Best-seller

Eu queria escrever em inglês. Um livro bem bom, um best-seller, que são os melhores livros que tem. Ia fazer ele bem grosso, com uma capa bem bonita e um monte de prêmios escritos pra impressionar. Se pelo menos eu soubesse as palavras. Eu juntava elas numa ordem que eu saberia e ia escrevendo, uma atrás da outra. Mas não sei inglês. É só o que falta. Talento eu tenho. Tem uma coisa dentro de mim dizendo que um dia vou ser um grande escritor. Só não nessa minha lingua, essa lingua de peão. Peão não lê livro, acha que é bichisse, não tem cultura. Se for pra escrever, tem que ser pros engravatados que a gente vê nos filmes. Esses que andam de metrô e têm telefone celular. Pra esses é que vale a pena. Porque o cara tá lá no trem, lendo. Quando vê que o livro é bom, já liga dali mesmo pro amigo e manda ele comprar. É assim que se vende. Escritor tem que saber fazer negócio. Se não vira que nem o poeta que conheci outro dia no bar. Fudido que nem eu. Também, escrevendo em brasileiro, quem lê? Já viu bóia-fria no pau-de-arara cheio de pompa com livro na mão? Já vi com enxada. Livro nunca. A não ser que a poesia fosse escrita no cabo da foice. Mas acho que daí já não é mais poesia. Sei lá, poesia eu não gosto. Pra ser poeta tem que ser meio nobre. Que nem o príncipe Charles. Ele sim, podia ser poeta. Não sei nem se não é. Agora, eu? Tô mais pra livro de sacanagem. Aliás, ouvi dizer que esses best-sellers tão cheios de pouca vergonha. Rico gosta dum fuqui-fuqui. Eles ficam sem jeito de comprar as revistinhas, então pôe nos livros, pra disfarçar. Por isso acho que um pobre, escritor, ia se dar bem. Pobre entende de fuder. Faz isso o tempo inteiro. Eu não consigo mulher porque sou feio. Mas leio nas revistas, daí fico sabendo. Se eu contasse pros ricos tudo o que sei, eles iam ficar de boca aberta. Pensando bem, acho melhor não virar escritor mesmo. Eu ia me empolgar e escrever coisas que as grã-finas iam ficar chocadas e pedir pro meu patrão me despedir. Deus me livre.