A Questão do Amor

 

 

Na filosofia, o livro mais famoso sobre o amor é "O Banquete" de Platão (428/27 – 347 a.C.). Trata-se de um banquete durante o qual alguns antigos atenienses tentam explicar porque o amor exerce tanto poder sobre nós. Um dos convidados, Aristófanes, lembra que, quando amamos uma pessoa, ela nos parece familiar, como se já a conhecêssemos antes, talvez numa vida pregressa ou em nossos sonhos. Segundo ele, a pessoa amada é nossa "outra metade" há muito perdida, a cujo corpo estávamos originalmente ligados. Todos os seres humanos foram criados como hermafroditas, com costas e flancos duplos, quatro mãos e quatro pernas e dois rostos virados em direções opostas na mesma cabeça. Esses hermafroditas eram tão poderosos, seu orgulho tão devastador, que Zeus foi forçado a cortá-los em dois, numa metade masculina e outra feminina e desde esse dia todos almejam se reunir a metade de que foram separados. Sócrates (outro convidado), expôs uma teoria que ficaria conhecida como "amor platônico". Quando somos jovens e ignorantes em filosofia, tendemos a nos apaixonar por pessoas fisicamente atraentes, com quem queremos dividir a cama. Infelizmente, essa não é uma forma muito pura ou nobre para Sócrates, embora com o devido aconselhamento possamos chegar a ver que a beleza específica de um corpo é somente um exemplo da beleza dos corpos em geral. Quando nos damos conta disso, nossa fixação maníaca por um corpo em particular diminui e passamos a amar a beleza onde quer que ela se encontre. Somos capazes de aprender que a beleza da alma é muito mais valiosa do que a beleza física. É a partir daí que passamos a apreciar a beleza da ciência e a da filosofia, chegando por fim a apreciar a beleza da beleza. Para Sócrates, o amor começa com a paixão por um corpo atraente e termina no amor pela beleza absoluta. Com relação ao sexo, o desejo sexual não é irrelevante para o amor, mas é uma versão de qualidade inferior do amor sublime que descobrimos quando abandonamos nossos desejos físicos - uma visão que encontrou abrigo nos pensadores do cristianismo primitivo e que explica os tradicionais problemas do Ocidente com o corpo.
Para Shopenhauer (1788 – 1860) "o sentimento amoroso radica exclusivamente no impulso sexual". O amor é apenas um nome inventado que damos a um impulso de reprodução da espécie. " (O amante) imagina que se esforça e se sacrifica por seu próprio prazer, mas tudo que faz, na verdade, é guiado pela reprodução da espécie". Para ele, "(o amor) é digno da profunda seriedade com que todos o buscam; ele decide nada mesmo do que o substrato da nova geração". Em sua obra máxima, "O Mundo com Vontade e Representação", Shopenhauer explica por que o amor é um tema eterno: "(O amor" é o objetivo último de quase toda a preocupação humana; é por isso que ele influencia nos assuntos mais relevantes, interrompe as tarefas mais sérias e por vezes desorienta as cabeças mais geniais. Ele não hesita em interferir nas negociações dos homens de Estado e nas investigações dos sábios. Ele sabe como insinuar seus bilhetes de amor e seus anéis de cabelo nas pastas ministeriais e nos manuscritos filosóficos".
Para Nietzsche (1844 – 1900) "o amor é o ódio mortal dos sexos", porque "o homem quer o poder incondicional sobre a alma e o corpo da mulher". Além disso, achava que "a vontade de reinar é a marca dos homens mais sensuais". A seu ver, as mulheres desejam apenas "pertencer" a um homem viril. "O que uma mulher entende por amor é uma dádiva total do corpo e da alma, sem reservas".
Ele não é o único que tem essa visão sombria. Jean–Paul Sartre (1905 – 80) dizia que o amor é um "ideal irrealizável". E isso porque queremos algo impossível das pessoas que amamos: somos atraídos pela liberdade e independência que detectamos nelas. E, no entanto, ficamos tão apavorados que tentamos privá-las desses atributos quando estabelecemos uma relação amorosa. "O amante quer ser amado pela liberdade, mas exige que essa liberdade, como liberdade, não seja mais livre".
Immanuel Kant (1724 – 1804) não achava que os amantes fossem sempre morais. Ele distingue o amor "prático" do amor "patológico". O amor prático seria uma disposição racional de agir de modo benévolo com quem precisa, independentemente de qualquer relação que possamos ter com eles. Amor patológico, por sua vez, é uma inclinação para ajudar a quem amamos, por razões bastante irracionais, porque as desejamos sexualmente. Atos de amor patológico provêm de paixões volúveis e não de uma apreciação racional do que seja certo fazer. É por isso que eles carecem, segundo Kant, da dignidade ética que possuem os atos de amor.
Aristóteles tinha uma visão mais amena pois nunca escreveu especificamente sobre o amor, mas sobre a amizade. Ele achava que uma boa amizade, na qual duas pessoas se unem no amor pela verdade, era o que podia haver de melhor.

E você, o que acha?

 

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