Tempestade de Ilusões
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Ami Ikari & X/MADS!Capítulo 05: Viagem Rumo ao Desconhecido
"A mitologia é uma interpretação das formas, através da qual a mais informe das formas pode ser conhecida."
-= Joseph Campbell =-As antigas civilizações humanas, formadas nos primórdios da nossa contagem de tempo, criavam histórias para explicar os fenômenos da natureza que os homens não eram capazes de visualizar a sua origem, tampouco compreendê-los em sua totalidade. Atualmente, essas histórias são denominadas 'mitos' e, seu conjunto, 'mitologia'.
Das mitologias conhecidas, que sobreviveram ao súbito ataque da razão durante o Renascimento, a que mais chama a atenção da humanidade é a Mitologia Greco-Romana, seguida pela Mitologia Egípcia. Seus deuses e suas aventuras inspiraram autores por todas as eras em fábulas passadas pelas gerações.
A mitologia inspirou até mesmo os nomes dos planetas, que foram dados segundo os nomes dos deuses romanos. Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno e Plutão, assim como seus correspondentes gregos, cujos nomes foram aplicados nos satélites de cada planeta, excetuando-se a Terra e a Lua. Porém, em um passado não muito longínquo, a Lua era chamada de Selene, nome que inspirou um dos mais belos sonetos do poeta Camões, no qual ele narra o amor impossível de dois amantes: a história de Selene e Endymion.
A verossimilhança das mitologias, além de ser profundamente inspiradora, cria um certo desconforto nos seres humanos até os dias de hoje. Afinal, quem pode garantir que a razão explica a totalidade dos fenômenos estudados até o presente momento? Quem pode explicar as histórias fantásticas narradas por pessoas ditas 'paranormais' ou até mesmo a sua simples existência?
A parapsicologia é uma bela forma de racionalizar o irracional... mas não consegue justificar a existência de todos os 'fantasmas' que assolam a mente dos seres humanos.***
Andando de um lado para o outro no saguão do Aeroporto Internacional de Tóquio, aquele nem parecia ser o outrora tranqüilo rapaz que saíra de casa para estudar no Japão. Em intervalos espaçados por um breve tempo de cinco minutos, Martin olhava para o painel, esperando ver a chegada do vôo da JAL que estaria trazendo uma pessoa muito especial.
- ... da JAL, Los Angeles-Tóquio, aterrizando neste momento... saída dos passageiros no portão 3. - a voz suave da atendente do aeroporto soou pelo saguão, provocando uma ligeira corrida de Martin, Mamoru e Usagi para o portão 3.
A surpresa de Martin só não foi maior do que a de Tennotsukai Asuka, quando a viu verificando seus papéis em frente ao portão 3.
- Ohayo, Asuka-san. - cumprimentou Martin, sorrindo. "Geez... Será que todos os estudantes de intercâmbio são recebidos por ela?!"
- Ohayo, Martin-san. O que está fazendo aqui?
- Vim esperar o meu primo. Ele está chegando neste vôo. - respondeu ele. - Hmm... você está esperando algum aluno brasileiro? - perguntou Martin, com um sorriso cínico que assustaria até a si mesmo se olhasse em um espelho.
Asuka ia responder, mas foi subitamente interrompida por uma voz masculina muito conhecida de Martin.
- {Hiya, Martin!} - exclamou um rapaz alto, de feições semelhantes às do ficwriter, saindo do portão 3 com um carrinho cheio de malas.
- {Yo, Cousin!} - respondeu Martin, com uma gota na cabeça, ao ver o primo abanando a mão e chamando a atenção de metade do aeroporto. "Geez... Eu trago apenas uma mala e ele vem com TRÊS malas imensas para cá?!"
- <Você é o estudante brasileiro?> - perguntou Asuka, um pouco mais familiarizada com o fato de que os alunos que recebia NUNCA pareciam ser tipicamente brasileiros.
- Hai. Boku wa... Ricardo Gen desu. - respondeu Ricardo, gaguejando um pouco no seu conhecimento fanfictiano de japonês. - <Onde que eu vou ficar?>
Um sorriso maligno passou pelo rosto de Martin quando ele ouviu essa pergunta, talvez para aterrorizar seu primo, que subitamente sentiu um arrepio na coluna. Durante todo o vôo, suas preces foram direcionadas para que ele NÃO ficasse no Templo Hikawa ou coisa parecida.
- Chiba-ke. - respondeu Asuka, sorrindo e indicando Mamoru. - <Ele é o seu anfitrião.>
- Watashi wa Chiba Mamoru desu. - cumprimentou Mamoru. - <Vamos?>
Um suspiro de alívio pôde ser ouvido no aeroporto, quando Mamoru, Usagi, Martin e Ricardo começaram a caminhar na direção da saída. Por pouco os dois chineses não se viraram para encontrar a origem do som. Asuka, por sua vez, nunca havia se sentido tão feliz ao encaminhar um aluno sem maiores complicações.***
No apartamento de Mamoru, cuidadosamente arrumado pela faxina de Usagi e Makoto (leia-se: bagunça de Usagi e faxina dupla de Makoto), Ricardo sentiu-se mais à vontade e apoiou duas malas no sofá da sala. Martin ainda estava se perguntando o que o primo havia trazido dentro delas, mas a resposta veio rapidamente quando Ricardo, com seu típico sorriso 'eu DISSE, não disse?', tirou um teclado de dentro de uma das malas.
- {Achei que ia precisar disto.}
- {Pena que você não veio antes... acabei de comprar um teclado novo. E uns... extras.} - sorriu Martin, ainda pensando no conteúdo das malas. - {Mas você não trouxe um computador aí dentro, ne?}
- {Não. Parte da minha bagagem é sua.} - o 'Cousin' respondeu, apontando para Martin.
- Nani?!
- {Adivinha quem pediu para que eu trouxesse algumas roupas a mais...} - falou Ricardo, sorrindo cinicamente.
- Mommy... - suspirou Martin, com uma gota imensa na cabeça e rezando para que Mamoru e Usagi não tivessem entendido NADA. Infelizmente, suas preces não foram atendidas... como ele pôde perceber pelo olhar extremamente irônico de Usagi. "Bem que poderia ter sido suco de morango..."
- Mães nunca deixam de pensar que os filhos não sabem arrumar malas, ne? - comentou Usagi, com a cabeça inclinada para o lado.
- ... mães são todas iguais, só mudam de endereço... - respondeu com um ditado um envergonhado ficwriter, com o rosto cabisbaixo numa coloração muito próxima a whoopywhoopy (tm).***
Em um dos quartos do hospital da Universidade de Tóquio, flores enfeitavam quase todo o ambiente. Arranjos enviados por Rei, Yuuichiro, Usagi, Mamoru, Makoto, Minako e Akai estavam espalhados pelos cantos do quarto, que já estava quase saturado de flores e vasos. Para a felicidade de Mizuno-sensei, nem Paolla nem Ami eram alérgicas à pólen.
- Ami-chan, não estou com fome... - repetiu Paolla, já pela quarta vez consecutiva, quando Ami aproximava uma (outra) colher (cheia) de sua boca. - Onegai, Ami-chan!
- Iie, abra a boca. - retrucava Ami, sorrindo e balançando a cabeça. Isso porque Paolla estava agindo tipicamente como uma criança naquele momento, aproximando-se do perfil de irmã mais nova. - Shinasai, Limy-chan!
- LIMY-CHAN?! Como... como... - exclamou Paolla, abrindo demais a boca, dando espaço para Ami colocar a colher à força. - *gasp!*
- Não foi difícil descobrir que você tem DOIS nomes... bastou olhar no seu cartão do Seguro Médico Internacional. - respondeu Ami, pegando o cartão de dentro do bolso de sua blusa. - E a sua mãe ainda me ajudou um pouco, quando eu telefonei para ela.
Paolla simplesmente engoliu a sopa que Ami havia colocado dentro de sua boca, cujo sabor lhe lembrou muito as refeições servidas no Restaurante Universitário II da Unicamp, e ficou pensando em como as mães conseguem deixar os filhos em situações embaraçosas.
Esse pensamento saiu de sua mente assim que ela viu a segunda colherada de sopa de hospital vindo na direção da sua boca. O ferimento em sua nuca a impedia de movimentar muito o pescoço, deixando-a mais vulnerável aos 'ataques' de Ami durante as refeições. Como uma irmã dedicada, a Senshi de Mercúrio passava a maior parte do tempo no quarto de Paolla, controlando sua alimentação e os remédios para evitar maiores complicações. O único horário em que ela ficava sozinha era o período de aulas da Juuban High School...
"Pensando melhor, não tenho do que reclamar... tive até MUITA sorte de não ter tido qualquer paralisia..." pensou Paolla, engolindo mais uma colherada de sopa e fazendo uma careta. *gasp!*
O sorriso que aparecia no rosto de Ami a cada vez que Paolla se alimentava direito era uma das coisas que fazia com que ela concordasse em abrir a boca e a engolir a tenebrosa refeição 'cuidadosamente preparada e balanceada pelos nutricionistas do hospital'. A outra coisa era sua ansiedade em sair dali o mais rápido possível e voltar para as aulas na Universidade de Tóquio. Sua intenção era a de um dia retornar ao hospital - como ALUNA, não como PACIENTE.
- Abra a boca de novo, Limy-chan, falta pouco para acabar.
- Ami-chan, você precisa MESMO me chamar de Limy... *gasp!****
Um suspiro de alívio foi o único som que saiu dos lábios de Art depois que ele visualizou a recuperação da ficwriter através da esfera de Neko. Seus dedos deixaram a Silver Pen deslizar suavemente até pousar sobre as folhas que contavam a história que acabara de acontecer. Ela estava salva, era isso o que importava.
Lentamente, o escritor foi se deixando levar pelos braços de Morfeu. Deslizando pela cadeira, logo sua cabeça pendeu para o lado e ele se entregou completamente ao sono profundo que tanto desejava.
Em seus sonhos, ELA o estaria esperando... e, em seus braços, nunca mais as noites seriam solitárias. Era apenas uma questão de tempo para que ficassem juntos por toda a eternidade.***
- ...
Naquele mesmo momento, Paolla não era a única a comparar a refeição que tinha com algum restaurante universitário. Sem palavras para expressar qualquer coisa, Martin apenas ouvia... bem, o que dava para ser ouvido da cozinha de Mamoru. Era algo que ele não conseguia comparar com coisa alguma, e isso, vindo de um ficwriter, era algo realmente surpreendente.
Algumas vezes comparando o... 'som' com explosões, ora com miados de gato, panelas efervescentes e até mesmo cogitando sobre uma lula agonizante, Martin estava se arrependendo de ter ido buscar seu primo no aeroporto. Quer dizer, não era como se aquilo fosse desagradável, mas a insistência de Usagi para que ele TAMBÉM almoçasse na casa de Mamoru o deixou sem saídas.
Certo era que ele também nunca provou do restaurante universitário, mas a julgar pelas inúmeras descrições da 'carne mágica', ele NÃO tinha uma boa impressão daquilo. E isso bastava para comparar com o... 'som' produzido por Usagi. Olhando para a frente e desviando seu olhar dos talheres, ele encontrou Ricardo com a mesma expressão que se rosto.
Por mera curiosidade, ele virou a cabeça, encontrando um Mamoru excessivamente tranqüilo e a cantarolar uma música. Sem entender, ele apenas continuou a olhar adiante, mais precisamente na cozinha de Mamoru. Ou melhor, no que era a cozinha de Mamoru. Arrependendo-se amargamente durante bons dez segundos, a... 'visão' era ainda mais incomparável que o 'som'. Tingindo as paredes com várias cores e cheiros, obrigou Martin até mesmo a se perguntar que tipo de alimento deixava uma trilha verde e gosmenta. Talvez tivesse sido um repolho aquela mancha?
De qualquer forma, seu olhar desviou-se rapidamente, o que chamou a atenção de Ricardo. Observando o que não queria observar, ele quase engasgou quando tentou evitar que regurgitasse na mesa. Simplesmente não era agradável aquilo que parecia ser uma mão a sair da panela. Mesmo com o estômago endurecido pelas cenas realísticas de Hélio, ele jamais havia VISTO algo daquela forma. Fazendo uma nota mental para que Martin não se esquecesse de avisá-lo CASO houvesse uma próxima vez, ele começou a cogitar se tinha sido realmente uma boa idéia evitar o Templo Hikawa.
- ACABEI! - disse a cozinheira, para o pavor de dois chineses.
Sorrindo, Mamoru parecia não desconfiar do que era... 'aquilo'. Ou então, havia feito uma forte promessa para que 'aquilo' não estivesse chegando à sua mesa. Ainda assim, as esperanças dos primos desapareceu no ar quando Usagi postou a panela enorme diante deles.
Naquele instante, uma bolha marrom estourou na frente deles, assustando-os momentaneamente. Mamoru, quando abriu seus olhos, franziu então a testa. Parecia que ele REALMENTE não esperava por... 'aquilo'.
- Anoo... Usako? Não era para ser curry?
- E é, Mamo-chan! - respondeu a cozinheira. - Mas eu quis adicionar mais algumas... coisinhas. Mas eu garanto que está delicioso! - terminou ela, sorrindo abertamente.
Os três olharam por uns instantes para as bolhas que ainda estouravam e para a coisa lilás que saía da panela. Usagi ainda sorria, até ver as expressões dos três rapazes. Seu sorriso desapareceu naquele instante. Estava pronta a reclamar e a começar a comer quando...
- Kami-sama... não precisava fazer para um batalhão, ne? - disse Martin, começando a preparar seu prato.
Mamoru e Ricardo ficaram a olhar espantados para aquilo, mas não menos do que Usagi. Segurando o garfo, ele o espetou num pedaço rosa e começou a comer, indiferente dos olhares que recebia. Comendo com gosto, os três ficaram apenas a olhar para o chinês. Ricardo, seguindo então o exemplo do primo, começou a preparar seu prato, tomando ainda o cuidado de não encher tanto quanto o de Martin.
Sem dar nenhum sinal de aprovação ou reprovação, o casal ficou a observar então a reação de Ricardo. Este, tentou ser tão indiferente aos olhares quanto Martin e espetou a coisa lilás. Enfiando de uma só vez na boca, ele parou por alguns instantes, antes de continuar a mastigar. Engolindo então, ele parecia até estar se divertindo com a ansiedade do casal na espera de algum sinal.
- Está excelente, Usagi-san. - disse Martin, iniciando um segundo prato de curry especial. - Domo arigato.
- M-mesmo? - gaguejou Usagi, com os olhos úmidos.
- Hai. - respondeu Ricardo, agora tomando uma porção mais generosa do especial de Usagi.
Diante daquilo, Mamoru nada mais podia fazer do que começar a comer. Claro, a opinião de Mamoru era a que mais importava para Usagi. Após a primeira garfada, outras vieram, para o prazer de Usagi. Abraçando Mamoru, ambos sorriram ternamente, pouco antes de começarem a comer.
Todavia, Usagi estava tão satisfeita em observar os três comendo que sequer se importou em almoçar naquele dia. Claro, o pensamento dos três era diferente, enquanto tentavam esvaziar a panela o mais rapidamente possível.
"Nota mental: comprar anti-ácido o mais rápido possível."
Usagi sequer notou que a água estava indo mais rápido que o curry.***
Tarde da noite, num outro fuso horário. Na verdade, doze horas atrasado em relação ao almoço dos ficwriters. Isso pouco importava para aquele garoto.
Sentado na frente de um monitor de computador, seus dedos pareciam deslizar por entre as teclas, tocando uma estranha sinfonia na noite. A tela, com fotos de Priscilla Asagiri, estava com um tema novo de BGC ao invés do usual de NGE. Ao som do CD Red Eyes, o rapaz parecia estar longe do mundo, se não estivesse longe do planeta. Seu cabelo negro e curto parecia estar bagunçado propositalmente, enquanto um pouco do cabelo parecia preso numa miniatura de trança.
Seus olhos, de coloração incomum, pareciam variar do cinza ao azul, mas não se afastavam daquele monitor, enquanto palavras formavam-se tão rápidas quanto as sentenças. Embora tanta atenção estivesse presa no computador, ele não estava fazendo algo prazeroso. Ainda mais tão próximo da meia-noite e sem uma única caneca de Earl Grey.
- ARGH! ACABEI! - manifestou o garoto, colocando o último ponto final do texto. - Até que enfim...
Salvando então o trabalho feito, seus dedos logo localizaram as teclas de atalho, iniciando a impressão. O trabalho era longo, mas era merecido. Já até podia ver a cara da professora quando ele entregasse aquilo. Ainda que estivesse em época de Vestibular, aquilo simplesmente não era um motivo forte o suficiente para punir uma classe inteira a fazer um trabalho de dois dias a respeito de nuvens eletrônicas.
"Che!" pensou o garoto, "Vamos ver QUEM pune QUEM por aqui..."
Deixando agora o trabalho a cargo da impressora (e que Murphy tente não fazer plantão naquela noite), o rapaz saiu de seu quarto, rumando diretamente para a cozinha. Seus passos, silenciosos e bem espaçados, eram típicos para uso noturno. Em outras palavras, não era a primeira vez que ficava diante do computador em plena madrugada.
Em pouco tempo, ele manobrou o espaço entre seu computador e a porta do quarto, na parede oposta. Quieto, ele sabia que sua mãe e seu padrasto iriam certamente dar-lhe algum sermão se o pegassem acordado àquela hora. Entretanto, seu objetivo estava mais focalizado em outra coisa. Passando pelo corredor, ele imaginou o que o arquiteto havia bebido para fazer tal planta de apartamento, mas logo encontrando a porta sagrada.
Chegando na cozinha, ele acendeu as luzes. Torcendo a boca, ele acabara de se lembrar que havia consumido toda a água quente nas últimas três horas gastas com Earl Grey. E ele simplesmente não estava com humor suficiente para começar a ferver mais água. Com uma decisão rápida e simples, ele virou-se para o outro lado, procurando abrir a geladeira.
Lá estava ela. Com um sorriso quase macabro no rosto, ele a tomou em mãos. Como era precioso aquele momento! Embora fosse eterno, não havia nada como tocá-la como se fosse sempre a última vez.
Ainda sorrindo, ele alcançou logo um copo e despejou nele o negro conteúdo. Os olhos pareciam brilhar diante daquilo e seu cérebro parecia absorver toda a cafeína presente no líquido.
- Coca-Cola... - disse o garoto, quase a como venerar o líquido.
Bebendo o copo inteiro de uma só vez, ele quase sentiu seu cérebro se energizar com os produtos químicos ali presentes.
- Mwe. Heh. Heh. Heh... - continuou ele, voltando para seu quarto. Claro, a garrafa de dois litros de Coca-Cola ia a tiracolo.
*DING*DONG*
- Huh? - estranhou o garoto, ao passar pela mesa de jantar.
QUEM poderia ser numa hora daquelas? Deixando toda a atuação de lado, a seriedade tomou seu rosto, enquanto caminhava na direção da porta. Para sua infelicidade, aquele havia sido um dos dias em que a lâmpada do hall havia queimado, o que significava maior cuidado. O garoto então decidiu voltar o seu caminho, encontrando-se rapidamente no quarto-depósito.
Tirando um objeto de lá, o colegial voltou-se diante da porta de entrada de seu apartamento. Contanto que não fosse um 'boomer' ou coisa parecida a explodir sua casa, estava tudo bem e sob controle.
Mas surpresa dominou seu rosto quando abriu a porta.
- Kuso...***
- {Não pude evitar.} - respondeu ele, sem nem mesmo demonstrar quaisquer emoções. Ou ainda indicar qualquer pista de arrependimento.
- {Mas bem que você poderia ter dado algum sinal, ne?} - falou a outra voz, muito mais emotiva. - {Tudo bem que ela ficou feliz e tal... mas meu estômago NÃO agradece.}
- {Agradeça aos seus kamis, Cousin.} - disse a outra voz, ainda altiva e séria. - {Agradeça a eles, pois ela não irá mais repetir a façanha.}
Ricardo Gen, estudante colegial a intercâmbio no Japão, não conseguiu fazer outra coisa além da reação familiar a coisas estranhas. Ou seja, ele franziu a testa na direção de seu primo ficwriter com parafuso solto na cabeça. Algo que poucos teriam orgulho de afirmar.
- {Como assim?} - perguntou ele. - {Você por acaso a ameaçou de morte ou coisa parecida?}
- {Hey! Não seria uma má idéia... mas isso certamente não me obrigaria a ter comido.} - respondeu Martin. - {Todavia, apenas disse para ela que pratos deliciosos não podem ser degustados todos os dias, ou pode-se estragar os estômagos.}
- {No caso, iria fazer algo mais além de estragar. Literalmente falando.} - comentou Ricardo, passando a mão direita sobre seu estômago em recuperação. - {Sorte que Usagi-san saiu para ir visitar a Tieko.}
- Hai. - confirmou o ficwriter. - {Mamoru-san deve ainda estar no banheiro, então é melhor nós caminharmos um pouco mais.}
- Un. - concordou Ricardo. - {Mudando de assunto, você até que está falando bem o japonês, não?}
- {Como assim?}
- {Bem, você conseguiu aquele anti-ácido sem qualquer ajuda.} - disse Ricardo, lembrando os últimos trinta minutos num lugar público.
- {Quem disse que era anti-ácido??? Depois daquilo, nem anti-ácido resolve.} - falou Martin, fazendo Ricardo parar naquele instante.
- {Então, o que foi aquilo? Loção mágica?}
- Iie. - respondeu Martin, com um sorriso aterrador em seu rosto. - {É apenas um dos vários produtos para 'limpeza estomacal'.}
- ... - Ricardo piscou os olhos por alguns instantes, o que revelou algo que Martin já premeditara. - {Você comprou PURGANTE???} - gritou Ricardo, que começou a correr atrás de um primo fujão.
- {HA! Funcionou, não funcionou?} - respondeu Martin, agora em melhor forma para corridas. Claro, ele não comentou isso com seu primo ou com sua 'treinadora particular'.***
Quando um estranho bate à porta... isso, isto e aquilo acontecem. Quem nunca viu isso nos filmes de terror? Repentinamente, abre-se a porta e podemos encontrar com um assassino estranho ou ainda um corpo em estado lamentável a cair sobre nós.
Entretanto, não havia sido isso que ocorrera com Henrique Loyola naquela noite de Maio (mas haveria de ocorrer se um trocadilho infame fosse pronunciado). Não menos estranho, porém muito pouco assustador, estava ali uma pessoa que ele jamais esperaria ver tão tarde da noite. Isso SE ele algum dia tivesse imaginado que alguém iria tocar a campainha de seu apartamento numa hora tão tarde da noite.
- O que faz aqui, Tolaris? - perguntou Henrique, ainda segurando a garrafa de Coca-Cola, agora sendo dividida pelos dois.
- Bem, eu meio que soube da viagem de Ricardo e pensei que podia vir até aqui para todos nós nos despedirmos dele. - falou Daniel 'Tolaris'. - Já avisei o Edson também.
- ... - foi a resposta de Henrique. - Anoo... Ricardo partiu hoje de manhã. Quer dizer, ONTEM de manhã. - disse ele, confirmando pelo relógio.
- NANI YO?!?
- Shh... Kaasan está dormindo! - falou Henrique, tampando de imediato a boca de Daniel.
- Hmm... HMMMMmmMMfmmMMFT... HMMM! - foi a resposta seguinte de Daniel. Claro, o fato de haver uma mão na frente da sua boca deixou o diálogo pouco inteligível.***
A tarde estava muito agradável em Tóquio, perfeita para um passeio de um casal apaixonado, como os muitos que se viam nos parques que ainda não haviam sido destruídos. Com a primavera se aproximando, não era raro ver as flores desabrochando, os pássaros cantando, como se anunciassem a época do amor. E, principalmente, as épocas das famosas sakurabana do Japão. Em pouco tempo, as flores das cerejeiras iriam começar a cair como uma chuva rosada.
Infelizmente, com elas cairiam o humor do japonês que andava naquele instante no meio do parque. Nervoso, as cerejeiras apenas pareciam aumentar o ímpeto nobre que vagava em seu coração, despertando algo que ele esperava não rever. A primavera era também uma época de intensas saudades.
Chutando pedregulhos pelo caminho, Satori Ryu caminhava pelas ruas de Juubangai, indo na direção da casa de Kano Akai. A brisa suave que batia em seu rosto, fazendo com que seus cabelos ficassem bagunçados, parecia trazer mais lembranças do 'Evento' do que recordações felizes, como os sorrisos de Minako e mesmo as lutas contra o Reino Negro... quando estavam todos vivos.
Os Dragon Kishi já não estavam completos. Faltavam quatro... Mizusei Ranko, Aisei Kyoko, Inazumano Shippu e Tatsumaki Kitsune. No Japão somente dois permaneciam junto às Senshi: Ryu e Akai. Os outros estavam muito longe... muito distantes.
"Perdemos eles."
A sua própria voz ressoava em sua mente, enquanto a imagem de Kyoko agonizante passava diversas vezes pela sua memória. Não, não agonizante. Ele continuava a observar aquele rosto sereno da Dragon Kishi. Mesmo diante da própria morte, ela havia provado ser muito mais forte do que aparentava.
A herdeira milionária havia sofrido muito, mas aqueles olhos... aquele rosto havia sido impresso como ferro em brasa em sua mente. Seu sangue estava espalhado por todo o lugar, mas sua expressão era de pura calma. Ela tinha sorrido na sua direção, pouco antes de seu corpo desaparecer como estrelas cintilantes. Ryu jamais se perdoou por aquilo.
Que espécie de líder ele era afinal... se não conseguira evitar que seus amigos se perdessem nas mãos de Dark Angel?
"Você não é um líder, Satori Ryu. Você é um fracassado."
A sua consciência continuava lhe atormentando, culpando e julgando-o por um crime que nem mesmo ele sabia se havia cometido. O único fato real era que quatro de seus amigos estavam perdidos - e ele não havia feito nada para impedir que isso acontecesse.
Mesmo que Kazeno Ken continuasse a dizer várias vezes para ele que não havia sido sua culpa... que eles haviam escolhido os seus destinos... Ryu não podia admitir isso. Era diferente. De alguma forma, era diferente. Ele falhou ao não conseguir manter a equipe unida. Forte.
Quando se viu na frente da casa dos Kano, Ryu suspirou e tocou a campainha algumas vezes, impacientemente. Parecia até mesmo estar aliviando a sua tensão através da campainha.
- Ryu? - exclamou Akai, ao abrir a porta. - Daijoubu?
- Un. - resmungou Ryu, ainda atormentado com seus próprios pensamentos. - Está ocupada, Akai?
- Iie...
- Posso entrar? - perguntou simplesmente o Dragon Kishi. Ele simplesmente não estava mais com humor para etiquetas.***
Já dentro do quarto de Henrique, Daniel enfim conseguiu fôlego para falar alguma coisa... sem uma mão na frente de sua boca, as palavras saíam mais claramente.
- Quer dizer que o Ricardo foi ONTEM para o Japão?! - perguntou Daniel, genuinamente surpreso.
- Hai. Pensei que era só o seu senso de direção que era terrível, não sabia que a sua noção temporal também era ruim. - riu Henrique, largando a garrafa de Coca-Cola em cima da escrivaninha. E tomando cuidado para não acordar a sua mãe no quarto ao lado. - Deveríamos mudar o seu nick para Ryouga Hibiki. É mais condizente.
- Já me bastam a Anne e a Tieko tirando sarro de mim por causa disso, Ranma. - resmungou Daniel, tirando a mochila das costas. Sim, para reforçar a conclusão de Henrique, era uma mochila GRANDE. - E não tenho um senso de direção tão ruim assim. Consegui chegar até aqui.
- Sim, mas você já veio aqui DEZENAS de vezes. - retrucou Henrique, sorrindo para a mochila, que Daniel tentava ignorar. - Agora... você chamou o Edson para vir aqui?
- Chamei. Ele me disse que estaria aqui às oito, já que os vôos da JAL costumam sair entre nove e dez horas da manhã.
Henrique olhou sorrateiramente para o seu relógio e, constatando que a impressão do seu trabalho havia terminado e que era mais de uma hora da manhã, abriu o armário, puxou um colchonete e o estendeu no chão.
- Se não dormirmos AGORA, o Edson vai nos arrancar da cama. - disse diretamente o ficwriter.
- Jeez... - falou Daniel, olhando um tanto surpreso para o colchonete. Quase ia comentar algo sobre 'o que você faz com um colchonete dentro do armário do quarto?', mas ele decidiu por não o fazer. Conhecendo o ficwriter, era melhor não arriscar em receber OUTRO comentário a la Hibiki. - Preguiçoso do jeito que ele é, acha que ele vai chegar cedo? - riu Daniel 'Tolaris', deitando-se no colchonete.
- Espere tudo de um 'Cloud Strife'... foi ele quem levou a Tieko para o aeroporto, lembra-se? E ele acordou BEM CEDO naquele dia.
Após jogar um travesseiro na cabeça do primo de seu primo Fernando, Henrique acomodou-se em sua cama e, colocando sua cabeça no travesseiro, tentou pegar no sono. Ao fechar os olhos, teve a nítida sensação de que deveria ficar em vigília... mas o calor de sua cama foi mais forte do que a sua força de vontade.
Além do que, tinha acabado a Coca-Cola...***
Num outro lugar e num outro tempo, outra pessoa também estava retornando a um lugar deveras conhecido. E não podia deixar de sorrir. Seu senso de direção nunca havia falhado, portanto não precisava se preocupar como uma certa pessoa que conhecia. Durante muito tempo ele esperou por esse dia. O dia em que poderia voltar para casa, carregando consigo algo que faria sua família orgulhosa.
Ao contrário dos demais, Seph decidiu não assistir o torneio dos Noble Kishi em Hades e preferiu retornar antes do tempo para Urano. Haviam sido anos de treinamento em Plutão... e era chegada a hora de voltar.
Viajando em seus pensamentos, só quando seus pés tocaram o solo de Urano, Seph notou que tudo havia acabado. Nada mais de treinamentos, aquilo agora fazia parte do seu passado. Porém, uma coisa ainda o perturbava: seu título deveria ser secreto, ninguém poderia saber que ele era um Kishi. Pertencente a uma equipe de elite selenita, o rapaz seria motivo de orgulho para sua família... mas ele não poderia revelar o que estivera fazendo durante os três anos em Plutão.
Procurando desviar sua atenção somente para o caminho que deveria seguir, ele divertia-se com o paradoxo que se criara com essa situação; logo aquele que defendia a liberdade a qualquer preço, estava preso em grilhões que nunca desejara ter.
"Nem mesmo o próprio filho de Sailor Pluto ou a princesa de Mercúrio puderam revelar quem realmente são... que assim seja. Guardarei esse segredo..." pensou ele, pausando por um instante. "... até o final de minha vida? Bem, não sei se é um tempo... negociável." terminou ele, fazendo uma careta para si mesmo.
Retomando logo o seu rumo com seus passos velozes, Seph não demorou muito para chegar em sua casa. Ao longe, ele já conseguia visualizar tudo do jeito que estava antes dele ser convocado. A saudade por sua família era imensa, e ele sabia que a recíproca também era verdadeira.
Seph estava erguendo o braço na direção da porta quando olhou para as próprias roupas. Vestido com calças e botas pretas, jaqueta verde escura, faixas de tecido da mesma cor envolvendo sua cintura e uma braçadeira com o símbolo de Urano no braço direito, JAMAIS que ele conseguiria convencer alguém de que ele não pertencia a alguma equipe selenita. Um sorriso passou pelo rosto do rapaz quando ele finalmente bateu na porta de sua casa.
"Fate-sensei, você fez isso de propósito, ne?" pensou Seph, lembrando-se da exigência de Sailor Pluto para que eles sempre usassem os uniformes de Kishi. Em outras palavras, ou ela queria que eles se tornassem sombras, ou ela tinha um estranho senso de humor.
"Ou ambos!" pensou também Seph, sorrindo ao abrir a porta. Pelo menos, agora estava longe de qualquer investigador mental.
- Tadaima! - exclamou Seph, colocando a cabeça para o lado de dentro da casa. Isso, é claro, era um movimento perigoso, como foi demonstrado a seguir. Uma lição aprendida por Seph de Urano.
- Ototo! - exclamou uma garota, sendo seguida por mais uma voz.
- Oniisan!
Duas garotas correram na direção da porta, envolvendo Seph em um abraço que ele desejou que nunca terminasse. Quase sufocado pela força dos braços delas e entretido com os alegres risos que invadiam seus ouvidos, ele quase não escutou uma terceira voz feminina.
- Okaerinasai, Seph-chan. - disse a voz meiga.
- Okaasan... - murmurou Seph, desvencilhando-se dos braços de suas irmãs para ir na direção de sua mãe. - Tadaima, okaasan...
O terno e doce sorriso de Rhea devolveu ao corpo de Seph o calor que ele pensara que perdera em Plutão. Ele estava em casa... desta vez, para nunca mais abandoná-la.***
E a sensação de estar em casa certamente lhe seria abençoada. Com o relógio biológico completamente bagunçado pela mudança de fuso horário, Ricardo estava prestes a DESMAIAR de sono no Templo Hikawa. Claro, o fato de seu estômago estar um tanto estraçalhado pelos dotes culinários de Usagi também ajudava um pouco em seu estado de torpor. Amaldiçoando mentalmente seu primo por ter comprado purgante, o garoto procurava tentar ENTENDER alguma palavra do que as meninas à sua volta estavam dizendo.
- Seu primo, Martin? - perguntou Rei, sentando-se entre o hóspede do templo e sua amiga Minako.
- Hai. Algumas coincidências da vida e brincadeiras de Murphy fazem com que coisas desse tipo aconteçam... Cousin também faz parte do meu grupo de ficwriters, MAS... - falou Martin, elevando a sua voz naturalmente baixa para algo BEM audível quando viu Makoto se aproximando. - ... _NÃO_ foi ele quem escreveu aquela história que vocês leram.
Um leve suspiro de alívio saiu dos lábios de Mamoru, nem um pouco disposto a ver mais uma sessão de perseguição-em-volta-do-templo. Makoto, por sua vez, limitou-se a cumprimentar Ricardo e a sentar ao lado de Usagi, que estava entretida lendo um mangá de Marmelade Boy, para a surpresa de todos.
- <Então vamos às apresentações de praxe...> - brincou Minako, com Artemis no colo. - <Eu sou Aino Minako e estas são as minhas amigas, Usagi, Ami, Rei e Makoto. Estes são Artemis e Luna.>
- <Bom... eu sou Ricardo Gen...>
- <Você também usa algum daqueles nicks de Internet?> - perguntou Makoto, interrompendo-o bruscamente.
- <Si-sim.> - gaguejou Ricardo, começando a suar frio. Claro, parte disso era devido ao terrorismo mental feito por seu primo mais velho. - <Meu nick na Net é R-kun.>
- Aru-kun?! - exclamou Minako, abafando uma risadinha ao ver Artemis levantando uma orelha.
"Damn... Cousin, você PODIA ter deixado de falar isso..." pensou Martin, dando um leve tapa na própria testa. "Ou melhor... não. Que os kamis nos protejam e que Saotome NÃO venha para cá... ou que ele diga que o nick dele é Saotome, não Ranma." Ele repensou, ao ver a expressão facial de Kino Makoto, riscando algo em uma folha de papel.
- {Conheças agora a turma da Coelha.} - disse seriamente Martin ao ficwriter que observava atentamente a pessoa de odangos ao seu lado.
- {Não fui quem deu nó no coelhinho.} - retribuiu em sua cansada voz o ficwriter. Ambos sorriram diante da incompreensão de todos.
- Às vezes, ele precisa se lembrar para não gaguejar na frente de garotas. - explicou malevolamente o ficwriter com o humor ativo de "Tonight I will conquer the World, Pinky!", sorrindo abertamente.
- <O que foi que você disse, Martin?> - perguntou agora o ficwriter.
- <Que você precisa fazer mais exercícios para solucionar AQUELE problema.> - respondeu Martin, estrategicamente olhando para a pessoa ao lado do seu primo.
- <Ah! Sim... claro...>
Cousin, é claro, entendeu que o problema era mais... gástrico. E não entendeu porque as garotas haviam rido baixinho naquele instante, mas isso favoreceu para que ruborizasse.
Tentando se esquecer disso por um instante, Ricardo surpreendeu-se novamente ao perceber que não conseguia realmente parar de pensar. Algo já dito diversas vezes por seu primo que se auto-clamava acéfalo.
No entanto, para seu 'extremo' bel-prazer, Murphy decidiu que o assunto que sua mente deveria se ocupar seria justamente o que a garota de cabelos castanhos estava a anotar. O terror voltou a preencher parte da mente de Ricardo, o que ficava evidente pela extrema palidez de seu rosto. Sem dúvida nenhuma, ele não havia viajado tantos quilômetros para virar patê... AGORA ele estava começando a entender o porquê de Martin ter insistido tanto para modificar a página na Internet o mais rápido possível. Pelo menos não havia sido ele a escrever 'Senshi psicótica' como sinônimo de Sailor V.***
O dia, no entanto, começou BEM cedo para outras pessoas com relações de primos. mais precisamente, Henrique 'Ranma' Loyola e Daniel 'Tolaris' Rezende. Exatamente como havia sido previsto pelo primeiro, a campainha do apartamento tocou antes das oito horas da manhã, machucando os ouvidos dos dois notívagos.
Felizmente, o som da campainha não durou muito tempo, sendo substituído pelo barulho de passos e de algumas vozes...
- Bom dia, Edson.
- Bom dia. O Henrique e o Daniel já acordaram?
- Daniel? - espantou-se a mãe de Henrique. - Mas ele não está aqui.
- Não?! - surpreendeu-se Edson por um instante e franzindo a sua testa. - Estranho... ele combinou de se encontrar comigo aqui... posso acordar o Henrique?
- Claro, entre.
Edson aceitou logo o convite, esperando então que a ex-senhora Loyola trancasse a porta. Ele já estava planejando um modo rápido e eficaz de 'como trucidar violenta e dolorosamente um Tolaris em poucas etapas' enquanto caminhava na direção do quarto de Henrique. Por sua vez, Regina Célia estava imaginando como Daniel poderia ter marcado um encontro em seu apartamento se ele nem ao menos estava...
- DANIEL?! - exclamou a pobre senhora ao ver o primo de seu sobrinho dormindo no chão do quarto.
- Hã? Ah, bom dia, tia... - resmungou atrapalhadamente Tolaris, levantando a cabeça do travesseiro. Com uma cara de 'quero dormir mais um pouco', ele tentou não dizer nada quando uma segunda cabeça apareceu pelo batente da porta. - Bom dia, Cloud...
Uma gota gigante apareceu na cabeça da mãe de Henrique quando relacionou o estranho barulho que ouvira na noite anterior com o repentino aparecimento de Daniel em seu apartamento. Não, é claro, que ela tivesse já considerado os 'barulhos' de Henrique como naturais, mas ela saberia ao menos reconhecê-los. Olhando com certo desapontamento na direção dos três, ela sabia que a geração mais jovem de sua família e os amigos dela eram esquisitos, mas jamais poderia imaginar que a loucura poderia chegar àquele ponto: andar pelas ruas de São Paulo em plena madrugada, para bater na porta de seu apartamento às três horas da manhã?!? Aquilo era certamente demais.
Ela certamente precisava conversar com a mãe de Daniel, também. Como ela podia deixar o filho sair daquela forma? Quer dizer, para SÃO PAULO, e de MADRUGADA. E um garoto que SEQUER parecia saber que horas são apropriadas para ir à casa de familiares.
- Bem... - ela começou, sem saber direito o que falar naquela situação. - Querem tomar café?
Ao som da palavra 'café', Henrique e Daniel levantaram das camas imediatamente, causando um princípio de tumulto no apartamento. Sons de 'Eu primeiro!' e 'Não! EU primeiro' repercurtiram pelo lar dos Loyola, enquanto Edson se limitou a segui-los, olhando em seu relógio a cada cinco minutos. Sem dúvida nenhuma, ele não estava com a mínima vontade de chegar atrasado ao aeroporto para se despedir de seu amigo...***
Do outro lado do mundo, uma outra pessoa também perdera completamente o seu sono. Na verdade, essa pessoa tinha um bom motivo para tanto. Depois de toda a agitação que tivera no Templo Hikawa, Ricardo Gen decidiu que já era hora da verdade se concretizar. Bem, sendo um pouco menos 'X-File', ele havia simplesmente se perplexado quando a 'Gangue da Coelha' havia mencionado que Tieko-san estava no hospital.
Já estava na porta do hospital, juntamente com seu primo, que, estranhamente, preferia observar o ocaso atingir as paredes brancas do recinto do que propriamente ENTRAR no hospital. Movido um pouco pela sua própria ansiedade, Cousin R-kun havia então 'convencido' seu primo para apressar-se um pouco mais.
- {Olha lá, hein?} - disse Martin, enfatizando as palavras. - {Se você não entregar as latas de capuccino em pó, irei PESSOALMENTE requerer as ações devidas na sua mesada.}
Claro, talvez o motivo não fosse tão... interessante quanto devesse ser, mas havia funcionado na opinião de Ricardo Gen. Ele, ao menos, podia dizer que conhecia o seu próprio primo. Não demorou muito, até que uma garota de cabelos azuis aparecera diante do saguão do hospital, chamando a atenção do ficwriter. Olhando para seu primo, a expressão de familiariedade presente o fez concluir que deveria ser outra da 'Gangue'.
Segundo as descrições feitas nos fics, Ricardo concluiu rapidamente que se tratava de Mizuno Ami. No entanto, seus pensamentos ainda estavam vagos na direção de Tieko-san. Assim como Martin, ele era amigo de Paolla, embora que apenas havia sido uma amizade via a Grande Rede. Lembrando-se da cena cômica ocorrida no aeroporto de São Paulo, Ricardo sorriu, mas pouco depois voltou a se preocupar. Não pela saúde de Paolla, que, segundo a calma sempre presente de Martin, estava estabilizada. Ele estava agora preocupado com algo muito mais importante em sua opinião, embora soubesse logo que a opinião de seu primo seria de que era algo banal.
- <Olá! Você deve ser o primo do Martin, ne?> - cumprimentou educadamente a garota de cabelos azuis. - <Meu nome é Ami.>
- <Hmm... oi! Sou o Ricardo... prazer.> - respondeu o garoto chinês, enquanto um segundo estava a sorrir malevolamente diante da situação. - {E quanto a você, nada de tentar fazer disto um fic!}
- Okee-dookey. - disse MADS, ainda sorrindo. - <Podemos visitar a Paolla, Ami-san?>
- <Claro! Quem sabe ela não se anima um pouco mais?> - concordou Ami, lembrando-se que Limy-chan ainda não havia terminado o jantar.
Ricardo Gen, por outro lado, respirou fundo. Iria finalmente conhecer Paolla Matsuura, em carne, ossos, sangue e talvez um pouco de silício. Quer dizer, não é como o encontro ocorrido no aeroporto. Aquilo, Ricardo sequer consideraria um 'encontro'. Martin e Paolla haviam apenas se esbarrado no meio do aeroporto e ele sequer tivera mais tempo do que Edson de colocar ambos no saguão de embarque da JAL.
E agora... agora era O encontro. Não, seu hentai, não é DESSE tipo de encontro que ele está a pensar. Agora era O encontro entre Ricardo Gen e Paolla Matsuura. O encontro que quebraria a ilusão da Grande Rede, como falava constantemente MADS pelos seus trinta e-mails diários. Entretanto, os pensamentos de Ricardo foram novamente interrompidos por seu primo, quando ele disse algo ao passar (finalmente) pela porta principal do hospital.
- Anoo... Ami-san, não estamos fora do horário de visitas? - perguntou Martin, tentando decifrar alguns kanjis de uma placa no saguão de entrada do hospital. Felizmente, números era algo já natural para a mente do bacharelando de ciências da computação, o que facilitara em muito a interpretação. Embora ele continuamente se perguntasse qual era o problema que eles tinham numa universidade em NÃO usar os algarismos arábicos.
- Um pouco, mas ela está em um quarto particular, pago pelo Seguro Médico Internacional. Aquele horário que você estava vendo na placa é para pacientes japoneses. - respondeu Ami, indo na direção de um longo corredor branco. Não, não era um corredor de luz ou imaginação de moribundo. Você precisa REALMENTE de ajuda, se pensou nisso.
- Hmm... so ka. - disse Martin, deixando de olhar a placa e notando algo... interessante. - Hey, Ami-san! Espeeeeereeee!!! - chamou/gritou Martin, quando notou que estava se distanciando MUITO de Ami.
- {Cousiiiiiiin!} - gritou Ricardo, ficando para trás.
O pequeno 'tumulto' criado pelos dois primos não ficou sem ser ouvido do quarto 230, para onde Paolla havia sido transferida após alguns dias na UTI. Sentada na cama, com o lap-top no colo, ela sorria mentalmente enquanto digitava furiosamente no pequeno teclado do Cassiopéia.
Evidentemente, Ami não iria gostar muito de vê-la escrevendo sem estar totalmente recuperada... em um piscar de olhos, Paolla desligou o monitor do lap-top e o colocou sob o travesseiro, deitando-se em seguida.
Fechando os olhos só para fingir que estava dormindo, a ficwriter conseguia escutar vozes vindas do corredor. Vozes típicas de 'quem entra primeiro', 'ei, eu vou na frente', 'sai, é a minha vez', 'parem, ela deve estar dormindo' e coisas do gênero...
Quando (finalmente) a porta se abriu e todas as vozes se calaram. O cenário, segundo os pares de olhos abertos e presentes, estava perfeito: o quarto silencioso como se fosse um templo budista, a paciente em recuperação deitada, provavelmente pelo cansaço físico de seu corpo, e de olhos fechados... Mas algo quebrou aquela perfeição. Teria sido tudo perfeito, se não fosse por UM único detalhe.
A luz estava ACESA.
- Limy-chan! - chamou Ami, percebendo que ela ainda estava acordada.
"Ack!" pensou Paolla, abrindo os olhos abruptamente na direção da garota de cabelos azulados.
- Ami-chan, quantas vezes vou ter que pedir para que...
- LIMY-CHAN? - indagou enfaticamente Martin, inclinando levemente a cabeça para o lado. - {Posso saber o que aconteceu nesse tempo em que eu NÃO vim para o hospital?}
- {E você pergunta para MIM? De repente, ela começou a me chamar de Limy-chan!} - respondeu um tanto nervosa Paolla, virando-se na cama e esquecendo-se de um pequeno detalhe que estava embaixo do travesseiro.
O computador.
Vendo a ponta grafite do lap-top, Martin discretamente o pegou antes que Ami, que estava arrumando as flores do quarto, percebesse que sua 'paciente' estivera usando o computador quando deveria estar em repouso.
"Mas como é que vou sair com esse lap-top daqui? Se ao menos a maleta dele estivesse por perto..." pensou Martin, inclinando-se sobre a cama... e vendo uma maleta sobre a cadeira. "Geez... que conveniência, Murphy..."
- Bem, não faz mal. - disse o chinês, aproximando-se da garota. - Pelo menos está melhor... e estou MORTO de saudades! - exclamou o ficwriter, jogando-se sobre a amiga, abraçando-a. Claro, aproveitando o impulso do abraço, ele pegou a maleta com a mão direita.
No entanto, a ação não havia sido despercebida pelos presentes no quarto de hospital. Ricardo e Ami ficaram com olhos imensos, porém, não maiores do que os de Paolla. Todos sabiam que a amizade que Martin tinha por ela era grande, mas não TANTO assim. Outro detalhe: a última vez em que ele a visitara havia sido no dia anterior...
Para Martin, no entanto, a sua OUTRA ação havia sido espetacular. Nem mesmo Paolla parecia ter percebido que um certo aparelho não estava mais debaixo do travesseiro. Soltando a chocada ficwriter brasileira e silenciosamente guardando o lap-top na sua maleta, ele deu uns tapinhas amigáveis nas costas da agora sentada Paolla, pouco antes de esconder a maleta atrás de si.
- <Hey! Que caras são essas?> - perguntou 'inocentemente' o ficwriter para os boquiabertos. - <Não posso mais abraçar uma amiga?>
- ... - foi a resposta dos três, enquanto Paolla corava levemente.
- Geez... - retrucou Martin, encostando-se próximo à parede. - <De qualquer forma, ESTE é Cousin, Paolla-san!> - disse sorridente o ficwriter, aumentando ainda mais a confusão nas três mentes.
- {Hã... oi?} - produziu Ricardo, um tanto confuso. - Limy-chan, ne?
- {... oi.} - respondeu a ficwriter.
*blinks*blinks*
Essa foi a única reação de Ami diante dos brasileiros. Mas, momentos depois, a ausência de um chinês não foi detectada quando Ricardo e Paolla tentavam aprimorar o 'contato' da comunicação, enquanto a mercuriana tentava ainda organizar os seus pensamentos.***
"Che! Pensamentos aleatórios a la MADS." pensou o garoto fora do quarto. Certamente, ele sabia que, depois da surpresa e de toda aquela movimentação, eles ainda ficariam um tanto surpresos, perdidos e confusos. Afinal, essa era a natureza humana.
Martin sabia disso perfeitamente pelo simples fato dele também ser sujeito àquela tempestade de emoções. Saindo durante a confusão, o chinês predizia que bastava esperar com a maleta em suas mãos ali fora para que ninguém ainda tentasse se lembrar do que aconteceu durante o tumulto. Isso, por sua vez, significava que ninguém iria lhe perguntar sobre como a Cassiopéia havia parado em suas mãos ali no hospital. No entanto, o que realmente lhe importava naquele instante era que nenhum banco brasileiro estava ali por perto para fazer comercial.
Fazendo uma nota mental para tentar não agir tão rapidamente antes de pensar, Martin não deixou de observar que havia REALMENTE feito aquilo quase num reflexo condicionado para evitar que amigos fossem prejudicados. No caso, ele quase conseguiria fazer uma analogia com o incidente do salto ao telhado de Hikawa Jinja. Isso, se ele se lembrasse exatamente do que ocorreu durante a pirueta acrobática.
Também perdido em seus pensamentos, Martin agora deixara de sentir O olhar atravessando a sua alma. Mas a estranha sensação não havia sido esquecida... e tampouco deveria.
Sentado num banquinho ali perto, ele inconscientemente fechou a boca sobre os lábios, formando duas 'covas' nas maçãs de seu rosto. Um olhar preocupado e pensativo dominou a expressão do chinês novamente, como era-lhe corriqueiro antes de fazer qualquer coisa séria.
Página integrante da Jikan no Senshi Destiny Kishi
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