Da Desconstrução à Gramatologia,
Centrou-se, e muito, a atenção em torno de Derrida a partir da desconstrução. Pretendemos um passo adiante ao vermos na Gramatologia o principal nome do programa de Derrida, o que não impõe uma oposição binária em seu pensamento, mas uma releitura de sua obra a partir de uma perspectiva que centra sua atenção para além da perspectiva exclusiva que a centra na desconstrução. Aliás, na própria obra de Derrida (The time of a thesis in Alan Montefiore, ed., Philosophy in France Today (Cambridge, 1983) ele escreve. " Eu usei esta palavra (desconstrução) por uma conveniência apressada (for the sake or rapid convenience), embora seja uma palavra que eu não gosto e cuja fortuna tem sido desagradavelmente surpreendente".
Gramatologia, em contrapartida, é uma noção mais inclusiva, abrangendo ao mesmo tempo a desconstrução e a escritura (entendida não somente no sentido especial da écriture textual, mas também no sentido de uma prática de composição, de produção).
Desconstrução e escritura são operações complementares, e Gramatologia as engloba. Descontrói-se compondo. A diferença entre desconstrução e escritura pode ser vista de um modo mais claro quando comparamos o trato que Derrida dá aos textos filosóficos e aos textos artísticos e literários. Os primeiros ele desconstrói, os segundos ele imita (he mimes). A metodologia nas duas instâncias apresenta uma pequena semelhança. Os trabalhos filosóficos são tratados como um objeto de estudo, o qual é analiticamente articulado pela determinação e descrição das lacunas, rupturas ou descontinuidades, separando o que o trabalho diz (suas conclusões e proposições) do que ele mostra ou ostenta (seus exemplos, detalhes, o material com o qual, em contrapartida, está trabalhando). Textos literários ou criativos não são analisados, mas são adotados como modelos ou como tutores a serem imitados, como forma geradoras para a produção de um outro texto. As leituras derrideanas de textos de arte não são desconstrutivas, pois as leituras desconstrutivas são primordialmente influenciadas pela leitura de textos filosóficos. Desconstrução é, pois, um modo de análise; a escritura um modo de composição. Isto se torna mais claro a partir do surgimento de trabalhos como Glas, La carte postale e La vérité en peinture, as quais reorientam toda a problemática. (Depois de Glas temos uma mudança, em que começa a predominar a Segunda ênfase: textos experimentais)
Derrida vê a diferença entre o estilos filosóficos e os estilos literários como representando teorias alternativas da linguagem, e desde o seu primeiro livro (onde ele opõe Husserl e Joyce) isto já pode ser percebido.
Temos, então o que ele chama Picto-ideo-fonografico e a de-sedimentação de três níveis de comunicação: imagens, jogos de palavras (puns) e discurso. Há também os níveis não discursivos, que podem ser sistematicamente explorados: imagens e jogos de palavras(trocadilhos), ou exemplos e homofonias como um modo alternativo de composição e pensamento aplicável ao jogo. Esta escritura não é um método de análise ou criticismo, mas de invenção (e aqui escritura separa-se da desconstrução).
Escritura é a inventio de uma nova retórica. A maior inovação da escritura é sua confiança nas imagens. Novamente, a contribuição de Derrida não é simplesmente o uso de imagens, mas a expansão sustentada de imagens dentro dos modelos, dos exemplos imitados. Assim Derrida dá uma atenção considerável, em seus textos, à descrição de objetos do cotidiano tais como uma caixa de fósforos, um guarda chuva, o cadarço de um sapato, um cartão postal – cujo funcionamento ele interrroga como modelando os mais complexos e abstratos níveis do pensamento. Neste processo ele revela uma economia e uma simplicidade que nos frustram se estamos buscando conceitos, argumentos, teses – o que de fato está presente, ainda que aparentemente obscurecido pelo ornamento.
A atitude composicional excede o que tem sido identificado como desconstrução e reflete um programa mais extenso que pode ser derivado dos textos de Derrida; um programa que pode ser chamado de Gramatologia.
Gramatologia como composição (escritura) não se encontra confinada a livros e artigos, mas endereçada mais compreensivelemnte pelas necessidade de performance multicanal. Assim, a escritura tal qual Derrida a pratica poderia ser chamada de Scripting, desde um texto como La carte postale (embora publicada como um livro), que tem o status de um script. Ele é para este programa de gramatologia o que um roteiro é para um filme. Um conjunto de indicações, descrições e direções as quais para seu completo efeito devem ser atuadas. Um trabalho de gramatologia teórica que contém o script de uma gramatologia aplicada.
As aplicações das idéias de Derrida tem se focalizado, comumente, no princípio (ou método) da desconstrução ( o que pode ser observado a partir do título de algumas obras sobre Derrida). A fase inicial de importação de Derrida nas universidades americanas parece agora ter acabado. Esta fase inicial tomou lugar na linguagem e nos departamentos de literatura (mais do que nos departamentos de filosofia ou de ciências humanas) e as preocupações eram quase que exclusivas na prática do criticismo literário. Por maior que tenha sido o interesse dos criticos da escola de Yale (Paul de Man, J. Hillis Miller e Geoffrey Hartman) que patrocinaram sua introdução, nota-se por toda parte um sentimento de insatisfação, um sentimento de discrepância entre a primeira aplicação dos textos de Derrida e o programa completo esboçcado em suas teorias. Ou seja, começa-se a perceber, nos EUA e nos países que deles dependem culturalmente, que o que se produziu em torno de Derrida (ou a partir de Derrida) não diz respeito à totalidade do programa proposto por Derrida, mas gira tão somente ao redor da desconstrução e de seu uso crítico. O que poderia ser um avanço, não fosse o seu movimento dentro de limites pré-estabelecidos, foram as discussões sobre o potencial político da desconstrução. A "New French Theory" seria potencialmente subversiva. E por aí partiram os ataques e as defesas da desconstrução.
Mas a desconstrução, nestes termos, parece ter se esgotado e mesmo se tornado algo pejorativo. Isto é o que deduzimos a partir da leitura de ULMER (1985). É preciso ir adiante, compreender o trabalho de Derrida dentro de um quadro maior. Somente isso poderia superar o impasse. ULMER, que nos tem inspirado, optou pela Gramatologia. Ou seja, a aplicação das teorias de Derrida não mais em termos de desconstrução (embora este ainda permaneça um dos aspectos mais importantes da obra de Derrrida e não pode ser descuidado), mas de uma nova organização dos estudos culturais, de um novo modo de escritura cuja prática possa trazer a linguagem para uma relação responsiva com a era de novas tecnologias que estamos começando a viver. Não se trata de recusar a desconstrução, mas de fazê-la avançar. Não de criar uma outra disciplina ou um outro modo de análise, mas de atos de escritura, atos de deslocamento, jogo com modos de trabalho que violam a linguagem e a racionalidade.
A Gramatologia, até Derrida, teria produzido histórias da escritura e uma teoria para um modo de pesquisa que até então produziu quase que exclusivamente histórias da escritura.. Historiadores confundiriam a questão 0 que é a escritura? (perguntando pela essência da linguagem) com o problema da origem da escritura (uma questão que finalmente paraliza a pesquisa de fatos). O efeito disto é que as questões teóricas nunca são colocadas.
A fase da gramatologia da qual Derrida participa tem como sua tarefa a formação de uma teoria que organize e conceitualize estes fatos. Assim podemos pensar três fases neste campo:
Derrida identifica duas rupturas maiores chefiando o status corrente da gramatologia. O primeiro teria ocorrido no século XVIII, um período no qual uma busca por uma linguagem universal foi acompanhada pelo início da gramatologia como uma ciência positiva. A Gramatologia fora fundada nesta época como uma ciência de deciframento de escritas não alfabéticas, mais especificamente, o deciframento do hieróglifos egípcios. Neste período havia dois grandes obstáculos para uma ciência da escritura. De um lado os preconceitos teológicos como o mito de uma linguagem original ou primitiva, dada ao homem por Deus. Por outro lado, a incompreensão dos hieróglifos, admirados como uma forma do sublime, uma escritura mística. Somente com a superação destes obstáculos é que se pode criar um campo onde a reflexão sistemática pode superar a correspondência entre escritura e fala. A maior dificuldade era agora conceber, de um modo simultaneamente histórico e sistemático, a coabitação organizada, dentro do mesmo código gráfico, de elementos figurativos, simbólicos, abstratos e fonéticos.
A Segunda grande ruptura ocorreu na literatura durante o período modernista quando se mostrou os limites da estrutura lógico-gramatical do modelo Ocidental, oferecendo-se em seu lugar uma escritura que balanceava o ideográfico com os elementos fonéticos da escritura. O hieróglifo providenciou um denominador comum relacionando estes dois momentos no desenvolvimento da gramatologia (graphic poetics de Mallarmé e Ezra Pound. Poesia concreta).
A presente fase teórica da gramatologia, a fase teórica da Gramatologia, o segundo estágio da ciência da escritura, poderia ser caracterizada como uma nova egiptologia e necessitaria mais do que uma liberação intra-científica e epistemológica, mas de uma quebra semelhante a produzida por Frerét e Warburton (um trabalhando com o Chines e o outro com a escrita egípcia, ou seja uma quebra epistemológica pela construção de técnicas científicas de decifração). Para Derrida, este avanço é possível através da descoberta e desconstrução da história da metafísica, em todos os seus conceitos. A tradição metafísica é o primeiro obstáculo à gramatologia (um obstáculo que passa a ocupar e a absorver Derrida a partir de então), A estrutura conceitual imposta pela metafísica ocidental sobre o nosso pensamento (a qual opõe corpo e alma e valoriza o espiritual ou o ideal sobre o material através de uma longa lista de oposições) entalhou e vinculou uma perspectiva instumentalista e tecnicista da escritura. O obstáculo que Derrida deseja remover é a concepção (inclusive um hábito de pensamento) segundo a qual a escritura é exterior à fala, e a fala é exterior ao pensamento. Um ponto de vista segundo o qual a linguagem é um instrumento do pensamento, e a escritura somente uma extensão de um instrumento.
Ao mesmo tempo em que critica os temas do logocentrismo, Derrida começa a praticar um modo de escritura que não mais subordina a fala ou o pensamento, uma escritura não mais funcionando como uma representação da fala, uma escritura na qual a hierarquia entre pensamento, fala e escritura entra em colapso.
Nesta "nova egiptologia" a escritura estaria modelada pelos trabalhos de dois dos principais decifradores do mundo moderno: Champollion e Freud (que inclusive era um colecionar de artefactos egípcios).
Na história da decifração, é creditado a Warburton a descoberta de que a escrita hieroglífica não era um código oculto ou secreto, mas possuiam um significado público e uso popular, e como tal era legível, em princípio. O próximo passo foi a descoberta de que os ornamentos que envolviam os obeliscos continham os nomes dos reis ou dos deuses. A decifração de textos, a partir de então, sempre começou a partir da identificação de nomes próprios no texto. Outro aspecto essencial da decifração foi a interação trilingue da tradução tornada possível pela pedra de Rosetta, que possuia inscrições em hieróglifo, em demótico e em caracteres gregos. Assim, partir-se do que se sabia para o que não se sabia: como em Champollion, como em Freud.
A história da decifração do egípcio, a descoberta do segredo dos sonhos por Freud são associações que vinculam a escritura com os temas da identidade (o nome próprio), a morte (inscrições mortuárias egípcias e a morte do pai – em Freud), orações e o jogo fortuito do sentido: pontos de partida de investigação téorica de Derrida.
Os livros e ensaios de Derrida não são uma aplicação de sua gramatologia, mas trabalham ao nível de uma teoria que providencia um modelo que projete uma compreensão de como aplicar a gramatologia. Uma das suposições de Derrida, essencial para uma postura simpática em relação o projeto gramatológico, é que a linguagem escrita, assim como a linguagem falada, oferece atrito, ao mesmo tempo em que evolui e se modifica, e que a evolução da escrita não é necessariamente dependente da evolução da fala.
O primeiro fato a ser confrontado na evolução da escrita é o desenvolvimento e o aperfeiçoamento do alfabeto pelo gregos. O problema que circula através de todo campo de reflexão, Derrida sustenta, constituindo a fundamental condição que todo gramatologista deve endereçar, é a fonetização da escritura. Uma escritura puramente fonética é impossível, por razões estruturais e essenciais, e nunca acaba por reduzir o não fonético. Uma gramatologia aplicada é a busca de uma escritura que reconheça e contrabalanceie o duplo valor -ideográfico e fonético – da escritura., ao par da desconstrução da primazia dada pela tradição ocidental à palavra e ao verbal na tentativa de capturar toda a realidade dentro da linguagem. Assim, o significado não é sujeitado pela sucessão e pela linearidade, de acordo com a ordem de um tempo lógico, onde a linha apresenta a presença final de uma presença originária, de acordo com uma linha reta ou um círculo. Nisto ele confronta-se com um modelo, vigente desde Aristóteles até Hegel, onde é assumido que a linearidade da linguagem vincula-se a um conceito linear do tempo. Neste sentido, a perspectiva aberta por Derrida nos ajuda a pensar numa outra forma de escritura, aquela presente no hipertexto, o qual, gradativamente, destrói o modelo linear e nos faz pensar de acordo com uma outra temporalidade, distinta de um tempo homogêneo, dominado pela forma do agora e pelo ideal de um contínuo movimento, linear ou circular.
Para além da subordinação da escritura à fala, da primazia dada a palavra e ao verbal, na civilização ocidental, Derrida nos convida a pensar dentro de uma outra lógica. O fim da escritura linear, Derrida declara na Gramatologia, implica no fim do livro, mesmo que é a forma do livro que possibilita que as novas escrituras –literária ou teorética - sejam envolvidas. O surgimento, na atualidade, nas formas de comunicação, de novas estruturas emergentes em todas as formas práticas, e também no domínio do trato e do arquivamento da informação, e que massivamente reduzem o papel da fala, da escrita fonética e do livro, poderiam nos fazer, equivocadamente, pensar que a gramatologia implica na morte do livro. No entanto, o fim do livro e o início da escritura envolve a noção de fechamento, não de fim em si mesmo. O livro continuará, indefinidamente, ele não tem fim, assim como a escritura não tem uma origem (a escritura já está aí, está já sempre trabalhando). O livro, para Derrida, possui também um significado psicanalítico, mostrado por Freud no sonho da monografia botânica. Ele é algo precioso na civilização ocidental, algo que sempre será buscado, como a Mãe. Mas eis que estamos diante de uma nova questão, colocada por bases empíricas: o desenvolvimento das mídias eletrônicas. Questão que está nos trazendo radicais transformações culturais, cujo imperativo não pode mais ser ignorado.
Ao participar do encontro dos "Estados Gerais da Filosofia", realizado na Sorbonne em junho de 1979, Derrida chamou a atenção para a diminuição do papel da filosofia na educação francesa e apelou para que as humanidades participassem da revolução na mídia. Não se poderá mais ignorar, rejeitar ou condenar esta revolução. Derrida propunha então que voltássemos o nosso foco sobre este novo objeto, e modo de estudo e comunicação.
A mídia, inclusive, tem modificado as instituições educacionais, e dada a completa ausência ou qualquer elemento crítico nesta nova educação, a primeira tarefa para os Estados Gerais diz respeito ao funcionamento da esfera do mercado, às tecno-políticas da mídia e o que o governo administra sob o nome de Cultura e Comunicação. Em suma, este trabalho com as tecno-políticas da mídia deveria tornar-se, a partir de agora, uma parte regular da educação filosófica por vir.
O interesse de Derrida pela mídia faz parte de seu interesse em geral pela escritura como uma tecnologia, uma tecnologia envolvente, constrangida por três milênios ao serviço da linguagem. O mentor de Derrida nesta empreitada não é Marschall McLuhan, que projetou um retorno à civilização oral, mas Heidegger. Não é a tenologia em si mesma que deve ser confrontada. O perigo da tecnologia é que seu rígido ordenamento e encarceramento causa-e-efeito podem cegar a humanidade em relação a outros ordenamentos. O confronto com a tecnologia não pode se dar no próprio campo da tecnologia, mas num campo alheio ao tecnológico, a saber, o campo da arte. Não se trata simplesmente de condenar o enclausuramento tecnológico, ou este e aquele meio tecnológico, mas de produzir e revezar a informação em múltiplos significados. A tecnologia, assim, é deslocada, torna-se uma questão diferente. De fim em si mesma ela torna-se um meio necessário, uma pedagogia mais do que um sistema de conhecimento.
Em sua participação nos Estados Gerais da Filosofia, Derrida nos convoca não somente a estudarmos os efeitos dos mídia, mas a nos engajarmos na prática dos mídia. É dentro dos mídia que a batalha deve acontece.
A Gramatologia aceita os limites da ciência e de suas especializações, mas propõe um corte através das antigas divisões do conhecimento, incluindo na formação estudos como a semiologia e a cibernética. Assim, propõe-se novas inscrições e delimitações na ciência. Também aceita os limites do livro, associado à idéia de uma totalidade unificada – da qual o conceito de livro depende. Ou seja, à idéia de que a totalidade do significado pré-existe à totalidade dos significantes, sobrevivendo a sua inscrição em signos e sendo independente deles em sua idealidade ( o livro platônico, o livro da natureza, o livro do mundo). O livro, a partir de agora, deve tornar-se texto.
Então, mesmo que usemos o formato do livro para escrever, o gênero tende a se estender para o do ensaio. O ensaio é mais do que um simulacro do livro pois o princípio diretor de sua produção não é mais logocêntrico, não é mais a metafísica platônica na qual a escritura é secundária. Os novos ensaios serão escritos em e por uma idade de mídias eletônicas, escritos ao mesmo tempo contra o antigo modelo do livro e como um suplemento às novas mídias, para auxiliarem e estimularem a transição para a nova época.
Organizei este site com um tríplice objetivo.
1. Dispor de uma página na internet como um ponto de partida para todo o universo derrideano que cresce a cada dia com a expansão da Web. Um ponto de partida para a localização de textos e para uma experiência neste texto que se constrói a cada dia.
2. Construir um texto (na verdade um hipertexto) que dê conta do que andei fazendo nos meses que cursei uma disciplina com o prof.Dr. Ernildo Stein no pós-graduação em Filosofia da PUC/RS. O tema do semestre girava em torno de Freud, Heidegger e Derrida e a desconstrução do Eu. A internet, parece-me, é um excelente mote para tal.
3. Disponibilizar material para os meus alunos em Epistemologia e Psicanálise, no curso de Psicologia da Unisinos. As aulas deste semestre estão construídas ao redor do que aprendi e discutimos nas aulas do prof. Stein.
4. Oferecer aos interessados no trabalho de Derrida uma porta de entrada através daquilo que fui "pescando" na internet.Garanto que foi um trabalho árduo. Boa parte do material que aqui se encontra está em inglês. Se algum dos autores não estiver nomeado e se sentir lesado, por favor, envie-me um e-mail antes de qualquer providência, pois terei o maior prazer em corrigir a falha.
Entendo que a desconstrução não é um método, apesar de seu uso equívoco em muitas ocasiões. Por si mesma, a desconstrução resiste a uma definição definitiva. Antes de qualquer coisa, ela é uma estratégia de leitura cuja peculiaridade, diante de qualquer outra, reside justamente no objeto que elq busca; um mecanismo intertextual que ultrapassa - ou que ultrapassou - as intenções de quem produziu o texto em questão, ou as intenções que o texto pretende manifestar.
A leitura desconstrutiva trata de encontrar aqueles deslizes textuais em que se manifesta que o sentido do texto não é justamente aquele que está se propondo, senão outro que pode ser, inclusive, contraditório. A desconstrução busca a aporia, é a busca vivilante destas aporias, dos momentos de vacilo e de autocontradição, em que o textoinvoluntariamente trai a tensão entre retórica e lógica, entre o que ele manifestadamente quer dizer e aquilo que ele é constrangido a dizer.
Realizar uma leitura desconstrutiva implica em ater-se às zonas marginais do texto, às notas de pé de página, aos trabalhos pouco relevantes, aos lugares comuns, aos jargões, aos florões, às metáforas; lugares em que a vigilância de quem escreve poderia ter sido menor. Assim o marginal é convertido em centro, o centro e a margem se manifestam em um único território, o da textualidade.
Os deslizes textuais não são considerados como meros acidentes da escritura como representação da fala, mas a essencia da linguagem como tal. Se, tradicionalmente, a escritura era considerada como um substituto ou uma representação vicária da fala, agora ela passa a ser entendida como a base de toda a realidade e de toda linguagem. O valor de um enuciado não se encontra mais assgurado pela sua ligação a um emissário ou a um determinado autor. Como a escritura, o emissor e sua mensagem estão sempre necessariamente distanciados pela própria essência da linguagem.
A desconstrução terá por tarefa, pois, desmontar todas aquelas oposições constituídas a partir do mito idealista da presença do significado na mente do falante ou do escritor. Oposições tais como a da realidade/aparência, fala/escritura, presença/ausência, sensibilidade/inteligibilidade, essência/acidente, alma/corpo, razão/emoção, etc. Desmontar quer dizer descobrir o funcionamento real da linguagem. Como estratégia de leitura a descontrução encontra a realidade como um conjunto de versões e de interpretações em diferentes sistemas simbólicos. A desconstrução aponta claramente a inexistência de um significado transcendental ou de uma referência objetiva. O significado não é, pois, transcendental e a referência é a própria intertextualidade. Existe uma pluralidade de interpretaçòes e de sentidos, e não se pode mais decidir a superioridade de uma sobre as outras por sua ligação com a objetividade o mundo. Isto não implica em um relativismo, mas na afirmação do caráter textual de toda realidade; se nem todas as versões são boas, nem todas as interpretações devem sê-lo.
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Charles Lang
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