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"Na escola eu ando como
um robô, com medo que um gesto me denuncie. Na
noite gay, me sinto mais eu"
Hilton, 15 anos, com Ney, seu primeiro namorado
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Meus pais sabem
Adolescentes gays de classe média preferem enfrentar
os pais a viver como clandestinos
VALÉRIA PROPATO
A Polícia Federal acaba de instaurar um inquérito para
apurar a corrupção de menores na Internet. A denúncia de
um pai de classe média alta da zona sul do Rio, há duas
semanas, levou policiais a flagrarem, numa chácara em
Campinas, um encontro de adolescentes gays regado a bebidas
alcoólicas, com churrasco e filmes pornográficos. Dos 15
participantes da festa, oito tinham idades entre 16 e 18
anos. Todos se conheceram em bate-papos em um site gay da
Internet e tiveram que pagar ingresso de R$ 35. O site dava
dicas sobre como mentir para os pais sobre o encontro e
oferecia uma vasta programação de shows e visitas a boates
gays. João*, comerciante, autor da denúncia, ficou
chocado. "Meu mundo desabou. Será que meu filho pode
escolher? Ele é só uma criança", desabafou. A
primeira reação de João foi procurar o Centro Brasileiro
de Defesa da Criança e do Adolescente. Motivados por sua
iniciativa, dezenas de outros pais procuraram o centro para
apresentar denúncias. É pouco provável, porém, que eles
consigam deter as mudanças nessa área.
A rede de aliciamento de jovens para festas gays na
Internet é apenas parte de uma nova realidade que envolve o
comportamento dos adolescentes no mundo virtual e no real.
Os teenagers encontram na Internet uma cúmplice preciosa.
Vitor, 16 anos, já teve relações sexuais com dez rapazes
que contatou nos sites gays da rede. "Até o ano
passado eu quase não saía de casa. Tinha curiosidade em
transar com meninos, mas não sabia onde procurar. Depois
que descobri esses sites, me senti mais à vontade com a
minha sexualidade e comecei a levar a vida que tinha
programado para quando ficasse adulto", afirma.
Mas não é preciso ser internauta para fazer contatos.
Basta circular pelos bares gays do Rio e de São Paulo para
conferir. A noite cor-de-rosa – que inclui points como o
clube paulista Base, e, no Rio, o baixo gay, o bar @Loka e
as boates 1140 e Gaivota – está cheia de adolescentes.
Segundo o dono da Base, Sérgio Kalil, 10% dos cerca de 700
jovens que lotam a matinê da boate são adolescentes.
Muitos já estão certos de seu papel sexual. Definem-se
como homossexuais ou bi. Outros andam à procura de sua
tribo e rejeitam rótulos. Filhos de famílias de classe média
alta, com idades entre 14 e 18 anos, estão se permitindo
experimentar vínculos sexuais e emocionais com alguém do
mesmo sexo sem grandes grilos ou culpas. Numa atitude improvável
há algumas décadas, aceitam com naturalidade seus desejos
e aventuras sexuais e alguns até arriscam partilhá-las com
os pais.
Regina, 16 anos, não sabe dizer quando tudo começou. Já
namorou muitos garotos, mas sente atração por meninas.
Gosta de estar perto delas e de inventar brincadeiras para
poder tocá-las. Um dia, no banheiro do colégio, pediu num
impulso um beijo a uma amiga. "As mulheres são mais
sexies, atraentes e divertidas", diz. Levada por uma
prima gay da mesma idade, Regina passou a frequentar aos sábados
a boate Blade Runner, em Botafogo, na zona sul do Rio. Ali,
encontra meninas com desejos iguais aos seus. Ela começa a
se arrumar às duas da tarde para estar na boate às 22h em
ponto. O ritual inclui escova no cabelo, uma pincelada de
esmalte nas unhas e um sem-número de análises na frente do
espelho. Regina faz listinha de suas conquistas e jura, com
jeito de moleca, que já deu beijo na boca de 40 moças, nem
um pouco recatadas. Há quatro meses, ela transou com uma
colega de 22 anos em seu quarto, enquanto os pais dormiam.
Foi sua primeira vez. Regina tremia dos pés à cabeça, mas
a vontade e a curiosidade eram tantas que não resistiu. Ela
absorveu com rapidez a experiência e contou tudo para a mãe.
"Me senti livre. Não fico constrangida se me apaixono
por meninas", afirma.
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"Um dia, no banheiro do
colégio, pedi um beijo a uma amiga. As mulheres são
mais sexies, atraentes e divertidas"
Regina, 16 anos (à dir.), com as amigas Andréia
e Isa
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A busca do prazer é comum na adolescência. Os jovens
costumam ser extremamente hedonistas nessa fase, vivem
intensamente a descoberta da sexualidade e querem gozar a
vida a cada segundo. Têm também mais liberdade que seus
pais tiveram no passado para tatear o mundo lá fora. A
novidade é que a puberdade vem sendo ensaiada num cenário
de muitas mudanças na construção da sexualidade. O
contexto é outro. Há bares e boates gays aos montes nos
grandes centros urbanos. As bancas de jornais estão cheias
de publicações dirigidas a gays e há pelo menos três
editoras investindo no filão. A paulista Summus criou o
selo GLS. A Record lançou uma coleção chamada Contra-Luz
e a Rocco, Sexo Plural. Namorados gays viram personagens em
novelas. Juízes já permitem que casais de homossexuais
adotem crianças, e defende-se na Câmara dos Deputados, em
Brasília, legalizar a união homossexual. "Os jovens
que querem entender qual é a sua hoje encontram mais espaços
para viver abertamente relações não convencionais. Isso
ajuda a conviver com as experiências homossexuais de forma
mais positiva", teoriza o antropólogo e presidente da
Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia),
Richard Parker.
No início do ano, o Centro de Estudos Homoeróticos da
USP abriu um cursinho pré-vestibular para o público GLS e
recebeu 120 inscrições, das quais 51% eram de alunos de 16
a 20 anos. Os teens circulam sem problemas nos ambientes
gays proibidos para menores. Muitos falsificam a identidade.
Outros contam com a vista grossa da segurança. Às vezes têm
sorte. Quando não conseguem passe livre, os cariocas
contentam-se em fazer ponto na calçada da rua Visconde
Silva, em Botafogo, onde há inúmeros bares para
homossexuais. Ali, funciona o baixo gay, que Ney, 17 anos,
chama também de Lama. "Lá dá de tudo", brinca.
Ney transa com meninos desde os 14 anos. "Nunca tive
atração por mulheres. Com elas dava sempre tudo errado. Me
sentia péssimo porque sabia que devia estar na cama com um
homem e não com uma mulher. Gosto de ser gay e não me
importo de dar beijo na boca na frente dos outros. Para
estar bem com as pessoas preciso estar bem comigo
mesmo", diz Ney
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No Rio, quando são barrados em
boates, os garotos se reúnem no chamado baixo gay
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Colegas cruéis Óbvio
que nada é tão simples como ele pinta. É difícil ser
diferente da maioria e ter desejos incontroláveis. Embora
os limites do aceitável sejam cada vez mais flexíveis na
sociedade moderna e de a convivência com as minorias
sexuais ser hoje mais pacífica, enfrenta-se ainda o
preconceito. Adolescentes hetero costumam às vezes ser mais
cruéis com seus colegas gays que os adultos. O namorado de
Ney, Hilton, 15 anos, diz que anda na escola feito um robô,
com medo que um mínimo gesto o denuncie. "Não quero
que me chamem de veadinho. Sou virgem e faço sexo oral com
meninos. Se gosto disso e não prejudico ninguém, qual o
problema?", desabafa. Ney é seu primeiro namoro sério.
Antes disso, Hilton conta que se habituara a ficar com
meninos nos banheiros dos shoppings da Barra da Tijuca, na
zona oeste do Rio. "É a maneira mais fácil de
experimentar. Rola a maior pegação", revela. A
primeira experiência foi com um vizinho, na sauna do condomínio
onde mora, e deixou Hilton confuso. "Ele vivia me
cantando e dizia que eu era bonito. Não sei explicar como
aconteceu. Quando voltei, me tranquei no quarto e chorei.
Agora minha cabeça tá legal. Comecei a frequentar a noite
gay e me sinto mais eu."
No passado, a maioria dos jovens preferia guardar segredo
de sua vida sexual, sobretudo se sua preferência recaísse
sobre o mesmo sexo. A revelação podia resultar numa
temporada de colégio interno ou até numa surra. Hoje,
muitos adolescentes estão preferindo abrir o jogo com os
pais. Andréia, 16 anos, começou a transar com mulheres no
ano passado. Depois de um período de dúvidas, tentando
compreender o que lhe acontecia, ela consegue se definir
como uma menina sem preconceitos ou conflitos e tentou
mostrar isso aos pais. Sem prévias explicações, apareceu
em casa ao lado da namorada. "Essa é a vida que
escolhi e eles têm que me aceitar assim. Primeiro eu,
depois eu", diz Andréia.
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"Não vou deixar de amá-lo
porque ele é drag. Pelo menos não se perdeu em
drogas nem se prostituiu"
Cleide, comerciante, mãe de Leandro, 18 anos
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Vitor disse aos pais que gostava de homens e mulheres e
que era ativo. "Esse detalhe deixou meu pai mais
aliviado. Mas ele preferiu esquecer a conversa", ele
conta. "Minha mãe ficou um mês sem falar comigo.
Depois passou a me aceitar e hoje até brinco com ela. Às
vezes digo: mãe, peguei um cara lindo e ela ri." Ney
também revelou seus desejos à mãe no início deste ano.
"Estava recebendo muitos telefonemas de rapazes e ela
desconfiou. Aí eu disse: mãe, eu sou gay. Ela foi para o
banheiro e desmaiou no boxe. Me fez prometer que ia parar
com essa história. Prometi, mas não cumpri. Disse que se
ela não me aceitasse do jeito que sou sairia de casa. Daí
tudo mudou. Somos grandes amigos e até já fomos juntos a
uma boate gay", conta Ney.
Apesar de se mostrarem bem resolvidos, abrir-se com os
pais nunca é fácil. Existe o medo de decepcionar e magoar.
"Fui muito dura com minha mãe. Disse sem rodeios que
era sapatão. Fiquei triste de ver ela triste", detalha
Regina. Para a maioria dos pais, a aceitação é um
duro aprendizado. "A gente aceita quando o homossexual
é o filho do vizinho. Quando é o seu filho, tudo
muda", admite a mãe de Regina, Mara, 33 anos, secretária,
separada do marido há um mês. A revelação levou-a a um
grande conflito. "Não quero que minha filha seja lésbica.
Ao mesmo tempo, sou uma mulher liberal e não posso ser
preconceituosa com minha própria filha." Mara tenta
aceitar e respeitar, dizendo-se que, afinal, a menina não
está cometendo nenhum crime. "Não posso botar minha
filha fora de casa por causa disso. Proibir é pior."
Como acontece em geral com os pais, quando surpreendidos
pelas escolhas dos filhos, Mara se culpa. "Talvez ela
tenha esse comportamento por causa dos problemas que tive no
meu casamento. Meu ex-marido bebia e me agredia. Regina pode
ter crescido pensando que os homens não prestavam, mas digo
a ela que tem muito homem legal por aí", aflige-se
Mara, que vai pedir ajuda a um psicólogo. Acha que isso
pode ajudar sua filha a "clarear um pouco as idéias".
Ela teme que o preconceito contra homossexuais exponha a
filha a sofrimentos. "Até agora isso não aconteceu.
Digo a Regina que a vida é dela e que estou do seu lado.
Prefiro saber que ela está numa boate gay a não conhecer
minha filha." No íntimo, Mara nutre a esperança de
que a filha esteja vivendo uma fase passageira. É possível
mesmo que esteja.
Na opinião do sexólogo Marcos Ribeiro nada nessa idade
é definitivo. "Não podemos afirmar que esses
adolescentes irão se transformar em adultos gays ou bi. No
meio do caminho podem perceber que essa não é a praia
deles ou o contrário", observa Ribeiro. Vitor, 16
anos, que começou a transar com garotos com a ajuda da
Internet é dos que não vivem sua escolha como um passo
definitivo. "Não coloquei as meninas no banco de
reservas. Gosto de gente. Gosto dessa brincadeira toda. Já
tentei convencer amigos heteros a experimentar, mas me
chamam de maluco." Mas ele só conta essas coisas a
amigos íntimos. No colégio, diz que faz o estilo careta,
comportado. "Os adolescentes se fixam muito no que eles
aprenderam que é certo e errado."
Não satisfeito em assumir-se como gay para a família,
Leandro Cerqueira Leite, 18 anos, revelou que é drag queen.
"Cheguei a namorar uma menina por pressão dos amigos.
Mas não adiantava ir contra minha natureza", diz
Leandro. A reação de sua mãe foi surpreendente. "Não
vou deixar de amá-lo por causa disso. Pelo menos, ele não
se perdeu em drogas nem se prostituiu", justifica
Cleide, 49 anos, comerciante. Hoje ela ajuda a compor de pelúcias
e plumas a roupagem de ator transformista.
Alguns jovens podem contar com pais compreensivos. O
contador Sérgio Soares, 42 anos, pai de Andréia, passou a
acompanhar a filha e a namorada de 20 anos a boates para lésbicas.
"Não posso criticá-la nem repreendê-la. Ela precisa
de apoio. Sou separado da mãe dela e acho que faltou uma
orientação mais firme da minha parte", acredita
Soares. Sérgio e Cleide estão longe de ser uma regra na
família brasileira, principalmente se o filho ainda é
adolescente.
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"Não quero saber se é
modismo ou doença. Para mim o que interessa é
que existe amor"
Clara, 16 anos com
Selma, 21
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Terapia em família A
psicanalista Cláudia Cristina Dias de Oliveira, que
trabalha na orientação sexual de jovens e adolescentes
homossexuais, costuma incluir a família na terapia.
"Os pais estão sendo obrigados a entender e aceitar o
que acontece com os filhos. A primeira reação deles é
tentar negar. Depois, procuram as causas de uma possível
doença. Por último, começam a pensar que erraram na educação."
A psicanalista não acredita que adolescentes lançam-se em
aventuras homossexuais por rebeldia, para romper
preconceitos ou chocar os pais. Tampouco confia nas teses da
psicanálise ortodoxa, que atribui o homossexualismo à
presença de uma figura materna forte (no caso dos meninos)
assumindo a posição do pai. "Há várias teorias
sobre o assunto, mas nada definitivo. Acredito na versão
que sustenta que durante a gestação do bebê pode ocorrer
a produção de uma quantidade maior que o normal de hormônios
masculinos ou femininos. Os jovens estão apenas se
descobrindo mais cedo, porque hoje têm liberdade para
experimentar mais", explica a psicanalista.
Para o sexólogo Marcos Ribeiro, a coisa pode ser mais
complicada. "A nossa sexualidade é psicológica e
cultural. A opção sexual depende de como a criança vive a
relação com os pais e com os amigos, das informações que
chegam até ela", ressalta. O psicanalista Wilson
Chebabi acredita que os adolescentes estão apenas seguindo
um modismo. "Hoje é fashion reagir à hipocrisia
social e à submissão ao figurino heterossexual",
afirma. Mas ele não quer levantar a bandeira do
homossexualismo. Na opinião pouco convencional de Chebabi,
somos todos bissexuais. "Ostentar a atividade
homossexual, assim como a hetero, é dramatizar a fobia de
contatos entre diferentes", explica.
As teorias têm sua contribuição para a liberação dos
costumes. Mas as conquistas práticas ainda dependem de
muito esforço e sofrimento. E, aparentemente, não falta
disposição para isso. Clara, 16 anos, namora há seis
meses Selma, 21. Perdeu a virgindade há três anos com um
menino do colégio e diz que não foi uma experiência do
outro mundo. Gosta de admirar o corpo das mulheres na rua e
colecionar notícias sobre o movimento gay. Também tem vídeos
sobre homossexualismo. Segura de sua opção, revelou seu
namoro aos pais. Eles a proibiram de ver a namorada. "É
um desgosto. Não pode ser normal o que ela está
querendo", critica o pai de Clara. Indignada, Selma
liga várias vezes ao dia para os pais de Clara. "Só
estou fazendo bem à sua filha. Essa proibição é
absurda", argumenta. Clara disse aos pais que pretende
morar com Selma e que ninguém tente impedi-la. A menina não
quer saber se homossexualismo é modismo ou doença. Acha
tudo natural. "Podem falar o que quiser. O que
interessa é que existe amor."
Colaborou Chantal Brissac. *Os personagens
desta reportagem deram nomes fictícios. Produção:
Luciane André. Maquiagem: Rosita Jimenez Modelos:
Andréia Locks e Vânia Freitas. Assist. de Estúdio:
Dárcio de Jesus.
Uma obra do corpo e do meio
A psicologia define a sexualidade humana como uma combinação
de vários elementos: o sexo biológico (o corpo que se
tem), as pessoas por quem se sente desejo (a orientação
sexual), a identidade sexual (quem achamos que somos) e o
comportamento ou papel sexual. A sexualidade começa a se
desenvolver desde o nascimento, quando o bebê experimenta
prazer no contato com a mãe. Por serem os pais quem mais de
perto interagem com a criança, eles têm forte influência
no estabelecimento de sua identidade.
As crianças começam a se perceber como meninos e
meninas entre os cinco e sete anos de idade. Nesse período,
elas passam a decodificar informações sociais e familiares
do tipo "menino é forte como o papai" e
"menina é bonita como a mamãe". É também nessa
fase que, segundo os psicanalistas, as crianças vivenciam o
conceito de Édipo. As meninas se apaixonam pelo pai e
querem imitar a mãe para agradá-lo. Do mesmo modo, os
meninos nutrem um amor secreto pela mãe. "É muito
importante, nesse período, que os pais não tentem denegrir
a imagem do parceiro nem coloquem os filhos no meio de suas
discussões", ensina a psicanalista e terapeuta de família
Cynthia Ladvocat. Os excessos na educação, segundo Cynthia,
também devem ser evitados. "A criança tem de saber
que tem um corpo e não precisa ter vergonha dele. Também não
é recomendável que os pais fiquem sempre com o corpo à
mostra, tentando passar uma naturalidade. Os filhos têm de
aprender a respeitar a individualidade e a
privacidade", diz Cynthia.
Na opinião da psicanalista, dizer que homem não chora,
proibir meninos de ter cabelos compridos e meninas de
liberarem sua agressividade não ajuda na construção do
papel sexual. "Hoje em dia tudo isso é relativo. A família
faz tudo para acertar. Mas não está a seu alcance educar
um filho para que ele não seja gay. Onde a criança irá
colocar a sua libido é uma escolha que depende de muita
coisa. O que os pais devem fazer é abrir os canais de
comunicação com os filhos e não reprimir seus afetos e
emoções."
Numa pesquisa que a antropóloga Mirian Goldenberg está
realizando com 1.300 homens e mulheres sobre identidade,
sexualidade e infidelidade, 5% dos jovens até 23 anos
admitem ser bissexuais ou ter tido mais de uma experiência
homo. "Os jovens hoje querem ser múltiplos e plurais.
Não estão preocupados mais em definir seu papel sexual e não
querem ser rotulados por esse papel", diz Mirian.
Quando ele sorria, me quebrava...
Fui apaixonado por um menino da minha sala, no colégio,
durante dois anos. O que eu mais gostava nele era o sorriso.
Quando ele sorria, me quebrava... Tenho dois tios
homossexuais na família e sempre soube que isso existia.
Achava que também ia acontecer comigo um dia.
Perdi a virgindade com uma amiga. Não foi nenhum trauma,
mas faltava alguma coisa. Eu me sentia muito sozinho. No ano
passado, no dia dos namorados, resolvi conhecer o baixo gay.
Dei só um selinho num cara e fiquei mal. Chorei, comecei a
pensar no desgosto que eu ia dar para minha mãe. Cheguei a
abrir aquele guia Minutos de sabedoria, do Torres
Pastorino, para me confortar. Queria que minha mãe me
aceitasse. Mas essa crise durou só uma semana. Voltei ao
baixo e, desde então, já namorei uns 20 caras. Rola só
sexo oral. Quero transar com um cara bem legal.
Há um mês e meio, li a biografia de um adolescente
homossexual, O terceiro travesseiro. No final, ele
conta tudo aos pais. Resolvi contar à minha mãe. Eu disse
que preferia que ela adivinhasse o que eu tinha para dizer.
Ela perguntou tudo. Se eu tinha engravidado alguma menina,
se eu estava namorando uma mulher mais velha, se eu estava
me drogando. Só no fim, depois de esgotar todas as
alternativas, perguntou se eu era gay. Não contei para o
meu pai porque tenho uma relação péssima com ele. Minha mãe
aceitou. Ela só tem medo de que eu sofra. Estou disposto a
continuar saindo com homens. Me reprimir seria me anular.
Pode até ser que no futuro eu fique com meninas. Estou
aberto a tudo.
Ique, 17 ano
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