Barbitúricos
O primeiro barbitúrico lançado no mercado foi o Veronal, em 1903, embora os
barbituratos já tivessem sido sintetizados na Bélgica em 1684. De 1912
aos nossos dias, mais de 2500 derivados do ácido barbitúrico foram
desenvolvidos. Inicialmente, acreditava-se que essa droga representava
a cura para a insônia e a ansiedade, transformando-se, assim, no
sedativo-hipnótico ideal.
Na década de 30, começaram a acumular-se evidências de que os barbitúricos
produziam sérios efeitos colaterais, principalmente quando misturados ao
álcool. Os alertas das autoridades de saúde, entretanto, tiveram resultado
oposto ao esperado - a droga popularizou-se nos anos 40 justamente por
provocar exaltação quando ingerida com bebidas alcoólicas. Nos anos 70,
muitos ainda encaravam os barbitúricos como remédio inofensivo. Hoje,
sabe-se que, quando usados corretamente, sob supervisão médica, os
barbitúricos são eficazes em alguns casos, mas os perigos representados
por seu abuso são inegáveis.
Existem três categorias de barbitúricos:
- Drogas de longa ação (de oito a 16 horas): são usadas no tratamento de
epilepsia, no controle de úlceras pépticas e pressão sangüínea alta. Estão
nesse grupo o Veronal (barbital), Luminal (phenobarbital), Mebaral
(nefobarbital), e Gemonil (metabarbital).
- Drogas de ação média (quatro a seis horas): são usadas como pílulas
para dormir, e são os barbitúricos mais comumente abusados: Alurate
(aprobarbital), Amytal (amobarbital), Butisol Sodium (butabarbital),
Nembutal (pentobarbital), Seconal (seccobarbital) e Tuinal (amobarbital e
secobarbital).
- Barbitúricos de curta ação (imediata mas breve): são usados como
anestésico ou sedativo junto com inalantes, e incluem Penthotal Sodium
(thiopental), Brevital (sodium methohexital) e Surital (sodium thiamylal).
Os barbitúricos agem sobre o sistema nervoso central deprimindo ou
inibindo os sinais nervosos no cérebro, alterando o equilíbrio químico e
reduzindo as funções de alguns sistemas orgânicos. A ação neurológica é
diminuída, assim como o batimento cardíaco, a pressão sangüínea e a
respiração. Simultaneamente, ocorre um relaxamento geral dos músculos que
estão juntos do esqueleto. Os efeitos da droga aumentam de acordo com a
dosagem, ao mesmo tempo em que as funções do corpo são desaceleradas,
produzindo, como consequência, desde o alívio da ansiedade até a sedação,
hipnose, anestesia, coma e morte. Ao ser ingerida, a droga penetra na
corrente sangüínea e é distribuida por todo o corpo, acumulando-se
principalmente nos tecidos dos órgãos e nos depósitos de gordura. Os
barbituratos são por fim metabolizados e eliminados através do fígado e
dos rins.
De acordo com os pesquisadores norte-americanos, os barbitúricos afetam
pessoas diferentes de formas diferentes, podendo ainda provocar, numa mesma
pessoa, uma variedade de efeitos diversos. Afirma um relatório publicado
nos Estados Unidos em 1977:
"A curto prazo, os efeitos dos barbitúricos se assemelham aos do álcool.
Ansiedades e tensões dissolvem-se num calmo e pacífico relaxamento.
Preocupações desaparecem numa intoxicação nebulosa, na qual nada realmente
importa. O usuário cambaleia vacilante por uma realidade alterada, com a
fala pastosa e sentindo seus músculos como se fossem feitos de borracha.
Seus reflexos reduzem-se e seu tempo de reação a estímulos é extremamente
longo. A longo prazo, o uso regular de barbituratos pode levar a sintomas
crônicos: sonolência contínua, memória falha, dificuldade para concentrar
a atenção, perda da coordenação motora, instabilidade emocional, náusea,
ansiedade, nervosismo, movimentos involuntários dos olhos, fala enrolada
e mãos trêmulas. Reações paranóicas e aumento da hostilidade podem induzir
a atos de violência."
Com o uso repetido por um certo período de tempo, o organismo adquire
tolerância à droga, e maiores quantidades passam a ser necessárias para
produzir os mesmos efeitos, resultando na dependência física e psicológica.
A dose letal, entretanto, permanece a mesma, e pode acabar sendo atingida
pelos usuários que precisam ir sempre aumentando a dosagem. Para a maioria
das pessoas, a dose letal é calculada como sendo dez vezes maior do que a
dose prescrita.
Normalmente, a dosagem terapêutica, entre 100 e 200 miligramas ao dia, não
produz dependência se usada por um breve período de tempo. Quando ingerida
habitualmente, por dois meses, em dosagens superiores a 600 miligramas ao
dia (ou 800 miligramas ao dia por um mês), a droga passa a causar tolerância.
Ao contrário dos opiáceos, entretanto, a tolerância desenvolve-se
gradualmente, e pode desaparecer depois de uma ou duas semanas de abstinência
da droga. Caso dosagens elevadas sejam ingeridas por três meses ou mais,
o usuário tornar-se-á um dependente, experimentando sintomas de privação
se o uso do barbitúrico for suspenso.
A síndrome de privação, no caso de usuários crônicos, pode durar até duas
semanas, uma eternidade para a vítima, que sofre sintomas cada vez mais
violentos à medida que passa o tempo sem a droga. Entre os sintomas estão
a perda de apetite, ansiedade, insônia, transpiração, agitação, náusea,
hiperatividade, tremores, cãimbras, aceleração cardíaca, alucinações,
delírios, paranóia, febre, convulsões e reações semelhantes à epilepsia.
Em casos extremos ocorrem delirium tremens, tal como nas crises
alcoólicas, resultando em estados psicóticos, exaustão, colapso
cardiovascular, falha dos rins e, finalmente, morte.
Quando misturados a outras substâncias, os perigos dos barbituratos são
multiplicados. A combinação álcool-barbitúrico é considerada especificamente
mortífera, já que as bebidas potencializam os efeitos dos barbitúricos,
reduzidos a quantidade necessária para se chegar à dose letal. A mistura
de barbitúricos com anfetamina, por exemplo, é considerada uma das formas
mais perigosas de abusos de drogas. Combinadas, essas duas substâncias
geram um grau de euforia muito maior do que quando tomadas separadamente.
Os viciados em anfetaminas costumam utilizar barbitúricos para conseguir
relaxar depois de dias e noites movidos por anfetamina.
Ao contrário das anfetaminas, os barbituratos têm diversas aplicações
na medicina: como hipnótico (induz ao sono), sedativo, anticonvulsivo,
analgésico e como medicamento para o tratamento de alcoolismo. Contudo, os
barbituratos não aliviam dores severas, podendo até causar um efeito
contrário, a hiperaugesia, ou aumento da reação à dor. Depois de algumas
semanas, os barbituratos perdem seu poder hipnótico para a maior parte
dos pacientes, deixando de funcionar como pílulas para dormir. Eles também
podem perturbar o período do sono em que acontecem os sonhos, o que
provavelmente tem consequências psicológicas. Mulheres grávidas devem
decididamente evitar o uso de barbitúricos.
Retirado da Revista Planeta de julho de 86.
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