Bethânia chega aos 50 com CD 'delicado'
Para comemorar seus 50 anos, a cantora Maria Bethânia não deixou por menos:
gravou um disco que reúne nomes expressivos da nova safra de compositores
brasileiros, convidou Chico Buarque de Hollanda (21 anos depois da última
vez que gravaram juntos) e colocou voz em uma das faixas (composição do irmão
Caetano Veloso) no legendário estúdio Abbey Road, de Londres.
O resultado, conforme ela mesma define, é um disco ''delicado''.
De fato, nas 14 músicas do CD predomina uma serenidade sonora ímpar. Nada
de arroubos vocais ou exageros nos instrumentos. Tudo muito tranquilo, embora
alegre.
Porque alegre e tranquila é como Maria Bethânia chega aos 50 anos, ela mesma
diz. ''Quando adolescente, eu era insuportável. A partir dos 25 anos passei a
gostar mais de mim. E hoje é muito mais confortável viver comigo mesma."
Durante conversa no estúdio em que prepara seu novo show (que estréia no Rio
dia 10 de outubro e chega a São Paulo em dezembro), Bethânia não escondia o
entusiasmo com os jovens compositores que participam do disco.
Vão de Adriana Calcanhoto (''a esquisitice de suas composições laça as
pessoas, que ficam no colo dela'') a Chico César, passando por Orlando
Morais, Carlinhos Brown e Arnaldo Antunes.
Para este último ela não poupa elogios: ''Adoro este poeta''.
Mas registra uma ausência sentida: a de Nando Reis, cuja composição não
satisfez a ambos na medida em que pudesse ser definitivamente gravada.
''Sinto falta do Nando Reis no disco''.
Chico Buarque
Em contrapartida, o disco registra um reencontro emocionante para Bethânia:
a participação de Chico Buarque em ''Quando eu Penso na Bahia'', de
Ary Barroso. A última vez que ambos estiveram juntos foi em show e disco
de 1975.
Outro reencontro importante para ela foi com a canção ''Chão de Estrelas'',
clássico de Orestes Barbosa e Silvio Caldas. ''Há muitos anos eu queria essa
música, mas a coisa não dava certo. Agora deu. Esse é um daqueles casos em
que é a música que escolhe quem vai cantá-la''.
Essa confluência do novo com o tradicional patrocinada pelo seu disco
reflete, segundo Bethânia, ''a vitalidade, a generosidade dadivosa'' da
música brasileira. Tudo dentro de um contexto de muita alegria, ''uma
alegria que vem justamente da multiplicidade de ritmos que há no Brasil''.
E por falar no Brasil, Bethânia afirma estar plenamente satisfeita com
a maneira como as coisas andam acontecendo no mundo cultural pátrio.
''Estou feliz porque constato que todos estão se virando muito na música,
no cinema, em outras áreas também. Sinto que as coisas estão andando.''
E andando num ritmo que agrada à cantora porque contagiados pela felicidade
e pela alegria.
''Quando se diz que há uma saudade do tropicalismo, o que ocorre é a saudade
da alegria daqueles tempos. Sim, porque nós, brasileiros, somos muito mais
felizes do que deprimidos. E, quando fica sisudo, tem que fazer molinho.''
LUIZ CAVERSAN
Folha de São Paulo - 28/09/96