Sigmund Freud      

TERRORISMO : UM BOLO EM CAMADAS

Dr.  Waldemar  Zusman
Psicanalista Didata, filiado à IPA

À primeira vista, quem olha para este bolo de camadas superpostas e se limita à percepção de sua superfície, não vê mais que esta cobertura glamourosa de heroísmos trágicos, que se manifestam em atos de desespero e que custam o preço da vida.  Alguns pensam que o gesto suicida paga pelos homicídios simultâneos.

Abaixo desta primeira, surge a segunda camada do bolo, feita de perguntas nascidas da perplexidade, às quais podem ser dadas respostas políticas de todos os matizes, que terminam por criar um circulo vicioso: a opressão belicista gera o terrorismo e o terrorismo gera a opressão belicista. Causa e efeito se retro-alimentam.

Situemos-nos na terceira camada do bolo : o problema religioso e suas vertentes míticas. O ato terrorista, que implica no sacrifício da própria vida, é tido pelos religiosos de certos credos islâmicos como um exercício sagrado que garantiria ao seu executor um passaporte seguro para o céu, onde ele gozaria das graças e glorias do Deus de seu povo. Antes mesmo de praticado e, principalmente depois, a comunidade terrena em que ele vive cerca o terrorista e seus familiares de aplausos, admiração, homenagens e compensações financeiras. No conflito atual do oriente médio esta ascensão aos céus é um dos pontos de maior significação. Ali 3 religiões lutam pela posse do território sagrado de seus templos ou das ruínas deles, e dos túmulos de seus antepassados, que teriam tido, dizem os mitos, um contato de primeiro ou de segundo grau com o  respectivo Deus de cada religião. Estas minúsculas regiões geográficas não podem deixar de lhes pertencer porque se tornaram, no imaginário mítico de cada povo, o portão sagrado para ascender aos céus pelo caminho das orações, das privações, das peregrinações, do jejum, do sacrifício. O fanatismo vive da soma destes ingredientes. Os terroristas preferem um caminho mais rápido e seguro: o suicídio. Mas nem todos os fanáticos são terroristas.

Em todas as religiões tudo gira em torno do medo da morte, da qual se quer escapar pela crença numa outra vida. Ou pela busca de um amparo onipotente (Deus) que livraria os fiéis do absoluto desamparo a que estamos todos condenados. É uma questão de poder ou não poder suportar esta angustia intrínseca à condição humana em todas as partes do universo.

Mas se o medo é de morrer, perguntaria alguém, porque é que os terroristas se matam, como acabamos de ver no ataque a Nova York?

Vamos então à quarta camada do bolo, que a psicanálise explica.

Terroristas são pessoas aterrorizadas para as quais é difícil suportar o terror do desamparo inerente à vida. O terror que eles difundem e disseminam é o terror que eles não suportam carregar consigo, enquanto vivos. Por outro lado também não suportam a confissão desta debilidade ou desta covardia, nem a si mesmos.

Oferecem-se para a prática de um gesto heróico que lhes vai permitir livrar-se da vida insuportável e da vergonha de confessá-lo, ainda que fosse só para pedir ajuda.

É claro que estas coisas não são conscientes. O sacrifício aparentemente heróico de um terrorista muitas vezes não passa de uma depressão que está em busca de uma causa "nobre", que sirva de justificativa a um suicídio longamente sonhado. Profissões e esportes de alto risco também facultam a realização disfarçada de propósitos suicidas inconscientes.

Todo ser humano recita para si próprio, surdamente, por entre os dentes, o monólogo de Hamlet, ser ou não ser. Os terroristas, os suicidas, optam pelo não ser.

É claro que o extremado entusiasmo político, o excessivo fervor religioso e a trágica coragem heróica muitas vezes não passam de coberturas enfeitadas do bolo da morte, preparado com os ingredientes de graves e encobertos problemas emocionais, da loucura.

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