SAIR E VIVER
Estavam muitos homens, uma vez, dentro de quartos inteiramente fechados. Neles encontraram segurança. Sabiam vagamente que lá fora havia alguns movimentos mas eles não se envolviam. A vida era um pouco chata, frustrante, mas eles tinham alimento enlatado e comiam com satisfação e sem risco. O alimento ia se acabando, mas, por uma estranha situação, sempre permanecia igual e podia ser reaproveitado. O ar entrava, em pequenas quantidades, por aberturas que eles tentavam fechar, sem que nisso tivessem êxito completo. O ar se deteriorava, mas os mantinha quase vivos e, como eles diziam: "Isentos de micróbios."
O destino dos homens enfurnados em seus quartos foi diverso.
Uns morreram quando conseguiram fechar-se inteiramente.
Outros tiveram seus quartos destruídos por vendavais e tormentas e, desses, uns foram mortos nesses cataclismos, outros passaram a viver ao ar livre.
Outros receberam visitas - a esperança, a vergonha, o compromisso, a opção, a teoria, o amor, a liberdade, a justiça, ... - e, por causa daquela visita que receberam, abriram suas portas e janelas.
Outros, enfim, pensaram sobre uma porção de coisas que tinham divisado quando havia abertura, e resolveram abrir as portas e janelas, e sair, e viver.
Danilo Gandin
Este texto é uma colaboração de Cíntia/Porto Alegre-RS