Egito Antigo
"Tão certo como Osíris vive, tu vives. Tão certo como ele não morre, tu também não morrerás. Assim como ele não pôde ser destruído, tu também não serás."
-citação egípcia
Único povo do mundo antigo a erigir uma religião nacional em torno da doutrina da imortalidade da alma, os egípcios foram também os primeiros a pregar um monoteísmo universal, a providência divina, o perdão dos pecados e as recompensas e punições depois da morte. Fonte de normas de moralidade pessoal e social, influencia até hoje o comportamento de várias nações.
A religião dos antigos egípcios evoluiu, gradativamente, de um simples politeísmo para um monoteísmo filosófico. No início, cada localidade possuia seus próprios deuses e representações das forças da natureza. Com a unificação do Baixo e do Alto Egito, no Antigo Império - aproximadamente em 3.000 a.C. -, houve uma fusão de divindades. Todas as divindades protetoras foram consubstanciadas em Rá, o deus-Sol. Mais adiante, com a ascenção de uma dinastia tebana ao poder (início do Médio Império, por volta de 2.000 a.C.), passou-se a chamar Amon ou Amon-Rá, nome do deus principal de tebas.
As divindades elementais, isto é, os deuses que representavam os poderes da natureza, fundiram-se em Osíris. Durante toda a história do Egito, Rá e Osíris rivalizariam entre si pela supremacia. Isto, de um ponto de vista político-cultural, pois, na verdade, os dois representavam faces diferentes de um mesmo princípio.
Já a partir da V Dinastia (entre 2.563 e 2.423 a.C.), os faraós passaram a se chamar filhos de Rá. O governo era uma teocracia e o absolutismo do rei era exercido em nome de deus. De acordo com suas crenças, era o deus, como personificação da justiça e da ordem social, que de fato governava - o monarca era seu agente, seu mensageiro. Como "filho de Rá", o rei era considerado divino. Não se podia sequer mencioná-lo pelo nome, referiam-se a ele como faraó - do egípcio per-o, que significa "casa grande" ou "casa real". Não podia casar-se com qualquer pessoa que não fosse sua parente próxima e a divindade não o excluia de árduos serviços em prol do bem público.
Durante o Antigo Império, o culto de Rá servia como religião oficial e sua função principal era dar imortalidade ao estado e ao povo. O faraó mantinha na terra a lei do deus. Acreditava-se que a mumificação do corpo do faraó e sua conservação em um túmulo eterno contribuiria para a existência eterna da nação.
Os faraós eram iniciados mas, não necessariamente, evoluídos os bastante para terem atingido o adeptado. Havia no Egito três centros de mistérios: Ábidos, Hermópolis e Heliópolis. Três santuários nos quais se concentrou o saber dos sacerdotes egípcios. Aos profanos jamais era admitida a entrada em seu recinto sagrado, pois tais santuários, em época pré-histórica, haviam vistos as próprias origens do Egito.
Parece ter sido o de Ábidos, de sete capelas consagradas e arcada constelada de estrelas, onde foi enterrado o próprio Osíris, o homem-Deus. Osíris teria sido o homem que introduziu a civilização no Egito, tirando o povo da barbárie. Os sacerdotes de Osíris tinham como incubência preservar o Osirianismo e seus mistérios a qualquer preço. O que se vê, durante toda a História, como a volta aos mitos de nossas origens, a busca de maior contato com os poderes da natureza, é a perpetuação desse compromisso.
Ábidos foi o primeiro santuário do culto de Osíris, a primeira grande loja para os ritos secretos dessa religião, para os mistérios, ancestrais da Franco-Maçonaria primitiva.
Os mistérios do segundo centro, Hermópolis, estabelece a aproximação da revelação na tradição egípcia (simbolizada por Tot-Hermes) com a tradição nórdica (Thor). Como se sabe, o termo hermético (de Hermes) passou a significar tudo o que é referido às ciências tradicionais, aos mistérios.
A divulgação - para quem fosse digno disso - dos mistérios acumulados em Hermópolis foi a função da Irmandade de Heliópolis.
A importância de Heliópolis é atestada até pelo cristianismo; no Novo Testamento, diz-se que seria em Heliópolis que a Sagrada Família teria repousado por ocasião da fuga para o Egito.
Em grego, Heliópolis significa "a cidade do Sol". denominação que substituiu o antigo nome egípcio que tinha o mesmo significado.
Na iniciação de base solar, destaca-se essa comunidade espiritual - a Irmandade de Heliópolis - que guiava os sacerdotes egípcios, como deveria guiar os druidas e todos que, no decorrer da História, tiveram em suas mãos a chave dos grandes mistérios.
Com a descoberta e profanação de
pirâmides e tumbas, a curiosidade em torno da cultura e,
sobretudo, da religião egípcia, das múmias, a
"Tutmania" promovida pelos meios de comunicação,
muito se especulou e divulgou-se saber fatos que talvez não
sejam reais. Estamos muito longe de partilhar dos antigos
mistérios no que depender de estudos arqueológicos.
Sobre os túmulos, um iniciado da
Irmandade de Heliópolis relatou, em 1947, ao escritor Paul
Brunton: "Os túmulos dos grandes adeptos são muito bem
guardados, para que nunca sejam vasculhados por 'escavadores';
não são túmulos de mortos, mas de vivos. Não contém múmias,
mas sim os corpos dos adeptos em um estado específico, que
apenas o termo 'transe' pode aproximadamente descrever. Já foi
constatada, na Índia, a existência de faquires que se deixam
enterrar por um período variável, durante o qual seus corpos
ficam em transe. O funcionamento de suas vias respiratórias é
inteiramente suspenso enquanto permanecem sepultados. Até certo
ponto, o estado dos adeptos egípcios é análogo, mas seu
conhecimento vai muito mais adiante, já que mantiveram seus
corpos vivendo, ainda que em transe, por milhares de anos (...).
"Seus corpos são escondidos em túmulos impenetráveis, esperando a volta de seus espíritos. Um dia, com efeito, estes virão animar estes corpos em coma, fazendo com que eles voltem então ao mundo exterior. É preciso que o mecanismo dessa volta à vida seja operado por pessoas qualificadas, dotadas do conhecimento exigido. Uma parte do ritual do despertar consistirá no cântico de certas palavras de oração, secretas. Pode parecer curioso, mas seus corpos só são aparentemente embalsamados. Envoltos em tecidos, depostos em sarcófagos, diferem todavia das múmias verdadeiras pelo fato de que seu coração não foi retirado - e essa é uma diferença vital! Todos os seus órgão essenciais permanecem intatos, exceto o estômago, que baixou, já que desde a entrada em transe cessou toda a alimentação. Outra diferença, os adeptos vivos têm o corpo e o rosto inteiramente cobertos de uma camada de cera; esta lhes foi aplicada depois que se iniciou o transe... "
As idéias dos egípcios sobre o pós-morte atingiram seu completo desenvolvimento no período final do Médio Império. Primeiramente acreditava-se que o morto continuava sua vida na tumba; com o amadurecimento teológico, foi adotada a concepção do julgamento diante de Osíris, que compreendia três estágios: 1) exigia-se que o morto se declarasse inocente de quarenta e dois pecados, dentre os quais o homicídio, o furto, a mentira, a cobiça, a ira, o adultério, a blasfêmia, o orgulho e a desonestidade em transações comerciais; 2) afirmar suas virtudes, confessar que satisfez a vontade dos deuses, que ajudara os necessitados, etc e 3) o coração do réu era posto na balança em face de uma pena (Maat), símbolo da verdade, para se determinar a exatidão do que afirmara.
Com o estabelecimento do Novo Império
(a partir de 1.580 a.C.), a religião sofre sérias
adulterações. Os sacerdotes se tornaram muito poderosos e
exploravam o terror das massas em proveito próprio. Isto levou a
uma grande reforma religiosa liderada por Amenotep IV, que
começou a reinar por volta de 1375 a.C. Ele abandona o culto de
Amon e valoriza o culto de Aton (antiga denominação do Sol
físico). Muda seu nome de Amenotep ("Amon repousa")
para Ikhnaton ("Aton está satisfeito"). Estabelece o
monoteísmo e constrói templos solares, a céu aberto, em Tell
al Amarna (então a capital) e Karnak.
Em resumo, assim se desenvolveram os
conceitos religiosos do Egito Antigo e que serviram de base para
as posteriores civilizações.
Extraído da revista eletrônica ISIS
© Copyright da revista ISIS, março de 1996 - by Sandro Fortunato
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