SONETO DE FIDELIDADE

De tudo, ao meu amor serei atento 
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto 
Que mesmo em face do maior encanto 
Dele se encante mais meu pensamento. 

Quero vive-lo em cada vão momento 
E em seu louvor hei de espalhar meu canto 
E rir meu riso e derramar meu pranto 
Ao seu pesar ou seu contentamento. 

E assim, quando mais tarde me procure 
Quem sabe a morte, angustia de quem vive 
Quem sabe a solidão, fim de quem ama 

Eu possa me dizer do amor (que tive): 
Que não seja imortal, posto que e chama 
Mas que seja infinito enquanto dure.

Vinicius de Moraes

SONETO DE VESPERA

Quando chegares e eu te vir chorando 
De tanto te esperar, que te direi? 
E da angústia de amar-te, te esperando 
Reencontrada, como te amarei? 

Que beijo teu de lágrima terei 
Para esquecer o que vivi lembrando 
E que farei da antiga mágoa quando 
Não puder te dizer por que chorei? 

Como ocultar a sombra em mim suspensa 
Pelo martírio da memória imensa 
Que a distância criou - fria de vida 

Imagem tua que eu compus serena 
Atenta ao meu apelo e à minha pena 
E que quisera nunca mais perdida...

Vinicius de Moraes

AMOR

Amor – pois que é palavra essencial 
comece esta canção e toda a envolva.? 
Amor guie o meu verso, e enquanto o guia, 
reúna alma e desejo, membro e vulva.? 

Quem ousará dizer que ele é só alma? 
Quem não sente no corpo a alma expandir-se 
até desabrochar em puro grito 
de orgasmo, num instante de infinito? 

O corpo noutro corpo entrelaçado, 
fundido, dissolvido, volta à origem 
dos seres, que Platão viu completados: 
é um, perfeito em dois; são dois em um. 

Integração na cama ou já no cosmo? 
Onde termina o quarto e chega aos astros? 
Que força em nossos flancos nos transporta 
a essa extrema região, etérea, eterna? 

Ao delicioso toque do clitóris, 
já tudo se transforma, num relâmpago. 
Em pequenino ponto desse corpo, 
a fonte, o fogo, o mel se concentraram. 

Vai a penetração rompendo nuvens 
e devassando sóis tão fulgurantes 
que nunca a vista humana os suportara, 
mas, varado de luz, o coito segue. 

E prossegue e se espraia de tal sorte 
que, além de nós, além da própria vida, 
como ativa abstração que se faz carne, 
a idéia de gozar está gozando. 

E num sofrer de gozo entre palavras, 
menos que isto, sons, arquejos, ais, 
um só espasmo em nós atinge o climax: 
é quando o amor morre de amor, divino. 

Quantas vezes morremos um no outro, 
no úmido subterrâneo da vagina, 
nessa morte mais suave do que o sono: 
a pausa dos sentidos, satisfeita, 

Então a paz se instaura. A paz dos deuses, 
estendidos na cama, qual estátuas 
vestidas de suor, agradecendo 
o que a um deus acrescenta o amor terrestre....

Carlos Drummond de Andrade

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