Elsa R. J. Giugliani
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elaborado por Máikel Luís Colli
O aleitamento materno, antes um ato natural, fisiológico, tornou-se uma opção nos dias de hoje. Na década de 70, quando as taxas de aleitamento materno alcançaram os níveis mais baixos da história da humanidade, começou a ocorrer um movimento internacional para resgatar a “cultura da amamentação”. Apesar de haver um aumento da prática do aleitamento materno, ela está, ainda, muito aquém da recomendação da Organização Mundial de Saúde, que preconiza amamentação exclusiva nos primeiros 4-6 meses e parcial até pelo menos o final do primeiro ano de vida(1). No Brasil, praticamente 90% das crianças são amamentadas inicialmente. No entanto, a duração média da amamentação é curta, de apenas 90 dias, além de não ser exclusiva na maioria das vezes. Apenas 6% das crianças são amamentadas exclusivamente até os 2 meses de idade. Metade das crianças nesta faixa etária recebe água, 42% outros líquidos, 23% leite de vaca, 23% fórmulas e 16% alimentos sólidos ou semi-sólidos(2). Como na maioria dos países em desenvolvimento, as mulheres brasileiras residentes em áreas rurais e as provenientes de classes menos privilegiadas amamentam mais que as mulheres de regiões urbanas e de melhor nível sócio-econômico. Entretanto, em áreas mais desenvolvidas do País, o padrão de amamentação é semelhante ao dos países industrializados, ou seja, as mulheres mais educadas, de melhor nível sócio-econômico, amamentam por mais tempo(3).
A
amamentação, segundo o Interagency Group for Action on Breastfeeding, deve
ser assim definida(4):
— Amamentação
exclusiva: quando a criança recebe apenas leite materno.
— Amamentação
quase exclusiva: quando a criança recebe, além do leite materno, vitaminas,
chás, sucos
e/ou água.
— Amamentação
parcial com predominância de leite materno: quando 80% ou mais da alimentação
da
criança (leite materno mais outros alimentos) é constituída de leite materno.
— Amamentação
parcial com ingestão média de leite materno: quando 20 a 80% da dieta da
criança é
constituída de leite materno.
— Amamentação
parcial com baixa ingestão de leite materno: a dieta da criança é predominan-
temente
constituída de outros alimentos. O leite materno contribui com menos de
20%.
— Amamentação
“residual”: quando o seio é usado primariamente para consolo da criança
e não como
fonte de nutrição. Nesta categoria, a criança suga menos de 15 minutos
por dia ou menos de
2-3 mamadas curtas num período de 24 horas.
Atualmente,
somam-se as evidências epidemiológicas das vantagens do aleitamento materno.
Entre elas, destacam-se:
— Redução
da mortalidade infantil: atribui-se ao aleitamento materno a prevenção
de mais de 6 milhões
de mortes em crianças menores de 12 meses a cada ano, no mundo inteiro.
Acredita-se que
mais 2 milhões de mortes (de um total de 9 milhões) poderiam ser evitadas
se todas as crianças
fossem amamentadas de acordo com as recomendações da OMS(4). Quanto menor
a idade
da criança e maior o período de amamentação, mais importante é a contribuição
do leite materno
para a sua sobrevivência. As crianças de baixo nível sócio-econômico são
as que mais se
beneficiam com o aleitamento materno, sobretudo se for exclusivo. No Rio
Grande do Sul, em um
estudo sobre mortalidade infantil nos municípios de Porto Alegre e Pelotas,
as crianças não amamentadas
tiveram um risco 14,2 e 3,6 vezes maior de morrer por diarréia e doença
respiratória, respectivamente,
quando comparadas com crianças em amamentação exclusiva. O risco foi máximo
nos 2 primeiros meses de vida. Para as crianças alimentadas parcialmente
ao peito, esse risco
foi de 4,2 e 1,6 vezes(5).
— Redução
da morbidade por diarréia: há fortes evidências epidemiológicas da proteção
do leite materno
contra diarréia, sobretudo em crianças de baixo nível sócio-econômico.
A maioria dos estudos
feitos em diversos países mostra esta proteção, que é mais evidente nos
países em desenvolvimento.
É importante ressaltar que o efeito protetor do leite materno contra diarréia
pode
diminuir, ou mesmo desaparecer, quando qualquer líquido ou sólido, incluindo
água e chás, é
adicionado à alimentação da criança(6). Em um estudo caso-controle, as
crianças não amamentadas
tiveram um risco 3,3 vezes maior de desidratar na vigência de diarréia,
sugerindo que
o leite materno tem influência não só no número de episódios de diarréia,
como também na gravidade
dos mesmos(7).
— Redução
da morbidade por infecção respiratória: os resultados de vários estudos
realizados em diferentes
partes do mundo, com diferentes graus de desenvolvimento, sugerem proteção
do leite
materno contra infecções respiratórias. Tal proteção é mais significativa
na amamentação exclusiva
e nos primeiros 6 meses, embora possa perdurar além deste período. Assim
como na diarréia,
a amamentação parece diminuir a gravidade dos episódios de infecção respiratória.
A associação
entre aleitamento materno e menor número de episódios de otite média já
está bem estabelecida.
— Redução
de hospitalizações: vários investigadores encontraram associação entre
aleitamento artificial
e maior risco de hospitalização. Provavelmente este achado se deve à proteção
do leite materno
em si, que diminui a incidência e a gravidade das doenças, e também à indicação
mais restrita
de internações em crianças amamentadas, pela dificuldade de separação da
dupla mãe-bebê.
— Redução
de alergias: a alergia alimentar tem sido encontrada com menos freqüência
em crianças amamentadas
exclusivamente. A dermatite atópica pode ter o seu início retardado com
a alimentação
natural.
— Redução
de doenças crônicas: embora ainda não esteja bem estabelecida a proteção
do leite materno
contra certas doenças crônicas, começam a aparecer relatos na literatura
sobre o papel do
aleitamento materno na redução do risco de certas doenças auto-imunes,
doença celíaca, doença
de Crohn, colite ulcerativa, diabetes mellitus e linfoma.
— Melhor
nutrição: por ser da mesma espécie, o leite materno contém todos os nutrientes
essenciais
para o crescimento e o desenvolvimento ótimos da criança pequena, além
de ser
melhor digerido, quando comparado com leites artificiais.
— Melhor
desenvolvimento: alguns estudos mostram vantagem das crianças amamentadas
quanto ao
desenvolvimento neurológico (melhor desempenho em testes de inteligência
e compreensão, melhor
expressão verbal). No entanto, é difícil avaliar a contribuição de outros
fatores como relação
mãe-filho, características maternas e ambiente familiar. Um estudo recente
sugere que o leite
materno, por si só, possa influenciar positivamente na inteligência dos
indivíduos(8).
— Proteção
contra câncer de mama: em geral, os estudos prospectivos mostram associações
fracas ou
não significativas entre amamentação e câncer de mama, enquanto que os
estudos de caso-controle
tendem a evidenciar um fator de proteção do aleitamento materno contra
este tipo de
câncer. À luz dos conhecimentos atuais, é razoável afirmar que: a) o aleitamento
materno não previne
o câncer de mama, embora alguns estudos sugiram um papel protetor; b) para
as mulheres
em risco de desenvolver câncer de mama, a amamentação prolongada pode,
no mínimo, retardar
a sua ocorrência; c) quanto mais uma mulher amamentar, menor será a sua
chance de vir a
desenvolver câncer de mama antes da menopausa e d) depois da menopausa,
não há diferença quanto
à incidência de câncer de mama entre as mulheres com diferentes antecedentes
de amamentação(9).
— Mais
econômico: amamentar uma criança ao seio é mais barato que alimentá-la
com leite de vaca ou
fórmulas, mesmo levando em consideração os alimentos extras que a mãe deve
ingerir durante a
lactação. Esta vantagem não pode ser desconsiderada em famílias com dificuldades
financeiras. —
Melhor qualidade de vida: parece óbvio que a qualidade de vida das crianças
amamentadas com sucesso
e de suas famílias tendem a ser melhor na medida em que há menos doenças,
menos hospitalizações,
menores gastos e maior prazer.
— Promove
vínculo afetivo entre mãe e filho: o impacto do aleitamento materno no
desenvolvimento
emocional da criança e no relacionamento mãe-filho a longo prazo é difícil
de avaliar,
uma vez que existem inúmeras variáveis envolvidas. Empiricamente, acredita-se
que o ato de
amamentar traga benefícios psicológicos para a criança e para a mãe. O
ato de amamentar e de ser
amamentado pode ser muito prazeroso para a mãe e para a criança, o que
favorece uma ligação
afetiva mais forte entre elas. É uma oportunidade ímpar de intimidade,
de troca de afeto, gerando
sentimentos de segurança e de proteção na criança e de autoconfiança e
de realização na
mulher.
— Proteje
contra novas gravidezes: no nível populacional, mulheres que amamentam
apresentam períodos
de amenorréia, de anovulação e de infecundidade mais prolongados, resultando
em intervalos
intergestacionais maiores e em taxas de crescimento populacional menores.
Na América
Latina, a lactação reduz a fertilidade em 16%, em média(10). Sabe-se que
a amenorréia devido
à lactação depende da freqüência e da duração das mamadas, o que pode variar
significativamente,
dependendo dos hábitos do desmame nas diferentes regiões. Em 1988, um grupo
de peritos se reuniu na Itália, chegando ao consenso de que as mulheres
amenorréicas, amamentando
exclusiva ou predominantemente até os 6 meses após o parto têm 98% de proteção
contra
nova gravidez(11).
As
mamas das mulheres adultas são formadas pelo parênquima e pelo estroma
mamários. O parênquima inclui de 15 a 25 lobos mamários (glândulas túbulo-alveolares),
que são subdivididos, cada um, em 20 a 40 lóbulos. Cada lóbulo, por sua
vez, se subdivide em 10 a 100 alvéolos, local onde o leite é produzido.
A secreção
láctea é excretada por intermédio de uma rede de ductos que vão convergindo,
até formarem os seios lactíferos, local onde o leite é armazenado para
consumo da criança. Para cada lobo mamário há um seio lactífero, com uma
saída independente no mamilo. Portanto, existem de 15 a 25 orifícios de
saída de leite no mamilo. Envolvendo os lobos mamários, encontram-se tecido
adiposo, tecido conjuntivo, vasos sangüíneos, tecido nervoso e tecido linfático.
Já
no início da gravidez, o tecido mamário se desenvolve sob a ação de diferentes
hormônios. O estrogênio é responsável pela ramificação dos ductos e o progestogênio,
pela formação dos lóbulos. Lactogênio placentário, prolactina e gonadotrofina
coriônica contribuem para a aceleração do crescimento mamário. A secreção
de prolactina aumenta de 10 a 20 vezes na gravidez. No entanto, a prolactina
é inibida pelo lactogênio placentário, não permitindo que a mama secrete
leite durante a gravidez.
Com o nascimento
da criança e a expulsão da placenta, a mama passa a produzir leite sob
a ação da prolactina. A ocitocina age na contração das células mioepiteliais
que envolvem os alvéolos, provocando a saída do leite. A prolactina e a
ocitocina são reguladas por dois importantes reflexos maternos: o da produção
do leite (prolactina) e o da ejeção do leite (ocitocina). Tais reflexos
são ativados pela estimulação dos mamilos, sobretudo pela sucção. O reflexo
de ejeção do leite também responde a estímulos condicionados, tais como
visão, cheiro e choro da criança, e a fatores de ordem emocional como motivação,
autoconfiança e tranqüilidade. Por outro lado, a dor, o desconforto, o
estresse, a ansiedade, o medo e a falta de autoconfiança podem inibir o
reflexo de ejeção do leite, prejudicando a lactação.
O leite
é produzido nos alvéolos, em células epiteliais altamente diferenciadas.
A maioria do leite é produzido durante a mamada, sob o estímulo da prolactina.
A secreção de leite aumenta de 50mL no segundo dia pós-parto para 500mL
no quarto dia, em média. O volume de leite produzido na lactação já estabelecida
varia de acordo com a demanda da criança. Em média, é de 850mL por dia
na amamentação exclusiva.
O leite dito “maduro” só é secretado por volta do 10º dia pós-parto. O colostro, produzido nos primeiros dias, contém mais proteínas e menos gorduras e lactose que o leite maduro. É rico em imunoglobulinas, em especial IgA. A Tabela 1 apresenta os principais componentes do leite materno maduro e do colostro, bem como do leite de mães de recém- nascidos pré-termo, cuja composição é diferente do leite de mães de bebês a termo. O Quadro 1 lista os fatores anti-infectivos encontrados no leite.
Tabela 1. Composição do colostro, do leite materno
maduro e do leite de mães de crianças pré-termo
Nutriente Colostro
Leite
maduro Leite
de mães
(1-5
dias) (>30dias)
de crianças
pré-termo
(15 dias)
Calorias (Kcal) 58
70
67
Carboidratos (g) 5,3
7,3
6,4
Proteínas (g) 2,3
0,9
1,9
Gorduras (g) 2,9
4,2
3,8
Cálcio (mg) 23
28
28
Fósforo (mg) 14
15
15
Magnésio (mg) 3,4
3,0
3,0
Sódio (mg) 48
15
32
Potássio (mg)
74 58
69
Cloro (mg) 91
40
54
Ferro (mg) 0,08
0,08
0,1
Zinco (mcg) 540
166
375
Cobre (mcg) 46
35
52
Vitamina A (mcg) 89
47
13
Vitamina C (mg) 4,4
4,0
4,2
Vitamina D (mcg) —
0,04
0,05
Vitamina K (mcg) 0,23
0,21
1,5
Tiamina (mcg) 15
16
16
Riboflavina (mcg) 25
35 36
Niacina (mcg) 75
200
147
Vitamina B6 (mcg) 12
28
10
Vitamina B12 (ng) 200
26
Ácido fólico (mcg) —
5,2
5,2
Ácido pantotênico (mg) 183
225
184
Fonte: Riordan e Auerbach.
Estudos
realizados em diferentes países industrializados mostram que, em geral,
o crescimento das crianças amamentadas ao seio e das alimentadas artificialmente
é semelhante nos 2 a 3 primeiros meses de vida, passando, a partir de então,
a ser mais lento no grupo de crianças amamentadas ao seio (para maiores
detalhes, ver o Capítulo “Vigilância do Estado Nutricional da Criança”).
Em países
em desenvolvimento, as crianças amamentadas ao seio têm, em geral, um melhor
estado nutricional nos primeiros 6 meses de vida, quando comparadas com
as alimentadas artificialmente. Vários estudos demonstram que, nestes países,
a amamentação exclusiva ou quase exclusiva no primeiro semestre garante
um crescimento adequado (mesmo às de baixo nível sócio-econômico), semelhante
ao de crianças amamentadas nos países industrializados. No entanto, é comum
que as crianças amamentadas no peito em países pobres mostrem um crescimento
insuficiente a partir dos 3 meses de idade. Acredita-se que outros fatores,
além da amamentação, estejam envolvidos neste atraso de cresci-
mento, como baixo peso de nascimento, introdução precoce de alimentos
de baixo valor nutritivo na dieta da criança e uma maior exposição a infecções.
Há uma controvérsia quanto ao impacto da amamentação prolongada (mais de
1 ano) no estado nutricional da criança. De 13 estudos selecionados, 8
encontraram uma associação negativa entre aleitamento materno prolongado
e ganho de peso, 2 mostraram uma relação positiva e 3 obtiveram resultados
neutros(12). A associação entre aleitamento materno prolongado e estado
nutricional parece não ser uniforme, variando entre as populações. As crianças
de baixo nível sócio-econômico tendem a apresentar um melhor estado nutricional
quando amamentadas por um período maior, ocorrendo o inverso em crianças
mais privilegiadas. Mesmo ue a associação entre desnutrição e amamentação
prolongada se confirme, a proteção que o leite materno confere contra infecções
justificaria esta prática, sobretudo nas camadas mais pobres.
Quadro 1. Propriedades imunológicas do leite materno
Fator Imunidade
in vitro contra
IgA secretória Bactérias:
E. coli, C. tetani, C. diphtheriae, K. pneumoniae, Salmonella, Shiguella,
Streptococus, S. mutans, S. sanguis, S. mitis, S. salivarius, S.
pneumoniae, C. burnetti, H. influenzae, enterotoxina do E. coli e do V.
cholerae
Vírus:
poliovírus tipos 1, 2 e 3, coxsackie tipos A9, B3 e B5, ecovírus tipos
6 e 9, Semliki Forest, Ross River, rotavírus, citomegalovírus, retrovírus
tipo A3, vírus da rubéola e da caxumba, herpes simples, influenza,
vírus respiratório sincicial
Parasitas:
G. lamblia, E. histolytica, S. mansoni, Cryptosporidium
IgM, IgG Bactérias:
V. cholerae, E. coli Vírus: vírus da rubéola, citomegalovírus e
vírus respiratório sincicial
IgD Bactérias:
E. coli
Fator bífidus Bactérias:
enterobactérias
Fatores de ligação de proteínas Bactérias:
E. coli
(zinco, vitamina B12, folatos)
Complemento C1-C9 Efeito
desconhecido
Lactoferrina Bactérias:
E. coli
Lactoperoxidase Bactérias:
Streptococcus, Pseudomonas, E. coli, S. thyphimurium
Lisozima Bactérias:
E. coli, Salmonella, Micrococcus lysodeikticus
Fatores não identificados Bactérias:
S. aureus, toxina do C. difficile Parasitas: T. rhodesiense
Carboidrato Bactérias:
Enterotoxina da E. coli
Lipídios Bactérias:
S. aureus Vírus: herpes simples, Semliki Forest, influenza, dengue,
Ross River, vírus da encefalite japonesa B, Sindbis, West Nile
Parasitas: G. lamblia, E. histolytica, T. vaginalis
Gangliosídios Bactérias:
enterotoxinas da E. coli e do V. cholerae
Glicoproteínas + oligossacarídios Bactérias:
V. cholerae
Análogos de receptores Bactérias:
S. pneumoniae, H. influenzae
de células epiteliais
(oligossacarídios)
Células (macrófagos, neutrófilos,
Bactérias: E. coli, S. aureus, S. enteritidis
linfócitos B e T) Fungos:
C. albicans
Vírus:
herpes simples, citomegalovírus, vírus da rebéola, da caxumba, do
sarampo, vírus respiratório sincicial
Macromoléculas (não Vírus:
herpes simples, vírus da estomatite vesicular, coxsackie tipo B4, imunoglobulinas)
Semlike
Forest, retrovírus tipo 3, poliovírus tipo 2, citomegalovírus, vírus
respiratório sincicial, rotavírus
Alfa-2-macroglobulina Vírus:
influenza, parainfluenza
Ribonuclease Vírus:
vírus da leucemia
Inibidores da hemaglutinina Vírus:
influenza e vírus da caxumba
Fonte: Adaptado de Riordan e Auerbach.
QUANDO
NÃO AMAMENTAR
Cabe
à mãe a opção de amamentar ou não uma criança. Porém, é dever do profissional
de saúde informá-la quanto às vantagens da amamentação e às desvantagens
da introdução precoce de leites artificiais. Muitas mulheres, embora biologicamene
aptas para a lactação, não conseguem amamentar os seus filhos por diversas
razões, conscientes ou inconscientes. Em tais casos, o médico deve evitar
julgamentos e ajudar essas mães a diminuir o sentimento de culpa que com
freqüência acompanha as mulheres que não amamentam.
Há
poucas contra-indicações à amamentação. A galactosemia e a fenilcetonúria,
doenças metabólicas raras, são exemplos de contra-indicação formal ao aleitamento
materno.
Outras
situações em que não se recomenda o aleitamento natural são: doença mental
severa da mãe, colocando em risco a vida da criança, doenças graves que
debilitem a mãe, uso de drogas que contra-indiquem a amamentação e infeção
materna pelo HIV em áreas onde a desnutrição e as doenças infecciosas não
são a principal causa de mortalidade infantil.
Muito
embora algumas doenças sejam passíveis de transmissão pelo leite materno,
na maioria das vezes a amamentação é permitida na vigência de infecção
materna. O Capítulo “Doenças Transmissíveis: Condutas Preventivas na Comunidade”
discute as condutas quanto à amamentação de crianças cujas mães são portadoras
de gonorréia, sífilis, tuberculose, citomegalovírus, herpes simples, sarampo,
rubéola, varicela, cachumba e hepatite B.
A
mastite, por si só, não contra-indica a amamentação. Em casos de abscesso
mamário, pode ser necessária a suspensão temporária da amamentação no seio
afetado.
Aleitamento
Materno em Mães HIV-Positivas
Ainda
não está bem-estabelecido o papel do leite materno na transmissão da Síndrome
da Imunodeficiência Adquirida (AIDS).
O
HIV foi isolado no leite materno, antes mesmo do primeiro relato de criança
contaminada pelo HIV via (provável) leite materno, em 1985.
Um
dos estudos mais importantes sobre a transmissão do HIV pelo leite materno
é o estudo multicêntrico europeu, envolvendo, até 1991, 721 crianças de
mães HIV-positivas de 19 centros em 7 países, com um acompanhamento mínimo
de 18 meses. Neste estudo, a transmissão vertical do vírus foi de 14% nas
crianças não amamentadas e de 31% nas amamentadas. O risco de adquirir
o vírus foi 2,25 vezes maior entre as crianças amamentadas. Não houve associação
com a duração da amamentação. Deve-se ressaltar que o pequeno número de
crianças alimentadas ao seio (apenas 36) limita as conclusões deste estudo.
Atualmente,
as mães HIV-positivas são desaconselhadas a amamentar, exceto em locais
onde a prevalência de doenças infecciosas e de desnutrição é elevada, contribuindo
para uma mortalidade infantil alta.
Amamentação
e Uso de Drogas
Como
regra geral, deve-se recomendar à mãe que está amamentando evitar ao máximo
os medicamentos, porque muitos deles podem ser excretados no leite em quantidades
suficientes para causar efeitos (muitos ainda não bem estudados) no lactente.
No entanto, poucas drogas são comprovadamente contra-indicadas na lactação.
Segundo o Comitê de Drogas da Academia Americana de Pediatria, as drogas
contra-indicadas durante a amamentação são: anfetamina, bromocriptina,
cocaína, ciclofosfamida, ciclosporina, doxorubicina, ergotamina, fenciclidina,
fenindiona, heroína, lítio, maconha, metrotexate e nicotina(13). O uso
de substâncias radioativas para exames diagnósticos requer a cessação temporária
da amamentação.
A
maioria das drogas já estudadas é usualmente compatível com a amamentação,
embora possa exercer efeitos colaterais nas crianças amamentadas, não suficientemente
importantes a ponto de orientar a suspensão da amamentação.
Antes
de prescrever a uma nutriz qualquer droga cujo efeito para o lactente seja
desconhecido do médico, ou antes de recomendar a suspensão da amamentação
por uso dessas drogas pela mãe, o médico deve consultar uma tabela de drogas
na amamentação e calcular os riscos e os benefícios para a mãe e a criança.
É importante lembrar que, para a maioria dos medicamentos, o efeito das
drogas na criança é minimizado se a ingestão for feita logo após a amamentação.
A
maioria das gestantes recebe assistência pré-natal. O médico, nesta oportunidade,
deve conversar com elas sobre os seus planos quanto à alimentação do futuro
bebê. A promoção do aleitamento materno deve fazer parte da rotina do atendimento
pré-natal. Neste contexto, cabe ao médico no acompanhamento pré-natal:
—
Examinar as mamas de todas as gestantes, a fim de diagnosticar precocemente
algum problema mamário
que possa interferir com a amamentação, como por exemplo mamilos planos
ou invertidos
e cirurgias plásticas.
—
Discutir as vantagens do aleitamento materno e as desvantagens da introdução
precoce de leites artificiais.
—
Explicar à gestante a fisiologia da lactação, enfatizando que a manutenção
da produção do leite depende
do estímulo da sucção dos mamilos.
—
Alertar para as dificuldades que poderão surgir e ensinar a preveni-las
ou a superá-las.
—
Desfazer certos tabus, explicando às gestantes que todas as mulheres, salvo
raras exceções, têm condições
de amamentar, que não existe “leite fraco” e que a produção do leite independe
do tamanho
da mama. As mulheres que vão ter o primeiro filho e as que não amamentaram
ou apresentaram
dificuldades na amamentação de filhos anteriores devem receber atenção
especial.
Contrário
ao ditado popular, o aleitamento materno não é um ato puramente instintivo.
É uma arte feminina transmitida de geração a geração. Em função das mudanças
sociais e da migração para áreas urbanas, muitas mulheres se viram privadas
do apoio e dos conhecimentos das mulheres da família que já amamentaram
e que tradicionalmente transmitiam a sua experiência, ajudando as novas
mães. Por isso, todas as mães que amamentam, especialmente as que o fazem
pela primeira vez e as que amamentaram por pouco tempo filhos anteriores,
devem ser orientadas e ajudadas.
Recomenda-se
que as mães amamentem os seus filhos imediatamente após o parto se as suas
condições e as da criança o permitirem. O alojamento conjunto deve ser
instalado o mais cedo possível. A amamentação deve ser em regime de livre
demanda, ou seja, sem horários pre-estabelecidos.
O
uso de mamadeira, especialmente no início da amamentação, além de confundir
o reflexo de sucção do recém-nascido, pode retardar o estabelecimento da
lactação.
A
Técnica da Amamentação
Uma
boa técnica de amamentação é indispensável para o seu sucesso, uma vez
que previne trauma nos mamilos e garante a retirada efetiva do leite pela
criança. O bebê deve ser amamentado numa posição que seja confortável para
ele e para a mãe, que não interfira com a sua capacidade de abocanhar o
tecido mamário suficiente, de retirar o leite efetivamente, assim como
de deglutir e respirar livremente. A mãe deve estar relaxada e segurar
o bebê completamente voltado para si. Estudos com cinerradiografias e ultra-som
mostram que é importante a criança abocanhar cerca de 2cm do tecido mamário
além do mamilo para que a amamentação seja eficiente. A criança que não
abocanha uma porção adequada da aréola tende a causar trauma nos mamilos
e pode não ganhar peso adequadamente, apesar de permanecer longo tempo
no peito. As mamadas ineficazes dificultam a manutenção da produção adequada
de leite e uma má estimulação do mamilo pode diminuir o reflexo de ejeção.
Muitas vezes, o bebê com pega incorreta é capaz de obter o chamado leite
anterior, mas tem dificuldade de retirar o leite posterior, mais nutritivo
e rico em gorduras. Numa pega ótima, os lábios do bebê ficam levemente
voltados para fora. Lábios apertados são indicação de que ele não conseguiu
pegar tecido suficiente. É importante enfatizar que quando a criança é
amamentada numa posição correta e tem uma pega boa, a mãe não sente dor.
O Quadro 2 pode servir de guia para os profissionais de saúde e para as
mães conferirem posicionamento e pega na amamentação.
Quando
a mama está muito cheia ou ingurgitada, o bebê não consegue abocanhar adequadamente
a aréola. Em tais casos, recomenda-se, antes da mamada, a expressão manual
da aréola ingurgitada.
Prevenção
de Fissuras
As
fissuras de mamilo são muito comuns e bastante dolorosas, podendo culminar
com a interrupção da amamentação. Todas as mulheres que amamentam devem
ser orientadas quanto à sua prevenção, que consiste de:
— Técnica
correta de amamentação.
— Manter
os mamilos sempre secos, usando secador de cabelo após as mamadas, banho
de sol ou banho
de luz.
— Introduzir
o dedo na boca do recém-nascido quando houver necessidade de interromper
a mamada.
— Evitar
o ingurgitamento mamário por meio de mamadas freqüentes e expressão manual
(ou por bomba
de sucção) das mamas, quando necessário.
Quadro 2. Lista para conferir posicionamento e
pega na amamentação
1. Roupas da mãe e do
bebê adequadas, sem restringir movimentos.
2. Mãe confortavelmente posicionada, bem apoiada,
não curvada para trás nem para frente.
3. Corpo do bebê todo voltado para a mãe. O
apoio do bebê deve ser feito nos ombros e não na cabeça, que
deve permanecer livre para inclinar-se para trás.
4. Braço inferior do bebê ao redor da cintura
da mãe, corpo fletido sobre ela, quadris firmes, pescoço levemente
estendido.
5. Bebê no mesmo nível da mama, sustentada
por fralda se necessário, boca centrada em frente ao mamilo.
6. Comprimir a mama suavemente enquanto o bebê
abocanha, entre polegar e indicador, atrás da aréola, não
entre indicador e dedo médio.
7. Encorajar abertura grande da boca, língua
bem abaixada, estimulando o lábio inferior com o mamilo; repetir
até conseguir boa abertura da boca.
8. Levar o bebê ao peito, não o peito ao bebê;
tórax com tórax.
9. O bebê deve abocanhar boa porção da mama
além do mamilo.
10. Checar se o queixo está bem de encontro à mama.
11. O bebê mantém a boca ampla colada na mama, lábios não
apertados.
12. Lábios do bebê curvados para fora, não enrolados criando
um lacre.
13. Língua do bebê sobre a gengiva inferior, algumas vezes
visível. Checar voltando-se suavemente o lábio
inferior para baixo.
14. O bebê deve manter-se fixado sem escorregar ou largar
o mamilo.
15. A mama não deve parecer esticada ou deformada.
16. Freqüência rápida de sucção (>2 por segundo), caindo
para cerca de 1 por segundo, pois o volume de
leite por sucção aumenta após o reflexo de ejeção; pausas ocasionais; maior
irregularidade no final
da mamada.
17. Bochechas do bebê não se encovam a cada sucção; não
deve haver ruídos da língua; a deglutição, entretanto,
pode ser barulhenta.
18. Bebê mamando ativamente trabalha pesadamente; mandíbulas
e freqüentemente toda a cabeça se move;
orelhas podem se mexer.
19. Logo depois que o bebê larga a mama, o mamilo parecerá
alongado; o trauma é indicado por mamilo com
estrias vermelhas ou áreas esbranquiçadas ou achatadas.
20. Amamentação com posicionamento e pega bons não dói.
Fonte: Material distribuído no Curso de Treinamento
em Amamantação Para Equipes Multidisciplinares de Saúde. Centro de Lactação
de Santos, São Paulo.
Idealmente,
todas as mães que saem da maternidade amamentando deveriam ter acesso à
assistência, a qualquer hora, em casos de dúvidas e dificuldades relacionadas
ao aleitamento materno.
Ao
sair da maternidade, as mães devem ser orientadas a comparecer com o recém-nascido
para reavaliação médica quando este tiver não mais do que 7 a 10 dias,
pois é nos primeiros dias, em casa, que surgem problemas e dúvidas que
podem dificultar a amamentação. Em todas as visitas de reavaliação é importante
que o profissional de saúde promova e proteja a amamentação e oriente o
desmame na época oportuna (ver o Capítulo “Alimentação do Lactente: Desmame”).
A complementação do leite materno com água ou chás nos primeiros 6 meses
de vida é desnecessária sob o ponto de vista biológico, e pode ser prejudicial,
diminuindo o efeito protetor do leite materno contra diarréias. A Organização
Mundial de Saúde preconiza a amamentação natural e exclusiva como a forma
ideal de alimentação nos primeiros 4-6 meses de vida.
A
saúde física e mental da mãe deve sempre ser checada tanto nas revisões
da mãe como nas da criança. Sabe-se que fatores de ordem emocional como
motivação, autoconfiança e tranqüilidade são fundamentais para uma amamentação
bem sucedida. Por outro lado, a dor, o desconforto, o estresse, a ansiedade,
o medo e a falta de autoconfiança podem inibir o reflexo de ejeção do leite,
prejudicando a lactação.
O Quadro 3 apresenta alguns dos fatores que podem dificultar a amamentação, devendo o profissional de saúde checá-los sempre que a mãe referir ter pouco leite ou se a criança não estiver ganhando peso adequadamente.
Quadro 3. Fatores que podem interferir com o sucesso
da amamentação
1. Má técnica de amamentação
(posicionamento e pega).
2. Suplementação líquida (leite, suco, chás),
saciando a criança, fazendo-a espaçar mais as mamadas, com
conseqüente diminuição da sucção dos mamilos.
3. Uso de chupetas (bico) que podem funcionar
como um substituto para as mamadas freqüentes.
4. Uso de protetores de mamilos, interferindo
nos reflexos produzidos pela sucção.
5. Horários fixos de mamadas, dificultando
o ajuste da produção do leite à demanda da criança.
6. Mamadas infreqüentes, muito curtas ou num
só seio, estimulando pouco os mamilos.
7. Fadiga ou tensão materna, interferindo no
reflexo de descida do leite.
8. Uso de drogas que interferem na produção
do leite (anticocepcionais orais, nicotina em excesso, bromocriptina).
As seguintes
situações são bastante comuns. O médico deve estar preparado para diagnosticá-las
e manejá-las precocemente.
Ingurgitamento
Mamário
O
ingurgitamento mamário é mais comum em primíparas e costuma aparecer no
segundo dia pós-parto. Resulta do aumento da vascularização e congestão
vascular das mamas e do acúmulo de leite. Pode atingir apenas a aréola,
o corpo da mama ou ambos.
Quando
a aréola está ingurgitada, a criança não consegue uma boa pega, o que pode
ser doloroso para a mãe e frustrante para a criança, pois, nestas condições,
há dificuldade para a saída do leite.
No tratamento
do ingurgitamento mamário, são úteis as seguintes medidas:
— Manter
as mamas elevadas; usar sutiã apertado.
— Compressas
frias entre as mamadas pode reduzir a vascularização. Compressas quentes
(ou ducha
de água morna) antes das mamadas facilitam a saída do leite.
— Amamentar
com freqüência. Se necessário, extrair o leite manualmente ou com bomba
de sucção. As
bombas manuais não são eficientes.
— Usar
analgésicos, se necessário.
Hipogalactia
Uma
queixa comum durante a amamentação é “pouco leite”ou “leite fraco”. Essa
queixa, com freqüência, está relacionada à insegurança materna quanto a
sua capacidade de nutrir seu filho, fazendo com que interprete o choro
da criança e as mamadas freqüentes (normal no bebê pequeno) como sinais
de fome. A ansiedade que tal situação gera na mãe e na família pode ser
transmitida à criança, que responde com mais choro. A complementação com
leites artificiais muitas vezes alivia a tensão materna e essa tranqüilidade
vai repercutir no comportamento da criança, que passa a chorar menos, reforçando
a idéia de que ela realmente estava passando fome. É muito comum a seguinte
cadeia de eventos: choro do bebê => ansiedade materna => mais
choro => introdução da mamadeira => menor estimulação dos mamilos
=> menor produção de leite =>mamadas reduzidas =>rejeição
do peito (ou frustração da criança quando vai ao seio) =>interrupção
da amamentação.
O melhor
indicativo da suficiência do leite materno é o ganho ponderal da criança
e o número de micções por dia (no mínimo 6 a 8). Se a produção do leite
parecer insuficiente para a criança, pelo baixo ganho ponderal na ausência
de patologias orgânicas, cabe ao médico conversar com a mãe e tentar determinar
o que está interferindo com a produção do leite. Quase sempre são detectados
um ou mais dos fatores apresentados no Quadro 3.
Se nenhum
desses fatores for detectado e a criança continuar ganhando pouco peso,
a introdução de leite artificial é inevitável. Nesse caso, é importante
orientar a mãe a complementar a mamada ao invés de substituí-la pelo leite
artificial, mantendo assim o estímulo da sucção, indispensável para a produção
do leite.
Além da
sucção dos mamilos, alguns fatores estão relacionados com o aumento dos
níveis séricos de prolactina, tais como o sono e o exercício físico. Estudos
duplo-cegos têm demonstrado que a metoclopramida, na dosagem de 10mg, 3
vezes ao dia, via oral, aumenta os níveis séricos maternos de prolactina,
bem como o volume de leite produzido. Alguns autores tem relatado aumento
da produção de leite em mulheres com hipogalactia quando tratadas com esta
droga por 10 dias, que se mantém após a retirada do medicamento.
Traumas
Mamilares
As
mães devem ser orientadas a procurar assistência médica quando surgirem
traumas dos mamilos. A amamentação não deve ser dolorosa.
Na presença
de queixa de mamilos dolorosos ou fissurados, o clínico deve examinar as
mamas e os mamilos, observar a mamada, checando pega e posicionamento e
fazer as seguintes recomendações:
— Manter
os mamilos sempre secos.
— Após
as mamadas, expressar algumas gotas de leite e passar nos mamilos. Secar
os mamilos com secador
de cabelo (por 2 minutos a uma distância de 15 a 20cm, na temperatura mais
baixa).
— Banhos
de sol ou de luz nas mamas.
— Expressão
manual da aréola antes das mamadas.
— Iniciar
a amamentação pelo lado menos comprometido.
— Variar
o posicionamento do bebê nas mamadas, evitando que ele precione as áreas
traumatizadas.
— O uso
de cremes com vitamina A e D ocasionalmente pode ajudar. Não precisa ser
retirado antes de
a criança mamar. Em casos de fissuras graves, recomenda-se creme com corticóide
após as mamadas,
desde que não haja suspeita de presença de fungos.
— Analgésicos,
se necessário.
— Enfatizar
a prevenção de novas fissuras.
Se o tratamento
não surtir efeito e as fissuras forem suficientemente dolorosas a ponto
de pôr em risco a amamentação, recomenda-se a suspensão da amamentação
no seio mais comprometido por 24 a 48 horas. Em tal situação, deve-se efetuar
o esvaziamento (manual ou com bomba de sução) da mama comprometida, após
cada mamada no outro seio. Após esse período, proceder da mesma forma com
a outra mama.
Mastite
São
as fissuras, na maioria das vezes, a porta de entrada para os germes (especialmente
o Staphylococcus aureus) que provocam a mastite. Tal patologia deve ser
precocemente diagnosticada e tratada. A mastite, em geral, compromete o
estado geral da nutriz, provocando dor local intensa, febre e mal-estar.
A mama apresenta-se com edema, hiperemia e calor no setor comprometido.
O tratamento é conduzido com antibióticos antiestafilocócicos (como, por
exemplo, oxacilina e dicloxacilina) e esvaziamento suave e completo da
mama comprometida, prevenindo, assim, o ingurgitamento e mantendo o suprimento
do leite. A amamentação não deve ser interrompida. Naqueles casos em que
não ocorrer melhora após 48 horas de tratamento, pode estar havendo a formação
de abcesso, que pode ser palpado e identificado pela sensação de flutuação.
Em tais casos está indicada a drenagem cirúrgica e, freqüentemente, a interrupção
temporária da amamentação no seio afetado.
Uma
mãe saudável, bem nutrida, tem mais chances de amamamentar plenamente,
com sucesso. Estima-se que para a produção do leite uma nutriz necessite
ingerir um acréscimo de, no mínimo, 500 calorias e 15g de proteínas por
dia. Isto pode ser conseguido através de uma dieta variada que forneça
todos os nutrientes essenciais. A alimentação ideal de uma nutriz pode
ser inacessível para muitas mães de baixo poder aquisitivo, o que pode
desencorajá-las a amamentar seus filhos. Por isto, é preciso orientar a
alimentação de cada nutriz de acordo com as suas possibilidades econômicas.
Estudos demonstram que mulheres sem alimentação adequada, e mesmo desnutridas,
têm condições de amamentar seus filhos plenamente, pelo menos nos primeiros
meses de vida, devendo, pois, serem encorajadas para tal.
Há muitas
crenças com relação à dieta da mãe durante a amamentação. Cólicas e “assaduras”
são muitas vezes atribuídas a certos alimentos ingeridos pela lactante.
Um dos poucos estudos duplo-cegos testando a associação de determinados
alimentos com sintomas na criança evidenciou uma associação positiva entre
cólicas e ingestão materna de leite de vaca(14). Há autores que sugerem
a retirada, por duas semanas, do leite de vaca e de ovos da dieta de mães
que estejam amamentando crianças com eczema ou sintomas gastrintestinais,
como prova terapêutica(15). Estaria indicada a retirada desses alimentos
da dieta da mãe somente se os sintomas da criança, após uma melhora substancial
com a retirada dos alimentos, piorassem com a reintrodução dos mesmos.
Na
família moderna, nuclear, surge a necessidade de os pais darem apoio psicológico
e assistência às mães. Alguns estudos mostram evidências de que o pai,
atualmente, é uma figura importante para a prática do aleitamento materno.
No entanto, muitos pais não sabem de que maneira podem apoiar as mães,
provavelmente por falta de preparo. Acreditamos que alguns sentimentos
negativos dos pais, comuns após o nascimento de um filho, poderiam ser
aliviados se eles estivessem conscientes da importância do seu papel, não
apenas nos cuidados com o bebê, mas também nos cuidados com a mãe (ver
o Capítulo “Promoção da Saúde Mental da Criança”). Portanto, cabe ao profissinal
de saúde dar atenção ao novo pai e estimulá-lo a participar deste período
vital para a família.
Além dos
pais, os profissionais de saúde devem tentar envolver as pessoas que têm
uma participação importante no dia-a-dia das mães e das crianças, como
avós, parentes, etc.
COMO CONCILIAR AMAMENTAÇÃO E TRABALHO FORA DO LAR
O trabalho materno fora do lar é um obstáculo à amamentação. Apesar disso, as taxas de aleitamento materno entre as mães que trabalham fora do lar mostram que é possível conciliar trabalho e amamentação. Para tanto, as recomendações contidas no Quadro 4 são bastante úteis para as mães que queiram continuar amamentando após retornarem ao trabalho.
Quadro 4. Orientações úteis para as mães que trabalham
fora do lar
Antes do retorno ao trabalho
1. Praticar o aleitamento
materno exclusivo (não oferecer mamadeiras de espécie alguma) para que
a lactação
esteja bem estabelecida.
2. Fazer reconhecimento no local de trabalho
das facilidades para a retirada e armazenamento do leite
(privacidade, geladeira,
horários).
3. Familiarizar a criança com antecedência
(10 a 14 dias) com a pessoa que vai cuidar dela e o alimento que
vai receber na ausência da mãe. A criança tende a aceitar melhor o alimento
se este for inicialmente
oferecido por alguém que não seja a mãe e na metade do dia.
4. Praticar a retirada do leite (manualmente
ou com bomba) e congelar o leite (quando possível) para uso
no futuro.
Após o retorno ao trabalho
5. Amamentar o máximo
número de vezes que puder quando estiver em casa, inclusive à noite.
6. Amamentar logo antes de sair de casa e assim
que chegar.
7. Não alimentar o bebê próximo do horário
de chegada da mãe para que o seio seja esgotado na mamada.
8. Evitar ao máximo o uso de mamadeira no período
em que a mãe estiver fora de casa. Se a criança não for
muito pequena, alimentá-la com papa ou sucos, usando colher ou copinho.
9. Durante as horas do trabalho esgotar o seio
manualmente ou com bomba e guardar o leite na geladeira
por no máximo 24-48 horas. Oferecer o leite à criança na ausência da mãe
ou congelá-lo por até 6
meses. Retiradas freqüentes do leite são mais efetivas do que retiradas
espaçadas.
10. O leite estocado nunca deve ser fervido ou colocado
no micro-ondas. Deixar descongelar naturalmente
e após aquecer em banho-maria.
Fonte: Giugliani(16).
Além da orientação, o profissional de saúde tem o dever de informar às mães os seus direitos legais de nutriz. A legislação brasileira prevê uma dispensa de até 4 meses para a lactação e dois descansos diários de meia hora cada um durante a jornada de trabalho para que a mãe possa amamentar o seu filho, até ele completar 6 meses. Quando não existir creche na empresa, ou ela ficar distante do local de trabalho, o descanso de meia hora terá que ser aumentado, a fim de que a mãe possa sair da empresa para amamentar o seu filho. Nestes casos, a mulher tem o direito de receber indenização pelas despesas que tiver.
Ver o Capítulo “Planejamento Familiar”.
Desmame
é definido como o processo que se inicia com a introdução de alimentos
diferentes do leite materno. Ele deve ser gradual, com início entre 4 e
6 meses de idade. Nas comunidades onde o saneamento é precário, recomenda-se
postergar o desmame, caso a criança esteja se desenvolvendo adequadamente.
Alimentos
complementares não são necessários nem recomendáveis antes dos 4 meses,
idade em que a criança desenvolve o mecanismo de secreção salivar e a capacidade
de mastigação, podendo deglutir alimentos semi-sólidos.
A
partir do 6º mês o aleitamento materno exclusivo pode se tornar inadequado,
uma vez que após essa idade um número crescente de crianças necessita também
de outros nutrientes para manter um crescimento adequado.
A
época da retirada completa do seio depende muito de fatores sociais, econômicos
e culturais. A Organização Mundial de Saúde preconiza o aleitamento materno
exclusivo nos primeiros 4-6 meses de vida e parcial até os 2 anos, especialmente
nas populações de baixa renda, uma vez que o leite materno pode ser uma
importante fonte de calorias e de proteín