I-JUCA PIRAMA

IV

"Meu canto de morte,
Guerreiros, ouvi:
Sou filho das selvas,
Nas selvas cresci;
Guerreiros, descendo
Da tribo tupi.

"Da tribo pujante,
Que agora anda errante
Por fado inconstante,
Guerreiros, nasci:
Sou bravo, sou forte,
Sou filho do Norte;
Meu canto de morte,
Guerreiros, ouvi.

"Já vi cruas brigas,
De tribos imigas,
E as duras fadigas
Da guerra provei;
Nas ondas mendaces
Senti pelas faces
Os silvos fugaces
Dos ventos que amei.

"Andei longas terras,
Lidei cruas guerras,
Vaguei pelas serras
Dos vis Aimorés;
Vi lutas de bravos,
Vi fortes - escravos!
De estranhos ignavos
Calcados aos pés.

"E os campos talados,
E os arcos quebrados,
E os piagas coitados
Já sem maracás;
E os meigos cantores,
Servindo a senhores,
Que vinham traidores,
Com mostras de paz.

"Aos golpes do imigo
Meu último amigo,
Sem lar, sem abrigo
Caiu junto a mi!
Com plácido rosto,
Sereno e composto,
O acerebo desgosto
Comigo sofri.

"Meu pai a meu lado
Já cego e quebrado,
De penas ralado,
Firmava-se em mi:
Nós ambos, mesquinhos,
Por ínvios caminhos,
Cobertos d'espinhos
Chegamos aqui!

"O velho no entanto
Sofrendo já tanto
De fome e quebranto,
Só qu'ria morrer!
Não me contenho,
Nas matas me embrenho,
Das frechas que tenho
Me quero valer.

"Então, forasteiro,
Caí prisioneiro
De um troço guerreiro
Com que me encontrei;
O cru dessossego
Do pai fraco e cego,
Enquanto não chego,
Qual seja, - dizei!

"Eu era o seu guia
Na noite sombria,
A só alegria
Que Deus lhe deixou:
Em mim se apoiava,
Em mim se afirmava,
Em mim descansava,
Que filho lhe sou.

"Ao velho coitado
De penas ralado,
Já cego e quebrado,
Que resta? - Morrer,
Enquanto descreve
O giro tão breve
Da vida que teve,
Deixai-me viver!

"Não vil, não ignavo,
Mas forte, mas bravo,
Serei vosso escravo;
Aqui virei ter.
Guerreiros, não coro
Do pranto que choro;
Se a vida deploro,
Também sei morrer."

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