A classe média e a consciência política no Brasil
Homero Andretta Júnior ( 1º DI )
Existem pessoas que observam os mendigos, os camelôs, os
vendedores nos semáforos da cidade, os invasores de terras e se
indignam com essa situação - não porque buscam uma
explicação racional para isso, mas sim porque acreditam que
estes são vagabundos e desordeiros. Esse raciocínio, por mais
absurdo que seja, ocorre principalmente nas mentes de quem se
informa exclusivamente pelo Jornal Nacional ou dos leitores das
páginas esportivas da imprensa escrita. É muito cômodo mudar
de canal ou ler apenas as manchetes dos jornais sem conhecer as
entrelinhas, evitando uma reflexão sobe esses assuntos.
Caso você acredite que os miseráveis devam ser exterminados,
aconselho-o a parar essa leitura, pois você deveria visitar a
África - se tiver dinheiro - e fazer contato com
macacos. Há quem afirme que o prefeito, o governador, a
polícia, Deus ou o Diabo devam expulsar esses deturpadores
da ordem do cenário televisivo ou real da sua vida, talvez
porque causem uma sensação desagradável.
Suponha, então, que tais excluídos, sem nenhuma dessas
alternativas, ao invés do suicídio, resolvam vir para a grande
metrópole. Sem encontrar emprego nas indústrias ou no comércio
(onde está a globalização que virá salvá-los?), no instante
em que a fome bater, eles decidam pedir gentilmente,
com uma faca ou um revólver, uma grana para o
tio que dirige um carro não-blindado (ou seja,
você, pertencente à classe média) nas esquinas desta já
violenta cidade. Sabe-se que nenhum fator psicológico ou nenhuma
ordem coercitiva afastaria este indivíduo da criminalidade. A
diferença é que estes esfomeados não teriam opção, exceto o
crime, já que estariam hipoteticamente impedidos de pedir, de
camelar, de vender flores e balinhas nos
semáforos, de invadir terras devolutas ou de saquear
supermercados quando o governo os abandona no pior estado de
necessidade.
Pode ser fácil tentarmos imaginar que não somos responsáveis,
que não nos importa a situação desses famigerados, pelo menos
até o momento em que a violência bate à porta de
casa, no bolso da calça ou no vidro do carro. Quem é realmente
rico, pode enclausurar-se em uma mansão cercada com fios
elétricos, comprar um carro blindado ou um helicóptero e
ignorar totalmente essa realidade. Se, entretanto, você não é
tão abastado, não resta saída além de conviver com essa
situação.
Continue aceitando-a, elegendo ótimos governantes
que roubam mas fazem, que apregoam neobesteiras e que
se esquecem das obrigações sociais do Estado. É necessário
que a classe média entenda que não é burguesia e que seus
interesses assemelham-se mais aos dos pobres do que aos dos
ricos. Entenda-se aqui burguesia como o industrial, o
latifundiário, o banqueiro, os donos dos veículos de
comunicação, enfim, aqueles cujos filhos estudam no exterior e
que já têm uma herança capaz de sustentá-los durante toda a
vida. Compreenda-se por classe média o profissional
liberal, o funcionário de uma empresa, o dono de um pequeno
negócio e que, caso houvesse uma boa escola pública, um sistema
de saúde estatal bem aparelhado, não hesitaria em utilizá-los.
Só o debate político e, por conseqüência, o voto consciente,
conduzirão ao progresso da democracia brasileira. A violência
que o atual governo faz com o povo, através da fome, do
desemprego e da insegurança, reflete-se principalmente sobre a
classe média. Ainda assim será mais fácil eximir-se dos
problemas do que enfrentá-los; inaceitável é desconhecer
suas causas.