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Desenvolvendo a TV interativa / última atualização em 01/09/1998 |
por Roberto Tietzmann / todos os direitos reservados, reprodução proibida.
A televisão tradicionalmente foi o melhor exemplo de um paradigma de comunicação bastante autoritário. Caracterizado por "um emissor, muitos receptores", tal modelo motivou infinitas discussões sobre os jogos de poder e implicações econômicas envolvidas no controle da fonte de sons e imagens. Passivos e imbecilizados por um conteúdo que não aprofundava os tópicos abordados, os espectadores não tinham escolha senão desligar o aparelho.
Mas chegamos nos anos 90. De 1996 em diante acelerou-se a convergência entre a televisão, a internet, a rede de distribuição de sinais de tv por cabo ou satélite e a telefonia, tornando cada vez mais próxima a realidade de encontrarmos uma televisão rica em conteúdo e capaz de comportar a interação com seus espectadores de maneiras ainda não imaginadas.
Quando da redação deste artigo (setembro de 1998), os passos já tomados para a criação de uma televisão plenamente interativa apontam em duas direções com resultados semelhantes: a integração de código HTML nas transmissões de TV e a transmissão de vídeo via Internet com links embutidos no conteúdo.
O resultado destas tecnologias é que chegaremos a uma "TV clicável", onde a pessoa pode buscar mais conteúdo sobre aquilo que é apresentado através de simples interação. A televisão "tradicional" desperta o interesse e a navegação pela Internet proporciona outras formas de aprofundamento no conteúdo ou participação no programa .
Embora nenhuma tecnologia de fusão entre a televisão e a Internet esteja inteiramente amadurecida, conhecer os desenvolvimentos deste processo nos permite estar atento a novas oportunidades enquanto profissionais.
A chave para compreendermos este desenvolvimento atual está na rapidez com que o acesso à Internet conquistou usuários. Até 1993, a rede estava restrita a pessoas que tivessem vínculos com universidades ou o governo. Com a difusão de provedores de acesso comerciais disponíveis a partir de 1994, a Internet passou a atingir milhões de domicílios e cresce sem parar.
A televisão, por sua vez, vem experimentando há algum tempo com interatividade simples em sua programação. Os episódios do "Você Decide", os filmes do "Inter Cine" e as reportagens do Fantástico são exemplos da integração entre o telefone e a transmissão de TV. Programas ao vivo com monitoramento em tempo real do índice de audiência, como o "Ratinho Livre" ou o "Domingo Legal" espicham ou encurtam suas atrações de acordo com a resposta do público.
A Internet pode transmitir quase qualquer tipo de informação. Do texto ao vídeo. Sua difusão entre o público em geral facilita o desenvolvimento de produtos híbridos entre televisão e computador. Segundo Josh Bernoff, um analista-chefe da Forrester Research, "Antes você precisava desenvolver todo o sistema por conta própria . Agora, boa parte dele está automaticamente lá esperando você graças à Internet e a tv a cabo."
Os primeiros passos bem sucedidos comercialmente na integração entre a televisão e Internet vieram da empresa WebTV Networks. Ao final de 1996 eles lançaram um pequeno dispositivo, não muito diferente em dimensões de um decodificador de TV a cabo, que permitia aos usuários navegarem pela rede vendo o conteúdo em suas televisões. Era o computador dedicado à Internet para aqueles que não tinham um computador.
Recebido com olhares de suspeita pelos usuários e desenvolvedores que já estavam acostumados com seus computadores, o WebTV encontrou um nicho de mercado em especial junto às pessoas que não tinham computador e nem queriam gastar mais de mil dólares com um. O produto está disponível em duas versões : WebTV Classic (US$99) e Plus (US$199).
Segundo a empresa, o número de usuários tem dobrado em menos de um ano. Até julho de 1998 havia 350.000 assinantes, estimando-se mais de 500.000 usuários no total. É também um público qualificado, de alta renda e que passa mais de 40 horas online por mês. Somente 35% dos assinantes já tinha um computador em casa, e a grande maioria não tinha experiência prévia com a Internet.
Uma vez que a TV e a Internet partilhavam a mesma tela, seria uma questão de tempo até que seus conteúdos passassem a se misturar de forma direta . Para encontrar as respostas necessárias ao desenvolvimento da TV interativa, foi criado um consórcio entre grandes companhias chamado de Advanced Television Enhancement Forum (Fórum para o desenvovimento da televisão melhorada), ou ATVEF. Ainda sem ter concluído a primeira versão de suas especificações, a ATVEF tem alguns bons desafios pela frente.
O mais desafiador deles é como enviar as informações que possibilitam a interatividade através de uma transmissão normal de televisão sem que isso prejudique a recepção em aparelhos que não sejam capazes de entendê-la. Não diferente, portanto, do desafio de transmitir em cores de forma compatível com os receptores preto e branco.
A resposta mais segura a que eles chegaram até agora, e que vem se difundindo rapidamente, é utilizar o espaço usado para as legendas opcionais (chamado de Closed Caption e só recentemente introduzido no Brasil) para enviar endereços de internet para os televisores capazes de decodificá-los. Embora a implementação de tal recurso já exista, usar o espaço de legendas para deficientes auditivos para transmitir informações digitais não é uma solução boa o suficiente.
Estão em desenvolvimento várias outras tecnologias para embutir em "espaços não utilizados" das transmissões de TV quantidades maiores de informação. A nova geração de equipamentos da WebTV promete uma tecnologia chamada "Video Modem", sobre a qual não dá maiores detalhes. A Microsoft também tem patentes na área, e guarda segredo sobre elas.
As tecnologias que estão melhor definidas são aquelas que integram vídeo e demais informações enquanto conteúdos da própria Internet. Entre a variedade de sistemas para a transmissão de vídeo pela rede , um dos mais aprimorados é o desenvolvido pela Real Networks.
Conhecido como Real Video , o sistema permite o acesso rápido a vídeos com áudio sincronizado através de modems de 28.8Kbps ou superior. Pode parecer muito, mas não é. Na verdade, uma folha de texto datilografado é a quantidade média de informação que um modem destes pode transmitir. Vídeo com boa qualidade pode ocupar muito mais, conforme a tabela1, abaixo:
Vídeo com qualidadde SVHS plena e compressão MJPEG | Vídeo com qualidade VHS e compressão MJPEG | Vídeo para CD-ROM normal | Vídeo para Internet visando modems de 33.Kbps |
6 MB/s | 1.5 MB/s | 200K/s | 3K/s |
Tabela 01: Quantidade de informação que passa por segundo em cada meio
Muita informação precisa ser descartada ao decidirmos publicar o vídeo na Internet. Conseqüentemente, é necessário abrir mão de tela cheia e movimento plano, restringindo-se a uma janela de vídeo com as dimensões pouco maiores que uma caixa de fósforos e uma atualização de tela variável, poucas vezes superior a cinco quadros por segundo. Parece desanimador em um primeiro momento, mas abre a possibilidade de experimentar possibilidades narrativas ainda pouco exploradas.
Tendo as limitações do meio em mente e muitas perguntas a serem respondidas, foi desenvolvido por alunos do pós-graduação em cinema e publicidade da PUCRS no primeiro semestre de 1998 o vídeo interativo "O Crime".
O objetivo básico do projeto era desenvolver uma história de ficção em vídeo que oferecesse ao espectador diferentes caminhos por onde desenvolver a trama, sem que nunca brecasse e perguntasse a ele "Por onde ir?". Semelhante ao andar por uma estrada, onde tomamos as decisões de caminho sem parar o carro, "O Crime" estaria em constante movimento.
A história toda se baseava em um storyline simples:
A partir daí, buscou-se outros desenvolvimentos possíveis para a trama. Por exemplo:
E sobre estes storylines se construiu a história de Luís e Cláudia, ex-namorados prestes a se matarem se cruzarem um com o outro. Luís, louco de ciúme, decide tentar matar Cláudia para chamar sua atenção. Mas, quem sabe? tudo pode até acabar em romance!
Desde o início do projeto foi publicada uma página na Internet (no endereço http://geocities.datacellar.net/TelevisionCity/Set/3445) com o roteiro, storyboards e notícias da produção. A premissa era justamente a de fazer o projeto interagir com seu público desde o mais cedo possível. Os visitantes responderam além do esperado, questionando e sugerindo novas abordagens para a história. Muitas das sugestões foram incorporadas ao projeto durante o andamento. Entre as sugestões:
A tecnologia de transmissão de vídeo pela Internet Real Video permitiu que "O Crime" fosse disponibilizado para um público global, evitando as limitações que normalmente afastam as produções universitárias ou independentes de uma audiência maior. Desde abril de 1998, a página já teve mais de 900 visitas.
O Real Video também permite que os espectadores d'"O Crime" escolhessem o final da trama enquanto ela se desenrola. Na figura 01, a visão geral da trama conforme disponível na Internet. Com um simples clique do mouse na janela de vídeo durante os chamados "pontos de interação", a trama desvia para outra seqüência de vídeo e o espectador influencia a trama. por exemplo, se clicarmos quando Luís está cruzando a rua, o carro que está passando por ele na rua o atropela. Ou um clique quando Cláudia tem devaneios românticos nos leva para o final onde Luís e Cláudia voltam a se apaixonar. Quando o espectador chega ao final da história, ele também tem a possibilidade de "voltar atrás" e conhecer os demais desenvolvimentos da trama.
"O Crime" permite aos seus espectadores conhecerem a história em vários níveis, inclusive acompanhando a extensa documentação sobre o trabalho "por detrás das câmeras". Ao enriquecer a narrativa audiovisual com conteúdos extras e dar a escolha sobre a trama para o espectador, este projeto experimentou algumas possibilidades da fusão entre a narrativa linear tradicional e a liberdade da comunicação proporcionada pela Internet. Apesar de todas as limitações.
A convergência entre televisão e Internet ainda não encontrou a resposta ideal para suas perguntas. Por um lado, a integração de interatividade no televisor ainda carece de padrões. Por outro, o vídeo via Internet ainda sofre com as limitações do acesso por modem. Todavia, os sistemas estão rapidamente evoluindo e abrindo novas possibilidades para os comunicadores.
http://www.wired.com/news/news/email/member/technology/story/14056.html
Net TVs Speak Same Lingo
http://www.wired.com/news/news/culture/story/11357.html
It's a Skate for Interactive TV
http://www.wired.com/news/news/culture/story/7465.html
PBS Pushes Fusion of TV, Net
http://www.wired.com/news/news/technology/story/6914.html
WebTV Plus Raises the Stakes
http://www.wired.com/wired/1.01/departments/idees.fortes/interactive.html
Is Interactive Dead?
Welcome to the Advanced Television Enhancement Forum!
WebTV Networks
Real Networks
http://developer.webtv.net/articles/whydev/Default.htm
Why Develop For WebTV?
http://geocities.datacellar.net/TelevisionCity/Set/3445
"O Crime"