotado na eleição para a presidência da Câmara dos Deputados foi o povo brasileiro. Severino é um político dos mais tradicionais: amigo dos amigos, não se constrange em defender propostas absurdas e impopulares e não está nem aí para o que pensa a sociedade de suas atitudes. Quando era corregedor da Câmara defendeu abertamente a absolvição do então deputado Hildebrando Pascoal, aquele que resolvia seus problemas com opositores na base do machado e da serra elétrica. Representa tudo o que há de mais superado e retardado na política brasileira, um arquétipo que, se não havia de fato nem de direito, se pensava ter sido sepultado no cenário político. O deputado federal pernambucano prega a quase duplicação do valor do já alto salário dos deputados, manutenção do absurdo recesso de três meses, a contratação de parentes e mais verba para a nomeação de assessores. Mais populista e canalha impossível.

                        Agindo como uma “D. Maria I, a louca”, Severino já saiu disparando mais despautérios, como a prorrogação do mandato do presidente Lula e, por conseguinte, de todos os deputados federais para que as eleições municipais coincidam com as demais. Teremos dois anos em que a Câmara Federal passará por um processo que a desgastará ainda mais, jogando o já fundo conceito que o Poder possui com a população ainda mais para baixo. É preciso que, nas eleições do próximo ano, os eleitores dêem um exemplo ao todos os deputados – os 300 que votaram em Severino e os demais que foram incompetentes para deter sua vitória – e mostre que a sociedade brasileira não compactua com pessoas que agem com leviandade e brincam com um poder delegado que é entregue a cada um dos parlamentares.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 255 - 28/02/2.005

O presidente e a responsabilidade

                        Na semana passada o presidente Luís Inácio Lula da Silva afirmou que obrigou um de seus subalternos a se calar e não expor supostas irregularidades em privatizações, ações que caracterizaram o governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). O presidente proferiu as declarações durante um discurso, com as imagens sendo veiculadas pelas principais redes de TV do País. Infelizmente mais um episódio triste num governo que foi conduzido ao poder amparado na esperança de transformação na política que conduziu o voto do povo brasileiro.

                        As palavras do presidente não causaram espanto e indignação pelo teor das denúncias de irregularidades nas privatizações realizadas pelo desastroso governo FHC, onde a maioria do patrimônio brasileiro foi entregue ao grande capital, onde o maior prejudicado foi seu proprietário, o povo. Não é nenhuma novidade a forma irresponsável e criminosa como o governo tucano dilapidou o patrimônio público em favorecimento do grande capital. As privatizações das “teles”, por exemplo, foi um festival de crimes de lesa pátria, bem como das concessionárias de fornecimento de energia.

                        O que causou indignação foi a afirmação de Lula segundo a qual obrigou seu subalterno a silenciar diante das tais irregularidades e por não ter determinado a apuração dos fatos para que, em se comprovando atos ilícitos e identificados os culpados, houvesse a punição dos culpados. Essa é a obrigação de qualquer agente público. Agindo da forma que revelou o presidente cometeu crime de responsabilidade, previsto no Artigo 85 da Constituição Brasileira: “são crimes de responsabilidade os atos do presidente da República (...) especialmente, contra: V – a probidade na administração pública”.

                        Caso dois terços da Câmara dos Deputados admita a acusação contra o presidente, este será submetido a julgamento perante o Senado Federal, além de ficar suspenso de suas funções, após a instauração de processo e por um prazo máximo de 180 dias. As casas legislativas são instâncias políticas, o que significa que o fato nem pode ser levado a esse princípio constitucional de acordo com a capacidade do governo de negociar com sua base política. Mais um triste episódio de um governo ao qual se julgava ter comprometimento com a lisura e probidade administrativa. Mas, por outro lado, é preciso também que se investigue as denúncias e, em se comprovando, se punam os responsáveis.

                        Como não há interesse do governo atual em prolongar esse episódio, tampouco do partido que antecedeu o governo petista, o PSDB, de apurar as irregularidades de sua administração, não tenhamos nada além do mis en scéne que ora vem sendo feito. Aliás, o governo Lula e seu ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, precisam explicar, também, por qual motivo não receberam a freira Dorothy Stang, quando ela tentava informar ao governo as ameaças de morte que estava recebendo. A freira não foi recebida pelo ministro, não conseguiu expor seu caso e acabou sendo assassinada em Anapu, no Pará. Um crime que, talvez, pudesse ter sido evitado.

 

MARÇO

ATUALIZAÇÃO N.º 255 - 28/02/2.005

Bandido de toga

                        Mais uma vez o Poder Judiciário foi atingido de forma dura e preocupante, através do assassinato do vigilante José Renato Coelho Rodrigues pelo juiz Pedro Pecy Barbosa Araújo. Foi um crime que chocou a sociedade mas, em especial, aos próprios magistrados de todo o País. Tanto que os juízes trabalhistas, através da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), logo emitiram nota oficial demonstrando sua revolta com a atitude do colega e cobrando punição exemplar. Por aqui a Associação Cearense de Magistrados publicou uma tímida nota, na qual solidariza-se com a família da vítima mas não a favor da punição de seu associado.

                        O tiro que o juiz Pedro Pecy desferiu na nuca de José Renato e lhe tirou a vida foi apenas um ato extremado de uma situação que se verifica no Judiciário, muito provavelmente desde que foi instituído no País. Há muito tempo a sociedade vem sendo vítima da atitude da maioria dos magistrados, seja quando processos levam anos para receber um simples tombo, imagine audiências e sentença. Isso sem falar nas inúmeras brechas que a lei permite. Quando um juiz se deixa corromper é um tiro que ele desfere em toda a sociedade. Da desídia, omissão dos magistrados advêm as principais mazelas que castigam a sociedade.

                        A cada dia o povo é achacado por atitudes de juízes, desembargadores que agem de maneira déspota e prepotente. Existe até uma conhecida piada no meio jurídico, segundo a qual a metade dos juízes acham que são Deus, enquanto a outra metade tem certeza disso. O assassinato do vigia resultou do comportamento e personalidade distorcidos do juiz, mas reflete a forma autoritária como a maioria se comporta. O primeiro crime cometido foi o abuso de autoridade, pois o fato de ser magistrado não significa que Pedro Pecy estaria acima da lei, tampouco pudesse transgredir as normas internas de uma empresa privada. Fora do horário de funcionamento o magistrado queria a todo custo entrar no supermercado onde ocorreu o crime.

                        Não contente de cometer o abuso de autoridade nesse momento, ainda resolveu dar voz de prisão ao vigilante. Prisão por qual motivo? Não havia elementos para isso, não houve desacato, sequer. Mas ainda não contente Pedro Pecy resolveu aplicar a pena capital, realizando, em segundos, o julgamento de um crime que só ele considerou que existiu. Não garantiu sequer o direito de ampla defesa de quem estava julgando sumariamente. Não mais que de repente, de julgador passou a executor da pena que havia determinado à pessoa que tratou como réu. Pena essa que existe apenas em seu próprio código penal, assim como os crimes que atribuiu à vítima e pelos quais julgou e executou José Renato.

                        Quando um magistrado se transforma num bandido de toga é preciso punição mais do que exemplar de quem envereda por esse caminho. Com esse episódio que a sociedade aumente a pressão para que o Judiciário deixe de ser um Poder autoritário, prepotente, arrogante, inacessível e dissociado dos anseios da população. Existem, claro, magistrados cônscios de sua função e sua responsabilidade social, mas estes são, infelizmente, uma minoria. É preciso que, mais uma vez, os que compõem o Judiciário brasileiro entendam a simbologia desse episódio, sob pena de cada vez mais se distanciarem do povo.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 257 - 14/03/2.005

A raposa administrando o galinheiro

                            O Legislativo Federal mais uma vez deu um exemplo de como não está preocupado com os anseios do povo, de como se porta de maneira irresponsável e de que não tem qualquer compromisso com o cuidado que os meios de comunicação de massa. O novo presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados é nada menos do que Jáder Barbalho (PMDB/PA), indicado para o cargo com o apoio da ala governista dos peemedebistas. O cargo é de extrema importância, pois é quem irá chefiar, por exemplo, a análise das renovações das concessões das emissoras de rádio e TV.

                            As empresas de comunicação são concessões do Poder Público e têm que seguir as regras determinadas na Constituição para funcionarem. Ou seja, a implantação dessas empresas não segue a lógica normal de mercado ou as utilizadas para outros empreendimentos, por tratar-se de setor estratégico do Estado brasileiro. A comunicação de massa, a informação são bens da sociedade, mas infelizmente não é dessa forma como os veículos de comunicação trata esses itens essenciais do povo, mas, de forma geral com raríssimas exceções, irresponsavelmente e sem colocar o interesse coletivo acima dos pessoais, corporativistas. Mesmo existindo uma lei que regula o setor.

                            Jader é empresário do ramo de comunicações, proprietário de várias empresas emissoras de rádio e TV em seu estado natal, o que por si só já o impediria, ética e moralmente, a ocupar o cargo. Mas ética e moral, definitivamente, não são qualidades conhecidas não apenas no deputado paraense, mas nos que corroboraram com sua indicação para o cargo estratégico. As obstruções vão muito além do fato do conflito de interesses - na verdade congruência deles - entre o empresário de comunicação e o parlamentar. Existe um impedimento que em outro país onde existisse compromissos dos homens públicos com a moralidade e, principalmente, responsabilidade do eleitor e cobrança do cidadão, seria decisivo para que o deputado sequer ocupasse uma cadeira no Legislativo Federal.

                               Jader Barbalho tem contra si diversas denúncias de desvio de verbas da extinta Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), do Banco do Estado do Pará e, como se não bastasse, de utilizar trabalho escravo em terras que possui na Amazônia. Em 2001, por causa dessas denúncias, renunciou ao mandato de senador para escapar da cassação e a perda dos direitos políticos. Candidatou-se no ano seguinte à Câmara Federal e, em mais um gesto exemplar de como o brasileiro ainda não tem responsabilidade na hora de votar, foi eleito. Esse tipo de pessoa é que está à frente de uma das mais estratégicas comissões da Câmara. Um sintomático caso onde a raposa recebe a chave do galinheiro.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 258 - 21/03/2.005

Todos os limites ultrapassados

                                Os meios de comunicação cearenses ultrapassaram todos os já saturados limites do bom senso, da responsabilidade, do compromisso com o mister de informar bem, do respeito às pessoas, principalmente seus telespectadores, leitores, ouvintes. Tudo começou na manhã do sábado, dia 12 de março, quando o adolescente José Roberto Rafael dos Santos foi assassinado e José Wilson Xavier acabou preso, acusados de tentativa de assalto à uma loja de conveniência localizada num posto de gasolina no bairro Edson Queiroz. Começava ali o episódio que expôs cruamente o nível de irresponsabilidade como os meios de comunicação vêm se portando há muito tempo.

                                O autor do homicídio foi o vigia do posto Petrocar, que, em depoimento, disse ter agido daquela forma por pressupor que os dois citados iriam praticar um assalto contra o estabelecimento. Disse ainda que a vítima portava uma arma, possivelmente uma faca ou um cossoco, que não foram encontrados nem apresentados. Inicialmente, as equipes dos programas policiais de TV – Barra Pesada, Cidade 190 e Rota 22 – foram as primeiras a cometerem as aberrações. Fundamentando-se apenas no que dizia o comandante do policiamento da Capital, coronel PM Deladier Feitosa, afirmaram que a vítima tratava-se de um “bandido com diversas passagens pela Polícia”, bem como o que havia sido preso. Entrevistaram o oficial e este fez as acusações.

                                Nenhum dos “repórteres” se preocupou em questionar o coronel sobre o que estava dizendo e haviam reproduzido, se havia provas documentais sobre a acusação quanto aos precedentes da dupla. O próprio oficial, entrevistado posteriormente, após a confirmação de que não constava qualquer antecedente criminal relativo aos acusados, disse que havia feito as declarações “baseado no que ouviu de populares no local”. Como um policial de alta patente comete um ato tão irresponsável. Sua atitude o colocou na posição de mentiroso e sua credibilidade colocada em xeque. Os “repórteres” logo embarcaram nas palavras do coronel, repetindo uma ladainha diária que compõe o clichê de suas falas.

                                No dia seguinte, foi a vez dos jornais impressos cometerem suas aberrações. A manchete do jornal Diário do Nordeste foi: “Bandido morto durante assalto a posto”, enquanto o jornal O Povo estampou, em sua capa: “Segurança reage e mata ladrão”. No corpo da matéria, o DN afirmou que os dois acusados teriam entrado armados na loja e anunciado o assalto, dando início à uma troca de tiros que resultou com a morte do adolescente. Estória da carochinha, escrita por um redator com muita imaginação, irresponsabilidade ou preguiça de averiguar, de fato, o que havia acontecido. Ou tudo isso junto. A família do jovem morto protestou, afirmando que ele não era bandido. Estava certa, comprovou o que dissera.

                                Ambos os jornais publicaram o posicionamento dos familiares da vítima, mas ficou apenas nisso. Nenhum mea culpa, nenhum reconhecimento do erro cometido. Os programas policiais da TV também optaram por não dar o braço a torcer, numa postura autoritária, arrogante e desrespeitosa para seus telespectadores. Isso é fruto, também, da ausência da qualificação das pessoas que fazem esses programas, em sua maioria esmagadora falsos profissionais, picaretas que exercem ilegalmente o jornalismo, sem qualquer preparo intelectual, ético, moral. São pessoas que não diferem em nada das que entrevistam diariamente, por terem se colocado à margem da lei.

                                No caso dos jornais impressos não há muita diferença dessa realidade. O episódio é emblemático sobre a postura dos programas policiais televisivos e dos jornais impressos quanto ao tratamento das matérias, ocasionado pela deficiência de seu material humano. A família do jovem morto e do que foi preso têm que acionar o oficial, o Estado, os meios de comunicação, seus profissionais e falsos jornalistas pelo crime que cometeram: calúnia, tipificado no artigo 138 do Código Penal Brasileiro. Além disso, não merecem absolutamente nenhum tipo de crédito, pois ultrapassaram – de vez e, pelo visto, de maneira irreversível – todos os limites.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 259 - 28/03/2.005

Crucifica-o, crucifica-o!

                        Passados, segundo o calendário ocidental e a história oficial, 1972 anos da crucifixão de Jesus a humanidade mostra que muito pouco ou quase nada avançou em seu desenvolvimento pessoal. Naquela época o Império Romano era a máquina que oprimia os demais povos, impondo através do fio da espada sua vontade e explorando seus conquistados, sugando-lhes suas riquezas. Boa parte da população mundial durante a vigência desse Império viveu e morreu sob o domínio dos césares. Hoje o imperialismo, cujo representante maior é o norte-americano sucedeu o jugo romano, utilizando-se, porém, dos mesmos expedientes e práticas para tomar, matar, destruir.

                        O fanatismo religioso, a manipulação pela necessidade de crença das populações que, por opção ou como forma de buscar um sentido para sua existência, buscam um ser demiúrgico para dar sentido à suas vidas, a ganância desenfreada e todas as mazelas que há milênios a humanidade apresenta existem para mostrar como ainda somos extremamente frágeis, relativamente à nossa incapacidade de melhorarmos como seres que possuem o diferencial da capacidade de pensar, embora muitas vezes tenhamos motivos para questionar se realmente possuímos isso.

                        Construímos máquinas ultramodernas, impensáveis num passado muito recente, pisamos na lua, a indústria bélica a cada momento fabrica novas armas, mas não conseguimos acabar com a fome, com as doenças. Enquanto uma minoria usufrui de tudo o que a mente humana consegue desenvolver para tornar a vida mais confortável e prazerosa, a maioria vive e morre sob o domínio dos gananciosos. O Império hoje já não é formado apenas por romanos ou quem comprava sua cidadania, mas por todos os que representam a opressão do capital, da mais valia. Os povos conquistados hoje são os miseráveis da América latina, da África, os famintos fundamentalistas do oriente médio e todos os que sofrem a privação imposta pelos que detêm o capital, more onde morar.

                        A guarda pretoriana ainda protege seus dirigentes e os exércitos seus patrícios. O fio da espada foi substituído pelas ogivas nucleares, os povos conquistados ainda são executados a cada sinal de tentativa de rebelião e se hoje as cruzes não se multiplicam nos morros, se não existem mais arenas onde os rebeldes serviam de refeição para famintos e ferozes leões, mata-se pelo chumbo, pelos explosivos, pela fome, pela doença, pela falta de justiça. No 33 a.D. o "status" quo que vigia matou o homem que poderia conduzir o povo à sua união e liberdade, independentemente e abstraindo-se da discussão sobre sua origem divina, mas centrando-se em sua liderança popular.

                        Hoje também os oprimidos repetem os atos dos judeus que gritaram quando Pôncio Pilatos perguntou o que queriam que se fizesse com Jesus: crucifica-o! São as pessoas que assistem à miséria de seus irmãos e com ela até se regojizam, consideram motivo para rir, acenar aos holofotes da mídia. Crucificamos Jesus quando ignoramos os que passam privações, vilipendiamos os que perdem seu dom maior: a vida, quando deixamos morrer à míngua nossos irmãos. Muitos deles nos perdoam, pois reconhecem que não sabemos o que fazemos. Tudo fica consumado. Talvez todos eles perguntem: “Eloi, lama sabachtani?”, Deus, porquê me abandonaste, e entregam seus espíritos.

 

ABRIL

ATUALIZAÇÃO N.º 260 - 04/04/2.005

Parabéns, jornalistas

                        No dia 07 de abril é comemorado o Dia do Jornalista. Infelizmente diante do quadro caótico em que a categoria se encontra, não há muito que ser comemorado. Os constantes ataques à regulamentação da profissão, os inúmeros falsos profissionais que infestam o mercado de trabalho, os cursos de jornalismo que surgem aos borbotões jogando profissionais despreparados, o aviltamento das condições de trabalho por parte das empresas de comunicação e, principalmente, os baixos salários pagos aos jornalistas são alguns dos martírios à que a categoria é submetida.

                        Os jornalistas são pessoas incumbidas de muitas missões essenciais à sociedade: registro histórico, fiscalização, debate, discussão, etc. Possuem um papel crucial na democratização de um dos bens públicos mais preciosos: a informação. De sua atuação podem resultar danos irreparáveis e por isso têm que se pautar pela correção, precisão, ética, compromisso público. Caso se distanciem desses e de outros princípios acabam por expor a população à uma das mais absurdas formas de violação.

                        Cada vez mais o jornalismo é invadido por pessoas que o exercem ilegalmente, muitas vezes através de decisões equivocadas do Judiciário – felizmente já suspensas –, que buscam na profissão saciar sua fogueira da vaidade. Com a proliferação dos inúmeros cursos de jornalismo que surgem a cada dia, sem qualquer preocupação que não seja a de gerar lucro para quem os cria, também são incontáveis os que, irresponsavelmente, recebem um diploma que lhes proporciona a requisição do registro profissional, mas acabam por se tornarem profissionais sem qualquer condição do exercício do bom jornalismo.

                        A lei de mercado segue, claro, a lógica capitalista: manutenção de um exército de trabalhadores reserva para pressionar a quem está no mercado de trabalho a não reivindicar melhores salários e condições de trabalho; o despejo de muita mão-de-obra para que o salário se mantenha sempre em níveis baixos e nenhuma preocupação com a qualidade. Num País onde professores, médicos, policiais e uma gama de profissionais essenciais ao crescimento da sociedade são vilipendiados e aviltados com baixos salários e péssimas condições de trabalho, enquanto “celebridades” instantâneas e desprovidas de qualquer conteúdo ou retorno à sociedade são super-valorizados, resta aos jornalistas, lastimável e incansavelmente, continuar sua via crucis.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 261 - 11/04/2.005

Qvo vadis, Domini

                               Após o sepultamento do papa João Paulo II, após vários dias de homenagens e da comoção que marcou os quatro cantos do Planeta, o mundo aguarda quem o colégio de cardeais irá eleger como sucessor do polonês que durante 26 anos conduziu com mão de ferro e princípios conservadores os destinos da religião que está entre as que mais possui seguidores em todos os continentes. No último quarto de século a Igreja manteve-se fiel à sua trajetória conservadorista e, muitas vezes, na contra-mão dos avanços que a humanidade experimenta, seja no campo da ciência, seja no âmbito do desenvolvimento pessoal.

                               João Paulo II isolou a ala moderada e progressista da Igreja, muito embora também tenha tentado se aproximar das questões sociais que castigam os países que visitava. O papa descartou a intenção dos padres que abandonaram a batina para se casarem de acumularem o casamento com o sacerdócio, instituição celibatária que teve intensificação na Idade Média, quando a Igreja assim procedeu para que os padres vindos de famílias abastadas deixassem toda sua herança para a Santa Sé. Apesar desse estratagema não mais se aplicar aos dias de hoje, esse voto é mantido sob ferrenha e radical defesa.

                               Também durante esse último papado as mulheres continuaram ocupando uma posição coadjuvante, inferior mesmo, aos homens. Elas ainda não tiveram o direito de celebrar missas, mantiveram-se apenas com a permissão de ministrar a comunhão. A estrutura machista da Igreja vem se mantendo desde sua fundação, sem que os avanços nas relações humanas nas quais conduziram as mulheres à uma posição de igualdade com os homens fossem assimilados pela cúria da Igreja. João Paulo também condenou o uso de preservativos e métodos contraceptivos, num mundo onde as doenças sexualmente transmissíveis, como a AIDS, crescem a cada dia, vitimando mais e mais pessoas.

                               Já no campo de seus dogmas a Igreja continua posicionando-se contra a união entre pessoas do mesmo sexo, que se por um lado é um dos postulados históricos, por outro vai contra a liberdade do ser humano de escolher sua própria forma de felicidade. Apesar de seu uma questão ainda bastante polêmica, o assunto tomou ares de inquestionável. Também foi fortalecida a posição de que, como união indissolúvel, as pessoas que se casam na Igreja, se separam e casam-se novamente, ainda que fora dos sacramentos religiosos, cometem adultério. Como se quem fosse infeliz no casamento tivesse a obrigação de viver o resto de tempo que ainda possui de vida ligada à uma pessoa que não lhe é cara. Também condenou e proibiu o batismo dos filhos gerados fora do casamento.

                               Os tempos são outros, mas a Igreja Católica continua negando a dialética histórica. Os cardeais que estão reunidos para a escolha de um novo papa discutem que rumos a Instituição irá tomar daqui por diante, se dentro dos mesmos ditames ou buscando, pelo menos, a abertura de diálogo com as diferentes correntes de pensamento. Durante o papado de João Paulo II a Igreja perdeu espaço para outras religiões, distanciou-se dos jovens. Nem mesmo as reações ao avanço das demais crenças, como a renovação carismática, por exemplo, conseguiram quebrar essa distância. A cadeira de chefe da Igreja Católica possui uma grande importância política e todos se questionam para onde vai o destino da Instituição.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 262 - 18/04/2.005

Rompimento emblemático

                               A semana passada foi marcada por um acontecimento político que chamou muito pouco a atenção da mídia e dos partidos políticos, mas que possui um significativo significado simbólico: em encontro nacional o Partido Comunista Brasileiro (PCB), o mais antigo partido político do País, deliberou pelo rompimento com o governo de Luís Inácio Lula da Silva. Não se trata apenas da decisão de um partido de esquerda, de onde saíram ou se inspiraram todas as agremiações políticas que se declaram com essa postura, mas de um sinal para a sigla petista, que deve ser codificado por seus dirigentes.

                               O PCB foi o primeiro partido a prestar apoio público e oficial à coligação PT/PL para a presidência da República, em 2002, sendo o primeiro partido de esquerda a oficializar a entrada na composição. Historicamente, desde o segundo turno das eleições presidenciais de 1989, quando o PT apresentou pela primeira vez a candidatura de Lula, o PCB foi o mais fiel apoiador da sigla petista. Sua pequena, porém eficiente e dedicada militância, imediatamente passou a se integrar às campanhas.

                               Naquele ano boa parte do PCB já pregava o apoio ao candidato petista ainda no primeiro turno, mas o então deputado federal Roberto Freire – oportunista, que mais tarde viria a revelar sua verdadeira identidade de carreirista – impôs sua candidatura, “para marcar terreno e consolidar o nome do partido após anos de clandestinidade”, como declarava à época. O PCB sobreviveu à tentativa esdrúxula do parlamentar de tentar extingui-lo, chegando ao cúmulo de registrar, como se fosse uma marca ou patente de sua propriedade, a sigla e o símbolo do partido. Afinal, após sobreviver a anos de clandestinidade e perseguição, não seria um déspota que iria decretar o fim da agremiação.

                              Há muito tempo a discussão sobre o fato do desvirtuamento do governo Lula de seus propósitos históricos vinha sendo travada internamente. O fato é que o governo petista transformou-se em mera continuação do modelo que vinha sendo executado pelos neo-liberais tucanos do PSDB. Nada do que historicamente pregava a esquerda brasileira vinha sendo sequer cogitado de ser implementado pelo PT. Infelizmente o País vem assistindo ao longo desses três anos à repetição de velhas práticas condenadas por quem possui ética e deseja uma política límpida, asséptica promovida por pessoas que destruíram um passado construído na resistência às violações de liberdade por causa de interesses pessoais.

                        O PCB tomou a iniciativa corajosa de afastar-se dos que detêm o Poder não por uma questão oportunista ou resultado de projetos pessoais ou interesses de grupos. Acima de todo e qualquer interesse individual está o coletivo, postulado que não pode ser colocado à distância ou à margem por nenhum partido político que tenha como meta liberdade, justiça social, uma sociedade igualitária. Em seu dna o PCB é essencial e fundamentalmente libertário. Agora por uma questão de coerência precisa, sine qua non, entregar os cargos que ocupa nas administrações estaduais e municipais petistas. Parabéns tovarichts.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 263 - 25/04/2.005

A história continua

                               Após um rápido conclave, os cardeais elegeram o Joseph Ratzinger como o novo Papa, que adotou o nome de Bento XVI. Ratzinger desempenhava o papel de cabeça pensante do papado de João Paulo II, tendo sido guindado à condição de sumo pontífice com a missão de, na linha de frente, continuar o trabalho que vinha fazendo nos últimos anos nos bastidores. O novo papa alemão é um religioso que não tem, nem de longe, a empatia de seu antecessor, mas é muito mais competente na radicalidade de suas idéias conservadoras.

                               Ratzinger tem um passado obscuro que a mídia mundial já tratou de maquiar. Filho de um policial alemão, o novo papa participou da Juventude Hitlerista, um movimento nazista jovem, durante o III Reich. Os meios de comunicação já se apressaram em divulgar que o então jovem estudante Ratzinge somente participou desse grupo porquê todos em sua idade eram obrigados. Ora, uma argumentação que cai por terra, uma vez que os opositores do nazismo na Alemanha da segunda guerra – como apregoam terem sido os pais do novo papa – eram sumariamente eliminados, como os judeus.

                               Anos mais tarde Joseph Ratzinger alistou-se, espontaneamente, no exército alemão e combateu na segunda guerra nas forças do eixo. Primeiro numa bateria antiaérea, depois como telefonista. Participou nos últimos anos do conflito, foi prisioneiro de guerra nas mãos dos aliados e mais tarde libertado. Com uma forte formação acadêmica – detém dez títulos de doutor – o cardeal alemão foi o mentor intelectual da Igreja católica nas duas últimas décadas. De seu pensamento conservador e de João Paulo II saiu a condenação de métodos contraceptivos, dos preservativos, do controle de natalidade, da manutenção das mulheres numa posição secundária na organização da Instituição, etc.

                               O mundo esperava que a Igreja católica aproveitasse o momento para avançar nas conquistas sociais. Apostou-se num papa latino, ou num negro, mas o ranço europeu acabou impondo mais um papa branco, ariano. Demonstrando sua discriminação para com os povos latinos, em sua primeira reunião com a imprensa, o papa alemão expressou-se em inglês, francês, italiano e em sua língua pátria. Não se dirigiu aos povos de língua hispânica, tampouco portuguesa. A maioria dos católicos do mundo fala espanhol e o Brasil é o maior país católico. Já dá para se ter uma idéia de como será a gestão do papa Bento XVI. Credere non posso. Resistentea su incredibile...

 

MAIO

ATUALIZAÇÃO N.º 264 - 02/05/2.005

A história não contada

                        Semana passada a principal rede de emissoras de TV do País, a Globo, completou 40 anos. Foram dias de comemorações, festas, programas especiais para homenagear a quarta maior rede de emissoras de TV do Planeta. Como sabe promover shows como nenhuma outra rede e detentora de um grande elenco de profissionais, a programação transformou-se num libelo de exaltação. A história da Globo foi contada, claro, de uma maneira que o telespectador tivesse contato apenas com a versão oficial da empresa. Não traduziu com fidelidade as quatro décadas de sua conturbada existência.
                        A emissora surgiu no ano seguinte ao golpe militar que derrubou o presidente João Goulart e instalou um regime ditatorial, prosperou e se consolidou como uma potência quase imbatível durante o tempo em que a ditadura militar. Nos 21 anos em que vigiu o período de exceção a Globo se transformou não apenas na maior emissora de TV do Brasil, mas também na que esteve a serviço dos que detinham o poder pela força das baionetas. Não foi a única, mas com certeza foi a mais incisiva e a que mais lucrou. Até hoje ela colhe os frutos do serviço que prestou aos militares.
                        A Globo silenciou diante das atrocidades cometidas pelos militares e os que estavam a seu serviço. Apesar de não ter sido a única a se omitir, sua atitude foi crucial para a sobrevivência do regime. Hoje se justifica dizendo que não tinha condições de resistir, sob pena de colocar em risco sua existência. Não é bem isso o que a história registrou. As generosas verbas publicitárias oficiais, bem como a distribuição de concessões para a instalação de emissoras de TV nos estados para os que fossem se filiar à rede denuncia o contrário. Enquanto jornalistas eram assassinados, como o diretor de jornalismo da TV Cultura, Wladimir Herzog, a Globo era um agradável refúgio para quem procurava a sombra do guarda-sol estatal.
                       Muitos de seus profissionais que hoje posam de arautos da moralidade, da liberdade, da ética na comunicação, como Arnaldo Jabor, Jô Soares, Alexandre Garcia – para citar apenas alguns – viveram anos de beneplácito e sinecuras. Jabor fez diversos filmes com o dinheiro do contribuinte, via Embrafilme. Alexandre Garcia ganhou um emprego público no Banco do Brasil. Jô Soares amealhou um considerável patrimônio, enquanto artistas como Francisco Milani precisou trabalhar como motorista de caminhão durante o tempo em que foi impedido de trabalhar pela ditadura. Outros – como o ator Benvindo Siqueira – também integravam uma lista de pessoas que não poderia trabalhar na emissora.
                        Com o fim da ditadura militar, quando os donos do capital decidiram que era a hora dos milicos retornarem aos quartéis e eles próprios, pessoalmente ou através de prepostos, assumirem o comando do País, a emissora continuou prosperando. Poucos anos antes a emissora praticamente silenciou enquanto o Brasil em peso nas ruas gritava por diretas já e lamentava a rejeição da emenda Dante de Oliveira, que restabelecia a eleição direta para presidente da República. Somente abriu espaço em seus noticiários para os gigantescos comícios – que já começara a reunir boa parte dos oportunistas que, pouco tempo depois, engabelava o povo com a “Nova República”, de triste lembrança – depois que nem o governo conseguia reprimir as manifestações.
                        Na primeira eleição direta para presidente depois do golpe de 64, não teve pudor em apoiar explicitamente o candidato/farsante Fernando Collor de Melo, primeiro chefe de Executivo nacional afastado e cassado através de um processo de impeachment. Durante a campanha do segundo turno manipulou criminosamente a edição do segundo debate realizado entre ele e seu opositor, Lula da Silva, com o objetivo de favorecer seu ungido. Também não teve pudor em insinuar que o seqüestro do empresário Abílio Diniz, realizado por militantes do Movimiento de Isquierda Revolucionaria (MIR), da guerrilha de El Salvador, havia sido praticado por simpatizantes do candidato petista.
                        Mais recentemente contribuiu decisivamente para a eleição, reeleição e manutenção do governo neoliberal tucano de Fernando Henrique Cardoso. Atuou, mais uma vez, como agência de notícias estatal quando do lançamento do Plano Real. Evitou o debate dos principais temas dos problemas sociais brasileiros durante a gestão FHC e sempre colocou-se a serviço de sua administração. A retribuição? Empréstimo com dinheiro do contribuinte, concedido pelo governo federal, através do BNDES.
                        Em sua camaleônica trajetória, a Globo não teve qualquer problema ou pudor em oferecer seus serviços – que foram aceitos – ao mesmo candidato que, treze anos antes, havia prejudicado na campanha política. A emissora possui a maior e melhor estrutura de jornalismo da TV Brasileira, quilômetros à frente das concorrentes, mas prefere utilizá-la como apêndice de seu jogo de interesses. Essa história o telespectador, evidentemente, não viu nos especiais da Globo. Provavelmente nunca a verá. Mas a história está aí para contar e nem mesmo a poderosa emissora conseguirá apagá-la dos anais.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 265 - 09/05/2.005

A mordaça que não cala

                        O jornalismo brasileiro sofreu, mais uma vez, um atentado à liberdade de expressão. A Justiça do estado de Goiás determinou o recolhimento do livro “Na toca dos leões”, de autoria do escritor e jornalista Fernando Morais, sob a alegativa de ofensa ao deputado Ronaldo Caiado (PFL-GO). O parlamentar é velho conhecido da cena política brasileira: candidatou-se à presidência da República em 1989 obtendo votação pífia, fundou e presidiu a União Democrática Ruralista (UDR), que de democrática não possui absolutamente nada, defendendo que seus integrantes se armassem para repelir com violência as invasões de terra realizadas por trabalhadores sem terra.

                        O parlamentar integra a bancada ruralista na Câmara Federal, que luta por privilégios e benefícios sempre custeados pelo contribuinte. Por mais ofensivo que o legislador considerasse a publicação, jamais a Justiça poderia proferir sentença ferindo o dispositivo constitucional do direito à liberdade de expressão. Caso o parlamentar se considerasse lesado, que buscasse judicialmente o reparo cobrando indenização. Determinar a apreensão do livro constitui-se num ato de censura, à qual foi extinta com a Constituição de 1988. Mas o Judiciário goiano foi mais longe: o juiz Jeová Sardinha, além de determinar a apreensão da publicação, ainda proibiu o autor de realizar qualquer manifestação envolvendo o deputado, sob pena de pagar multa de R$ 5 mil.

                        O Judiciário brasileiro precisa, urgentemente, oxigenar suas idéias, perceber que o País atravessa uma nova fase histórica – há muito tempo –, não desrespeitar as leis que tem a obrigação de cumprir e aproximar-se dos verdadeiros anseios da população, que lhes paga o salário. Os magistrados precisam, o quanto antes, quebrar essa estrutura organizacional e de pensamento hermética, fechada, caquética, superada, carcomida pelos vermes. Não é de hoje que o Poder investe contra a categoria: primeiro foi a decisão absurda da limitada juíza Carla Richster, que visou desregulamentar a profissão, ferindo e rasgando a lei que a regulamentou e a própria Constituição Brasileira, decisão felizmente que está para ser revogada. A ameaça togada que utilizou o subterfúgio de confundir liberdade de expressão com o exercício da profissão de jornalista é uma afronta a todos os jornalistas e à sociedade.

                        Qual será o próximo passo da Justiça brasileira? Existem no código civil, na Constituição e na Lei de Imprensa mecanismos que possibilitam às pessoas que se sintam atingidas em seus direitos por parte de profissionais de imprensa buscar reparação. Atitudes como essa somente trazem de volta recordações de um período nefasto da história brasileira e que as pessoas de bom senso e caráter libertário querem, definitivamente, sepultar. Não vamos ressuscitar quem não queremos nocivamente de volta à cena. Nos armários existem muitos esqueletos, vistam eles ou não toga. Não há mais espaço para retrocesso, tampouco para déspotas que não sabem conviver com a liberdade de expressão.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 266 - 16/05/2.005

Falência total do Poder Público

                               Dois casos ocorridos na semana passada demonstraram a falência total do Poder Público e como o povo brasileiro está á mercê de pessoas incompetentes e inescrupulosas decidindo suas vidas e, mais grave, malversando o dinheiro que o Estado arrecada através do pagamento dos pesados impostos por parte dos contribuintes. A primeira ocorreu no estado de Rondônia, onde deputados estaduais foram flagrados pedindo propina ao governador do Estado para não lhe fazer oposição. A segunda foi a exposição do estado de descalabro instalado na área da segurança pública no estado do Ceará.

                               No primeiro episódio, as imagens exibidas pelo programa Fantástico, da Rede Globo, na noite do dia 15/05 não deixam dúvidas: um grupo de dez deputados estaduais pediu dinheiro e favorecimento em licitações públicas para não fazer oposição ao governo estadual, todos, entretanto, repetindo o velho discurso da moralidade quando entrevistados antes de saberem das gravações, feitas com câmera oculta. Todos, ao serem indagados, se esmeraram em passar uma mentira desmascarada de maneira inconteste, foram pegos com as calças nas mãos. Tanto não tiveram como se explicar que se recusaram a novamente conceder entrevistas.

                               O que acontece em Rondônia não é uma realidade muito diferente nos demais estados brasileiros e o Distrito Federal. Muitos dos 1.052 deputados estaduais agem de maneira idêntica aos parlamentares rondonienses. Negociam, agem da maneira mais sórdida, nefasta, corrupta. Para estes não pode haver alternativa senão a cassação de seus mandatos e o banimento perpétuo da política brasileira. Infelizmente nossas leis e magistrados da Justiça Eleitoral nem sempre atendem aos anseios da população, de quem também lhes paga os salários, assim como dos parlamentares. Além do Judiciário e do Legislativo, o Executivo também dispensa pouca atenção e respeito aos anseios populares.

                               No Ceará a violência atingiu níveis insuportáveis, fruto da incompetência e da falta de compromisso do governador Lúcio Alcântara para com o setor. Falta tudo: material humano, material de expediente nas delegacias, combustível para as viaturas da Polícia Militar realizar o trabalho preventivo, vagas nos presídios para transferir os presos que se amontoam nas delegacias, vergonha na cara do governo estadual e da maioria da mídia local, que silencia e reproduz o discurso oficial, evitando a crítica mais aprofundada e poupando o governador de um desgaste ainda maior. Existe um trabalho de despersonalização das críticas ao setor de segurança pública, onde os erros são apontados e criticados, mas sem endereçamento.

                              A população cearense está abandonada à própria sorte. A gota d’água foi a ação de policiais civis do Rio de Janeiro, que realizaram a prisão de um conhecido traficante no Ceará, mas realizaram a operação sem comunicar as autoridades policiais locais, pois temiam pela segurança de seus homens e até mesmo de uma frutração da ação, uma vez que acusaram policiais cearenses de receberem dinheiro para darem proteção ao traficante. No mesmo dia em que a Polícia fluminense acusou a cearense de corrupção, dois policiais foram flagrados e presos tentando extorquir um comerciante. Assaltos, seqüestros, roubos, furtos, tráfico de drogas e de pessoas e toda uma gama de ilícitos ocorrem sob os olhares inertes, complacentes e incompetentes do governo do Estado. Trata-se da falência total do Poder Público.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 267 - 23/05/2.005

Não está direito

                                   Dois episódios colocaram o Direito mais uma vez no centro das discussões nacionais. O primeiro diz respeito à decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, que concedeu liminar em ação impetrada por deputados estaduais, suspendendo a exibição de uma reportagem feita pela TV Globo e que foi exibida para o resto do País no programa Fantástico, onde o governador Ivo Cassol apresentava gravações feitas com uma câmera escondida mostrando os parlamentares pedindo propina para apoiarem as ações do Executivo no Legislativo. A medida configurou-se censura, uma vez que a lei assegura o direito de pleitear reparação indenizatória a qualquer pessoa que se julgar vilipendiada.

                                   A Justiça de Rondônia não devia quedar-se à manobra escusa dos deputados denunciados, que visaram impedir que a população tomasse conhecimento dos atos que cometeram. São pessoas públicas, que abdicaram de algumas prerrogativas dos cidadãos normais ao se elegerem para cargos públicos. Mas é muito difícil conter a vontade popular, quando esta se manifesta de maneira incisiva. A Justiça estipulou uma multa de R$ 200 mil à emissora em caso de descumprimento da decisão, mas a reportagem foi exibida em universidades e escolas de Rondônia. Nem mesmo o TJ pôde impedir que o cidadão buscasse informar-se. Infelizmente, mesmo com o final da ditadura militar - ainda que vivamos um outro tipo de ditadura - os casos de censura à imprensa ainda continuam ocorrendo.

                                  O segundo fato refere-se ao ápice negativo que o ensino do Direito alcançou. Para ter o direito de exercer a profissão o bacharel precisa submeter-se ao exame promovido pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), realizado pela Instituição em todo o País através de suas secções estaduais. Sem conseguir aprovação, não há a concessão do registro profissional. Ocorre que os índices de reprovação alcançaram níveis inaceitáveis. A média nacional de reprovação superou os 70%, com casos ainda mais extremados, como em Curitiba (PR), onde o índice superou os 91%, percentual inadmissível. Os números revelam a extrema deficiência do ensino do Direito no Brasil.

                                 O presidente nacional da OAB, Roberto Busato, admitiu que a situação fugiu ao controle do governo federal, que tem a obrigação de fiscalizar a qualidade do ensino superior e da própria Instituição, que não tem conseguido impedir que novos cursos de Direito pipoquem nos quatro cantos do País. Inúmeras faculdades de Direito surgem a cada dia, sem qualquer controle da qualidade do ensino oferecido, transformando-se em meras vendedoras de diplomas, daí o alto índice de reprovação no exame da Ordem. Segundo previsões da OAB, nos próximos anos serão despejados no mercado de trabalho 120 mil novos bacharéis, mesmo número de advogados em atividade na Inglaterra. Atualmente já há uma enorme saturação do mercado.

                                  O problema da baixa qualidade do ensino, entretanto, não é restrito apenas à área do Direito. Praticamente todas estão em franca decadência qualitativa em seu ensino, desde que o governo federal resolveu tornar mais fácil e simples a abertura de uma faculdade ou universidade do que um botequim. Jornalismo, medicina, engenharia e demais profissões também são seriamente afetadas pelos "profissionais" precariamente formados em universidades e faculdades privadas, e se a situação é grave na área do Direito, onde existe uma Instituição que aplica uma rigorosa prova para que profissionais incapacitados não sejam lançados no mercado, imaginem nas áreas profissionais onde isso não existe. Isto, definitivamente, não está direito.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 268 - 30/05/2.005

Luta por liberdade e independência

                        No próximo dia 1º de junho comemora-se o Dia da Imprensa. Afinal, o quê se tem para comemorar? Infelizmente nos últimos tempos têm-se intensificadas as ações para o cerceamento da Imprensa, expressada em decisões judiciais absurdas ou por tentativas de intimidar profissionais do jornalismo. As notícias de atentados contra a vida e residências de jornalistas entristecem a categoria e alertam a sociedade para uma situação que pode ainda ter imbricações muito mais danosas. A imprensa livre é um pressuposto indispensável para a manutenção do estado democrático de direito.

                        Além dos atentados à sua liberdade, a Imprensa também é vítima de outros. A distribuição de concessões de emissoras de rádio e TV por parte do Poder Público balizada apenas no critério político, com a conseqüente formação de monopólios das empresas de comunicação é um cancro que há anos vem eivando a Imprensa brasileira. Essas concessões vêm sendo utilizadas há tempos como moeda de troca por quem ocupa o governo federal, quase sempre contemplando políticos que lhes prestam apoio ou seus prepostos e sócios, além de empresários que contribuem para campanhas de parlamentares.

                        Os profissionais de Imprensa que não honram sua profissão, tampouco o compromisso social de sua atividade também têm contribuído, de forma incisiva, para que a Imprensa cada vez mais seja vilipendiada. Agindo como verdadeiros vendilhões, essa corja utiliza-se de sua atividade para atender unicamente seus interesses pessoais. Agem de maneira ilícita, anética e desprovida de qualquer seriedade. São pessoas que não têm escrúpulos em lançar mão das medidas mais baixas unicamente para atingir seus objetivos paroquiais. Merecem o repúdio, o desprezo e a severidade da lei.

                        A sociedade precisa, urgentemente, buscar com que os direitos constitucionais que lhe garantem proteção às distorções cometidas com os meios de comunicação de massa sejam exercidos e respeitados. A Imprensa precisa ser livre não apenas para exercer seu papel de democratização da informação, mas livre de toda e qualquer manipulação, distorção e oportunismo. A Imprensa brasileira precisa agir com mais independência em relação ao Poder Público e aos grandes grupos econômicos, pois apenas dessa maneira poderá obter o respeito da população e, sobretudo, cumprir seu papel institucional. Somente a Imprensa livre interessa aos cidadãos.

JUNHO

ATUALIZAÇÃO N.º 269 - 06/06/2.005

Quem investigará a Imprensa?

                                   Nos últimos tempos a Imprensa brasileira tem sido pródiga em divulgar casos de corrupção envolvendo pessoas públicas. As mais recentes foram as imagens de um funcionários dos Correios recebendo propina para facilitar licitações fraudulentas, em nome do presidente nacional do PTB, deputado Roberto Jéferson e as gravações de escutas telefônicas feitas pela Polícia Federal, que culminaram por revelar a existência de um grupo de extermínio existente no Ceará, integrado por policiais militares e empresários. São exemplos de como a Imprensa atua como agente fiscalizador da sociedade, tendo um papel de suma importância na democratização da informação.

                                   Isso demonstra como é extremamente importante a ação de uma Imprensa livre e atuante. Durante os regimes de exceção que vigiram no País uma das primeiras atitudes de quem usurpava o poder era decretar o controle institucional dos meios de comunicação de massa. Através do controle da informação, seja pela cooptação econômica de quem detinha os veículos de comunicação, seja pela força bruta, a ditadura militar perdurou durante longos vinte e um anos. Atualmente, além do empresariado do setor, os detentores do poderio político-econômico também realizam o mesmo trabalho de cooptação dos profissionais de imprensa ocupantes de cargos-chave. Infelizmente as novas gerações do jornalismo, em sua maioria, não aprenderam e não assimilaram exemplos de jornalistas que chegaram até a pagar com a vida a defesa de suas convicções.

                                   Na condição de estilingue, a Imprensa sai-se muito bem. Não se comporta da mesma forma, entretanto, quando passa a ser vidraça. Afinal, a categoria nunca passou por uma situação idêntica às quais costuma colocar as demais, nunca houve, salvo uma ou outra exceção, uma investigação sobre o que ocorre nos bastidores do jornalismo brasileiro. Caso isso acontecesse, a população veria que, da mesma forma como ocorre no mundo político e no serviço público, a atividade também possui seus personagens nefastos e que utilizam a profissão e a posição que ocupam para aferir vantagens pessoais, colocando seus interesses pessoais acima do coletivo e realizando ações que superam o questionamento ético e caem da ilegalidade. Caso câmeras escondidas fossem apostas nas redações, conversas telefônicas entre jornalistas e corruptores fossem gravadas, a sociedade veria que muitos dos que apontam para os outros têm o dedo sujo de lama.

                                   Para o próprio bem da categoria, seria muito bom que o quanto antes essa depuração pudesse ser feita, mas trata-se de uma possibilidade bastante remota. Afinal, os profissionais de Imprensa que dessa forma agem não o fazem solitariamente, sempre contam com uma cadeia que lhe dá suporte e cobertura para que não venha à tona o sujo. O jornalismo precisa urgentemente separar o joio do trigo, extirpar suas ervas daninhas. Infelizmente na maioria das vezes fala mais alto o espírito de corpo, onde em nome não se sabe de quê são praticados os mais sórdidos atentados contra o direito à informação. Está mais do que na hora de se investigar quem investiga.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 270 - 13/06/2.005

Corrupção, esporte nacional

                        O Brasil assiste a mais um festival de denúncias de corrupção no Governo Federal. Não se trata de ações sazionais ou isoladas, mas de uma prática que se verifica no País praticamente desde sua época colonial. Infelizmente a corrupção hoje é endêmica, tendo seu palco maior nas administrações públicas. Em todas as esferas de poder, não apenas no Executivo, mas no Legislativo e no Judiciário pipocam pelos quatro cantos as denúncias de malversação de recursos públicos. Os holofotes da mídia estão, nos últimos tempos, apontados para o governo Lula, mas já o fizeram nos governos anteriores, desde que a ditadura militar resolveu mandar de volta seus componentes para a caserna.

                        Para os brasileiros de boa memória ainda estão presentes as denúncias de distribuição de concessões de canais de rádio e TV feita durante a gestão do presidente José Sarney, para aprovar, durante a constituinte, do mandato de cinco anos para o hoje senador pelo Amapá. Em seguida, com a primeira eleição direta para presidente após o golpe militar de 1964, o Brasil pôde ter notícia de um dos períodos mais negros de sua história política. O presidente eleito, Fernando Collor de Melo, passou para a história como o primeiro a ser afastado do cargo por um processo de impeachment. A população tomou conhecimento de um dos mais horrendos esquemas de desvio de dinheiro público. A nação acompanhou tudo pelos meios de comunicação de massa, que, quando lhes interessou, passaram a dar amplo espaço para a cobertura dos fatos envolvendo Collor, PC Farias e companhia.

                        Seguiu-se ao governo Collor seu vice, Itamar Franco, que não pode ser dissociado do mar de lama de seu companheiro de partido, quando até então ambos eram filiados ao desconhecido PRN. Itamar também não se livrou de ter sua administração envolvida em denúncias de corrupção. Seu sucessor, apoiado e eleito por Itamar, foi o primeiro presidente a governar por dois mandatos consecutivos e para tal realizou um trabalho de cooptação de parlamentares para a aprovação da emenda constitucional que permitiu a reeleição. Durante os oito anos em que governou, Fernando Henrique Cardoso dilapidou o patrimônio público, seja através da corrupção, seja pela venda de estatais. Em seu governo a exploração dos serviços de telefonia móvel e fixa, além da distribuição de energia elétrica passou para a iniciativa privada. Muitas foram as denúncias de corrupção que a chamada grande imprensa silenciou e tratou de abafar seguindo seus interesses pessoais e econômicos.

                        Com a eleição do governo Lula, milhões de brasileiros depositaram suas esperanças de mudança no panorama político, mas, infelizmente, o presidente ex-torneiro mecânico e ex-sindicalista frustrou seu eleitorado, repetindo velhos erros do passado e que marcaram pessoas a quem, num passado não muito distante, combatia. Lula não teve reservas em aliar seu nome ao deputado federal Roberto Jéferson, homem que teve sua imagem ligada ao ex-presidente Collor, quando comandou sua “tropa de choque” e votou contra seu impeachment. Juntamente com Jéferson o presidente também não teve qualquer cerimônia em ligar-se ao também fisiologista e oportunista PMDB, de nomes como Michel Temer, expressão-mor dessas práticas abomináveis. Também se cercou do proselitista Ciro Gomes, que, a exemplo do Dr. Hide, tem dupla personalidade, condena seu antigo ninho, o PSDB, mas não estende as críticas ao seu mestre Tasso Jereissati.

                        O povo brasileiro também não foge dessa culpa, afinal, está passando por mais esse triste episódio por sua própria culpa. Os políticos não teriam como realizar suas rapinagens se não tivessem recebido um mandato eletivo do povo. Ademais, no cotidiano muitas são as ações que o brasileiro toma e que, na verdade, nada mais se caracteriza do que corrupção. Quando prefere dar uma propina a pagar uma multa de trânsito, quando sonega imposto, enfim, a corrupção virou, de fato, o esporte nacional. O Brasil é um país moralmente moribundo, precisando, o quanto antes, de um tratamento de choque. Do contrário, o paciente vai acabar morrendo, eivado pelo pior vírus social: a corrupção, mãe de muitos outros crimes.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 271 - 20/06/2.005

O outro mensalão

                        A Imprensa nacional vem noticiando nos últimos dias o desmoronamento de mais um intrincado esquema de corrupção, deflagrado com a denúncia da cobrança de propina por parte de funcionários da diretoria dos Correios, que visava arrecadar fundos para figuras proeminentes do PTB, capitaneados pelo presidente do partido, o ainda deputado federal Roberto Jéferson. Como contra-ataque, o parlamentar acabou utilizando a tática de atacar para defender, afirmando existir um esquema de pagamento de um valor mensal para deputados votarem favoravelmente às propostas de interesse do governo federal.

                        Não se trata da primeira grande crise política brasileira e, muito provavelmente, não será a última. Ainda estão bem vivos em grande parcela da população, os nefastos acontecimentos da era Collor – do qual esse mesmo Jéferson foi um de seus mais ardorosos defensores –; das denúncias de corrupção envolvendo os governos de Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso, se ficarmos apenas nas administrações eleitas após a restauração das eleições diretas para presidente. O governo Lula acabou vítima de quem se tornou refém desde antes de sua posse: aliados fisiológicos, oportunistas que naturalmente iriam desfigurar-lhe o caráter de transformação do País que a maioria do eleitorado depositou no presidente.

                        Mas existe um outro tipo de “mensalão” que também é pago pelo Poder Público e igualmente possui um reflexo negativo para a sociedade brasileira. Muitos são as empresas de comunicação e profissionais de Imprensa que recebem sinecuras que se assemelham ao imoral esquema denunciado pelo parlamentar petebista. Muitos dos que escrevem, falam no rádio ou na TV, se apresentando como arautos da moralidade pública possuem conduta idêntica aos que, de maneira justa, expõem. A Imprensa brasileira possui seus profissionais “mensalistas” e a existência de pessoas como Roberto Jéferson é muito mais comum do que imagina a população.

                        São as empresas de comunicação que recebem subvenção oficial em forma de publicidade para calarem-se ou divulgarem o que interessa ao Poder Público –  em todas as esferas – e os profissionais de imprensa que barganham sua consciência e moral em troca de um cargo público, de uma benesse estatal, de uma concessão para exploração de serviço de rádio ou TV. Muitos são os exemplos, já amplamente divulgados, com nome, sobrenome, razão social e sócios. Fato comum nas redações do Brasil os jornalistas que, aneticamente, acumulam a função na empresa de comunicação que trabalham com uma assessoria num órgão que se inclui no seu raio de ação profissional. Isso sem contar os repórteres de política que desempenham, concomitantemente, a assessoria dos mesmos políticos aos quais têm a função de cobrir.

                        Faz-se necessário, o quanto antes, que essas empresas de comunicação e jornalistas “mensalistas” sejam, o quanto antes, se não extirpados do meio, mas compelidos pela população a mudarem seu comportamento. O País não pode ficar à mercê de pessoas que apontam para corruptos com os dedos sujos da mesma lama. Winston Churchil dizia que o povo não deveria saber como são feitas as leis e as salsichas. Além disso, a população brasileira não sabe como são feitos os jornais impressos, radiofônicos e televisionados. Deveriam saber, profundamente, pois aí ficariam na dúvida sobre quem é mais canalha: denunciados ou denunciadores.

ATUALIZAÇÃO N.º 272 - 27/06/2.005

A CPI da mídia

                                   O País assiste a um festival de Comissões Parlamentares de Inquérito, instrumento pelo qual parlamentares têm a incumbência de investigar denúncias em qualquer área, que acabaram se transformando em instrumentos políticos. As CPI são utilizadas para os mais diversos fins, desde a perseguição e reação política a algum governo ou grupo político, econômico, até palanque político onde parlamentares disputam, avidamente, os holofotes da mídia em busca de exposição e conseqüentemente tentar um novo mandato. Com tanta distorção acabou desvirtuando-se, mas ainda é um bom instrumento de fiscalização, afinal, quem não lembra da CPI que culminou com o impeachment do ex-presidente Fernando Collor?

                                   Está na hora dos holofotes serem voltados para quem os apontam. O submundo habitado pelas empresas e profissionais de comunicação possui fatos que necessitariam de uma CPI, mas sem politicagens ou políticos, que investigasse a fundo tudo o que de errado existe na área. Mais uma vez a proposta de um programa público de socorro financeiro às empresas de comunicação, com o dinheiro do contribuinte ganha corpo, no esteio dos atos e atitudes que sempre acabam motivando as CPI nos parlamentos. Infelizmente a maioria dos empresários e profissionais de comunicação utiliza seu meio de trabalho como instrumento de barganha de vantagens pessoais.

                                   Os fatos políticos e a atitude desses não são diferentes dos que ocorrem no mundo da mídia. Jogos de interesses, negociações espúrias, cinismo, corrupção, muita lama. Numa forma idêntica à que já vem ocorrendo, a nação assistiria, enojada, aos fatos que forem sendo expostos. As semelhanças assustariam as pessoas, perceberiam que muitos dos que se apresentam como arautos da moralidade, da ética, não passam de simulacros dos mesmos personagens aos quais ilustram jornais impressos, televisionados, falados. Veria que por trás da roupa de super-heróis existem pessoas com as mesmas fraquezas, desvirtuamentos e distorções de caráter.

                                   Quem faria a gravação de um empresário ou profissional de comunicação embolsando dinheiro numa transação ilegal? Quem iria rastrear a perniciosa relação entre governantes e os dois segmentos? Quem iria denunciar o pagamento de mensalão à mídia? Quem seria o Roberto Jéferson da mídia, corrupto que iria denunciar seus pares?

 

JULHO

ATUALIZAÇÃO N.º 273 - 04/07/2.005

O tempo não pára

            A semana passada foi marcada por três acontecimentos que demonstram o fundo de poço em que o Brasil está metido. O País está à beira de uma convulsão institucional sem precedentes, fruto de uma fragilidade que, certamente, vai custar muito caro aos cidadãos. O governo federal não consegue conter a crise política na qual mergulhou fruto de sua própria incompetência, a cada dia eclodindo novas denúncias de corrupção e outros crimes. Acuado pelo noticiário das irregularidades em seu governo, o presidente Lula assiste atônito ao desmoronamento de toda sua história construída ao longo de anos no sindicalismo e na oposição ao status quo vigente.

            Da mesma forma que boa parte dos brasileiros têm se constrangido em ver no noticiário sobre corrupção nomes que fizeram história nos movimentos populares, sindical, na resistência à ditadura militar, assiste ao desfile de personagens que até bem pouco tempo estavam na mesma situação despejarem um discurso de moralidade e ética. Chega a ser cômico ver a nova geração herdeira dessa forma caquética e distorcida de fazer política, como Rodrigo Maia – filho do prefeito do Rio de Janeiro César Maia – e Antônio Carlos Magalhães Neto – que como o próprio nome denuncia descende de uma das linhagens mais nefastas da política brasileira. Ambos são do PFL.

            Também é completamente atípico ver o senador Virgílio Guimarães e Alberto Goldman se apresentarem como arautos da moralidade pública. Os parlamentares do PSDB serviram a um dos mais corruptos governos, que entregou a maioria do patrimônio público à iniciativa privada, cometendo crime de lesa pátria. Executivo e Legislativo cada vez mais se afundam numa crise incomensurável. No centro de tudo um deputado que confessou ter cometido crime eleitoral, foi flagrado num esquema de propina e arrecadação ilícita de dinheiro através de estatais e que se notabilizou por ser o fiel escudeiro de um dos – muito provavelmente o mais – governos mais corruptos já registrado pela história: o de Fernando Collor de Melo. Há bem pouco tempo ele integrava outra tropa de choque.

            A crise institucional também não poderia de abater o Judiciário, que há muito vem conseguindo se salvar de uma reforma que a população vem clamando incessantemente. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu conceder liberdade para Suzane Von Richthofen, que há três anos tramou a morte dos próprios pais, executados pelo namorado dela e o irmão deste. O STJ entendeu que a ré confessa não representava mais um perigo para o andamento do processo. Na verdade somente premiou quem cometeu um crime hediondo, reforçou o sentimento latente de impunidade e proporcionou que a ré, por exemplo, empreenda fuga, pois que garantia tem a Justiça de que ela permanecerá à disposição até ir a júri? Ainda por cima abriu um perigoso precedente para a libertação da dupla de irmão executora do barbado crime.

            Será que se fosse a ré negra, pobre, analfabeta e favelada a Justiça teria essa mesma benevolência? Branca, com instrução, classe média alta Suzane está muito distante do perfil de presas que abarrotam os presídios por todo o País. Incrível a capacidade que o Judiciário possui de frustrar a opinião pública. Concedento a liberdade a Suzane, o STJ não cometeu nenhum ato ilegal, mas também não incorreria nisso se negasse o pedido dos advogados da ré. O terceiro fato também se relaciona à área jurídica: a Ordem dos Advogados do Brasil reclamou pela ação da Polícia Federal, que, na cidade de São Paulo, desbaratou uma quadrilha de fraudadores comandada por um dos mais conhecidos e conceituados criminalistas da capital paulista.

            Pressionou o governo e, agora, é lei: caso a PF vá cumprir qualquer mandado de busca e apreensão, bem como de prisão, a Ordem tem que ser comunicada antes de sua efetivação e terá que estar presente ao cumprimento. A OAB não é uma entidade classista dos advogados, mas uma Instituição social que transcende e constitui-se numa entidade representativa de toda a sociedade. Esse tipo de atitude é mais afeito e cabe ao Sindicato dos Advogados. No próximo dia sete completam-se quinze anos da morte do cantor e compositor Agenor de Araújo Miranda, o Cazuza, e dele podemos utilizar os versos: “eu vejo o futuro repetir o passado, eu vejo um museu de grandes novidades”. O tempo não pára.

 

ANO V - ATUALIZAÇÃO N.º 274 - 11/07/2.005 - (00:00h)

Nau à deriva

            O Brasil continua assistindo, com perplexidade, os fatos que estão colocando o País numa grave crise política como há muito tempo não se via. Apesar de estar no olho do furacão, o PT não é o único envolvido nessa teia que se apresenta nefasta, mas outros partidos como PTB, PL, PP, PMDB e até o PSDB. Afinal, o publicitário apontado pelo deputado Roberto Jéferson (PTB-RJ) como operador do tal “mensalão” em 2002 apoiou e fez a campanha da mídia do então candidato ao governo de Minas Gerais Aécio Neves, que acabou por ser eleito.

            Quase todos os partidos políticos acabaram no mesmo barco. Pior, no mesmo lado do barco que, dessa forma, está muito próximo de afundar. Uma nau à deriva que perigosamente pode acabar tendo como timoneiro pessoas que não mereciam sequer uma bóia ao se jogarem ao mar. Tem gaiato já defendendo o nome de Roberto Jéferson para a presidência dessa República que terceiriza a culpa e não assume seus atos. Afinal, José Dirceu, Roberto Jéferson, Valdemar da Costa Netto, Sandro Mabel, Sílvio Janene, Severino Cavalcante e outras carrancas carcomidas de podridão não chegaram onde se encontram por seus próprios méritos. Receberam um mandato eletivo fruto do voto de milhares de brasileiros irresponsáveis.

             Agora o novo nome, a bola da vez é o deputado estadual José Nobre Guimarães, líder da bancada do PT na Assembléia Estadual do Ceará e irmão do ex-presidente nacional do partido, José Genoíno, que caiu depois das acusações de Jéferson. Seu assessor, José Adalberto Vieira, membro da executiva estadual cearense, foi flagrado com as calças na mão, ou melhor, com reais na mala e dólares “nos possuídos”, como dizem seus conterrâneos. É o caso de se perguntar se havia mais dinheiro escondido e onde diabos o assessor o teria metido... Guimarães sempre quis parecer uma fotocópia de seu irmão, imitando-o no modo de falar, de agir, etc. Resta saber se o imitava em mais algumas coisas.

            Vai ser difícil para Guimarães dissociar o episódio de sua imagem e, principalmente, de seu mandato, mas como é político extremamente maleável e não afeito a conflitos, sua plumagem camuflada poderá lhe ser útil. Poderá lhe render uma boa ajuda para levar essa situação no bico. O PT cearense demonstra a mesma incompetência registrada no âmbito nacional: não consegue virar o canhão de lama para quem lhe aponta, mesmo sendo os artilheiros tão ou mais sujos que seu alvo. PSDB e PFL não se ressentem de prática apenas para desempenharem o papel de oposicionistas, mas de arautos da moralidade pública, da ética na política. Chega a ser cômico ver o herdeiro do corrupto clã dos Magalhães discursando em favor da probidade administrativa.

            José Dirceu, José Genoíno, José Nobre Guimarães, Delúbio Soares, Sílvio Pereira não representam a esquerda brasileira. Não têm sequer autoridade para avocarem a si um passado de resistência e de luta pela liberdade no qual eles foram meros figurantes. Marighela, Lamarca, Herzog, Edson Luiz, Frei Tito, Gregório Bezerra e muitos outros que resistiram e pagaram com a vida a defesa de seus ideais são os legítimos representantes dessa nobre casta. Devem, certamente, estar se revirando em seus túmulos. Desde o período de transição do corrupto e nefasto governo FHC para o petista o Brasil passou a ter, com raríssimas exceções, apenas um rosto. Fazendo uma analogia futebolística, tornaram-se “joão”, a denominação que o jornalista Sandro Moreira inventou para designar os adversários que o magistral Mané Garrincha encontrava pela frente, e os quais deixava pelo caminho, desmoralizados com seus dribles. Pena que nossa política está abarrotada desse “joão”. O povo brasileiro é que está levando pancada: na canela, no joelho, na cara, no bolso. Não consegue driblar esse “joão” desleal.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 275 - 18/07/2.005

Manipulação criminosa

                        Cada vez mais os meios de comunicação de massa são utilizados como instrumento de manobra da população. Os brasileiros têm assistido, nos últimos dias, a um adicional à crise política que se acentuou: a manipulação de informações por parte da chamada grande Imprensa. Dois episódios foram particularmente reveladores dessa postura das empresas de comunicação, que repetem práticas utilizadas há anos, décadas, séculos. Primeiro, a centralização do enfoque da perniciosa relação do publicitário Marcos Valério apenas no atual governo de Luís Inácio Lula da Silva e em seu partido, o PT.

                        É fato que o publicitário tem uma obscura relação com integrantes do PT e que até bem pouco tempo ocupavam cargos estratégicos no governo federal. Não se discute a conflituosa relação entre Valério e um grupo de petistas, tampouco a suspeição de contratos de publicidade que a empresa dele amealhou no âmbito da administração federal, através de órgãos e empresas públicas. Existe um intrincado caso que deve ser apurado pelo Ministério Público e seus fatos levados a público, pois a população tem o direito de ter acesso a toda e qualquer informação de interesse coletivo.

                        A mídia nacional está deixando fora dos fatos importantes dados. O publicitário Marcos Valério não manteve relações obscuras apenas com integrantes do PT, mas com outros partidos. Foi ele quem atuou na campanha do ex-governador de Minas Gerais Eduardo Azeredo, do atual governador Aécio Neves e de Pimenta da Veiga, ex-ministro das comunicações do governo FHC, todos do PSDB. Entretanto esses dados não estão sendo expostos pela mídia. O discurso em defesa da transparência, da moralidade, da ética, da probidade administrativa não pode ser direcionado nem se ater a paixões ou cores partidárias, tampouco de interesses pessoais.

                        O outro episódio foi a apreensão de sete malas que continham mais de R$ 10 milhões que estavam em poder do deputado federal João Batista Ramos, que acabou expulso de seu partido, o PFL, nos dias seguintes ao fato. O parlamentar é “bispo” e presidente da Igreja Universal do Reino de Deus, proprietária das redes de televisão Record, Mulher e Família. Batista não falou com a imprensa no dia da apreensão, mas alegou à Polícia Federal que transportava o dinheiro de Manaus para São Paulo em espécie e nas malas porquê os bancos não aceitariam depósito de valor elevado e que tudo era fruto de dízimos ofertados pelos fiéis da IURD. Ora, existe algum banco que recuse depósito em dinheiro? Até seria mais sincero e honesto dizer que a Igreja não quis fazer a transferência por via bancária para não pagar CPMF.

                        Além do mais, como são isentas do pagamento de imposto de renda, as igrejas podem utilizar esse privilégio para outros fins, como a lavagem de dinheiro, por exemplo. É uma receita que não precisa ter sua origem explicada ao fisco. Mesma estratégia utilizada por proprietários de bingos e loterias, que justificam a receita através da venda de cartelas e bilhetes, quando se sabe que essa é uma artimanha amplamente utilizada para a lavagem de dinheiro ilícito. No meio do mundaréu de cédulas – a PF gastou horas para contar e até pediu emprestada a um banco uma máquina de contar dinheiro – muitas com numeração em seqüência – o que significa que o dinheiro teve, sim, passagem pelo sistema financeiro – e também cédulas falsas.

                        O pior é que o “bispo” recusou-se à prestar declarações à imprensa e utilizou os programas das emissoras da qual sua Igreja é proprietária para dar suas “explicações”. Desfilou um cabedal de explicações fajutas e descabidas que não eram questionadas pelos “profissionais de comunicação” que lhes entrevistava. Nem mesmo o sisudo e auto-intitulado bastião da vergonha nacional Boris Casoy agiu de maneira correta: não fez o contraponto nem os questionamentos necessários quando exibiu a matéria sobre a apreensão em seu telejornal na Record. Sua companheira de emissora, Sônia Abrão, além de não fazer nenhum questionamento ao tal bispo, ainda levantava a bola para que o manda-chuva evangélico chutasse. Essa, definitivamente, não é a função do jornalismo, tampouco do jornalista.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 276 - 25/07/2.005

Dois pesos, duas medidas, uma injustiça

                        Mais uma vez o PT perdeu a chance de dar um verdadeiro exemplo de que realmente está empenhado em fazer uma depuração em seus quadros, após as denúncias que colocaram o partido no olho de um furacão político que vem sendo acompanhado com perplexidade pela população. Não tanto pelas denúncias de corrupção na política, coisa que, infelizmente, tornou-se lugar comum no Brasil, tanto que os acusadores de hoje são os corruptos de ontem, mas por tratar-se de um partido político que sempre se apresentou como arauto da moralidade pública e bastião da ética política. O exercício do poder acabou por demonstrar que o PT está longe de ser uma reserva moral e ética, expondo práticas tão rotineiras a outras agremiações, como PSDB e PFL, hoje posando como mocinhos.
                        Mesmo sendo alvo de sérias denúncias de irregularidades, algumas, inclusive, assumidas publicamente pelo próprio denunciado, o PT não expulsou Sílvio Pereira, que exerceu o cargo de secretário geral nos últimos tempos. Envolvido num turbilhão de denúncias, a derradeira de ter recebido como “presente” um automóvel Land Rover Defender, que custou R$ 73 mil, dado por uma empresa que venceu uma milionária licitação da Petrobrás, Sílvio tinha, há muito tempo, oferecido motivos para que o PT o expulsasse. Os muitos indícios do envolvimento dele nas denúncias de esquema do mensalão, além de relações questionáveis com o publicitário Marcos Valério, apontado pelo também flagrado em esquema de corrupção Roberto Jéferson como operador do tal mensalão já eram mais do que suficientes para a exclusão do ex-secretário geral dos quadros petistas.

                        Primeiro Sílvio demorou a entregar o cargo que ocupava na direção do PT, explicitando que só sairia do posto quando achasse que lhe fosse conveniente. Amparado por seus companheiros de partido, que controlam – ou controlavam – a direção nacional, Sílvio fez pouco caso das vozes de seu partido que se levantaram pedindo seu afastamento do cargo, outros sua expulsão. Ao adotar a posição de evitar o inevitável desgaste de seu então secretário geral, a direção nacional petista acabou por desgastar algo maior do que o militante: a própria agremiação. Mesmo depois de seu sucessor no cargo, o deputado federal Ricardo Berzoini, dar declarações públicas de que Sílvio Pereira deveria ser expulso do partido, o agora ex-petista não foi excluído através de decisão da nova direção petista.

                        O mesmo aconteceu com Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, que confessou ter cometido crimes eleitorais, comprometido a imagem do partido, envolvendo-o num mar de lama no qual a maioria de seus filiados nunca pensou que a sigla iria chafurdar, mas, apesar de ter entregado o cargo que ocupava, não pediu desfiliação e, de quebra, teve barrado o pedido de desligamento por sessenta dias. Seus pares – e ímpares também – optaram por comprometer ainda mais a já combalida imagem do PT, não se sabe em nome do quê. Quanto mais o Partido dos Trabalhadores posterga a expulsão de Delúbio, esperando que o “companheiro” não saia pela porta dos fundos solicitando desligamento, mais se fortalece a decepção do povo brasileiro. Mas parece que expulsar filiados flagrados ou confessos de ilicitudes não é mesmo um hábito que o PT possua.

                        Adalberto “cuecão de ouro” pediu desfiliação. A Comissão de Ética do PT cearense, mais fraca do que caldo de bila, ainda engatinhava nos “trabalhos” de apuração do imbróglio no qual ele se meteu e enfiou o partido, o deputado José Nobre Guimarães, o ex-presidente nacional da sigla José Genuíno e o colega de apartamento e também exonerado assessor parlamentar José Vicente. Óbvio que toda pessoa acusada em qualquer tipo de processo, ainda que um procedimento interno de um partido político, tem o direito de ampla defesa, mas é igualmente obrigação dar celeridade para que os casos tenham seu desfecho da maneira mais rápida e correta possível, sempre observando os trâmites legais. Kennedy Moura Ramos, um dos envolvidos e principal suspeito de ser operador de um esquema de corrupção no Banco do Nordeste também ainda é filiado petista.

                        Por muito, mas muito menos o PT expulsou a senadora Heloísa Helena e os deputados federais Luciana Genro, José Fontes e Luciano Babá. O quarteto votou contra o projeto de reforma previdenciária, proposto pelo governo Lula, que além de não resolver o problema e apenas adiando-o para outras gerações, ainda criou duas categorias de servidores públicos. A proposta não resolveu o problema e poderia ter sido bem melhor, mas era contrária às bandeiras históricas do PT. Os quatro parlamentares justificaram o voto contrário alegando estarem sendo fiéis aos postulados que defenderam por anos a fio. Não cometeram nenhum ato de improbidade, não foram flagrados em corrupção, tampouco em crime eleitoral, mas foram expulsos pelo PT.

                        O PT não é hoje, nem de longe, um arremedo do partido que nasceu dos movimentos operários na segunda década de ditadura militar, que defendia o socialismo e se apresentava como legítimo representante da classe trabalhadora, propondo uma cruzada contra a corrupção e a improbidade administrativa. Trata-se de um aglomerado de pessoas que apenas estão interessadas na satisfação de seus interesses pessoais, acabou por transformar-se em mais um, espelhado no que há de mais podre na política brasileira: PFL, PSDB, PMDB, PL, PTB e PP, sendo esses quatro últimos, seus “aliados”. Os nomes que, por exemplo, ocuparam a mídia durante o corrupto governo de Fernando Collor são os que hoje posam para as lentes de cinegrafistas e fotógrafos ao lado do presidente Lula. O PT hoje não sabe quem ele é, para onde vai e tem uma vaga lembrança de onde veio.

 

AGOSTO

ATUALIZAÇÃO N.º 277 - 01/08/2.005

Deitado eternamente em berço esplêndido

                               O Brasil possui a maior parte de sua população vivendo nas mais desumanas e absurdas condições de vida. Milhões de brasileiros morrem nas filas de espera dos hospitais públicos, recebem educação deficiente nas escolas públicas, moram em condições subumanas, sem qualquer serviço básico, está desempregada ou fora do mercado formal de trabalho, não vislumbra perspectivas de um futuro melhor. Tudo isso somado à um clima de insegurança que caracteriza um país à beira de uma convulsão social grave e irreversível.

                               Esse brasileiro que é submetido ao martírio assiste a um deplorável espetáculo que, infelizmente, não é novidade, tampouco parece querer deixar de existir: o da malversação do dinheiro público. Torna-se absolutamente revoltante ver corruptos manipulando milhões, bilhões roubados do povo, enquanto esse mesmo povo conta moedas para poder tentar continuar sobrevivendo. Desde seu descobrimento a população brasileira é sistematicamente saqueada por bandidos que não se importam em matar de fome, de doença e de ignorância quem lhes sustenta.

                               São marginais da pior espécie, salteadores que deveriam ser imediatamente banidos permanentemente do convívio social. Infelizmente com a corrupção endêmica nacional é bastante difícil nutrir esperanças de que os ladrões do dinheiro público, gatunos da pior estirpe, sejam punidos com todo o rigor da lei. A corrupção no Poder Público tem ramificações em todos os setores de seu tripé de sustentação constitucional – Executivo, Legislativo e Judiciário – e, dessa forma, surge sempre uma grande redoma onde esses badidos se refugiam e continuam impunes. Muitos, inclusive, acabam recebendo um atestado de idoneidade moral, assinado por quem não tem esse requisito.

                               Enquanto a população não ver os que se aproveitam da coisa pública para se locupletarem pagando por seus crimes, dificilmente acreditarão que é possível viver num País onde valha a pena ser honesto. A tônica reinante no Brasil é o do mais esperto, onde cada vez mais se aplica a “Lei de Gérson”, onde se tira vantagem de tudo. O povo tem assistido, passivamente, ser ludibriado e roubado através dos séculos. Vem sendo cúmplice, pecando por omissão – salvo raros episódios – e até assimilando esse tipo de filosofia. Afinal, o famoso “jeitinho brasileiro” nada mais é do que a expressão da corrupção travestida de mania nacional.

                               O brasileiro prefere ocupar seu tempo com coisas fúteis, que não têm qualquer importância no seu dia a dia, em detrimento dos assuntos que regem sua vida. Prefere assistir programas de TV dedicados a futilidades, sobre fofocas do meio artístico, por exemplo, do que com os que podem lhe esclarecer os motivos pelos quais o País se encontra nesse atoleiro há cinco séculos. Aceita ser mergulhado nesse mar de letargia e inércia. Enquanto segue sendo iludido, cada vez mais é puxado para o fundo desse poço. Enquanto nós brasileiros não acordamos para essa situação continuaremos desempenhando um papel crucial em toda essa pantomima: o de palhaço.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 278 - 08/08/2.005

O cogumelo da vergonha

                        Há 60 anos o mundo era sacudido pela explosão da primeira bomba atômica, na cidade japonesa de Hiroshima. O fato marcou a história mundial, sendo um dos mais tristes episódios do século passado. A segunda guerra mundial estava em seu final, a Alemanha já havia se rendido, Adolf Hitler havia se suicidado, mas mesmo assim os Estados Unidos optou por lançar a mais devastadora de todas as armas bélicas. Nagasaki foi outra cidade japonesa também devastada por uma bomba atômica. Naquele instante a humanidade tomou conhecimento de que o instinto destruidor do homem não tem limite.

                        Na primeira explosão de uma bomba atômica instantaneamente mais de quarenta mil pessoas morreram, em sua maioria mulheres e crianças. Como estava em guerra compondo o eixo, a maioria dos japoneses estava no front de batalha. Muitas provavelmente devem ter se desintegrado, devido à alta temperatura provocada pela explosão. Segundo os próprios construtores da bomba, a temperatura no momento da explosão chegou a incríveis e inimagináveis seis mil graus centígrados. Algo próximo ao que se verificaria na superfície solar. Muitos dos que conseguiram sobreviver ao primeiro impacto da bomba sequer sabiam do que haviam sido vítimas.

                        Para o país que estava se transformando na maior máquina de guerra do mundo significou uma demonstração de seu poderio bélico. As conseqüências posteriores foram absurdas. Os níveis de radiação na região permaneceram elevados por muito tempo, gerações de japoneses foram expostas às mais variadas enfermidades. Durante muito tempo nada se plantou ou colheu e a região devastada ficou fechada não apenas para as pessoas, mas para a história. Mesmo tendo sido reconstruída no mesmo lugar e quase nada tendo sido preservado, a detonação da primeira bomba atômica tem um simbolismo inexorável para todos os povos.

                        O homem tem mostrado, ao longo dos últimos anos, um talento incontestável para a destruição. Não envida, entretanto, os mesmos esforços para a erradicação das doenças, da fome, da miséria. A ganância, a ambição desenfreada supera em muito a solidariedade, o senso de justiça e zelo pela vida. Encoberto pelo nome de um ser divino ou de uma liberdade válida apenas para quem domina, se mata, destrói, aniquila, dizima. A história registra essa caminhada perigosa da humanidade, rumo a um destino que se configura como aterrador. O cogumelo radioativo de Hiroshima foi o sinal de que o homem perdeu seu sentido de existência. O espécime mais nocivo e o pior predador do Planeta.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 279 - 15/08/2.005

Continuar no sonho ou acordar para o pesadelo?

                        Durante 25 anos o Partido dos Trabalhadores construiu seu patrimônio político apresentando-se como a maior expressão do pensamento esquerdista brasileiro. Mesmo quando há alguns anos o PT deu uma guinada em seus princípios, abandonando os ideais originários de sua fundação, o socialismo, para aderir à social-democracia, ainda assim continuou mantendo sua posição de maior partido de esquerda do Brasil. Já não era mais, situava-se na definição de centro-esquerda, mas continuou repetindo um discurso que não se alinhava bem com suas propostas. Dessa forma conseguiu, depois de um longo caminho, chegar ao posto máximo da República: a presidência.

                        Ao longo desse tempo, o PT foi perdendo boa parte dos integrantes e simpatizantes que efetivamente mantiveram o pensamento e o ideal esquerdista. Alguns se reagruparam em outros partidos, outros decidiram, desencantados, não mais participarem da vida política. Com a chegada à presidência e a aplicação prática dos ditames sociais democratas os partidos que ainda orbitavam em volta da sigla petista, iludidos ou não de que o PT ainda poderia voltar às suas origens, afastaram-se, sendo substituídos por todas as siglas de aluguel fisiologistas que sempre serviram a quem está de plantão no Poder, carcomidos pelos vermes da corrupção, pelo envelhecimento de seus ideais e práticas distorcidos.

                        Não se pode negar que o PT foi, durante muitos anos, o sonho de várias gerações de brasileiros que desejavam um País que expressasse na justiça social o tamanho de sua grandeza geofísica e de suas riquenas naturais. O partido foi fundamental para que fossem escritas importantes páginas da história nacional, como o fim do regime militar e a luta pela redemocratização do País, que, adversamente do que apregoam a maioria dos compêndios de história, não ocorreu em 1985, com o fim dos governos militares. A opressão trocou o fio da navalha das baionetas pelo papel-moeda. Estende-se até hoje e apresenta um fôlego e poderio de fazer inveja. Nesse caminho, entretanto, uma parte dos petistas preferiu optar por um outro sonho.

                        Dos discursos emocionados cobrando ética e compromisso na política, o PT passou a objeto dessa cobrança. Essa nova faceta do partido surpreendeu muito de seus componentes, muito embora não tenha sido fato novo para quem acompanhava essa tendência neoliberal adotada nos últimos tempos. Por causa de um grupo que resolveu colocar seu projeto pessoal acima dos anseios coletivos, o PT jogou no lixo toda sua história. Pior: levou consigo para essa latrina pessoas que não compactuam com esse tipo de atitude. Difícil ver gerações de brasileiros externando seu desapontamento. Os reflexos disso podem ser incalculáveis inclusive nas futuras gerações.

                        A cena do deputado Chico Alencar (PT-RJ) chorando no plenário, após o depoimento do marqueteiro Duda Mendonça, onde reforçou a acusação de irregularidades contra a ex-direção nacional do partido, foi emblemático. Chico integra o grupo de parlamentares que ainda mantém seu ideal, mesmo integrando uma sigla completamente desfigurada. Suas lágrimas representam a desilusão de milhões de brasileiros. As palavras do senador Aloízio Mercadante também são traduções da decepção: “eu não reconheço este PT”. Os milhões de brasileiros que sonharam e ainda sonham com um País diferente, limpo dos que visualizam o Poder Público apenas como um meio de locupletaçã, não podem quedar-se diante de um grupo de bandidos. Existem outros caminhos, alguns já sendo trilhados. Esse episódio veio mostrar que não importa partido, ideologia para quem tem mau caráter. O sonho não acabou.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 280 - 22/08/2.005

A fantástica fábrica de diplomas

                        Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), nos últimos quatro anos houve um acréscimo de 70% no número de cursos de jornalismo no País. A velocidade com que foram criados cursos de jornalismo nos últimos tempos foi inversamente proporcional à busca pela qualidade desse ensino e também pela capacidade de absorção pelo mercado de trabalho dessa massa de novos “jornalistas” precariamente formada. Os reflexos dessa situação já podem ser notados nas empresas de comunicação, seja pelo achatamento salarial provocado pela inundação da oferta de mão de obra, seja pela queda ainda mais acentuada da qualidade do jornalismo praticado.

                        Na Itália, país que possui uma população equivalente a um terço da brasileira, existem 13 cursos de jornalismo. Infelizmente a demagogia do governo FHC – mantida pelo atual governo Lula – de escancarar as portas para quem quisesse abrir um curso de nível superior para suprir uma obrigação do Estado, foi uma das causas dessa explosão de novos cursos. Aliada a isso está a estratégia das empresas de comunicação de obtenção de mão de obra barata, não importando a qualidade. Isso provocou um brutal achatamento salarial e cada vez mais a diminuição na qualidade do jornalismo feito.

                        Educação de nível superior transformou-se num grande e rentável comércio. Hoje é até mais fácil abrir uma faculdade, uma universidade do que mesmo um estabelecimento comercial comum. O País assiste à ação de uma verdadeira indústria de diplomas universitários atuando em todo o território. Uma legião de incautos – ou não – acabam por despender um bom dinheiro em busca de uma realização pessoal. Acabam se transformando em profissionais mal preparados, deficientes e que somente servirão para pressionar o mercado de trabalho. A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) tenta há algum tempo que o Ministério de Educação crie mecanismos de controle da criação e da fiscalização da qualidade do ensino de jornalismo, mas deveria ter percebido que está enfrentando uma poderosa máfia e deveria buscar uma ação mais concreta e efetiva.

                        Dos atuais 443 cursos de jornalismo espalhados pelo Brasil, apenas 74 são ofertados pela rede de ensino público, sendo 369 das instituições particulares de ensino. Isso demonstra como esses cursos surgiram da avidez de lucro de seus mantenedores, que não apresentam nenhuma preocupação com a qualidade do ensino. Infelizmente o governo Lula resolveu também não honrar seu passado também quanto à política educacional. Poderia ter disciplinado essa mercantilização desenfreada do ensino superior, mas optou por seguir a mesma cartilha neoliberal do governo tucano. Esses dados significam, também, a crescente elitização do ensino superior, pois atendeu a uma demanda que pode pagar por um ensino particular, enquanto o governo preferiu esse caminho a fortalecer o ensino público e garantir o acesso a quem não tem condições de arcar com esse custo. Preferiu incentivar a criação de uma fantástica fábrica de diplomas. E o pior: sem Oompa Loompas.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 281 - 29/08/2.005

Teoria da conspiração

                        Além dos partidos que fazem oposição ao seu governo no Congresso Nacional, o presidente Luís Inácio Lula da Silva tem atribuído responsabilidade da crise política que sua administração foi mergulhada, nos últimos meses, à Imprensa. Com efeito, os proprietários das empresas de comunicação nunca foram simpáticos ao presidente Lula, desde os tempos em que ele ainda era apenas um líder sindical. Também existem profissionais de imprensa que, para agradar seus empregadores ou por decisão de foro particular, não dispensam ao governo federal nenhum tipo de visão positiva, exceto aquela que lhe satisfaz o interesse particular.

                        Pessoas como Alexandre Garcia – funcionário fantasma do Banco do Brasil, no ingressou pela janela aberta nos tempos do regime militar e do qual aposentou-se – e Arnaldo Jabor – quem nem jornalista é, tendo passado todos os anos de exceção realizando filmes com o dinheiro do contribuinte, via Embrafilme – destilam pelos telejornais da Rede Globo todo seu ódio ao presidente, o que não se verificava, por exemplo, durante os oito anos da administração desastrada e danosa ao País de Fernando Henrique Cardoso. Incrível ver como pipocam arautos da moralidade e da ética pelos quatro cantos do Brasil, seja no âmbito da política quanto do jornalismo. A quase totalidade desses que se apresentam como bastiões da correção num passado recentíssimo eram focos de denúncias de locupletação.

                        Evidentemente que os indícios de corrupção envolvendo membros e ex-integrantes do governo federal são robustos. Pessoas como José Dirceu, Luiz Gushiken e Antônio Palocci têm seus nomes diretamente ligados aos fatos denunciados, além de outros parlamentares do PT, PTB, PL e PP. Puxando o fio da meada do imbróglio de irregularidades na administração pública, chegar-se-á a governos anteriores, principalmente ao entreguista governo tucano, onde a maior parte do patrimônio público foi dilapidado sem que ninguém tenha ido para a prisão por isso. Na lama onde alguns petistas hoje pisam, PMDB, PSDB e PFL já afundaram até o pescoço. Caso seja comprado que o presidente tenha participado do desvio de alguns de seus subalternos, que pague por seus atos e deixemos que a história – e os eleitores – apliquem a pena política.

                        A imprensa não fabricou os fatos, mas alguns setores da mídia têm emitido opiniões e juízos de valor que apenas contemplam interesses pessoais ou das empresas que representam. Necessário se faz ter responsabilidade em utilizar um meio de comunicação de massa para esse tipo de atitude. Não se pode – nem se deve – cercear o direito de ninguém expressar sua opinião, direito constitucionalmente garantido, mas obrigatoriamente a sociedade deve cobrar compromisso público de quem tem o privilégio de utilizar a mídia, seja para que fim for. A imprensa tem que continuar fazendo seu trabalho, mas não pode continuar a se deixar utilizar como instrumento de manobra e manipulação.

 

SETEMBRO

ATUALIZAÇÃO N.º 282 - 05/09/2.005

Desrespeito à Constituição

                        Com a chegada de setembro também chegam as esperanças de que a Justiça restitua o direito dos jornalistas e, principalmente, cumpra o que determina nossa lei maior, a Constituição brasileira. Nesse mês retorna de férias o juiz Manoel Álvares, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que tem a incumbência de julgar o recurso interposto pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, contra intempestiva e irresponsável decisão proferida em primeira instância pela juíza Carla Rister, da 16ª Vara Cível da Justiça Federal de São Paulo, segundo a qual, ao arrepio de nossa Constituição, suspendeu a obrigatoriedade da exigência do diploma de graduação universitária em jornalismo para a obtenção do registro profissional. Um despacho que feriu de morte o direito constitucional e somente contemplou interesses das empresas de comunicação e dos muitos falsos profissionais que exercem ilegalmente o jornalismo por todo o País.

                        A ação foi um desserviço prestado pelo Ministério Público Federal, que aceitou litigar em favor das empresas de comunicação e da legião dos que exercem o jornalismo à margem da lei. Alegando um infundado direito difuso e igualmente sem observar o que predispõe a Constituição Federal, o MPF moveu essa esdrúxula ação judicial. Em ação reparadora e lúcida, a desembargadora federal Alda Basto, do TRF-3ª Região havia suspendido a decisão de primeira instância, mas o mesmo juiz Manoel Álvares confirmou a decisão de primeira instância. O lobby das empresas de comunicação, que desejam o escancaramento total e com respaldo – ainda que equivocado – da Justiça é muito forte. Difícil lutar contra o interesse do grande capital. Mais fácil penalizar o lado mais fraco da pendenga: os trabalhadores.

                        Outro fato lamentável foi a União, ré na ação, ter igualmente interposto recurso da suspensão da liminar, através da AGU. Infelizmente o Executivo quedou-se à pressão das empresas de comunicação de massa. O inciso XIII do Artigo 5º da Constituição é bastante claro: “ é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”. O Decreto-Lei 972, de 17/10/69 estabeleceu as qualificações necessárias para o exercício da profissão de jornalista: o inciso V do Artigo 4º determina: “O exercício da profissão de jornalista requer prévio registro no órgão regional competente do Ministério do Trabalho e Previdência Social que se fará mediante a apresentação de: (...) diploma de curso superior de jornalismo, oficial ou reconhecido, registrado no Ministério da Educação e Cultura ou em instituição por este credenciada (...)”.

                        Não existe direito difuso frustrado, tampouco, como argumentou o MPF, “cerceamento do constitucional direito de livre expressão”. Com efeito, a Constituição conceitua no inciso IV do Artigo 5º: “é livre a manifestação do pensamento (...)”. Ora, não se trata de impedir nenhum tipo de manifestação de pensamento, mas do exercício de uma profissão, que tem regulamentação em lei federal e normas determinadas. Muitos procuradores da República por todo o País discordam do posicionamento de seus colegas paulistas, mas optam por não se manifestarem em sua opinião pelo fato da ação representar o corpo do MPF. A Procuradoria da República em São Paulo agiu unicamente na defesa dos interesses do patronato e dos que militam ilegalmente no jornalismo. A esperança é que o juiz Manoel Álvares recobre o bom senso e faça cumprir a Constituição, simplesmente fazendo cumprir o que já é lei desde 1969. Caso continue a se posicionar contra nossa Carta Magna, caberá aos ministros do Supremo Tribunal Federal restabelecer o respeito e o cumprimento à nossa Lei Maior.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 283 - 12/09/2.005

A república da incoerência

                        Além da corrupção, que tem se revelado o verdadeiro esporte nacional, em decorrência dessa situação o Brasil também tem se marcado por ser o país da incoerência. Não mais que de repente o País foi tomado por uma onda ainda maior de incoerência, que assola não apenas o mundo político mas toda a população brasileira. Desde o mais simples cidadão até o presidente da República têm incorrido em afirmações absolutamente incoerentes.

                        O presidente Lula hoje profere declarações de apoio à pessoas que, num passado muito recente, eram alvos de suas críticas. Dessa forma disse que daria um cheque em branco para o deputado Roberto Jéferson (PTB), que teve um de seus protegidos flagrados embolsando propina e dizendo que participava de um esquema de arrecadação de dinheiro para o partido do parlamentar. Uma linha de frente do governo petista hoje profere palavras, toma decisões, age de maneira absolutamente diversa do que pregava até bem pouco.

                        Parlamentares que integram partidos que sempre tiveram sua história confundida com a chaga da corrupção hoje se apresentam como bastiões da moral e da ética na política, como PFL e PSDB. Surgem nas entrevistas exaustivamente veiculadas como defensores de punição para colegas transgressores, cobrando correção e probidade, qualidades que não demonstraram quando estavam ocupando o poder. A frase característica dessa babélia política foi proferida pelo deputado federal ACM Neto (PFL-BA), em entrevista no programa do Jô, da Rede Globo, instado a falar sobre parlamentares que renunciam ao mandado para poderem escapar da cassação de seus direitos políticos e poderem novamente concorrer nas eleições seguintes: “quem renuncia para escapar de cassação é culpado pelo resto da vida”.

Esqueceu-se de que seu avô e mentor político, o senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA), de quem herdou também o nome, utilizou esse artifício há algum tempo. Deve ter tomado uns bons puxões de orelhas do “coronel” baiano por sua incoerência e por ter exposto assim seu mentor. ACM Neto vez por outra se refere à administração do ex-presidente cassado Fernando Collor de Melo como “uma das mais corruptas” da história. Também esqueceu-se que tanto seu avô quanto o filho dele, o falecido deputado federal Luís Eduardo Magalhães, o Toninho Malvadeza, também do PFL, votaram contra o pedido de impeachment do então presidente Collor.

                        A última ação da incoerência que vem caracterizando a vida nacional refere-se ao movimento para retirar do cargo de presidente da Câmara dos Deputados o desastrado Severino Cavalcanti (PP-PE), após declarações públicas de defesa de punição branda aos deputados que receberam mensalão ou que foram contemplados com dinheiro do valerioduto. Por isso o movimento “Fora Severino” tomou corpo nos últimos dias, também fortalecido pelas acusações de corrupção contra o presidente, fato que não surpreende quem conhece o tipo de prática política que ele executa em mais de quarenta anos de vida pública. O deputado pernambucano representa o que de mais tacanho há na política brasileira, personificação do retrocesso. Mas foi eleito com o voto das mesmas pessoas que hoje querem tirá-lo do cargo. Afinal, ele não chegou ao posto sozinho, mas com a ajuda dos incoerentes deputados críticos de suas ações.

                        O povo brasileiro, entretanto, vem mantendo sua coerência de manter-se inerte, omisso diante da bandalheira patrocinada pelos políticos que elegeu. O Congresso Nacional é um extrato da sociedade e se tem essa configuração é porquê espelha se não a maioria, pelo menos uma boa e significativa parcela da população. Dessa combinação extremamente nociva se verifica os pilares desse cenário político dantesco. O Brasil é, definitivamente, a república da incoerência.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 284 - 19/09/2.005

Insensibilidade e falta de compromisso público

                        O ministro da educação do governo Lula, Fernando Haddad, recusou-se a por em prática uma suspensão nas autorizações para a abertura de novos cursos de jornalismo, proposta pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj). No Brasil inteiro a cada dia pululam novos cursos de jornalismo, sem qualquer preocupação com a capacidade de absorção dessa mão de obra e, mais preocupante, com a qualidade do ensino. Já são mais de trezentos cursos de jornalismo no País enquanto países como a Itália, que possui um terço do número da população brasileira, tem apenas treze. Essa corrida mercantilista no rado do ensino superior foi bastante incentivada durante o governo tucano de FHC, mas a administração Lula nada fez para deter essa volúpia desenfreada.

                        A clara intenção de apenas oferecer mão de obra barata e precariamente formada às empresas de comunicação sedimenta-se na forma como os cursos conduzem sua didática, a maioria deles formadores de técnicos em jornalismo, não de comunicadores sociais. Cada vez mais se suprime o estudo da ciência da comunicação para reforçar o das técnicas de jornalismo. A cada semestre são despejadas dezenas de técnicos, não de comunicólogos. O fato é facilmente comprovado através do nível dos recém formados ou estagiários que deságuam nas redações a cada dia, quase sempre sem qualquer conhecimento profundo da comunicação social, apenas meros fazedores de texto. Também tem sido preterida a discussão sobre deontologia, o que provocará gerações de jornalistas ainda mais descompromissados com a ética.

                        O cancro da criação de cursos caça-níqueis não atinge apenas o jornalismo. Também são vítimas dessa ação predatória o Direito, a Engenharia, a Medicina e uma série de atividades profissionais que cada vez mais são aviltadas pela busca do lucro pelo lucro, alimentada por um exército de pessoas sequiosas apenas em obter um diploma de graduação superior, não na preparação adequada para enveredar numa carreira profissional. Adversamente do que apregoa os que defendem essa prática, de que o mercado de trabalho funcionará como processo seletivo para que vinguem os que melhores, a lógica do menos custo sem preocupação com a qualidade faz cair por terra essa argumentação.

                        Nesse jogo de interesses o incauto candidato ao diploma transforma-se em vítima de um estelionato, pois paga, e caro, por um serviço deficitário. A maioria está preocupada apenas em terminar logo o curso, obter o diploma, requerer o registro profissional e tentar uma vaga no mercado de trabalho. Muitos aceitarão se submeter trabalhar com remuneração abaixo do piso salarial da categoria ou atuará como um soldado que apenas cumpre ordens e não reflete sobre os comandos que recebe, atuando com subserviência desmesurada e de uma forma irracional. Não é esse tipo de profissional que interessa à sociedade, tampouco são os que contribuirão para o engrandecimento do jornalismo. Desempenham o mero papel de mantenedor de um sistema cruel, desumano e irregular.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 285 - 26/09/2.005

Chega de exploração

                        Os jornalistas cearenses estão, mais uma vez, em campanha salarial, buscando pelo menos a reposição das perdas salariais provocadas pela inflação que corrói os ganhos dos trabalhadores. Como sempre os empresários de comunicação se mostram insensíveis à situação de penúria em que os jornalistas que ainda conseguem manterem-se empregados passam, com salário aviltante e piso abaixo do que recebem muitas outras categorias profissionais que, apesar da importância social equivalente, não necessitam do investimento educacional e cultural que o profissional de comunicação precisa não apenas para se formar, mas para manter-se atualizado e, dessa forma, desempenhar da melhor forma sua função.

                        A intransigência do patronato é histórica, quando se refere a negociações salariais. Todos os anos o Sindicato patronal radicaliza e aproveita essa ocasião de negociação para tentar retirar conquistas de direitos que os jornalistas conseguiram após anos de reinvidicação. Houve época, inclusive, que não houve reajuste nos salários em troca de não demissão de profissionais por um determinado tempo, chancelado por administrações passadas do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado do Ceará (Sindjorce). No sistema capitalista a função dos patrões é exatamente aumentar a mais valia, ou seja, a diferença entre o valor real da jornada de trabalho e a remuneração de fato paga ao trabalhador.

                        Para reforçar essa situação as empresas de comunicação são extremamente favoráveis à criação indiscriminada de cursos de jornalismo, sem qualquer preocupação com saturação mercadológica ou da qualidade de ensino. Um dos postulados básicos do capitalismo é a manutenção de um exército reserva de trabalhadores, para que se possa exercer uma pressão sobre os trabalhadores que estão empregados à não buscarem melhorias salariais. Boa parte das empresas de comunicação já tem significativa parcela de suas redações formadas por estudantes de jornalismo, que se submetem às mais adversas condições, muitas vezes em troca apenas de vale-transporte, realizando um trabalho sem qualquer fiscalização pela qualidade e, ilegalmente, desempenhando função privativa de jornalista profissional. Com a omissão da Delegacia Regional do Trabalho e um pouco de tolerância do Sindjorce.

                        Agora o Sindicato acena com a possibilidade de desistir, por exemplo, de investigação de denúncias de assédio moral além de outras prerrogativas para tentar uma composição com o patronato. A Entidade não pode abdicar de um direito individual dos jornalistas, a não ser que queira fazer com que seus filiados não exerçam seu direito ou, então, se negue a amparar seus integrantes. Por outro lado, os jornalistas não podem se deixar pressionar para que assinem acordos ilegais, aceitar serem tratados como elementos dispensáveis. Infelizmente existem profissionais que, na paúra de perderem seus empregos, acabam aceitando as piores condições de trabalho e, caso pior, assimilando a ideologia de quem oprime. Somente com a união os jornalistas poderão fazer valer seus direitos e reinvidicarem a importância que realmente possuem no processo de comunicação.

 

OUTUBRO

ATUALIZAÇÃO N.º 286 - 03/10/2.005
 

Justiça seja feita
 

                                Finalmente o juiz Manoel Álvares, relator do recurso interposto pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP) no Tribunal Regional Federal da 3ª Região, decidiu incluir o processo na pauta. O recurso foi interposto contra decisão de primeira instância da juíza Carla Rister, substituta da 16º Vara Cível da Justiça Federal de São Paulo, que em 2001, ao arrepio da lei e ferindo dispositivo constitucional, suspendeu a exigência de graduação superior em jornalismo para a obtenção do registro profissional. A atitude da magistrada proporcionou, temporariamente, que os falsos profissionais requeressem o registro em regime precário.


                                Não é de hoje que os jornalistas sofrem vilipêndios em seus direitos, seja por decisões errôneas de magistrados, seja pela ação oportuna de políticos. Afinal, o Congresso Nacional não concedeu o direito aos profissionais de imprensa a criação de um Conselho Federal. Essa ação pequena dos deputados e senadores é frágil e sem fundamentação. Afinal, porquê médicos, advogados, enfermeiros e até corretores de imóveis têm o direito de ter um Conselho Federal fiscalizando e atuando não apenas em defesa de suas categorias profissionais, mas de toda a sociedade e os jornalistas não podem ter o mesmo direito? O quê temem tanto os senhores congressistas? Talvez pelo fato da maioria das empresas de comunicação pertencerem a políticos ou muitos destes contarem com o apoio das empresas de comunicação tenha influenciado seus gestos.


                                A decisão da juíza Carla Rister feriu frontalmente o inciso XIII do Artigo 5º da Constituição, que preceitua: “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”. A lei estabeleceu, desde 17 de outubro de 1969, quando foi publicado o Decreto-Lei 972 que regulamentou a profissão de jornalista. Uma das qualificações profissionais que a lei estabelece para a obtenção do registro de jornalista profissional e, conseqüentemente, o exercício legal da profissão, estabelecido no inciso 5º do Artigo 4º do Decreto-Lei é o diploma de diploma de curso superior de jornalismo, oficial ou reconhecido, registrado no Ministério da Educação e Cultura ou em instituição por este credenciada. Impossível imaginar que a magistrada não conheça o que predispõe nossa Carta Magna. Impossível, também, não conjeturar que sua decisão conflitante com a lei tenha acontecido por questões alheias à Ciência Jurídica.
 

                                O TRF da 3ª Região terá a oportunidade de reparar o erro cometido em primeira instância e fazer cumprir o que determina nossa Constituição. Não deve curvar-se aos interesses das empresas de comunicação ou de grupos políticos. Num País onde Executivo, Legislativo e até o Judiciário perderam a confiança e o respeito da população, cabe aos que integram esse último Poder, com funções vitalícias e que detêm a prerrogativa de determinação do cumprimento das leis, a responsabilidade de novamente restituir à população a certeza de que as Instituições públicas não estão à serviço de uma minoria que somente deseja a manutenção de seus privilégios e o atendimento aos seus interesses particulares, impondo à maioria da população sua vontade.
 

ATUALIZAÇÃO N.º 287 - 10/10/2.005

É proibido proibir

                               No próximo dia 23 de outubro os brasileiros irão às urnas para um referendo que determinará se a comercialização de armas e munição será proibida. Uma importante decisão que não está sendo discutida da maneira correta, principalmente pelos meios de comunicação de massa, que optaram pelo maniqueísmo do bem – atribuído aos que defendem a proibição – contra o mal – impingido aos que são contra –. A discussão é muito mais complexa do que a simplória e dicotômica luta entre o bem e o mal. As distorções vão além do que se realmente está sendo posto em debate.

                               Os opositores do atual governo federal aproveitam para reforçar suas críticas e ataques, citando situações e índices de violência que são herança das administrações sob responsabilidade exatamente desses que tentam transferir a culpa para quem não a possui de maneira exclusiva. A propaganda veiculada no horário gratuito acompanha a linha de distorção dos fatos. A realidade atual de insegurança que os brasileiros enfrentam é fruto do descaso e da irresponsabilidade dos três poderes constituídos da República: o Executivo – incluindo o estadual – porquê não dota a máquina pública de condições suficientes para o combate e a repressão à violência; o Legislativo que não cria leis mais severas e com punições mais pesadas aos que infringem a lei e o Judiciário, que não aplica com rigor as leis já existentes.

                               Dessa combinação nasce uma das principais molas mestras da violência. Com o aparelho policial sucateado, mal preparado, mal remunerado, que tipo de segurança pode ser oferecida ao cidadão? Com leis que prevêem penas brandas, concede exceções surreais e inúmeras brechas, o que pode esperar a população do combate à violência? Com penas e sentenças distantes da realidade do povo, com uma estrutura tacanha, distanciada, hermética, com um corporativismo danoso, que tipo de Justiça nós brasileiros temos? Descrentes no Poder Público, refém de uma situação desesperadora, oprimido e imprensado entre os interesses de uma elite econômica que utiliza o Estado brasileiro para a contemplação de suas conveniências pessoais, o que a população pode esperar de seu futuro?

                               Está em jogo a extinção ou não de um direito, o do cidadão possuir uma arma, municiada, de maneira legal. Há uma distância abissal entre a defesa desse direito e a do cidadão portar essa mesma arma, o que já é proibido por força de lei. O Brasil possui forças armadas para defender seu território em caso de alguma ameaça, invasão de outras nações, não para invadir ou pilhar outras nações. O País tem o direito de defender seu território, sua propriedade. O cidadão também precisa ter assegurado esse mesmo direito. Para retirá-lo o Estado precisa dar-lhe a garantia de que suprirá sua necessidade de garantir seu patrimônio, sua propriedade. Não será suprimindo esse direito que o Estado irá proporcionar segurança.

                               Atualmente para qualquer cidadão comprar uma arma existe um cabedal de exigências que se encarrega de dificultar ao máximo a aquisição. Caso ainda assim uma arma chegue à mão de uma pessoa despreparada para usá-la, pela via legal, a culpa é de quem o dever de fiscalizar. O problema não é a arma, mas quem a possui. Como a justificativa para o referendo é o quadro de violência que se verifica no Brasil, que provoca centenas de mortes diárias, em índices muito superiores aos registrados, por exemplo, em países em guerra, assolados por terrorismo ou outro fator de desgraça, por qual motivo não se realiza um referendo para que o povo decida sobre a proibição ou não da venda de cigarros? Afinal, são inúmeras as mortes causadas em proporções iguais ou até superiores pelo consumo do cigarro e um alto custo para a saúde pública o tratamento dos dependentes.

                               A mídia tem tratado de forma parcial o referendo. É fato que o posicionamento da maioria das empresas de comunicação é pelo sim à proibição e dessa forma vem fazendo uma campanha subliminar em favor disso, seja pela “convocação” de profissionais de seus quadros para assumir posição pública. Qual artista de TV favorável à não proibição tem a coragem de declarar-se publicamente defensor dessa tese? Será tachado de “defensor da violência” ou partidário da “bancada da bala”. Para que se tenha uma idéia de como o comércio legal de armas não tem significância na escalada da violência, ano passado pouco mais de trezentas armas foram comercializadas em todo o País. Trata-se de um número modesto se comparado, por exemplo, aos milhões de maços de cigarros vendidos, aos milhares de brasileiros que perderam a vida pelo fumo e dos milhões de fumantes ativos e passivos que sobrecarregam o sistema público de saúde.

                               A diminuição da maioridade penal também deveria ser objeto de referendo, no entanto isso nem se cogita, não obstante o crescente número de menores infratores que fermentam os índices de violência. Num referendo onde votar sim quer dizer não e vice-versa. Proibindo a comercialização de armas e munição o povo brasileiro agirá da mesma forma que um homem ou mulher que contrai núpcias com um parceiro infiel, sendo constantemente flagrado em seu ato num sofá, tomando a decisão de queimar o sofá na esperança que, dessa forma, seu cônjuge deixe de trair. Estão querendo queimar o sofá.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 288 - 17/10/2.005

O sacrifício pelas idéias

                               No próximo dia 25 transcorre o 30º ano do assassinato do jornalista Wladimir Herzog, nas dependências do DOI-CODI, um departamento do Exército que visava a repressão aos opositores da ditadura militar, numa ação da OBAN (Operação Bandeirantes), do 2º Exército destinado à repressão dos opositores da ditadura militar. Intimado a comparecer no dia 25 de outubro de 1975, Wladimir acabou preso, acusado de possuir ligação com o Partido Comunista Brasileiro (PCB). No mesmo dia o jornalista morreu, vítima das torturas sofridas. O assassinato do jornalista foi um fato marcante não apenas na história do jornalismo, mas na própria história brasileira.

                               O governo ditatorial militar da época apresentou a versão de suicídio, que teria sido praticado com o cinto do macacão de presidiário que estaria vestindo. Uma foto do jornalista morto correu o mundo e reforçou a contestação da tese de suicídio. A circunscrição da inteligência dos que montaram aquele cenário para forjar uma situação mentirosa propiciou vários indícios da farsa. A ditadura queria que todos acreditassem que Wladimir curvou as pernas para poder suicidar-se. Mas qual teria sido o motivo? O jornalista não tinha nenhum para cometer tal ato. Leandro Konder e Jorge Benigno Jathay Duque Estradas, colegas de profissão que estavam presos na mesma época e colocados ao lado da sala onde Wladimir foi levado para “interrogatório”, testemunharam terem escutado com nitidez que o jornalista estava sendo torturado.

                               O assassinato de Wladimir Herzog – morto aos 38 anos, nascido em Osijsk, na Iuguslávia, jornalista, professor da USP, teatrólogo e então diretor de jornalismo da TV Cultura – foi uma das maiores e emblemáticas expressões da opressão praticada de março 1964, quando um golpe de Estado instalou a ditadura até março de 1985, quando os militares deixaram a cena política e entregaram a ditadura das baionetas para a de terno e gravata. Na época, a reação da sociedade provocou a demissão do comandante do 2º Exército, general Ednardo D'Ávilla. Houve ainda o assassinato do estudante Edson Luís, no restaurante Calabouço, no final da década de 60; o assassinato – também nas dependências do DOI-CODI – do operário Manoel Fiel Filho; o assassinato do capitão Carlos Lamarca; a explosão da bomba num carro no estacionamento do Shopping Rio-Centro, onde se realizava um show musical em homenagem ao dia do trabalho, no final da década de 70. Na ocasião um militar do Exército morreu, outro ficou ferido.

                               Wladimir Herzog é o exemplo de resistência à prepotência, à imposição das idéias pela força. Pagou com a vida por defender suas idéias, por não concordar com a censura, com o poder das armas se sobrepondo à liberdade. Qual profissional de imprensa hoje teria a coragem de defender, até as últimas conseqüências, sua opinião? Quantos realmente possuem opinião própria? Infelizmente a semente deixada por Wladimir não germinou na quantidade necessária, mas felizmente manteve-se em qualidade. O que se vê hoje é a maioria dos profissionais de imprensa pensando em concordância com os que podem lhe garantir vantagens pessoais e uma remuneração, muitas vezes, sem lhe ser satisfatória. Muitos reproduziriam a farsa do suicídio e acabariam por enforcarem-se em sua condição de parvos.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 289 - 24/10/2.005

Quem ganhou o referendo?

                        Os brasileiros optaram pela manutenção da venda de armas e munição, num referendo onde se confrontaram várias correntes de pensamento, muito embora houvesse apenas duas opções de voto. O escrutínio desse dia 23 de outubro representou muito mais do que somente a confirmação ao cidadão do direito de defesa de seu patrimônio. Ambos lados que disputaram o voto dos mais de 120 milhões de eleitores cometeram erros e agora possuem responsabilidades bem mais complexas. O recado das urnas foi muito além do que a resposta ao questionamento do “sim” e do “não”.

                        Os que sufragaram “não” – a esmagadora maioria – disseram que desejam ter o direito de poderem se defender e ao seu patrimônio, mas querem do Poder Público ações para a contenção da violência que assola o País. O estatuto do desarmamento já previa restrições severas à aquisição de armas. A vitória do “não” não significa a concessão de um porte para que as pessoas andem armadas pelas ruas. Representa o reconhecimento pela população da incompetência do Estado em cumprir uma de suas funções institucionais: de segurança pública. Cabe agora cobrar de quem tem o dever legal de prover essa necessidade do cidadão que cumpra sua obrigação. Não é possível mais aceitar esse descaso e omissão para com o povo.

                        O Executivo tem que implementar políticas públicas de segurança, o Legislativo precisa elaborar leis mais enérgicas para a punição dos criminosos e, principalmente, o Judiciário precisa ser mais célere e afeitos aos anseios populares. A magistratura brasileira precisa, o quanto antes, dar respostas aos cidadãos de bem e banir de vez a realidade de que a o braço da lei apenas alcança pobres, que superlotam as cadeias, enquanto os bandidos que gatunam o povo, através da corrupção, mantenham-se incólumes. Enquanto a Justiça não for igual para todo cidadão, independentemente de sua condição financeiro-social, o Brasil continuará sendo um país à beira de um colapso institucional.

                        Durante a campanha do referendo os partidários do “não” centraram suas argumentações apenas na defesa do direito do cidadão que deseje adquirir uma arma. Omitiram a discussão sobre a garantia de outros direitos fundamentais, como o direito à vida, à segurança. Os defensores do “sim” preferiram optar pela falsa propaganda de que o voto “não” iria fazer com que se mantivesse o índice de violência. Os dois lados não foram de todo sinceros e transparentes em seus argumentos. Principalmente, não explicaram quem financiou a produção e execução da propaganda que foi veiculada no horário eleitoral. Quem ganhou o referendo? O cidadão, que pôde, numa rara – e talvez sem precedente – oportunidade ver sua vontade ser posta em prática. Muitos outros referendos precisam ser realizados. Há muito o que corrigir nesse País.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 290 - 31/10/2.005

A luta continua, továritchs

                        Há seis anos era publicado pela primeira vez o sítio Em Off. No dia 25 de outubro de 1999 começava a caminhada de um sítio que nasceu com a intenção de ser um espaço para discussão sobre jornalismo, defesa dos direitos da categoria e a veiculação de notícias que não são disponibilizadas em nenhum outro veículo de comunicação. Nesse tempo o Em Off vem cumprindo seu papel, ou pelo menos tentando, driblando percalços e opiniões contrárias que, democrática e salutarmente são sempre benvindas.

                        Nessa caminhada, alguns episódios que foram primeiramente aqui enfocados se tornaram marcantes, como o acompanhamento da agonia e sofrimento dos trabalhadores do extinto jornal Tribuna do Ceará; a divulgação das gravações telefônicas entre procuradores da República em que tramam contra um colega; a existência das investigações sobre o grupo de extermínio composto por policiais e empresários locais; o clima tenso entre funcionários e o chefe do Gapre do Banco do Nordeste, etc.

                        Hoje o Em Off é muito mais do que um site direcionado apenas aos profissionais de imprensa, mas um instrumento onde diversos setores da sociedade expressam sua opinião não apenas sobre a mídia, mas todos os assuntos de importância coletiva. O sítio acolhe todas as correntes de pensamento e garante, democraticamente, o debate entre as idéias. Continuaremos sempre defendendo os direitos dos jornalistas e combatendo os falsos profissionais, picaretas que teimam em desrespeitar a lei e atuam à margem da legislação.

                        Melhor presente não poderia nos ter sido dado do que o restabelecimento da lei e a reforma da decisão da juíza Carla Rister, que – ao arrepio da lei – decidiu pela abolição da obrigatoriedade da graduação universitária em jornalismo para a obtenção do registro profissional. Desde a decisão judicial, em 2001, o Em Off acompanhou toda a luta da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), associando-se à campanha para que a lei fosse restabelecida. Na semana em que comemorou seis anos de vida, esse presente, sem dúvida, foi o mais esperado e o mais querido. O Em Off não sabe quanto tempo mais possuirá de vida, mas se manterá, até seu último dia, dentro dos mesmos conceitos e princípios que nortearam sua criação.

 

NOVEMBRO

ATUALIZAÇÃO N.º 291 - 07/11/2.005

Além da decisão judicial

                        Os estragos causados pela decisão absurda da juíza Carla Rister, que se iniciaram em 2001, não cessaram quando o pleno do Tribunal Regional Federal da 3ª Região acolheu recurso interposto pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP), restabelecendo a lei e a obrigatoriedade do diploma de graduação universitária em jornalismo para a obtenção do registro profissional. A decisão dos três desembargadores federais apenas deu início a uma nova etapa.

                        Em todo o País estima-se que mais de 14 mil registros precários foram expedidos pelo Ministério do Trabalho, com base na decisão da juíza. Com a decisão do TRF, todos perderam a validade. Todos os que estavam respaldados pela frágil e equivocada decisão de primeira instância passaram, instantaneamente, à ilegalidade. Todos os sindicatos de jornalistas do País estão entrando com pedido de cancelamento desses registros precários. Foram pessoas que embarcaram numa ilusão, fomentada por pessoas inconseqüentes e por empresas de comunicação ávidas por mão de obra ainda mais barata, quase gratuita.

                        Esse exército de pessoas que apostaram numa possibilidade praticamente inexistente da lei continuar sendo desrespeitada e os direitos dos jornalistas vilipendiados, agora acordou para a realidade do exercício ilegal de profissão, contravenção contra a organização do trabalho, prevista pelo Artigo 14 do Decreto-Lei 3688. A Fenaj, os sindicatos e todos os jornalistas não devem esmorecer um segundo e precisam cobrar o cumprimento da lei. É obrigação de todos os jornalistas profissionais zelar pela execução dessa sentença. Junto aos que preferiram optar pelo caminho fácil para ingressar na profissão estão os que são engabelados nos muitos cursos de jornalismo criados a toque de caixa, sem qualquer cuidado com a qualidade do ensino.

                        Aqui no Ceará muitos foram os que requereram o registro precário, alguns nomes bem conhecidos do público, que exercem e continuam exercendo ilegalmente o jornalismo. O Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado do Ceará (Sindjorce) chegou a divulgar o nome dos que haviam requerido, entraram pela janela na profissão e acabaram saindo pela porta dos fundos, mas resolveu há alguns anos deixar de informar os nomes. Entre os que se beneficiaram temporariamente da decisão judicial reformada e que ainda foram listados pela Entidade estão César Espíndola, Nylson Fagata, Kezia Diniz, Cláudio Raposo, Ely Aguiar, Eugênio Stone, Caio Quinderé, Nilton Júnior, Marcos Lima, dentre outros. Para esses e todos os outros que obtiveram o registro precário em todo o País todo o rigor da lei.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 292 - 14/11/2.005

Expressão do autoritarismo

                        O episódio da indicação do defensor Luciano Simões para o cargo de Defensor Público Geral do Estado apenas confirmou a trajetória arrogante e prepotente, que tem marcado a história do governador Lúcio Alcântara. O defensor indicado recebeu apenas 25% dos votos da categoria, enquanto Renan Cajazeiras recebeu a expressiva votação de 75% dos sufrágios de seus colegas de Defensoria Pública. Contrariando a vontade da maioria dos defensores públicos, quebrando o princípio da impessoalidade na administração pública e fazendo valer seu capricho, o governador resolveu indicar para apreciação da subserviente e submissa Assembléia Legislativa o nome que recebeu apenas um quarto dos votos.

                        O fato não é isolado. Há algum tempo Lúcio impôs sua vontade e indicou para reitor da Universidade Regional do Cariri (URCA) um nome que recebeu menos votos na eleição feita pela comunidade universitária. O governador no seu capricho desrespeitou o princípio da impessoalidade na administração pública, indicando um nome de sua preferência pessoal, em detrimento da preferência da coletividade. Colocou seu interesse próprio acima do coletivo, como tem feito durante toda sua vida política. Os 23 deputados que votaram favoravelmente à indicação do governador também colocaram, como de costume, seus interesses pessoais acima dos da sociedade cearense.

                        Lúcio é um político que já passou por diversos partidos políticos, o que mostra seu oportunismo político. Forjou-se nas fornalhas da ditadura militar, tendo sido prefeito biônico de Fortaleza, surgindo sob a sombra do pai, Waldemar Alcântara, nas hostes da nefasta Aliança Renovadora Nacional (Arena), partido criado pelos ditadores militares. Em seguida, migrou para o sucedâneo Partido Democrático Social (PDS), quando da volta do pluripartidarismo. Por ocasião do fim da ditadura militar e parte dos que se utilizaram por décadas do Poder não conseguiram ou não quiseram se abrigar no volúvel PMDB, Lúcio mais uma vez migrou para o Partido da Frente Liberal (PFL). Não contente, para obter uma pseudo-aura progressista, resolveu bater asas para o Partido Democrático Trabalhista (PDT), onde transformou o partido em sigla alternativa do Cambeba. Para finalizar, acabou por desaguar no PSDB, anunciando a decisão em seu primeiro pronunciamento como senador, eleito que acabara de ser pela sigla pedetista. Não é à toa que foi apelidade de “político tapioca”, vira para lá, vira para cá...

                        Infelizmente o Ceará vem sendo alvo de atitudes de governantes sem qualquer compromisso que não seja com seus próprios interesses, colocando a máquina pública a serviço de um grupo de pessoas que não tem qualquer preocupação com a população, nem de tirar o povo da extrema situação de pobreza e miséria em que se encontra, dilapidando o patrimônio público para que esse grupo cada vez mais acumule riquezas em cima da opressão e da extorsão do povo.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 293 - 21/11/2.005

Discriminação condenável

Infelizmente alguns jornalistas confundem e distorcem suas funções. O episódio em que três jornalistas foram impedidos de participar de uma entrevista coletiva do ministro da Educação, Fernando Haddad, sobre a greve dos professores das universidades federais. A coletiva aconteceu no dia 16/11 e a coordenadora de imprensa do Ministério, Vera Flores, impediu que Luciana Bezerra – da assessoria de imprensa do impediu que Luciana Bezerra – da assessoria de imprensa do Comando Nacional de Greve dos docentes das Instituições Federais de Ensino Superior –, Carla Lisboa – da Associação dos Docentes da Universidade de Brasília (ADUnB) e André Castro – da assessoria de imprensa da UnB – participassem da coletiva. Segundo Vera, a coletiva era destinada apenas aos profissionais de imprensa.

A profissão de assessor de imprensa ainda não é regulamentada, por esse motivo muitos órgãos públicos e empresas possuem pessoas que não são jornalistas na função, dando uma feição política ao cargo, mas precisam de um profissional do jornalismo na assessoria. A coordenadora de imprensa do ME não poderia agir dessa forma discriminatória, até porquê a entrevista foi concedida por um agente público, num órgão público. Como justificativa Vera Flores disse que a coletiva era direcionada aos profissionais que “estivesse no exercício do jornalismo”. Ora, e por acaso jornalista deixa de ser jornalista se não estiver exercendo a profissão? Então ninguém é jornalista, mas “está” jornalista.

Não é difícil jornalista confundir suas atribuições como assessores de imprensa com advogado de defesa, assumindo um discurso alheio ao exercício de sua função. Infelizmente vende não sua força de trabalho, mas sua consciência e, principalmente, seu caráter. A atitude de Vera Flores merece o repúdio de todos os que defendem o jornalismo, o livre exercício da profissão, a democratização da informação, a liberdade. Nenhum jornalista pode compactuar com essa demonstração digna de períodos ditatoriais. O fato seria comum a algumas décadas, mas não com uma época onde se apregoa vivermos numa sociedade livre, como hodiernamente. Os assessores de imprensa preocupam-se muito mais em agradas seus assessorados do que com a prática de um jornalismo ético e correto, seja ele ou não considerado “exercício jornalístico”.

Os profissionais de imprensa e as demais pessoas que ocupam cargos de assessoria preocupam-se muito mais com a manutenção de seus empregos do que com o desempenho correto de suas funções, não importando se para isso tenham que cometer os mais absurdos atos de autoritarismo, discriminação e violência. O problema está também nos cursos de jornalismo, onde a função de assessoria de imprensa não recebe a devida importância. Os cursos funcionam como verdadeiros fornecedores para alimentar as caldeiras do mercado de trabalho, cada vez mais ávido por mão de obra barata e sem se importar com a qualificação.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 294 - 28/11/2.005

O show da violência

                        A violência que campeia no País não é um problema que envolve apenas o Poder Público, mas um fenômeno que já extrapolou todas as esferas institucionais e sociais. Trata-se de um problema que absorve muito dinheiro do erário, ceifa vidas, preocupa toda a população e constitui-se num dos – talvez o mais – graves imbróglios que o Brasil não consegue resolver e assiste, inerte, à sua incrementação sem que absolutamente nada de concreto seja feito para que haja, pelo menos, uma inibição em seus índices.

                        Segurança é dever do Estado, através da União, na implementação de políticas de segurança e sociais que possibilitem o combate à violência e através dos estados, que estão mais próximos do cerne da questão, através do aparelho policial constitucional – polícias Militar e Civil, além do provimento do sistema penintenciário – mas ambos têm sido incompetentes no combate à escalada da violência. Além dos fatores sociais que contribuem para o aumento da atividade à margem da lei – falta de escolas, emprego, saúde, perspectivas de vida – uma cultura de violência cada vez mais tomou corpo nos últimos anos, fazendo disparar os indicadores da violência.

                        Nesse cenário a fatia de contribuição do Judiciário é expressivo, pois da ação dos magistrados resulta num combate maior à violência. Penas brandas, corrupção, morosidade faz com que a sociedade se sinta cada vez mais desamparada. A impunidade é a mãe legítima da reincidência. Cada vez que um crime não tem seus autores punidos a sensação de que o braço da lei não se faz presente aumenta e algumas pessoas apostam ainda mais na violência. Enquanto magistrados estiverem cada vez mais distantes da realidade do povo essa tendência de violência só apresenta sinais de inflar-se. Ou o Judiciário aplica penas mais pesadas, que a lei prevê, ou o caos social só tende a piorar.

                        O Executivo precisa dotar o sistema penal de presídios capazes de proporcionar aos que se conduzirem à margem da lei, pelo menos, com as condições dignas mínimas de sobrevivência. O legislativo também tem que elaborar leis mais rígidas para que não existam tantas brechas nas quais os infratores acabam se beneficiando. Parlamentares também vivem num mundo completamente distante da realidade da população. Também são culpados pelo medo constante em que a sociedade vive, sempre temendo que algo maléfico possa lhe acontecer ou aos seus.

                        A imprensa tem tido um papel decisivo no atual quadro de violência. Não promove um amplo debate sobre a violência, limitando-se a jogar fatos e não estimular a discussão, bem como não pressionar o Poder Público para que tome providências. O processo de espetacularização da violência produziu um aumento incomensurável. Programas que enfocam a violência como um show pululam por todo o País. A glamourização da violência fez com que uma cultura de violência se enraizasse e se alastrasse com muito mais profundidade. Os holofotes da mídia promovem uma catarse negativa que muitas vezes revertem em mais ações violentas. Existe uma abissal diferença entre noticiar violência e transformá-la num show. No meio disso tudo está o cidadão, que não tem para quem apelar.

 

DEZEMBRO

ATUALIZAÇÃO N.º 295 - 04/12/2.005

Quebra de sigilo

                        O procurador da República Bruno Caiado Acioly teve a intenção de macular um dos principais direitos dos jornalistas: o sigilo da fonte. Acioly tencionava entrar na Justiça com o pedido de uma medida liminar para que fosse quebrado o sigilo telefônico de quatro jornalistas que redigiram matérias sobre denúncias, envolvendo servidores do Banco Central e dirigentes de bancos privados. O procurador, inclusive, havia consultado outros colegas do Ministério Público Federal para que lhe fornecessem subsídios para a ação. Acioly justificou-se recorrendo a comparações extremadas e com argumentações confusas, afirmando que os jornalistas vêm alegando o sigilo da fonte como negativa de revelar ao MPF os autores das informações sobre o escândalo Marca FonteCindam, que há seis anos causou um prejuízo de R$ 1,5 bilhão aos cofres públicos.

                        O segredo da fonte é um preceito constitucional garantido pelo inciso XIV do Artigo 5º da Constituição. Através desse dispositivo os profissionais de imprensa podem ser abastecidos por suas fontes sem que estas corram o risco de serem reveladas, pois é compromisso do jornalista a garantia do sigilo de seu informante. Através disso muitas reportagens foram publicadas, ajudando ao povo no acesso a informações que tem direito e muitas vezes lhe são negadas, bem como auxiliando o próprio Poder Público na coibição de vários delitos. Retirar do jornalista o sigilo de sua fonte é golpear de morte o jornalismo independente e livre. Afinal, quem se disporia a revelar informações a jornalistas caso corresse o risco de ser descoberto? Cabe ao profissional de imprensa atuar com ética, seriedade e responsabilidade baseado nesse direito que lhe é assegurado por nossa Carta Magna.

                        Isso inibiria a ação da imprensa. A quem interessa uma imprensa tolhida, amedrontada, silente? Às muitas mordaças que são impostas aos jornalistas, seja pelos interesses das empresas que lhes empregam, seja por pressões diversas que muitas vezes compele o profissional a agir de uma maneira adversa à que gostaria – muito embora isso não justifique se assim proceda – não poderia se juntar essa medida descabida. O retrocesso seria incalculável e comparável aos períodos de exceção. A sociedade perderia. A imprensa, tantas vezes instrumento de divulgação das ações do próprio Ministério Público, acabaria por reduzir-se a um instrumento meramente reprodutor de informações. O jornalismo, que por essência é investigativo, não teria como ser exercido em sua plenitude.

                        Como se trata de direito e garantia individual, o sigilo da fonte, ainda que sofresse uma ação para ser extinto, mediante emenda constitucional, não poderia ser alvo de proposta para isso, uma vez que isso é vedado pelo inciso IV do parágrafo 4º do Artigo 60 da Constituição. Felizmente o próprio corpo do MPF apressou-se em desautorizar publicamente a intenção de Bruno Acioly. Caso a intenção do procurador, que afirmou ser apenas uma “discussão acadêmica, teórica” obtivesse êxito, as conseqüências seriam catastróficas. Regozijariam-se os que optam pelo crime. Lamentariam os que buscam o exercício do jornalismo livre e independente. Por sua vez, os jornalistas precisam, acima de qualquer coisa, utilizar os direitos que possuem com ética e correção. Para que seus direitos sejam respeitados, necessitam cumprir seu dever. A resposta a ataques como esse é um jornalismo ético, sério, responsável.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 296 - 12/12/2.005

Arapongagem oficial

                        A atitude do procurador da República no Distrito Federal, Bruno Acioly, que intencionava mover ação para que fosse suspensa a garantia constitucional do direito do sigilo da fonte, um dos requisitos fundamentais para o exercício do jornalismo, já começa a provocar desdobramentos que, se não são inéditos, pelo menos ajudam a confirmar o caos que a supressão desse direito provocaria, bem como demonstrar como agem os que não respeitam as leis e utilizam subterfúgios escusos para a obtenção de seus objetivos.

                        No Espírito Santo, um instrumento de repressão estatal chamado “Guardião”, realizou escutas telefônicas ilegais de conversas de jornalistas e suas fontes, através de um “grampo” feito na central telefônica da Rede Gazeta, que reúne o jornal A Gazeta, uma emissora de rádio afiliada à CBN e a TV Gazeta. A escuta ilegal fere a liberdade do exercício do jornalismo, que tem no compromisso do sigilo da fonte um princípio previsto em seu Código de Ética e garantido pelo inciso XIV do Artigo 5º da Constituição brasileira, bem como crime previsto no Artigo 10 da Lei 9.296/96.

                        O órgão do governo do Espírito Santo não pode agir dessa forma, à margem da lei, que se coaduna apenas a bandidos. Um procedimento que foi comum nos períodos totalitários, mas não aplicável no atual momento do Estado brasileiro, ainda que vivamos numa democracia capenga e, em muitas vezes, apenas de fachada. O procurador Bruno Acioly desejava tornar legal uma prática ilegal, sem qualquer base e ao arrepio do que determina a própria Constituição, da qual o Ministério Público Federal é o legítimo bastião de defesa.

                        Aqui no Ceará o governo do Estado pretende criar um organismo semelhante ao que existe no Espírito Santo, que teria como atribuição principal a realização de escutas telefônicas autorizadas pela Justiça. Ora, mas quem garantiria que os “grampos” se limitariam aos determinados pelo Judiciário? Diante do histórico de autoritarismo, prepotência, arrogância, intimidação que norteia o grupo político que domina o poder no Estado há vinte anos, é difícil não supor que o tal organismo será transformado em mais um instrumento de repressão e intimidação aos que se opõem aos feitores do povo cearense.

                        O jornalismo precisa ser livre para poder ser exercido em sua plenitude. O sigilo da fonte não pode ter sua garantia suprimida. O Estado não pode assumir a feição autoritária, arrogante, prepotente, repressora de quem ocupa o comando do Poder Executivo. O aparelho estatal não pode ser utilizado para a contemplação de interesses pessoais e desvios comportamentais, saciar a sanha de opressão, perseguição e déspota de quem insiste em utilizar o Estado em proveito próprio.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 297 - 19/12/2.005

Retrocesso perigoso

                        O Brasil vem assistindo, nos últimos tempos, uma série de atentados ao exercício do jornalismo e aos jornalistas. Desde a decisão da juíza Carla Rister, que de maneira distorcida determinou a abolição da exigência do diploma de graduação universitária em jornalismo para a obtenção do registro profissional, atentados à liberdade de imprensa cada vez mais se intensificam lesando não apenas os profissionais de imprensa, mas toda a sociedade, uma vez que o livre exercício do jornalismo é uma condição primordial para que o acesso à informação seja cada vez mais democratizado.

                        Há duas semanas veio à tona o grampo realizado pela Secretaria de Segurança Pública do Espírito Santo nos telefones das empresas da Rede Gazeta, que envolve emissoras de rádio e TV, além de um jornal impresso. A Justiça daquele Estado havia autorizado escuta em outros números telefônicos, mas a execução da decisão foi distorcida para monitorar as conversas telefônicas dos jornalistas da Rede Gazeta. Cerca de 200 jornalistas tiveram suas conversas gravadas e desrespeitados seu direito constitucional de sigilo das suas fontes.

                        Em seguida, a Justiça Federal de São Paulo proibiu o jornal Folha de São Paulo de divulgar reportagens sobre o processo criminal que apura a contratação da empresa Kroll, pela empresa de telefonia Brasil Telecom, para investigar a concorrente Telecom Itáila. O despacho judicial atendeu solicitação de um dos envolvidos no processo, que tramita sob sigilo. Figuram como réus no processo o empresário Daniel Dantas e mais 15 denunciados. A Justiça determinou, inclusive, a retirada de mais de 100 matérias do sítio do jornal na Internet.

                        São fatos que remontam um passado de triste lembrança e do qual já pensávamos nos ter livrado. Durante a ditadura Vargas, o ditador criou o famigerado Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), para impor censura aos meios de comunicação. Quando um regime totalitário se instala em qualquer nação, uma das primeiras atitudes que toma é o controle da comunicação de massa. A imprensa livre não satisfaz aos interesses dos que optam por usurpar o Poder. Com jornalistas forçados a submeterem-se à um controle oficial a sociedade fica amordaçada, manietada e com seus olhos vendados.

                        Durante a última ditadura militar, que durou de 1964 a 1985, a figura do censor nas redações tornou-se, infelizmente, lugar comum. Edições de jornais só podiam ir para as bancas após passar pelo crivo dos censores, com muitas edições submetidas a uma verdadeira mutilação para que os interesses totalitários fossem contemplados. Programas de televisão e rádio tinham que enviar previamente seus roteiros para essa mesma censura. A diferença é que hoje o Brasil vive, pelo menos hipotética e oficialmente, numa democracia, num estado democrático de Direito. Mas não é dessa forma que pensam pessoas que ainda preferem exercitar a velha censura, ainda que para isso não possuam amparo legal ou abusem do cargo que ocupam.

 

ATUALIZAÇÃO N.º 298 - 26/12/2.005

A cassação popular

                        A Assembléia Legislativa do Estado do Ceará deliberou pela não cassação do mandato do deputado José Nobre Guimarães (PT), que confessou ter recebido R$ 250 mil do chamado “valerioduto”, recurso proveniente de transações ilícitas de sua agremiação com o publicitário mineiro Marcos Valério, com o qual pagou, segundo declarou, dívidas de campanha da campanha de seu partido ao governo do Estado em 2002. Guimarães é irmão do ex-presidente nacional do PT, José Genuíno e vem a ser o mesmo que teve um então assessor, José Adalberto, preso num aeroporto em São Paulo, quando tentava embarcar com R$ 200 mil e US$ 100 mil, estes últimos escondidos na cueca.

                        Adalberto afirmou que o dinheiro era para si, dando algumas explicações no mínimo duvidosas, para não dizer inaceitáveis, para a origem e destino do dinheiro. Segundo o Ministério Público Federal o episódio envolve ainda o ex-chefe do gabinete da presidência do Banco do Nordeste, Kennedy Moura Ramos, que, juntamente com o presidente daquela instituição financeira estatal, Roberto Smith, foi indicado pelo deputado petista para ocuparem os cargos. A absolvição, como não poderia deixar de ser, causou indignação na maioria dos brasileiros, que desejavam ver cassado o legislador do PT.

                        O espírito de corpo e as costuras políticas, já com vistas à eleição do próximo ano, possibilitaram a manutenção do mandato do petista. Mas algo mais, se não fossem esses ingredientes, faria com que a cassação de Guimarães fosse um ato de pura hipocrisia. Os deputados estaduais cearenses, em sua maioria, não possuem condições morais para tomar a decisão de cassar o mandato de um de seus pares. Espelho de outros poderes Legislativo estaduais e nacional, a Assembléia é um reduto de pessoas descompromissadas com o interesse público e que apenas visam a satisfação de suas próprias conveniências.

                        Cometedores dos mesmos erros que colocaram na berlinda o parlamentar do PT, os deputados estaduais cearenses optaram por não crucificar um de seus semelhantes. Guimarães merecia, com efeito, ser guilhotinado sem delonga, mas acabou por ser poupado por causa da, pasmem, coerência dos demais deputados. “Como ser algoz de um deputado que praticou as mesmas coisas que eu?”. “Como posso julgar uma pessoa que cometeu o mesmo crime que eu e pelo qual não fui pego?”. Certamente essas e outras indagações fizeram a si mesmos os deputados que votaram pela absolvição de Guimarães. Ainda assim os que votaram favorável à cassação – dezesseis optaram por isso – agiram com um enorme drama de consciência, pois estavam querendo punir alguém que age da mesma forma que eles. Prevaleceu, dessa forma e surpreendentemente, a coerência: “não posso condenar alguém por fazer o que eu também faço”, certamente pensou os que absolveram o petista.

                        Infelizmente o povo cearense assistiu a mais esse espetáculo deprimente da Assembléia Legislativa. Viu, impotente, um grupo de 46 parlamentares debochar, mais uma vez, de suas caras. Mas o cidadão ainda tem a oportunidade de reparar esse desrespeito. Decretar o fim da impunidade, do cinismo, do corporativismo, da irresponsabilidade para com o compromisso assumido à sociedade. No ano que se avizinha será realizada eleição, onde o eleitor terá a incumbência de ungir 46 pessoas que irão tomar assento no Parlamento Estadual. Precisa ter responsabilidade e votar com consciência e sempre lembrando do passado dos que estão a lhe pedir voto. Quem sabe um novo grupo de 46 pessoas que nunca tiveram mandato, que não estão, ainda, contaminadas pelo vírus dos vícios que permeiam a classe política local possa dar uma nova feição à Assembléia? Também à Câmara Federal, ao Senado, ao governo do Estado. Todos nós teremos a oportunidade de cassar o mandato dos deputados que quisermos, bem como senadores e governador.

Volta

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