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Trocados



sobre o autor

Veio um menino me pedir esmola. Mandei pastar. Eles estão cada vez mais abusados. Imagine que esse teve a cara-de-pau de dizer que era melhor eu dar um trocado porque assim pelo menos ele não tava roubando nem matando. Falei que por mim ele podia morrer de fome que eu não ligava, e se quisesse sair por aí matando era até melhor, menos gente no mundo. Ele me olhou com os olhos furiosos e foi pra junto de um grupo de outros pivetes falando alguma coisa. Achei melhor ir embora

Outro dia encontrei o mesmo garoto e ele não me reconheceu. Pra ele eu devia ser só mais um dos milhares que dizem desaforos todos os dias. Me pediu um trocado e dessa vez dei. Não ia me fazer falta e eu tava precisando de alguma coisa que me fizesse sentir útil. Precisava ajudar alguém. Só que dei o dinheiro pro garoto e não senti nada. Um pouco mais na frente uma garotinha, que devia ser da mesma gangue, veio pedir também. Pra ser justo tinha que dar, afinal por que pra um e não pra outra? Mas logo vi que se continuasse nesse raciocínio eu ia acabar sem dinheiro nenhum. E se era esse o preço pra me sentir melhor, era caro demais e eu não podia pagar.

Foi aí que vi um cartaz anunciando Hamlet no cinema. Pensei que um pouco de cultura não ia me fazer mal. É isso que os ricaços fazem pra não pensar nas pessoas que exploram: lêem, aprendem francês, jogam gamão, colecionam quadros. Isso deve funcionar, afinal eles são ricos há tanto tempo e ainda não desistiram.




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