No
começo era o Caos. Não Havia luz e também as trevas não
existiam. Era o Nada, o vazio total. Nele o Grande Espírito
existia sem consciência de sua própria existência. Não havia
o Tempo, não havia o amor, não havia nada. Mas a não-
consciência do Grande Espírito não impedia sua existência,
mergulhada em sono eterno, sono que pulsava em cadências de
expansão e recolhimento. E este movimento milenar começou a
organizar o Caos em ondas de energia. E passou a existir a
consciência dessa energia.
No Caos, no Nada, o
Grande Espírito conheceu sua própria existência. E sentiu o
impulso de projetar-se pelo espaço infinito, de abrir suas
imensas asas e limitar nelas o Universo então vazio.
E começou a vibrar. À
medida que se expandia através do Caos, ia deixando impressa a
possibilidade da existência. A consciência da existência fez
vibrar o Caos com intenção. Formou-se uma energia que se foi
reunindo em negros agrupamentos. E assim surgui Nix a
Noite. E ela tornou-se a existência das trevas superiores,
envolvendo-as com seu manto negro.
Junto com Nix surgiu
seu irmão, Érebo, as trevas infernais, inferiores.
E os dois irmãos,
unidos, mas tão opostos, coexistiram no seio do Caos.
E assim foi que no
Universo, antes vazio, passaram a existir os irmãos sombrios,
Nix e Érebo, unidos pela própria escuridão.
Nix e Érebo,
tensionados em si mesmos, explodiram em luz e depois desta
explosão, numa lentidão que só acontece fora do tempo, Érebo
mergulhou para sempre nas profundezas infernais e Nix, solta no
Caos agora cheio de Luz, começou a encurvar-se até
transformar-se numa esfera, que começou a vibrar, procurando
expandir-se ainda mais.
Estavam criadas a luz e
as trevas. Luz e trevas eram a consciência dualizada. Eram o
mais e o menos, o positivo e o negativo. Eram luz e eram trevas.
Nix pulsava e se
expandia, mergulhada na luz. E teve a consciência de que a luz
era o oposto que a complementava. E na tentativa de expansão, na
tentativa de tornar-se una com o éter luminoso, a esfera em que
havia se transformado partiu-se ao meio e as duas metades se
separaram. Do esforço único dessa separação nasceu Eros, o
Amor. Amor energia, Amor ígneo que ocupou o Nada, impregnou o
Universo despertando a semente da Vida.
O Amor uniu, por fim, a
luz e as trevas.
As duas metades de Nix
converteram-se, uma abóbada celeste Urano, e a outra na
Terra Géia.
Géia continha em si as
densas partículas do mundo físico e as mais sutis do mundo
astral e, quanto mais consciência tinha de si mesma, mais
promovia as transformações iniciais de sua existência física.
No mundo astral, Géia
começou a modelar um corpo para si mesma, um corpo que pudesse
caminhar pela luz, mover-se agilmente e observar em suas viagens
a formação da matéria no mundo físico a Terra. Uma
Terra primordial que começava a se formar, a se comprimir ou a
se afastar.
Um dia Géia olhou para
cima e viu Urano, o firmamento, que se expandia pela eternidade.
E viu que também Urano tinha para si um corpo astral, leve, que
se destacava de toda aquela energia etérea e flutuava na
imensidão.
Urano e Géia, em seus
corpos sutis que vagavam pelo mundo também sutis, aproximaram-se
e amaram-se. E Géia, mulher, encheu-se de doçura e submissão,
e aconchegou-se nos braços de Urano, que a fecundou.
No mundo físico, a
Terra tornou-se a virgem pronta a ser penetrada por uma chuva que
ainda não tinha acontecido e a ser rasgada por um arado que um
dia seria criado por algum ser humano que ainda não existia, nem
mesmo nos pensamentos do Grande Espírito.
No mundo astral, Géia
tornou-se mãe. Deste parto magnífico nasceram as forças da
natureza que também iriam se manifestar no mundo físico. Eram
os Titãs e foram seis, em número. E eram as Titânidas, que
também foram seis.
Aos Titãs, Géia
chamou de Oceano, Crio, Ceos, Hiperião, Jápeto e Crono. E as
Titânidas chamaram-se Téia, Réia, Têmis, Mnemosina, Febe e
Tétis.
Oceano era o espírito
da água. Ao nascer, projetou-se como uma serpente imensa pelos
mundos sutis, criando forças, concentrando em si todas as
potestades marítimas e então lançou-se no mundo físico, que
se encheu pela primeira vez de uma umidade que crescia, que o
impregnava em todos os recantos mais íntimos do seu ser
material, que aumentava, que crescia, que se transformava nas
águas que transbordavam em todo o mundo físico. Era o poder
masculino que logo procurou unir-se a um oposto feminino para
criar. E encontrou sua irmã Tétis, o espírito feminino das
águas, que ao toque de Oceano tornou-se a mãe dos rios, das
fontes, das nascentes e dos riachos e deles começou a cuidar com
veneração.
Hiperião era o
espírito do fogo, era o fogo astral. Estendeu-se pelos mundos
sutis seus longos braços ígneos, e encontrou sua irmã Téia, a
divina, e dessa união nasceram Hélio, o Sol, Selene, a Lua, e
Éos, a Aurora. Hélio tomou uma forma astral de grande beleza, a
cabeça cercada de raios e percorria os céus num carro de fogo
levado por quatro cavalos. Pela manhã, Hélio erguia-se no
firmamento e cruzava os céus, e a noite curvava-se no horizonte,
para que seus cavalos pudessem beber da água que banhava a
Terra. Nesse momento, sua irmã Selene tomava seu lugar nos céus
num carro de prata e atirava beijos luminosos que cintilavam na
escuridão. Éos, a Aurora, a deusa dos dedos cor-de-rosa, tomou
para si a função de abrir as portas dos céus ao carro de
Hélio, descerrando as pálpebras do dia e levando em sua urna o
orvalho matinal que espargia pelos quatro cantos do mundo.
Crio era o frio, eram
as noites sem dia em que Hélio, demorando-se no leito de suas
esposas, não atrelava seus cavalos de fogo e deixava que
descansassem nas estrebarias ocultas pela noite.
Ceos, em sua bela forma
astral de um azul translúcido, debruçou-se sobre o mundo,
tornando-se um eterno observador. Uniu-se a Febe, a Brilhante, e
ambos movimentavam as etéreas camadas de ar que se formavam
acima de Géia, a Terra.
Mnemosina expandiu-se
pelo espaço infinito e transformou-se na memória do universo,
no plasma onde foram gravados todos os acontecimentos passados e
onde seria impresso tudo aquilo que ainda estava para acontecer,
tanto no mundo dos deuses, como no mundo dos seres humanos, cuja
semente primeira ainda nem mesmo existia.
*Texto
extraído do livro: Olimpo - a Saga dos Deuses.
Parte 1, Cap. Gênesis. Pág. 11 a 13.