OS MORCEGOS E AS FIGUEIRAS

por : Carlos Esbérard & Mariane S. Nunes

Figos representam importante recurso alimentar para morcegos. Existe uma grande diversidae de espécies de figueiras em todo o mundo e cada exemplar apresenta a cada ano um período diferente de frutificação. No período de frutificação apresentam grande quantidade de frutos que se esgota ao fim de umas poucas semanas, consumidos pelos morcegos e aves. As figueiras são espécies que, por sua vez, dependem dos morcegos, que transportam as sementes e as liberam junto com as fezes durante o vôo em locais distantes, onde podem germinar outras árvores. Várias espécies de figueiras germinam sobre outras espécies de vegetais e as dominam. Sementes caídas sobre muros, peitoris, etc, também podem originar novas árvores, propriedade esta que torna as figueiras comuns em vários locais, onde outras árvores não sobreviveriam.

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Figura 1 - fruto de Ficus tomentella.

Várias espécies de morcegos dependem da frutificação das figueiras. Cada espécie de figo produz um fruto de diferente tamanho. Figos menores são visitados por uma maior variedade de morcegos e os frutos maiores são consumidos apenas por morcegos de maior porte. Com isso, quanto mais espécies de figueiras existirem em uma dada área, maior deverá ser o número de espécies de morcegos.

Para analisar o padrão de visita de morcegos a uma espécie comum no paisagismo de praças na Cidade do Rio de Janeiro - Ficus tomentella - realizamos capturas junto a quatro exemplares durante o período de frutificação, localizados na Quinta da Boa Vista. A Quinta da Boa Vista é um parque urbano com cerca de 500.000 metros quadrados, cujo paisagismo incluiu várias espécies de figueiras, nativas e exóticas. Alguns exemplares possuem mais de 140 anos de idade. Neste parque constatmos a existência de 16 exemplares adultos de Ficus tomentella entre as 2.294 árvores inventariadas.

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Conforme demonstrado no gráfico acima existe uma correlação entre o total de morcegos capturados e o diâmetro do tronco nos exemplares analisados. Com isso é possivel extrapolar que exemplares mais velhos, ou aqueles que apresentaram melhor crescimento,  podem ser visitados por maior número de frugívoros.

Os quatro exemplares de figueiras analisados apresentaram diferentes tamanhos de frutos, como pode ser conferido pelo gráfico apresentado a seguir.3

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O tamanho do figo poderia variar com a quantidade de frutos produzidos, impondo que cada exemplar realizaria um investimento proporcional a cada período de frutificação. No entanto, constatamos que um dos exemplares apresentou valores similares para o tamanho e peso de figos, apesar de ter produzido quantidades nitidamente diferentes em duas frutificações consecutivas analisadas (fevereiro e julho de 1999). Com isso, cada figueira investe diferente esforço a cada período de frutificação, que pode significar a adaptabilidade às condições ambientais apresentadas antes da produção dos sincônios.

O tamanho e o peso dos figos sofrem incremento durante o ciclo de maturação. Em um dos exemplares analisados coletamos frutos na quinta, sétima e nona semanas durante o ciclo de 10 semanas desde o surgimento destes até o completo esgotamento destes pelos morcegos. Como demonstrado no gráfico abaixo, obsevamos na nona semana um incremento no peso médio destes. Apenas na nona semana observamos que os figos estavam macios e sem a presença de látex. Este momento coincidiu com uma maior visitação pelos morcegos (incremento de  cerca de 76%).

O mais notável, entretanto, é a quantidade de morcegos capturados junto às figueiras em frutificação. Já haviamos amostrado neste parque morcegos usando redes japonesas desde 1989, totalizando 74 noites e mais de 2.200 exemplares haviam sido analisados. O total obtido nas 4 noites correspondeu a até 100 vezes mais do que o obtido neste parque fora do período de frutificação destas figueiras, conforme demonstrado na tabela abaixo.

 

FIGUEIRA 1

FIGUEIRA 2

FIGUEIRA 3

FIGUEIRA 4

74 COLETAS

CAPTURAS/REDE*HORA 1,45 1,52 0,72 1,76 0,013

  Sabemos que por vezes o elevado número de morcegos que visita simultâneamente uma figueira pode causar certo desconforto. Moradores tem reclamado de entradas eventuais em residências, associando estas às árvores muito próximas às suas casas e constatamos que várias construções podem apresentar-se manchadas com as fezes dos animais que se utilizam deste recurso. Em algumas localidades notamos que os moradores optaram em matar a figueira para eliminar o problema. As figueiras nativas não são empregadas comumente no paisagismo de logradouros, sendo os exemplares na sua maioria, oriundos de germinação de sementes carreadas por seus dispersores - aves e morcegos.

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