"VERDADES SOBRE MINHA VIDA"
                                         José Severino Silva

Nesta terra onde nasci,
É meu berço, Itaverava;
E vivendo sempre aqui,
Já vivi o que não esperava;

Aqui enfrentei a escola
Apertado, aprendi a ler
Mas nunca fui um trapincola,
Sempre tinha o que fazer.

 Cuidava do moinho distante,
lá com o milho trazia fubá;
E mais a tarefa constante,
Cuidar dos suinos e tratar;

 Sempre gostei de passarinhos,
também de ouvi-los cantar,
Fui fã dos meus cachorrinhos,
Pois, já pensava em caçar.

De onze para quinze anos,
Não me ajeitei no balcão;
Talvez cometendo enganos,
Troquei a minha profissão;

 Indo trabalhar com a tropa,
Era da tropa, o madrinheiro,
E levando manta na troca,
Passava mal o dia inteiro.

Um dia meu pai me perguntou,
Se queria aprender um ofício,
A sua conversa me agradou,
Tratei logo de dar ínicio;

Preferindo ser sapateiro,
Ele deu-me uma boa oficina
E despesas dum companheiro;
Fazendo-me esta propina.

 Contratei um bom sapateiro,
Com ele trabalhei uns tempos;
Ele, um ótimo companheiro,
E um rapaz de bons intentos;

E me sobrou algum dinheiro,
Graças ao seu belo serviço,
Que sendo um cara certeiro
Acabou com aquele inguiço.

Gostava do meu futebol,
E a música, eu aprendia,
Futebol eu até jogava,
E na música  persistia;

Mas, o meu pai adoeceu,
E o meu plano fracassou,
Sua doença permaneceu
E só, a esperança ficou.

Eu, aos poucos desenvolvendo
Sob a guarda dos meus pais
E sempre os obedecendo,
Sem me arrepender jamais;

Entretanto, meu pai morreu
E tudo tudo transformou,
O homem da casa era eu
E sua falta me apertou.

Eu ainda inexperiente,
No comércio que ele mantinha,
Quis fazer-me eficiente
Mas a prática eu não tinha;

O negócio foi piorando,
Apesar do esforço mantido;
A nossa freguesia falhando,
E o resultado exigido.

Insisti, lutei algum tempo
Para o meu caso resolver;
Mas o fiado por exemplo
Eu não consegui receber;

Desanimei e deixei pra lá,
Não cobrei mais, de ninguém;
Amolado com tanto azar,
Sacrifiquei-me e sai bem.

 Alguns, comentavam sorrindo;
Porém outros, se lamentavam;
Tinhamos amigos fingindo,
E alguns, que colaboravam;

Fomos vendendo a herança
Para saldar compromissos;
 Mantivemos a confiança,
E nada melhor, que isto.
Resolvendo eu me casei,

E fui feliz graças a Deus;
A moça que eu encontrei,
Gostava de mim e dos meus;
E assim nós fomos vivendo
A nossa vida de casados;

E o que ia acontecendo,
Controlavamos conformados.
Os filhos e filhas chegando
Felizmente com alegria;
O nome deles variando,
E o delas, todas Maria.

Com tristeza chegou também
Uma politicalha maldita;
Uma coisa que nunca faz bem,
E a minha esposa, a sua vítima.

Nós tentamos daqui sair,
Para evitar confusão,
Sem nada mais exigir,
A não ser direito de ação.

 Entretanto não conseguimos,
Nem soubemos qual a razão,
Nós soubemos e sentimos,
Frustrada nossa intenção.

Em mil novecentos e 37,
Pneumonia quis me matar;
 A esposa nos seus 27,
Ficou com medo de viúvar;

E bastante preocupada,
Vendo a minha situação,
Prometeu muito confiada,
E fez por minha intenção;

Grande e penosa promessa
De ir a Congonhas a pé
E uma promessa como essa,
Ela cumpriu com muita fé;

Passou muito mal no caminho,
Com aspereza de estrada,
Lá em casa, fria num cantinho,
Ela ficou três dias deitada.

Felizmente me recuperei,
Nos correios fui trabalhar;
Com um amigo eu achei,
Um galho para me ajudar;

Assim continuei a luta,
E cuidando da filharada,
Sem pensar que magia oculta,
Contra nós fosse impetrada.

Para melhorar nossa vida,
Serviços eu acumulava,
Fazia calçados pra lida,

E no correio manipulava;
Trabalhava fora da casa
Onde a família morava,
E até estranhava a causa,
Que a minha esposa chorava.

Um dia em casa eu chegava,
A esposa não me percebeu;
Muito triste ela se achava,
E aquilo me entristeceu;

Parece que ela percebia
Que na sua fatal gravidez;
Uma anomalia surgiria,
No seu parto daquela vez.

E os dias foram passando,
Já dentro de seu próprio mês;
E tudo tudo complicado,
Na sua obscura gravidez;

Providências foram tomadas,
Mas, não se tinha esperança,
Ela morria convulsionada,
Mas foi extraída a criança.

Tomou conta da minha filha,
Uma boa e santa criatura,
Que sendo gente da família,
Cuidou dela com ternura;

Também os outros que ficaram,
Amparados por Deus e os seus,
Aos poucos se encaminharam,
E estão bem, --- graças a Deus.

Assim eu fiquei sozinho,
Pensativo e sem lugar;
Saía e batia um papinho,
Tentando me desabafar;

Mas, a responsabilidade
E o pensamento nos filhos,
Faziam-me tanta saudade,
Que não era coisa do estilo.

Aguentei a mão algum tempo,
Amigos me estimulando;
Mas, eu não tinha o intento,

Ir logo logo, me casando
Com paciência esperei
E os seis anos passaram,
Assim eu me deliberei,
Como outros deliberaram.

 Tendo passado seis anos,
Novamente eu me casei,
Jesus que também é humano,
Inspirou-me e eu acertei;

Se surgia alguma coisinha,
Coisas que a vaidade faz,
A compreensão já se tinha,
E tudo acabava em paz.

Mais duas Marias chegaram,
Do meu segundo casamento;
Elas nunca me amolaram,
Tendo fé e entendimento;

  Já, com os dez filhos criados,
E felizmente com saúde,
Eu agradeço penhorado,
Por Deus dar-lhes o que não pude.

Já velho e aponsentado,
Elevaram-me a prefeito;
Mas, o poder me foi dado,
Pelo snr. Juíz de Direito;

Pouco fiz pra terra querida,
Apesar dela merecer,
Com uma renda escolhida,
Não adiantava querer.

Com dois anos de governo,
O tempo me prejudicou;
O legislativo enfermo,
Meu mandato desintegrou;

Agora já estou velhinho,
E pronto pra viajar,
Peço a Deus um cantinho,
Bom lugar para descansar.


Primeira frase dita assim que terminou sua obra:
"Na insignificância deste trabalho tudo pode faltar, menos a verdade"

Morreu no dia 17 de dezembro de 1991.
45 minutos depois de terminar o poema.
De Derrame Cerebral aos 83 anos.
"Que Deus o tenha"
Votos de seu neto Marcelo.

                                        Fim.
José S. Silva
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