A Eletrificação nas Ferrovias Brasileiras

Estrada de Ferro Elétrica Votorantim


Em meados da década de 1850 foi constituída a Fábrica de Tecidos Votorantim, situada na fazenda de Votorantim e Ituparanga, que fazia a estamparia final em tecido cru importado da Inglaterra, a aproximadamente treze quilômetros ao sul de Sorocaba (SP). A chegada da E.F. Sorocabana a essa cidade, em 1875, trouxe um grande surto de desenvolvimento à região, que logo se tornaria um grande polo da indústria textil.

A facilidade para a circulação de mercadorias que a ferrovia proporcionava logo chamou a atenção dos administradores da Fábrica de Tecidos Votorantim, que pretendiam facilitar tanto o escoamento de sua produção como o recebimento de matéria prima. Por volta de 1890 eles conseguiram uma concessão municipal para a construção de uma estrada de ferro entre Sorocaba e a Fazenda Votorantim, que foi construída em 1892. Ela ligava a estação de Paula Souza, próximo da ponte sobre o Rio Sorocaba da linha tronco da E.F. Sorocabana na cidade de Sorocaba, até a vila de Votorantim, numa distância de 7 quilômetros. Em 1894 a ferrovia ganhou mais 6,43 quilômetros até Ituparanga/Nova Baltar. Sua bitola era estreita, de 60 centímetros, o que barateou sua construção mas impedia o tráfego mútuo com a E.F. Sorocabana. Mesmo assim a facilidade de escoamento proporcionada pela ferrovia trouxe grande prosperidade às Fábricas Votorantim, que em 1904 passaram a ter sua própria tecelagem, que contava com 1300 teares em 1914.

Nessa mesma época a São Paulo Electric, subsidiária da Light and Power, construiu uma usina hidrelétrica no rio Sorocabana, em Ituparanga, o que criou a oferta de energia elétrica farta e barata na região de Votorantim. Na época a usina tinha três máquinas completas, gerando 45.000 HP; sua capacidade seria posteriormente elevada para 76.000 HP. A opção do uso de energia elétrica para tracionar as composições da E.F. Votorantim passou a ser analisada, até em função dos bons resultados que vinham sendo obtidos na tração de bondes elétricos em várias cidades brasileiras. O Ministério da Viação aprovou a eletrificação da E.F. Votorantim em 6 de Setembro de 1921, juntamente com seu alargamento de bitola para 1 m, permitindo a circulação direta dos vagões da E.F. Sorocabana. É interessante notar que essa usina também forneceria energia para eletrificação da E.F. Sorocabana, inaugurada em 1944.

A eletrificação na E.F. Elétrica Votorantim foi implantada pela Westinghouse, usando-se corrente contínua de 600 volts para se alimentar os veículos elétricos, um valor satisfatório dado o pequeno porte das composições que circulavam na ferrovia. O material rodante era composto de uma locomotiva elétrica para tracionar vagões de carga, além de quatro bondes fabricados pela J.G. Brill americana, 31 carros de passageiros e um carro de bagagem-correio.

Em 20 de Novembro de 1922 foi inaugurada a amplicação da estação Paula Souza, ponto de partida da linha de bondes. A eletrificação e alargamento de bitola nos sete primeiros quilômetros de linha foram inaugurados em 3 de Fevereiro de 1923, fazendo até com que o nome da ferrovia mudasse para E.F. Elétrica Votorantim. Os restantes 6,43 quilômetros só passaram por esses melhoramentos em 1928. Durante a década de 1930 a E.F. Elétrica Votorantim recebeu mais um bonde e vários carros-reboque provenientes do sistema de bondes de Piraju.

O tráfego nessa ferrovia cresceu continuamente. Em 1935, a implantação da fábrica de cimento Votoran em Santa Helena, entre Votorantim e Ituparanga, contribuiu decisivamente para a quantidade de carga por ela transportada, que se viu obrigada a alugar locomotivas a vapor da E.F. Sorocabana. A implantação de outros empreendimentos do Grupo Votorantim, como refinarias de óleo e fábricas de sabão, também contribuíram para o crescimento do tráfego na ferrovia.

Após o final da Segunda Guerra Mundial a E.F. Elétrica Votorantim recebeu um grande reforço em seu parque de tração. De acordo com Reg Carter (Stephenson Locomotive Society) e Nicholas Burman, em 1946 chegaram três locomotivas elétricas tipo B-B de 40 toneladas, estilo steeple-cab, fabricadas pela General Electric americana. Uma máquina idêntica adicional chegaria dez anos depois. Duas dessas locomotivas foram pintadas de verde e as outras duas de azul; a finalidade da cor era indicar a lotação original das máquinas, Paula Souza ou Santa Helena (fábrica de cimento). Cumpre notar que esta ferrovia também possuía locomotivas diesel, sendo uma Orestein & Koppel, fornecida em 1936, e outra de segunda mão, fabricada pela Whitcomb, que chegou em 1948.

Em 1959 a E.F. Elétrica Votorantim adquiriu um bonde da cidade de Sorocaba, após a São Paulo Electric ter desativado o seu sistema naquela cidade. No ano seguinte os bondes Brill passaram por uma grande reforma após quase quarenta anos de serviço ativo. Ela deixou marcas em alguns deles, que perderam a frente curva original, ganhando uma frente totalmente reta, certamente de fabricação mais fácil. Infelizmente essa reforma não pôde ser plenamente aproveitada pelos usuários: pouco tempo depois, em 1966, a ferrovia extinguia o serviço público de passageiros, em decorrência da forte concorrência rodoviária - mais um sintoma da decadência ferroviária brasileira que se abateu a partir da década de 1950... Contudo, os bondes continuaram sendo usados no transporte de cargas e na manutenção da linha, além de transportar os empregados da fábrica de cimento até 1977.

A eletrificação continuou operando por mais vinte anos, apesar do uso crescente de locomotivas diesel-elétricas e vagões da FEPASA, a ferrovia que absorveu a E.F. Sorocabana em 1971. Isso tornou a manutenção da rede aérea elétrica até Santa Helena cada vez menos viável do ponto de vista econômico, já que sua voltagem (600 volts) era muito baixa para uso pelas locomotivas elétricas da FEPASA, que operavam com 3.000 volts. A situação acabou por se resolver a 12 de junho de 1986, quando a locomotiva elétrica #4 se chocou com uma composição da FEPASA. Este incidente motivou a supressão total da eletrificação na E.F. Elétrica Votorantim, cuja rede aérea foi retirada logo a seguir. A partir daí a tração de vagões nessa ferrovia passou a ser exclusivamente feita por locomotivas diesel-elétricas da FEPASA.

Tanto uma locomotiva elétrica como um dos bondes Brill foram preservados e expostos em Santa Helena. Infelizmente sua aparência é muito prejudicada pela poluição liberada pela indústria de cimento, que adere à suas caixas. Um pouco antes da privatização da FEPASA, em novembro de 1998, a E.F. Votorantim passou por um longo período de paralisação, em função de problemas ligados ao alto preço dos fretes ferroviários, mas a situação parece ter sido resolvida a partir do ano 2000.




- Referências Consultadas


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Última Atualização: 23.06.2002

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