O barroco Fernando Pessoa

A partir de observações de algumas características da obra de Pessoa, surgiu-nos a pergunta: Fernando Pessoa seria Barroco? Se considerarmos as afirmações de Omar Calabrese, sim: “Por 'barroco' entenderemos (...) categorizações que 'excitam' fortemente a ordenação do sistema e que o desestabilizam em algumas partes, que o submetem a turbulências e flutuações e que o suspendem quanto à resolubilidade dos valores”
Como vimos anteriormente, Pessoa “desestabiliza” um modo de ver e sentir o mundo, criando uma obra que, tomada no seu conjunto, propõe uma nova ordenação da sensibilidade, sem deixar de produzir (através dessa nova ordenação) um sentimento de caoticidade (entendendo caoticidade como imprevisibilidade ou ininteligibilidade da informação estética) no momento da fruição dessa obra. Essa caoticidade é provocada justamente pela superposição das informações advindas dos poemas/poetas, que se configuram como labirintos de espelhos. Ao tentarmos compreender a lógica de um dos espelhos, o outro espelho modifica e complexifica a informação daquele, e assim ad infinitum ("Falar desse poeta e dessa obra equivale a mergulhar num atordoante labirinto de espelhos" - Ferreira Gullar). O labirinto, novamente segundo Calabrese, "é apenas uma das formas do caos, entendido como complexidade, cuja ordem existe, mas é complicada ou oculta". Essa ordem "oculta" produz a perda do referencial acarretando o que Calabrese chama de "prazer da obnubilação", ou seja, o prazer de ver-se perdido e ser instigado a encontrar o centro do labirinto. O prazer motivado por essa des-orientação e pelo "mistério do enigma" parece-nos semelhante ao prazer sentido por nós ao nos defrontarmos com a obra de Fernando Pessoa. Diante da proliferação dos textos e heterônimos pertencentes à criação labiríntica do autor de Mensagem, os pontos de referência turvam-se e ocultam-se, fugindo de nossas mãos qualquer fio de Ariadne e causando em nosso espírito o prazer intelectual de descobrir uma ordem onde aparentemente não existe nenhuma, só caos e mistério. Novamente, seguindo Calabrese, poderíamos dizer que o labirinto pessoano cria um "saber aberto", posto que em seus meandros e intersecções podemos sempre descobrir novas ramificações e caminhos para novos e surpreendentes significados, deixando o leitor "sempre sujeito ao risco da perda de orientação"
O labirinto, figura típica barroca, representa à maravilha a obra de Fernando Pessoa (considerando a criação dos heterônimos também como parte da sua obra), que ao mesmo tempo nos des-orienta e nos orienta para "Um Oriente ao oriente do Oriente”.

 

Paulo de Toledo

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