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J. Lemos Pinto
 
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O 3º Segredo de Fátima

        Estive presente em Fátima na peregrinação do dia 13/05/2000, aquando da visita do Papa João Paulo II. A divulgação ali feita da 3ª parte do segredo de Fátima pareceu circunstancial e pouco convincente. Por sua vez, a interpretação oficial tornada pública, há cerca de um mês, pelo Cardeal Ratzinger, apesar de mais abrangente, não convenceu a maioria dos observadores e crentes da mensagem de Fátima, onde também me incluo. Os “mass media” deram conta dessa frustração, rotulando a notícia de “pequeno segredo”, de uma “mão cheia de nada”, etc...
 
        De facto, as 62 linhas do manuscrito da Irmã Lúcia relativas ao 3º segredo de Fátima, são um texto de maravilhoso simbolismo que não pode ter uma leitura exclusivamente linear ou personalizada numa individualidade, nem aplicar-se apenas à Igreja mártir dos últimos tempos (no passado remoto ela foi muito mais mártir). A meu ver, este segredo deve ser lido, prioritariamente, como um texto profético, uma parábola ou mensagem oculta do que vai ser a Igreja do futuro... Só à luz duma leitura futurista anunciando o fim dum ciclo da Igreja, a ruptura e a mudança para uma nova era, a mensagem de Fátima pode ser elevada à dimensão universal e constituir um marco histórico na vida da Igreja.
 
        Assim, em linhas gerais o 3º segredo de Fátima pode ser uma admirável alegoria da velha e da nova Igreja, o prenúncio do fim da Igreja hierárquica e autoritária, o início duma nova Igreja participativa e profética.
O monte escabroso, a Cruz tosca (e não radiante) e os soldados situados no cimo dum monte representam a velha igreja centrada na autoridade dos clérigos e seus órgãos hierárquicos, inibidora da acção participativa das suas bases (os cristãos em geral) e, por isso sido, convertida numa organização triste e sem dinamismo.
        As personagens vestidas de branco, os homens e mulheres de várias classes sociais que caem assassinados representam todos os mártires (clérigos ou leigos) que ao longo da história lutaram por uma Igreja evangélica, democrática e participativa, tendo sido ignorados, renegados ou mesmo aniquilados pela própria Igreja (Inquisição...)
 
        Os dois anjos junto à cruz recolhendo, em regadores de cristal, o sangue daqueles mártires e regando as almas que se aproximavam de Deus, simboliza sem qualquer dúvida a purificação e santificação de todos os que morreram pelo causa da verdadeira Igreja ao longo dos tempos...

        A cidade pejada de cadáveres representa a verdadeira Igreja de base onde os cristãos são impedidos de manifestar a voz do Espírito e de participar nas suas decisões, tornando a cidade de Deus numa cidade morta de acção e vida comunitária, em total discordância com a parábola evangélica do serviço (Lc.22, 24-27 e 46-48; Mt.20, 24-28; Mc.10, 41-45 e 33-37) em que os verdadeiros senhores são os que estão sentados à mesa, tornando ilegítimo qualquer poder hierárquico (semelhante ao actual modelo de Igreja) exercido sem a legitimação e avaliação desses “senhores” que são toda a Comunidade cristã!

        A luz imensa de Deus pairando por cima de todo este cenário representa o sacerdócio único de Jesus Cristo distribuído indistintamente a todos os cristãos, não permitindo que outra luz ou autoridade se sobreponha ao seu espírito uno e universal.

        O Anjo armado com uma espada de fogo e apregoando “penitência” pode ser a proposta do modelo duma nova Igreja. Assim, o fogo lançado pela espada do Anjo, parecendo incendiar o mundo, em contraste com as balas e setas mortíferas dos soldados junto à cruz, simbolizaria o atributo que deve identificar os sacerdotes da nova Igreja, o possuírem de tal modo o espírito de Deus (fogo) que testemunhem (iluminem), de forma clara e amadurecida, o mundo à sua volta. Por outro lado, a palavra “penitência...” apregoada pelo Anjo como um lema ou método da acção, significaria que a nova Igreja deve ser construída sobre a “Penitência”, seja no sentido restrito (oração, sacrifício, privação voluntária, pobreza) seja no sentido mais lato de humildade e respeito pelos outros, considerando que todos possuem o mesmo espírito de Deus e devem ter a mesma oportunidade de intervir e participar como pedras vivas da Igreja.

        Finalmente, a presença de Maria em todo este cenário, retardando a chegada do Anjo armado com uma espada de fogo e apregoando penitência... (modelo da nova Igreja) pode significar que o processo de reconstrução duma nova Igreja unida e participativa, embora presidida pelo Sacerdote Único, fonte da única e imensa Luz, vai também ser acompanhado no terreno, pela intervenção directa de Maria.
 

        Dentre as leituras possíveis do texto do 3º segredo de Fátima, julgo ser esta a mais coerente e verdadeira, em que acredito firmemente, por visar a reconstrução duma Igreja unida e participativa, centrada em Fátima e Maria, no dealbar de um novo milénio!

José Lemos Pinto
Maio. - Ano 2000



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