Crônica de um cotidiano bizarroEle veio de longe. De muito longe. Na verdade, veio de um mundo em outra dimensão. Seu povo havia sido banido da Terra que conhecemos, por não saber controlar as forças místicas que manipulava. Em sua nova dimensão, seus patrícios aprenderam a respeitar essas forças, e mesmo as esqueceram. Começaram a observar seu mundo de uma forma mais objetiva: aprenderam a dividir e a classificar seus fenômenos para estudá-los separadamente. Dentre os expoentes dessa nova visão de mundo, ele se destacava. Sabia, como poucos, reduzir problemas grandes e classificar minúsculos detalhes. Seu nível de abstração do universo chegou a tal ponto que coisas estranhas começaram a lhe acontecer. Foi numa noite de verão. Enquanto estudava minuciosamente um neurônio de rato, ele se viu repentinamente como que jogado para trás. Acordou, na manhã seguinte, com a cabeça dolorida. A última coisa de que se lembrava era de sua assistente vindo trazer o jantar no laboratório. Havia desmaiado. Olhou em volta. O lugar lhe era estranho. Estranhíssimo. Havia, à sua frente, um caminho muito largo. À direita, outro caminho formava, com aquele, uma cruz. Ambos eram esculpidos em um chão de pedra cinza azulada que ele nunca vira. Elevando-se por sobre o caminho, luzes coloridas piscavam aleatoriamente. Muitas pessoas passavam por ali. Elas andavam pelas laterais dos caminhos. Pelo meio, passavam estranhos veículos tripulados. Às vezes, os veículos paravam por algum tempo antes de chegarem ao cruzamento; outras, passavam direto. Intrigado, ele sentou no chão e se pôs a observar. Era, de fato, um cientista. Após algum tempo, aprendeu que haviam três luzes voltadas para cada lado do cruzamento. Mais do que isso, percebeu que cada um desses conjuntos continha uma verde, uma amarela e uma vermelha, que acendiam uma de cada vez, sempre nessa ordem. Uma investigação mais minuciosa o levou a concluir, já pelo meio da tarde que, quando para um dos caminho as luzes verdes estavam acesas, para o outro estavam as vermelhas. Ao cair da noite, descobriu a relação perdida entre as repentinas paradas dos estranhos veículos e o compassado piscar das luzes: os veículos paravam quando, ao se aproximarem do cruzamento, encontravam diante de si uma luz vermelha ou amarela, só voltando a andar quando lhes acendesse a verde, de tal forma que aqueles vindos de um caminho não se chocassem com os vindos do outro. Satisfeito com suas conclusões, continuou a olhar, disposto a confirmar sua teoria. Nesse momento, aproximou-se um veículo. Parou sob a luz vermelha acesa. Seu tripulante virou-se para os dois lados e então avançou o sinal. Nosso cientista, já cansado e agora confuso, levantou-se e foi em busca de comida e de um abrigo para dormir. |
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