sábado 9.9.2000
3:09 10-09-2000
Chego ao Forte do Bom Sucesso às 9h da matina. Sem desjejum. O forte não consta em nenhum dos três guias que consulto (Lonely Planet, DK e uma edição limitada feita pel PT-Brasil). Fico sem maiores informações. Em frente ao forte há um monumento de 1993 aos combatentes portugueses ultra-mar, com um espelho d'água e um paredão, ao fundo, que lista os nomes das baixas, por ano.
Andando pela margem, rio acima, chega-se à Torre de Belém, a visita principal dessa manhã. A construção manuelina mistura vários estilos, diz-se, por causa das conquistas e invasões. Será quem vem daí nossa esculhambação? Nah, a torre, construída de 1515 a 1521 é muito bonita, tem detalhes inacreditáveis para uma estação avançada de batalha (que nunca entrou em confronto real, diz Saramago). Uma pintura que vi no guia da DK mostra a torre bem afastada da margem (não se vê, na pintura, a margem). Essa área toda das docas é um aterro, ao que parece, do século XIX.
Quando chego, a maré está baixa e o nível do rio me permite andar em volta da torre numa área de pedra cheia de limo onde poucos turistas se arriscam ir, ladeada por uma muretinha que será engolida pelas águas em algumas horas. Daqui dá para fotografar alguns detalhes que não sairiam à distância, como o rinoceronte saíndo debaixo de um dos postos de sentinela.
Como a torre só abre para visitação às 10h, fiquei por ali, andando e fotografando detalhes , procurando curiosidades e novos ângulos. Com a minha sorte habitual, o céu estava encoberto justo no dia da visita à Torre de Belém. Mas não, não choveu (I'm not that lucky).
Nesse dia, em frente à torre, estava havendo uma convenção de «carochas» (fusquinhas), e lá se vão mais algumas poses. Essa câmera digital foi minha perdição
Dei umas voltas pela área que circunda a torre, onde se encontra esta réplica de um avião usada para a travessia do Atlântico. Não sei quando, não sei por quem. A placa que fotografei (em vez de anotar os dados) ficou ilegível e eu não vou voltar lá só por causa disso. Desculpem o mau-jeito. Ah, aí vai uma foto para aqueles que me acusam de mostrar só o lado bom de Lisboa.
Chego à torre pouco antes de abrir, mas com tempo de bater umas fotos de detalhes da entrada. Cercam a porta, depois da ponte levadiça, dragões carcomidos e serpentes marinhas. Pena vocês não poderem tocar a pedra
Paga-se 600$00 de admissão e entra-se na torre por um salão com janelas em frente as quais estão os canhões a vigiar o Tejo. O salão é amplo e tem aberturas no teto e no chão, para iluminação vinda da área aberta do terceiro piso e para o calabouço, respectivamente.
Os detalhes da torre são muitos, já disse, mas o átrio central desse salão tem 20 coluninhas, e cada uma tem um detalhe diferente.
Com sete pavimentos, a Torre (cujo nome oficial é, ou era, Torre de São Vicente) já serviu de prisão, no nível mais inferior, que fica abaixo da água (durante a maré alta). Esse pavimento estava fechado quando fui lá. E escuro. Esqueci de ligar o flash e as fotos não saíram, nenhuma ao menos que prestasse.
Subo para mais uma volta no pavimento principal e vou pelo lance de escadas até o piso aberto, onde ficam a Nossa Senhora da Volta Segura (com Jesus no colo), postos de sentinela, a mureta cercando a abertura para o nível principal com suas gárgulas e a roda que servia para levantar a ponte. Daqui pode-se admirar a face voltada para o rio, com o balcão e o escudo com o brasão de Manuel I. Dá pra ver o Padrão dos Descobrimentos daqui, a próxima parada.
Subindo mais um nível, vou até uma sala com algo parecido com uma privada, ou pia, ou sei lá o que e umas passagens estreitas em dois dos cantos da sala, que dão para os postos de sentinela. É difícil imaginar alguém muito alto, com cota de malha e armas, passando por ali.
Mais um lance de escada e vou parar no que o guia da DK chama de Governor's Room, com direito a lareira e uma sacada comprida de onde se vê o pavilhão aberto onde eu estava. A sacada é muito bonita e tem uma vista «muita giro». Em cada uma das três outras paredes há sacadas menores, dando mesmo uma pinta de quarto principal.
Mais um lance da escadinha em espiral para chegar a um pavimento parecido, só que sem as sacadas, mas também provido de lareira. Aliás, lareiras são comuns por aqui, só quero ver se faz frio pra isso tudo. Ah, quando estiver aqui, lembre-se de olhar para cima.
Dali, um último lance de escadas para o topo da torre, ponto de visão privilegiada, mas sem maiores atrativos.
Saindo da torre, sigo Tejo acima para comer os pastéis de Belém. A placa me arranca um sorriso, o que não posso dizer do atendente da primeira barraca, quase estúpido, dizendo que acabou o pastel. A menina da barraca em frente é muito mais simpática (além de ser bonitinha), mas é a mãe dela que me explica que os pastéis de Belém são realmente apenas pastéis de nata, mas que a receita data de sei-lá-quantos anos. Ou seja, embuste para turistas. Oh, não me leve a mal. São deliciosos, mas as boas pastelarias servem pastéis de nata tão bons quanto. Vale pela tradição de vir até a torre e comê-los. Pago 300$00 por um pastel e um café expresso.
Pego o carro para deixá-lo entre o Museu de Arte Popular e o Padrão dos Descobrimentos. O horário de funcionamento do museu é das 10h às 12h30 e das 14h às 17h. Por causa da reforma, a maioria das salas está fechada. Pergunto à senhora da recepção se vai demorar a mesma: «Vão durar bastante», «Bastante
Meses?», «Anos, talvez.» Ela ri-se do meu olhar de espanto e eu vou dar uma volta no prédio. Já são horas de fechar e eu volto depois. Vou primeiro ao Padrão dos Descobrimentos.
O tal do Padrão dos Descobrimentos é um prédio em forma de proa de caravela, ladeado por esculturas gigantes de figuras históricas portuguesas. Foi mandado erguer por Salazar, em 1960, comemorando o quinto centenário da morte de Dom Henrique, o Navegador.
Paga-se 350$00 para entrar. Não há muito o que se ver aqui O prédio é um centro cultural meio que desprezado pelos portugueses por ser um monumento 1) novo, 2) com origem no regime ditatorial. Mas a turistada adora, o lugar fica chapado.
Pega-se um elevador que vai até o sexto andar e daí uns doze lances de escada até o topo do prédio e uma vista boa. Seria melhor num dia de menos nevoeiro, mas eu volto, podeixar.
Daqui se vê bem a área das docas, a Torre de Belém, o Centro Cultural de Belém, a Praça do Império em frente ao Museu Nacional de Arqueologia, o Mosteiro dos Jerônimos e um prédio que creio ser o Palácio Nacional da Ajuda. E a praça da frente, em sua totalidade, com a rosa dos ventos doada pela África do Sul quando ainda vivia o regime do apartheid. Realmente é um monumento de origens questionáveis.
Ao descer tenho mais uma prova que português não respeita fila. É um atropelo de gente querendo descer pelo elevador (as escadas estão fechadas), e fica um empurra-empurra, um saco. Quase não deixam o povo sair do elevador de tanto desespero. Outra coisa que não recomendo é o barzinho dentro do prédio (lame) e os banheiros sujos. Os banheiros, tomem cuidado, são sinalizados com uma faixa azul (para o dos meninos) ou uma faixa rosa (para as meninas). Duh.
Como ainda faltava muito tempo para abrir o Museu, eu vou até o Centro Cultural de Belém dar uma espiada, através da passagem sob as avenidas (da Índia e de Brasília). O centro é um SESC Pompéia crescido, mas sem o charme da antiga fábrica. Lá dentro me deparo com o Museu do Design, inaugurado em abril de 1999, novo demais para os guias.
Ao entrar no museu, vire à direita e compre o ingresso numas caixas que parecem ser da loja. Eu fui direto para o andar inferior e um guardinha veio me pedir o ingresso, falando em português pausado, enquanto o outro guardinha dizia que eu não sabia, que eu «obviamente» não era daqui. Japs aqui é exótico, mano.
O museu apresentava seu acervo e mais uma instalação e uma exposição de fotografias, a World Press Photo 2000. Pago 600$00 para ter acesso a tudo.
Começo pelo acervo, que tem muitas peças de mobiliário, algumas interessantes, outras mais para o lado da curiosidade ou do camp total. Nada de muito enriquecedor. Apenas curioso (como uma cadeira parecida com a usada no filme Man in Black).
A WPP 2000 me impressiona mais. Há algumas boas fotos aqui. Algumas geniais e outras nem tanto. Mas a seqüência que retrata a morte de Bernardino Guterres por milicianos em Dili (Timor Leste) quase me leva às lágrimas. O motivo da morte era um boné com o retrato de Xanana Gusmão.
A instalação é um projeto de Nuno Ribeiro. Uma sala com vídeos e um projetor contando a história de uma cara que amarra um balão numa cadeira e vôa sobre Los Angeles. A idéia até que foi interessante, mas a instalação não apeteceu, não envolveu o suficiente para me dar vontade de ver a trama toda se desenrolar. Pity
Não é, definitivamente, um Cooper-Hewitt. Mas dê ao museu tempo. Um ano é pouco.
Dali vou até a cafetaria sofrer mais um choque cultural: aqui tem Fanta Ananás!! Fanta Abacaxi!!! Fer chrissakes! Eeww!
A cafetaria seria boazinha se as atendentes dessem conta do recado. Mas a fila é insuportável nesse sábado de manhã. Do outro lado há um restaurante por quilo e uma área externa com mesinhas e uma vista bem legal. Mas não me apeteceu a comida.
Já deram as 14h e eu vou ao Museu de Arte Popular. Pago 350$00 para ver apenas uma sala. Depois do dinheiro trocar de mãos, a recepcionista me avisa que aos domingos de manhã não se paga ingresso. «É à borla.» Que bom. Ao menos, fica a dica.
O acervo que está aberto à visitação é de esculturas de Estremoz e Barcelos, principalmente.
Vou para o Flat em seguida. Consegui esgotar o espaço no stick de 64Mb da câmera. Penso em escrever a visita de hoje durante a tarde, mas o David me liga e me chama para sair. Eu disse, algum dia, que em São Paulo eu jogava flipper de vez em quando e ele gravou (alilás, o cara é uma anteninha, na segunda vez que falo sobre alguma coisa ele já sabe do que se trata, já pesquisou na Internet). E me leva até a Feira Popular de Lisboa (400$00 a entrada) para jogar um «arcade».
Passamos na casa de uma amiga dele e vamos até a Feira uma espécie de Playcenter; não, pior, uma espécie de Cidade da Criança (lembram-se, ficava em São Bernardo do Campo), só que cheia de lojinhas e restaurantes, além dos brinquedos. David e a amiga já não vinham aqui há uns 6 ou 7 anos e se decepcionam. É mais ou menos o que eu iria sentir se fosse visitar o Playcenter. Certas coisas devem ser deixadas na infância. Para sempre
Janto na casa de David, no bairro de Telheiras, afastado do centro, mas calmo e, me explica David, «o bairro do país com o maior número de universitários!»
Vamos buscar Rita (não a da Spread, a amiga do David que foi conosco à Feira) e Joana, outra amiga, para irmos ao cinema, assistir The Kid (filme da Disney com o Bruce Willys). Sessão da tarde total. Arranca algumas risadas e emoções baratas. Diversão para sábado à tarde, não para sessão da meia-noite. Mas valeu a intenção e valeu conhecer mais gente. Não, povo, nenhum interesse amoroso ainda.
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