Era o mar
e parecia ser o mar.
Era o mar.
Dois mil anos
esperei por aquele
que febre alguma
ou olhar
moedas escarnios
anseios desejos
amores confessos
puderam tocar.
À minha frente
ei-lo intacto
suspenso sobre meus lábios
aureolado suplicando
o nome do seu nome.
Era quimera
e parecia ser o amor.
Era quimera.
Graça flutuante
figurava estar sentado.
A cabeça era magra
coberta de cachos
junquilhos
de onde o sol jorrava.
As asas
mantidas fechadas
tocavam o chão
longas emplumadas
o corpo intangível.
Seus olhos
castanhoverdecinzadourados
escarlates me olhavam
como se fossem
desde sempre
a límpida palavra.
Era belo e assim se apresentava.
Era o caule
e parecia ser a flor.
Era o caule
Veste-se de blue
e um fio transparente
costura-lhe
asas e costas.
Os pés
traz escondidos
calçando botas.
Não voa
não cumpre seu nome.
Quer ser apenas
azul e belo
como é a paixão.
Era a Beleza
e parecia ser a beleza.
Era a Beleza.
Filho pródigo
abandonou a casa.
De seus vestígios de musa
de seus lampejos de Anjo
brotaram todas as lágrimas.
A dor
incrustada na curva da porta
esperou por muito tempo
a volta.
Depois no rubi deste coração
escreveu seu nome.
Neide Archanjo
Pequeno Oratório do Poeta para o anjo - Poema de Neide Archanjo, interpretação de Maria Bethânia - Coleção Poesia Falada - Volume 06 - Luz da Cidade, 1998