Oto e Efialtes

       Esta história é referida de passagem na Odisséia e na Eneida, mas Apolodoro é o único que a conta na íntegra. Apolodoro escreveu provavelmente nos séculos I e II da era cristã. Trata-se de um escritor geralmente monótono, mas, neste caso, menos que de costume.

       Esses irmãos gêmeos eram Gigantes, mas não tinham a aparência dos monstros que o termo costumava designar em suas origens, tinham belas formas e nobres feições. Homero diz que eram

Os mais altos dente os quais a Terra alimentou com
[seu pão,
E também os mais belos, depois do incomparável Orion.

       Virgílio fala, sobretudo, de sua louca ambição. Diz que eram

Gêmeos descomunais, que tentaram destruir o alto Céu
[com as mãos
E lutaram para destronar Júpiter de seu reino superno.

       Alguns dizem que eram filhos de Ifímedia, mas, outros afirmam o terem sido de Cânace: Contudo, qualquer que tenha sido sua mãe, o pai era sem dúvida Posídon, ainda que em geral fossem designados como Alóiades, filhos de Aloeu, marido de sua mãe.
       Eram muito jovens ainda quando resolveram provar que eram superiores aos deuses. Aprisionaram Ares, amarraram-no com correntes de bronze e o encarceraram. Os Olímpicos relutaram em tentar libertá-lo a força. Mandaram em seu auxílio o astucioso Hermes, que trabalhou sem ser percebido na calada da noite e conseguiu libertá-lo. Os dois jovens arrogantes ousaram então ainda mais. Disseram que iam colocar o monte Pélion sobre o monte Ossa e escalar as alturas do Céu, a exemplo dos Gigantes de outrora, que haviam empilhado o Ossa sobre o Pélion. Isso foi mais do que os imortais eram capazes de tolerar, e Zeus preparou seu raio para acabar com eles. Antes que o lançasse, porém, Posídon apareceu e pediu-lhe que os poupasse, prometendo que acalmaria os arroubos dos filhos. Zeus concordou com o pedido, e Posídon cumpriu a palavra empenhada. Os gênios pararam de desafiar o Céu, o que deixou seu pai bastante satisfeito. Na verdade, porém, os dois andavam a elaborar planos que os interessavam ainda muito mais.
       Oto imaginou que raptar Hera seria uma magnífica aventura, e Efialtes estava, ou pensava estar, apaixonado por Ártemis. Na verdade, os dois irmãos só queriam saber um do outro, ligados que eram por um extraordinário afeto. Tiraram a sorte para ver quem primeiro raptaria a sua amada, e Efialtes foi o escolhido. Procuraram Ártemis por todas as florestas e montanhas, mas, quando finalmente a encontraram, ela estava na praia e já começava a entrar no mar. A deusa tinha conhecimento de suas más intenções, e sabia também de que modo iria castigá-los. Lançaram-se no encalço de Ártemis, mas ela continuou caminhando, imperturbável, por cima das ondas. Todos os filhos de Posídon tinham o mesmo poder, isto é, andavam a pé seco tanto no mar quanto na terra, e os dois gêmeos puseram-se então a perseguí-la sem nenhum problema. Ela os conduziu até a ilha de Naxos, coberta de bosques, e ali, quando já estavam prestes a alcançá-la, desapareceu. Em seu lugar, os dois irmãos viram uma maravilhosa corça de extrema brancura que já começava a entrar na floresta. Diante de tão bela visão, esqueceram-se da deusa e puseram-se a perseguir a corça. Perderam-na de vista no interior da espessa floresta, e então resolveram separar-se, com o que pensavam duplicar as possibilidades de encontrá-la. De repente, e simultaneamente, os dois a avistaram. Estava de orelhas em pé, em uma clareira, mas o que nenhum viu foi que, por trás dela, oculto pelas árvores, estava o irmão. Assim que lançaram os dardos, a corça desapareceu. Os dardos atravessaram a clareira em direção às árvores, e ali, alcançaram seu alvo. Os corpos imponentes dos jovens caçadores desmoronaram no chão, cada um assassinando e sendo assassinado pela única criatura que tinha amado em vida.
       Foi essa a vingança de Ártemis.

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