Estamos finalmente às portas da virada do século. A velocidade alucinante das mudanças que presenciamos em nossas vidas está nos deixando a todos desnorteados. O futuro chegou e a humanidade hoje dança no olho do furacão de imagens e informações procurando adaptar-se a uma realidade em constante (e rápida) transformação.
É curioso agora olhar para trás, para toda a ficção ambientada por volta do ano 2000. A impressão é que nosso dia-a-dia não mudou tanto como era previsto. A tecnologia, é claro, se desenvolveu, mas não temos portas que se abrem sozinhas por toda parte, nem colônias em outros planetas. Já os progressos no campo das comunicações tiveram mais rápida assimilação no
cotidiano, e sua aceitação na nossa intimidade vem provocando uma revolução nos valores de nossa sociedade. Valorizamos cada vez mais as coisas efêmeras e as aparências, que nos são apresentadas pela mídia como um todo, como um sistema completo e acabado.
Nesse contexto o teatro, ao invés de ser valorizado pela sua efemeridade, está sendo absolutamente desvalorizado em toda parte por ser artesanato numa época dominada pela indústria, por ter como matéria-prima o saber na época da informação ligeira. A horizontalização do pensamento e o desenvolvimento das condições para a reprodução de obras de arte em série são a morte do teatro tal qual conhecemos. Ele carece dos recursos do cinema e do vídeo para transmitir grandes quantidades de informação, o aprofundamento nos assuntos que aborda é uma necessidade; além disso é
absolutamente irreproduzivel sem perda de seu efeito.
A arte dramática nos países onde as comunicações são mais desenvolvidas já se tornou há algum tempo um apêndice da indústria de entretenimento, inclusive no Brasil. No futuro provavelmente assistiremos àquilo que atualmente chamamos teatro nos museus ou bibliotecas, como uma arte datada.
É claro que me refiro ao teatro como o conhecemos nos dias de hoje, e que acredito que vá haver uma real transformação nas características fundamentais da arte do ator nos anos que virão. Essas transformações vão valorizar aquilo que só o teatro possui dentre as outras artes.
Gosto de dizer que só no teatro podemos explorar toda a potencialidade do efeito do contato fisico com uma explosão.
Nenhuma tecnologia vai reproduzir jamais a combinação de estrondo, clarão e deslocamento maciço de ar em um espaço fechado desencadeada por uma explosão indoor. Creio que é uma bela metáfora da vocação revolucionária da arte, pois o teatro é o lugar da revolta, e se tivermos sorte será reinventado nas catacumbas e nas sociedades secretas no próximo milênio.
Flavio Lofego