Ocorre principalmente nos diabéticos tipo 1. O início da sintomatologia pode preceder a cetoacidose diabética por alguns dias. É um distúrbio do metabolismo das proteínas, lípides, carboidratos, água e eletrólitos, pela menor atividade da insulina frente à maior atividade dos hormônios contra-reguladores (catecolaminas, cortisol, glucagon e hormônio de crescimento) que se caracteriza por hiperglicemia (em geral > 250 mg/dl), cetonemia (> 3 mMol/l), cetonúria e acidose metabólica. A hiperglicemia induz diurese osmótica, com depleção de volume e desidratação. É a maior causa de mortalidade em crianças diabéticas (10%), apesar do advento da insulina. Ela se inicia quando não há insulina suficiente para levar a glicose à célula; a gordura é transformada para fornecer energia e libera cetonas no sangue. Quando há altas concentrações de ácidos graxos no sangue o fígado faz sua absorção, resultando em fígado gorduroso, hipertrigliceridemia e cetoacidose.
Poliúria, polidipsia, boca seca e perda de peso; polifagia é rara na infância; fraqueza muscular; náuseas, vômitos e dor abdominal; hiperpnéia compensatória (ritmo de Kussmaul); hálito cetônico; confusão mental, torpor e coma. A perda de líquido pode causar colapso vascular e insuficiência renal. A temperatura é normal ou abaixo do normal; febre sugere infecção; leucocitose intensa é uma característica da acidose diabética e pode não indicar infecção. Há altos níveis plasmáticos de ácido acetoacético e ácido ß-hidroxibutírico. Apesar das concentrações iniciais do potássio serem normais ou altas há um déficit orgânico total enorme; o mesmo se dá com o fósforo; há ainda deficiência de magnésio. A concentração sérica de sódio tende a ser baixa em face a uma modesta concentração osmolar pois a hiperglicemia atrai água intracelular para o plasma. A amilase sérica pode estar elevada, e pancreatite pode ocorrer.
Testar a urina para glicose e cetonas; se a urina é negativa para cetonas outra causa para a acidose é provável; mas se for positiva, é necessário exame do plasma para descartar acidose pela fome.
1) distúrbios hidroeletrolíticos: diagnóstico diferencial com coma hipoglicêmico. Procurar e tratar os fatores desencadeantes. Questionar sobre uso prévio de insulina. Combater vômitos com antieméticos e, se persistirem, com sondagem e lavagem gástrica com soluções levemente alcalinas. 2)hidratação: evitar dissecções. 2.a) paciente em choque hipovolêmico: SF0,9%, 10-20 ml/kg, 1 ml/kg/min, EV; repetir até melhora das condições hemodinâmicas (não usar insulina até obter boa diurese). Se há melhora cardiocirculatória, mas persiste oligoanúria, avaliar a função renal. 2.b) paciente desidratado, mas com débito urinário bom: SF0,9% + SG 5% (1:1) + 20 mEq de potássio/l da solução, EV - 20-30 ml/kg/h até desaparecer sinais de desidratação. 2.c) paciente hidratado, com débito urinário bom: se a VO for inviável, usar hidratação de manutenção EV: SG 5%, 100 ml/100 Kcal/dia até 10 kg = 100 kcal/kg; 10-20 kg, 1000 kcal + 50 kcal/kg acima de 10; > 20 kg = 1500 kcal + 20 kcal/kg acima de 20. À hidratação de manutenção acrescentar as perdas urinárias continuadas: SG 5%, 50 ml/kg/d + sódio, 3,75 mEq/kg/dia + potássio, 2,5 mEq/kg/dia. 3)correção da acidose: só quando pH < 7,1 e/ou bicarbonato < 5 mEq/l, visando pH entre 7,1 e 7,2; usar bicarbonato a 1,4 % (1 ml = 0,167 mEq de HCO3; para apresentações mais concentradas, diluir com água destilada), EV, em 4 h, reavaliando 2/2 h. Após boa diurese, insulina: a) simples: 0,1 U/kg EV, seguido de 0,1 U/kg/h na forma de uma solução que contém 50 U/250 ml SF0,9% (lavar o equipo com a solução antes de iniciar a infusão e trocar a solução 6/6 h); ou IM, 0,2 U/kg, 2/2 h, se com boa perfusão periférica. A glicemia deve cair 10%/h; se a queda for mais rápida, diminuir 0,05 U/kg/h e, se for mais lenta, aumentar 0,05 U/kg/h. Quando a glicemia < 250 mg/dl, bicarbonato > 15 e pH > 7,25: insulina simples, 0,1 U/kg, IM ou SC, 4/4 h se a glicosúria > 2 +. Manter a infusão EV mais 30 min, 0,05 U/kg/h. Se a glicosúria for 0 ou 1 + ou não houver diurese, reavaliar a necessidade de insulina 2 h após. Se persistir acidemia mesmo com glicemia < 250 mg/dl, aumentar a velocidade de infusão de glicose, adicionando 2-4 g glicose/U de insulina. Não há perigo de toxicidade por altas doses de insulina, já que a resposta máxima fisiológica é obtida quando os receptores estão saturados, não importando quanta droga é dada. Um aumento artefactual da cetonúria e da cetonemia, medidos pelo método habitual com nitroprussiato de sódio, nas primeiras horas de tratamento, é esperada, apesar da evolução metabólica favorável. Na primeira manhã, mesmo com controle parcial da cetoacidose diabética, necessitando continuar insulina simples, prescrever NPH SC, em dose 10% > prévia à descompensação. 4)alimentação: iniciar assim que possível com dieta anticetótica: hidratos de carbono de absorção lenta, gorduras poliinsaturadas e rica em potássio e fosfatos (leite semidesnatado, cereais, carnes magras, verduras, legumes, frutas e sucos). 5)controles: dados vitais, glicemia, glicosúria, cetonúria, balanço hídrico e nível de consciência, devem ser anotados a curtos intervalos em uma planilha evolutiva. Repetir ionograma e gasometria com 4, 12 e 24 h de evolução.
1)hipoglicemia: se a glicemia atingir valores < 250 mg/dl, mesmo com instabilidade hemodinâmica ou hidroeletrolítica, adicionar glicose à fluidoterapia e alimentar o paciente VO. 2)hipopotassemia: observar hiporreflexia, distensão abdominal e hipotensão arterial; monitorização contínua do ECG. 3)acidose hiperclorêmica: as soluções eletrolíticas usadas proporcionam grande oferta de cloro e os cetoânions são oxidados a bicarbonato perdido na urina. Para manter a eletroneutralidade há uma retenção de cloro, surgindo a acidose metabólica hiperclorêmica. A realimentação via oral precoce previne tal distúrbio. Se necessita manter o paciente em hidratação parenteral prolongada, usar parte do potássio, na concentração de 20 mEq/l, na forma de fosfato de potássio. 4)edema pulmonar: a FR elevada, com volume corrente constante, leva à diminuição da pressão intrapleural média e ao aumento do efeito espaço morto. A pressão intersticial torna-se, então, mais negativa, possibilitando a saída de líquido do capilar para o interstício, mesmo com pressão intravascular normal. Pode haver, ainda, aumento da permeabilidade capilar pulmonar associado à microangiopatia diabética. Quando este aumento é concomitante à diminuição da pressão oncótica, que ocorre durante a reidratação, pode haver edema pulmonar com diminuição da complacência. 5) edema cerebral: manifesta-se horas após o início do tratamento. De imediato, usar manitol, 0,5 a 1,5 g/kg, EV rápido, repetindo tantas vezes quantas forem necessárias até a melhora dos sintomas. Intubar e hiperventilar para diminuir a pressão intracraniana. Restringir a oferta hídrica a 400-600 ml/m2 de SC/dia, repondo o volume urinário.
Característica dos pacientes tipo 2; em geral naqueles acima de 60 anos. A principal causa precipitante é a infecção, como pneumonia, ITU, abscesso, gastroenterite e sépsis. Também IAM, AVC, após cirurgias de grande porte, politraumatismos e nutrição parenteral total.
Há desidratação significativa, diminuição do nível de consciência, podendo chegar ao coma, intensa hiperglicemia (> 600 mg/dl).
O déficit de água é muito elevado, às vezes > 10 litros, e deve ser corrigido ao longo de 12-24 h. Na primeira hora infundir 1-2 litros de SF 0,9%; da 2ª-6ª h, caso a PA esteja normal, 500 ml de SF 0,45%. Insulinoterapia: dose de ataque em bolus de 0,15 UI/kg; a seguir, dripping de 5-7 UI/h, ou IM. Se a glicemia não diminuir pelo menos 10%/h, por 2 horas seguidas, dobra-se a infusão. Quando a glicemia chegar a 250 mg/dl, reduz-se o dripping à metade e associa-se SG 5% até o paciente poder se alimentar. Repor potássio, caso seja < 5,0 mEq/l, usando 20 ml de KCl a 10% no primeiro litro de solução salina e após 5 ml/l infundido. Manter os níveis entre 4,0-5,0 mEq/l.
A maioria dos diabéticos tratados com insulina tem pelo menos um episódio de hipoglicemia discreta ao mês; os sintomas são variados, mas há palpitações, sudorese, tremor e fome aguda e repentina; também sinais premonitórios como ansiedade, sensação de inquietação, desligamento da realidade, despersonalização, alteração do humor ou atividade excessiva. A hipoglicemia pela queda rápida do açúcar pode induzir sintomas diferentes, bem como o álcool, a neuropatia autonômica, o diabetes de longa duração, idade avançada e ß bloqueadores; ainda a queda abrupta da hiperglicemia ao limite de normalidade; fatores psicológicos também levam a quadros semelhantes. Para o paciente, tudo o que ele precisa é açúcar (carbohidrato de rápida absorção).
Lanches esquecidos, refeições atrasadas; dose errada de insulina; exercícios físicos sem o ajuste adequado da insulina ou carbohidrato adicional; episódio de consumo excessivo de álcool sem a adequada ingesta de carbohidratos.
Mesmo que o paciente se torne inconsciente amigos podem injetar glucagon IM (todo o líquido do frasco), e dar açúcar VO após recuperar a consciência; se não surtir efeito, procurar o médico. A hipoglicemia prolongada pode causar às vezes dano neurológico, que é mais assustador que perigoso. Motoristas devem ser avisados para manter açúcares no porta-luvas, e comê-los a cada 2 h. As crises de hipoglicemia induzidas pelas sulfoniluréias são bem graves, requerendo infusão IV de glicose por 24 a 72 h.