34. ESTRUTURAS BUROCRÁTICAS
Atendendo às exigências da sistematização, embora rudimentar, dividimos o período histórico abrangido por este volume em duas épocas distintas, procurando encontrar tópicos para justificar a divisão efectuada e estabelecer a diferença de condições, e de certo modo até a semelhança entre elas. Entendemos que as duas guerras mundiais poderiam servir de baliza à primeira parte e que o pormenor de Marcelo Caetano ser ministro das Colónias a partir de 1944 e ter deixado a Presidência do Conselho ao iniciar-se o processo de descolonização, por exigência dos revolucionários de 25 de Abril de 1974, servia perfeitamente a ordenação que se procurava.
Sem deixarmos de reconhecer deficiências e erros, temos de confessar que, durante os últimos cinquenta e cinco anos de presença portuguesa, desde que foi instituído o ensino liceal até ao momento em que Angola proclamou a sua independência, longo foi o caminho percorrido e vastos os resultados obtidos. No entanto, as necessidades da população eram ainda maiores e as suas exigências nem sempre foram satisfeitas. Se nos séculos passados bastava manter reduzidos núcleos de cultura, não se sentindo a premência de preparação mais completa, no século XX reconheceu-se a necessidade urgente de andar depressa, de recuperar atrasos e de nos colocarmos na longa fileira da promoção social, através da escolaridade. Em boa parte, este objectivo foi atingido e realizado!
As duas guerras, que espalharam pelo mundo calamidades e dores indizíveis e permitiram a prática de crimes inarráveis, tiveram também como resultado um assombroso e desmedido desenvolvimento técnico e um extraordinário aperfeiçoamento das ciências. A desesperada procura de peritos em todos os ramos do saber fez com que a escola se valorizasse, que fosse reconhecido o verdadeiro papel que lhe cabe na preparação dos indivíduos e na construção de um mundo novo, em que todos estamos empenhados. Porém, e como contraste bem compreensível, a essas exigências e à necessidade de preparação intensa e rápida, ao afluxo de grandes multidões às salas de aula, correspondeu o abaixamento do nível qualitativo do ensino ministrado que se manifestou de forma preocupante, não só nos aspectos intelectual e pedagógico como sobretudo no campo político e social. Reconheceu-se aqui a verdade da sentença que nos diz ser a quantidade inimiga da qualidade.
Não é difícil ver na escola uma das principais forças que levaram as regiões colonizadas do mundo, África e Ásia, a lançar-se desesperadamente à conquista da independência nacional. Foi exactamente o desenvolvimento técnico, assim como a divulgação do saber, que contribuiu para que esses movimentos pudessem vingar e encontrassem em toda a parte a simpatia e o apoio de que careciam. Mas foi também um certo desfasamento cultural que fez com que muitos jovens, descontentes e discordando da sociedade em que tinham de se integrar, não compreendendo as exigências do passado e os compromissos das gerações predecessoras, com preparação intelectual deformada e imbuídos de preconceitos, enveredassem abertamente pelo caminho da contestação e forçassem novas soluções. Na Europa e na América, em países com tradições estratificadas, a solicitação política arrastou-os para alterações mais ou menos profundas dos regimes políticos; na África, continente até então dominado por potências europeias que exploravam em proveito próprio as suas riquezas, a revolta não podia contentar-se com a simples alteração do tipo de governo, do sistema de administração, exigindo-se reformas mais profundas e lutando-se por conseguir a proclamação das independências. Por aqui verificamos que a divisão de épocas históricas atrás estabelecida não é tão artificial como pode parecer. As guerras, incluindo a Guerra da Libertação de Angola, influíram profundamente na evolução da escolaridade e na orientação pedagógica; mas a escola também exerceu importante papel na evolução política e social, ajudando a solucionar e a encaminhar problemas em sentido bem determinado.
O conhecido político português Marcelo José das Neves Alves Caetano foi nomeado ministro das Colónias em 6 de Setembro de 1944; substituiu neste cargo Francisco José Vieira Machado; manteve-se no lugar até Fevereiro de 1947, tendo sido neste período de tempo que terminou a segunda guerra mundial.
No dia 1 de Março de 1945, uma portaria assinada pelo governador-geral Vasco Lopes Alves delegou em diversos altos funcionários de Angola algumas das suas atribuições. Quanto ao chefe dos Serviços de Instrução Pública, poucas alterações se verificaram em relação ao que pouco antes tinha sido estabelecido, conferindo-lhe, praticamente, os poderes que já tinha e nós mencionámos noutro lugar.
Em 5 de Dezembro do mesmo ano de 1945, voltou a fazer-se referência às atribuições conferidas aos chefes e directores dos serviços. As alterações introduzidas começavam a vigorar a partir de 1 de Janeiro de 1946. Também desta vez eram poucas as modificações relativas ao chefe dos Serviços de Instrução. Pode dizer-se que foram apenas duas:
—Foi autorizado a liquidar o tempo de serviço público
prestado pelo seu pessoal;
—Recebeu o encargo de conceder o abono de diuturnidades a que tivessem
direito os professores e demais funcionários.
O diploma de 20 de Setembro de 1948, introduziu algumas alterações nos concursos para inspectores ou subinspectores escolares. Pelo disposto neste documento legal, foi dada nova redacção a um dos artigos do Regulamento do Ensino Primário Infantil e Geral, de 16 de Março de 1928, determinando-se que o júri dos concursos, nomeado pelo governador-geral , teria a seguinte constituição:
—Chefe dos Serviços de Instrução Pública
(ou seu representante legal);
—Dois inspectores do ensino primário;
—Um professor do quadro docente do Liceu Salvador Correia;
—Um médico escolar.
Em parágrafo único, especificava-se que, na falta de inspectores do ensino primário, poderiam estes ser substituídos por professores do liceu ou pelo inspector do ensino particular. Deduz-se da publicação do diploma e do seu texto que poderia dar-se o caso de não haver em Luanda inspectores suficientes para formarem o júri, por motivo que não é fácil determinar; poderemos admitir a hipótese de algum ou alguns estarem fora, em gozo de licença graciosa, ou em comissão de serviço noutro lugar, sendo casos de frequente verificação.
No dia 25 de Outubro de 1944, foi publicado o texto que introduziu algumas alterações à constituição da Comissão Administrativa do Fundo Auxiliar do Ensino Primário, em cada uma das províncias existentes em Angola, modificando neste particular o disposto no diploma legislativo de 18 de Março de 1942. Segundo as novas determinações, ficou a ser constituída assim:
—Director Provincial da Administração Civil;
—Director Provincial da Fazenda Pública;
—Director da Zona Escolar.
Antes de continuarmos a fazer referência ao assunto que acabamos de registar, queremos anotar que o último documento publicado nas páginas do Boletim Oficial de Angola, e que traz a assinatura de Marcelo Caetano, como ministro das Colónias, tem a data de 5 de Fevereiro de 1947; e o primeiro que aparece subscrito pelo seu sucessor, Teófilo Duarte, vem no mesmo número, com a data de 4 de Junho, tendo sido emitido no dia 10 de Março anterior.
Em 2 de Abril desse ano de 1947, foram aprovados os orçamentos dos seguintes organismos:
—Fundo de Instrução da Província de Luanda, na
importância de duzentos e sessenta contos;
—Fundo de Instrução da Província de Malanje, de
cento e sessenta e seis contos setecentos e vinte e cinco escudos;
—Fundo de Instrução da Província de Benguela,
em novecentos e setenta e quatro contos quinhentos e setenta e seis escudos;
—Fundo de Instrução da Província de Bié,
com a quantia de seiscentos e dezasseis contos.
Devemos recordar que estas verbas eram, em regra, empregadas para a construção de edifícios escolares, sua reparação, compra de mobiliário e aquisição de material didáctico.
Tendo sido extinta a província de Luanda, foi também extinto o correspondente fundo de instrução; e, sendo criada a província do Congo, o saldo existente passou a pertencer ao Fundo de Instrução da Província do Congo, logo criado. O território de Cabinda foi transformado num distrito, e por consequência criado o Fundo de Instrução do Distrito de Cabinda. A cidade de Luanda e seu termo ficou a constituir um concelho autónomo, e teve também o seu Fundo de Instrução do Concelho de Luanda.
No dia 7 de Setembro de 1949, foram extintos o Fundo Auxiliar do Ensino Primário (criado em 16 de Abril de 1927) e os Fundos de Instrução (estabelecidos segundo o disposto em 31 de Julho de 1937), os quais foram substituídos pelo Fundo Escolar de Angola; a sua forma de funcionamento tinha sido reestruturada em 18 de Março de 1942, como já dissemos. Com as alterações introduzidas pretendeu-se fazer a unificação das verbas cobradas e a sua aplicação segundo planos mais vastos e mais concordantes com as necessidades da população, procurando actuar mais equitativamente. Além disso, pretendeu-se ainda que passasse a ter maior influência na sua aplicação e administração a entidade a que dizia directamente respeito, os Serviços de Instrução Pública. Esclarecia-se, nesta altura, que deveria ter-se em vista a consecução dos seguintes fins:
—Construção de edifícios escolares, sua reparação
e manutenção;
—Compra de mobiliário e de material didáctico;
—Financiamento de experiências pedagógicas;
—Aperfeiçoamento do professorado primário;
—Publicação regular do Boletim do Ensino;
—Subsídio a iniciativas válidas ou organismos de promoção
cultural;
—Organização e manutenção de colónias
de férias.
Em 12 de Outubro de 1949, foram aprovados os orçamentos dos "Fundos de Instrução" de Malanje, Cabinda, Bié, Congo e Benguela (este em 9 de Novembro), cujas verbas somadas atingiam a elevada quantia de mil seiscentos e sete contos.
No dia 28 de Dezembro, foi aprovado o orçamento do Fundo Escolar de Angola, segundo se dizia, relativo ainda ao ano que estava a findar, e que atingia a importância de mil oitocentos e sessenta e cinco contos. Pouco depois, em 22 de Março, era aprovado o orçamento para 1950 que passava já para quase quatro mil e noventa contos. Este aumento, porém, não foi tão grande como poderá parecer, embora fosse muito acentuado, pois o saldo do ano anterior era exactamente igual ao que fora aprovado em fins de Dezembro. Não houve tempo para gastar esse dinheiro! Coisas da burocracia!
Não tivemos a preocupação de mencionar as verbas de todos os anos seguidos, mas apenas algumas que pudessem servir de exemplo e termo de comparação. Assim, em 4 de Março de 1953 era aprovado o orçamento do Fundo Escolar, que atingia cinco mil quatrocentos e oitenta e cinco contos e meio; subscreveu este documento o responsável pelos Serviços de Instrução Pública (como substituto legal) e presidente da respectiva comissão administrativa, Alberto de Matos Serpa Neves, nome que se distinguiu pela sua actuação e pelos seus méritos pedagógicos, assim como pela sua invulgar ilustração.
Damos por terminada a menção ao Fundo Escolar de Angola, que atingiu os tempos da descolonização e cujas verbas aumentaram de ano para ano, acompanhando de perto a evolução deste sector da vida pública Em relação à década que vai de 1921 a 1930, e também à que estende de 1931 a 1940, fizemos algumas referências a verbas despendidas com a escolaridade, como exemplo do interesse ou falta de interesse das autoridades responsáveis. Podemos, neste ponto, informar que o Orçamento-Geral de Angola para 1947 destinava 9.977.175$00 aos Serviços de Instrução Pública; em 1951 essa verba subiu já para 14.416.116$00. Devemos atender a que, nessa altura, ainda se não tinha começado a prestar ao ensino, em Angola, a atenção e o interesse que depois veio a merecer, vivendo-se ainda num ambiente de estagnação, de deprimente modorra.
No dia 7 de Março de 1956, foi aprovado o Regulamento da Utilização dos Aparelhos Gravadores de Som, subscrito pelo chefe dos Serviços de Instrução Pública, Rafael Ávila de Azevedo. Segundo se afirmava no documento em questão, deveriam existir nas zonas escolares e na Escola de Aplicação e Ensaios, de Luanda. Destinavam-se a:
—Gravar canções, coros, descantes do folclore nacional,
nas escolas que o solicitassem;
—Gravar lições-modelos, quando os inspectores reconhecessem
conveniência na divulgação pela sua actualidade pedagógica,
valor didáctico ou características de originalidade;
—Gravar documentários sonoros de filmes educativos aprovados
para uso nas escolas.
Este material poderia ser requisitado pelas emissoras radiofónicas, directores escolares, missões, reitores dos liceus, directores de escolas industriais e comerciais, seminários e casas de espectáculos.
Em 12 de Abril de 1949, o ministro Teófilo Duarte autorizou a
fixação de gratificações ao pessoal docente
da Escola de Preparação de Professores Indígenas,
que poderiam atingir mil escudos mensais. E logo a seguir, no dia 27 de
Abril, foi aprovado e entrou em execução o Regulamento
do Curso de Regentes Escolares assim como o Regulamento dos Professores
do Quadro Docente Eventual; e em 28 de Dezembro de 1948 tinha sido
autorizado o contrato de vinte regentes escolares e criado o curso especial
para fazer a sua preparação pedagógica, a funcionar
no liceu da Huíla. O Quadro Docente Eventual fora criado em 16 de
Março de 1945; os seus professores deveriam seguir um curso intensivo
de formação pedagógico-didáctica, com a duração
de dois semestres; os participantes deveriam ter as habilitações
literárias exigidas pela lei, mas não podemos concretizar
quais fossem; deveriam ainda ter idade compreendida entre os dezasseis
e os vinte e três anos. O estudo preparatório para vir a exercer
a docência era ordenado de acordo com o esboço a seguir reproduzido:
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Pedagogia e Didáctica Geral |
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Psicologia Escolar |
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Didáctica Especial |
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Legislação e Administração Escolar |
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Higiene Escolar |
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Desenho e Trabalhos Manuais |
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Org. Pol. e Admin. da Nação |
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Educação Feminina (sessão) |
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Religião e Moral (sessão) |
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Música e Canto Coral (sessão) |
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Educação Física (sessão) |
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—Prática Pedagógica (8 horas) + + Em 6 de Fevereiro de 1950, foi aprovado e posto em vigor o Regulamento do Ensino e do Magistério Rudimentar. Estava previsto que teriam programas especiais, que foram publicados como complemento do respectivo diploma. Segundo o determinado, abrangia o primeiro grau do ensino indígena, previsto no Estatuto Missionário, de 5 de Abril de 1941. Seria inteiramente ministrado em língua portuguesa; teria sentido prático, visando a boa preparação do indivíduo para angariar o sustento com o seu trabalho; destinar-se-ia a crianças dos sete aos quinze anos; abrangeria uma classe preparatória e mais três de estudos ascendentes. O ano escolar começaria a 15 de Dezembro e terminaria a 8 de Outubro; o ano lectivo iria de 3de Janeiro a 30 de Setembro.
Não deixaremos de comentar o longo período de férias estabelecido, de três meses seguidos, embora uma parte pudesse ficar preenchida com os trabalhos de exame. E não podemos esquecer os diversos hiatos de férias curtas... Julgamos interessante frisar que, um século antes, as escolas tinham férias mais reduzidas em comparação com as de agora. Tem-se acentuado a tendência de diminuir cada vez mais o número de dias lectivos em cada anuidade. Isso também contribui para o vilipêndio da classe docente, para estabelecer o espírito de insubmissão nos escolares, favorecendo crises académicas de vários tons...
As actividades didácticas teriam a duração de sete horas, sendo duas para trabalhos agrícolo-pecuários, três de aulas e mais duas de prática nas oficinas, que poderia ser substituída por ocupações campestres. Por aqui se verifica haver a preocupação de preparar os alunos para a vida futura, como trabalhadores agrícolas ou oficiais de alguns misteres, incutindo hábitos de trabalho e treinando-os na sua realização.
O pessoal docente seria recrutado entre os professores e auxiliares do ensino rudimentar. Para a sua conveniente preparação, seria estabelecido o correspondente curso do magistério rudimentar, com duração de três anos. Começariam por receber aulas de revisão da matéria já estudada, os programas de quarta classe do ensino primário geral — que se admitia ter sido mal assimilada ou estivesse esquecida. O programa dos anos seguintes não fora claramente elaborado, apresentava-se em esboço, imperfeitamente delineado. Pode aceitar-se que, ao longo de três anos, além do estudo específico, os candidatos teriam ocasião de receber noções rudimentares da organização e da escrituração escolares, prática de primeiros socorros e enfermagem (a que se dedicaria grande interesse e seria obtida pela assistência no hospital anexo, da sede da escola) e também a prática pedagógica (adquirida na frequência das escolas que funcionassem na localidade). Não se indicava ainda onde o estabelecimento iria ser criado.
Pela análise do texto legal podemos concluir que a enfermagem e as actividades agrícolo-pecuárias deveriam ter bastante importância, pois foram suficientemente desenvolvidos os respectivos temas, particularmente a enfermagem. Podemos pensar se não está aqui delineada a estruturação das futuras Escolas de Habilitação de Professores de Posto e mesmo se não se inspiraram nesta iniciativa os responsáveis pela instituição dos futuros cursos intensivos para preparação de monitores escolares.
Devemos acrescentar que, em 17 de Março de 1950, foi criada uma estação postal que devia funcionar na localidade próxima da escola, ficando a cargo do respectivo director. Apesar de não haver menção claramente expressa, inclinamo-nos para a hipótese de se estar pensando em Cuíma, na região do Huambo.
No dia 17 de Abril de 1957, foram criados cursos de alfabetização para indivíduos maiores de catorze anos. Segundo afirmava o diploma em questão, o afluxo de imigrantes de origem metropolitana, portanto portugueses europeus, fez com que aumentasse muito a percentagem de brancos analfabetos a residir em Angola. Alguns anos antes, reconhecera-se que entre estes e seus descendentes nascidos em território angolano, e mesmo entre a população de cor dita civilizada ou assimilada, era diminuta a taxa de indivíduos que não soubessem ler e escrever. Pretendia-se, com esta medida, difundir também a instrução entre os indígenas, que contavam altas percentagens de analfabetos. A partir de 1 de Julho de 1958, portanto um ano mais tarde, seria proibida a admissão de indivíduos não-indígenas que não soubessem ler e escrever, residindo em Angola há mais de seis meses, nas profissões que se relacionassem com o comércio ou a indústria; exceptuavam-se desta exigência os que tivessem mais de quarenta e cinco anos de idade ou mais de dez anos de estadia no território. Devemos atender a que Angola estava a imitar o que se fizera em Portugal a partir de 1952, pondo em prática medidas discutíveis, algumas mal estruturadas, por vezes um convite à fraude, mas que tinham em vista erradicar o analfabetismo, tendo conseguido a longo prazo resultados apreciáveis.
Em 4 de Março de 1959, foi aprovado o Regulamento dos Cursos do Ensino Primário para Adultos, previsto no diploma legislativo de 17 de Abril de 1957, atrás referido. Deverá ter sido elaborado sob a orientação de Túlio Lopes Tomás, que ao tempo exercia as funções de chefe dos Serviços de Instrução Pública. E com data de 27 de Março de 1959 eram criados cursos oficiais para o ensino de indivíduos adultos analfabetos nas cidades de Luanda (três), Nova Lisboa (dois), Sá da Bandeira (dois), Lobito, Benguela e Moçâmedes. No dia 1 de Abril de 1959, foi publicado o alvará que regulava o funcionamento do Conselho de Ensino de Adaptação, criado em 23 de Dezembro de 1957. Tinha a finalidade de melhorar o rendimento do ensino e de o difundir mais, estudando os complexos problemas que se prendem com a alfabetização dos indígenas e com a sua preparação para condições de vida melhores do que as de que disfrutavam. Devia fornecer ao Governo estudos que levassem a realizar a tarefa educativa em tempo mínimo e com o máximo de probabilidade de êxito. Deveria preocupar-se especialmente com o problema da mulher, dando-lhe possibilidade de vir a desempenhar o papel relevante que lhe compete. O Conselho de Ensino de Adaptação seria constituído pelas seguintes individualidades:
—Inspector do ensino ou seu delegado;
—Chefe da 5ª Repartição dos Serviços de Instrução;
—Chefe da 6ª Repartição dos Serviços de Instrução;
—Representante da Repartição Central dos Negócios
Indígenas;
—Representante das missões católicas, residente em Luanda
e indicado pelos bispos;
—Representante das escolas de magistério de adaptação,
do sexo masculino, indicado pelos prelados;
—Representante das escolas de magistério de adaptação,
do sexo feminino, também indicado pelos bispos;
—Representante dos estabelecimentos particulares do ensino de adaptação,
designado pelo governador-geral.
Não foi possível saber se desta iniciativa se colheram frutos satisfatórios ou se foi mais uma frustração a somar a outras anteriores e a juntar às que se lhe seguiram. Torna-se muito difícil, praticamente impossível por agora, avaliar os resultados de certas medidas, pois não temos conhecimento da actividade de numerosos organismos; nem todas foram registadas por escrito e nem todos os documentos podem ser manuseados e analisados pelos estudiosos.
Aproveitaremos o ensejo de estar a falar do Conselho de Ensino de Adaptação para referirmos um organismo afim, de cuja actuação nada sabemos mas que entendemos dever, no mínimo, arquivar a sua designação. Estamos falando da Comissão Central do Patronato. Não há notícias que se lhe reportem e desconhecemos a sua actividade, que nos parece estar relacionada com os problemas sociais, sobretudo os que diziam respeito ao trabalho. A sua constituição abrangia os representantes de:
—Inspecção do Ensino ou seu representante;
—Serviços de Agricultura e Florestas;
—Serviços de Portos, Caminhos de Ferro e Transportes;
—Serviços de Obras Públicas;
—Serviços de Economia e Estatística Geral;
—Serviços de Veterinária;
—Câmaras Municipais;
—Companhia dos Diamantes de Angola;
—Companhia Mineira do Lobito;
—Associação Industrial de Angola;
—Associação Comercial de Luanda;
—Petrangol;
—Grémios de Pesca;
—Associação dos Agricultores de Angola;
—Sindicato Nacional dos Empregados do Comércio e Indústria;
—Sindicato dos Motoristas, Ferroviários e Metalúrgicos
de Angola;
—Imprensa diária.
Este organismo, atendendo à sua composição, deveria estar particularmente vocacionado para resolver problemas do mundo do trabalho. No entanto, devemos atender a que o seu primeiro elemento foi recrutado nos serviços escolares e educativos. Tinha sido previsto pelo diploma de 23 de Dezembro de 1957 e veio a ser criado em 1 de Abril de 1959. Poderia ajudar a encontrar o melhor caminho para a orientação a imprimir ao ensino profissional, promovendo a sua valorização, o seu aperfeiçoamento e o enriquecimento cultural dos que o preferissem. Entre os meios apontados para atingir os seus objectivos, contava-se a realização de conferências, promoção de estudos, melhoria no apetrechamento dos estabelecimentos de ensino, instituição de prémios, subvenção financeira de estágios de aperfeiçoamento, organização do serviço de colocações, etc. Talvez algumas realidades do futuro, como a concessão de bolsas de estudo pelas maiores empresas, o auxílio a colónias de férias, a instituição de prémios aos melhores alunos, etc. tenham aqui a sua origem e a explicação lógica.
No dia 6 de Fevereiro de 1954, foi determinado que o ano lectivo (em Angola e Moçambique) começasse a 10 de Setembro e terminasse a 30 de Junho. Tinha-se em vista favorecer e facilitar as relações demográficas com Portugal, e a articulação mais perfeita e mais apertada dos serviços escolares. A divisão dos períodos em que o ano lectivo se subdividia seria estabelecida em cada um dos territórios. Segundo o que foi determinado, as férias do Natal iriam de 24 de Dezembro a 2 de Janeiro (depois ampliadas, de 19 de Dezembro a 3 de Janeiro); as férias da Páscoa seriam gozadas entre o Domingo de Ramos e a quarta-feira a seguir ao Domingo da Ressurreição. Nos anos seguintes houve alterações com vista ao reajustamento, pois pretendia-se que o ano escolar coincidisse com o de Portugal, incluindo as datas do exames, pelo menos os liceais. O ano lectivo de 1955-1956 começou em 26 de Outubro e terminou em 30 de Junho; esta agenda manteve-se, com pequenas discordâncias, até à data da proclamação da independência. No mês de Março, em Angola, as escolas suspendiam a sua actividade, entravam em férias.
O Boletim Oficial de Angola publicou no seu número 23 do ano de 1956 os pontos-modelo de ditado, redacção e aritmética referentes aos exames de admissão aos liceus e escolas industriais e comerciais. Foram subscritos por Armelim Cândido de Moura Dinis, substituto legal do chefe dos Serviços de Instrução.
Em 17 de Dezembro de 1952, considerando-se ser conveniente não se efectuarem os exames de admissão às escolas do ensino profissional, industriais e comerciais, naquele ano escolar, em Angola, foi suspensa a sua realização, pois previa-se que, por falta de professores e não estarem preenchidos os quadros docentes, não pudesse ministrar-se o ensino aos alunos que viessem a ser aprovados, o que causaria natural descontentamento às pessoas interessadas. Esta portaria veio a ser revogada em 30 de Maio de 1956, o que nos leva a pensar que nestes anos todos se não realizassem aquelas provas de apuramento dos candidatos à frequência do ensino técnico mais avançado. No entanto, deve ter-se em consideração que estava previsto, na origem, apenas "aquele ano escolar".
No dia 26 de Abril de 1954, porém, foi autorizada nas capitais das províncias ultramarinas portuguesas em que não existisse qualquer Escola do Magistério Primário a realização dos respectivos exames de admissão, aos indivíduos interessados em frequentar as escolas já criadas em Portugal ou noutros territórios sob a administração lusitana. Seriam admitidos, logicamente, os candidatos que estivessem nas condições legais, quer quanto a habilitações literárias quer quanto à idade estabelecida para a frequência daqueles estabelecimentos de ensino. Hoje, à distância de algumas dezenas de anos, podemos perguntar se um estudante estaria disposto a deixar a sua terra para cursar uma escola que iria fazer dele humilde e ignorado mestre-escola, professor de primeiras letras!
Sentia-se ser premente a necessidade de ordenar a actividade burocrática relacionada com o ensino primário, escalonando devidamente certas questões da administração. Deveria ter-se presente o que já fora estabelecido pelo decreto de 27 de Dezembro de 1957 e atender-se primacialmente ao número de escolas estabelecidas e seus graus. Tendo isso em conta, foi estabelecida na data de 25 de Junho de 1958 a classificação dos distritos escolares, em Angola, com correcções de 16 de Dezembro de 1959 e 22 de dezembro de 1962, ficando, resumidamente, ordenados como a seguir se indica:
—1ª CLASSE—Luanda, Huambo, Benguela e Huíla;
—2ª CLASSE—Uíge, Malanje, Bié, Cuando-Cubango e
Moçâmedes;
—3ª CLASSE—Cabinda, Congo, Cuanza-Norte, Cuanza-Sul, Lunda, Moxico.
Ainda dentro deste assunto, recordamos que a simples consulta ao Orçamento-Geral de Angola para 1963 nos diz que o ensino primário contava os seguintes cargos directivos e de fiscalização:
— 15 Subinspectores escolares;
— 05 Subdirectores escolares;
— 05 Inspectores escolares;
— 08 Directores escolares de 2ª classe;
— 04 Directores escolares de 1ª classe.
No dia 19 de Agosto de 1959, foi aprovado e posto em execução o Regulamento das Actividades de Educação Física nas Escolas Primárias, subscrito pelo presidente do Conselho Provincial de Educação Física. O seu texto só veio a ser publicado em 29 de Setembro de 1960, conjuntamente com o Manual de Preparação Física Geral nos Desportos de Competição e com o Manual da Preparação Física no Futebol, em igual data aprovados. Não se compreende o motivo de tão grande dilação! Estes documentos constituem um grosso volume do Boletim Oficial de Angola que abrange nada menos de cento e oitenta páginas.
Em 4 de Fevereiro desse ano de 1959, tinha sido determinado que as provas de passagem de classe, nas escolas primárias elementares, quer no ensino oficial quer no particular, se efectuassem nos últimos cinco dias lectivos do mês de Junho. Os exames da quarta classe, tanto no ensino geral como no ensino de adaptação, teriam início no primeiro dia útil de Julho. Estas decisões, pode dizer-se, continuaram em vigor até à independência, com a diferença de as passagens de classe serem antecipadas cerca de uma semana ou até mais, segundo em cada anuidade era determinado.
No dia 28 de Fevereiro de 1963, foram subscritas pelo director dos Serviços de Instrução, Sebastião António Morão Correia, as normas da promoção da terceira à quarta classes, nessa data aprovadas. Eram apresentados pontos-modelo de aritmética e geometria, história pátria, ciências geográfico-naturais e gramática aplicada.
Em 23 de Abril de 1962, um despacho do secretário-geral, ao tempo Amadeu Castilho Soares, regulamentou a situação dos alunos que frequentavam as escolas mantidas pelas forças militares em zonas de guerra, integradas numa campanha a que se deu o nome de Acção Psico-Social.
Com data de 31 de Maio de 1961, determinou-se que o prazo das matrículas nas escolas do ensino primário se fizesse coincidir com os dias que vão de 10 a 20 de Julho de cada ano. Ficavam sujeitos ao trabalho de matrícula os agentes de ensino em efectivo serviço e a trabalhar tanto nas escolas primárias como nos postos escolares.
Algum tempo antes, em 5 de Agosto de 1960, foram mandados aplicar no Ultramar, com diversas alterações, os Programas do Ensino Primário que tinham sido elaborados para as escolas de Portugal e foram aprovados em 28 de Maio do mesmo ano.
No dia 25 de Agosto de 1961, foram adoptadas algumas medidas relativas ao funcionamento da competente actividade burocrática. Criou-se o Gabinete de Apoio ao Director dos Serviços de Instrução, organizou-se a Repartição Escolar Distrital de Luanda e deu-se nova forma ao sistema de actuação das direcções escolares distritais e inspecções escolares, aperfeiçoando o seu funcionamento.
Ainda no decorrer do mesmo ano civil, em 2 de Novembro, foram criados nos Serviços de Instrução Pública, e com execução a cargo da Comissão Provincial de Auxílio às Populações Desalojadas, alguns cursos intensivos para preparação de pessoal especializado, com aulas que se estenderiam por dez meses e começariam a funcionar no dia 21 desse mesmo mês de Novembro. Estavam previstos os seguintes cometimentos:
—Curso de Agentes de Trabalho Social;
—Curso de Agentes Familiares;
—Curso de Jardineiras de Infância.
Mais uma vez se demonstra que a necessidade força muitas vezes a tomar atitudes, a improvisar soluções; o condicionalismo da guerra obrigou as autoridades portuguesas a desenvolver uma actividade que sem ela não seria tão intensa nem tão extensa — mesmo que viesse a promover-se, seria muito mais morosa, muito mais lenta, e pode até admitir-se que em muitos casos não chegaria a experimentar-se...
Ao terminar este capítulo, vamos referir-nos aos livros escolares, retomando em parte o que já foi dito atrás. Começaremos por mencionar que, em 8 de Junho de 1945, um decreto do Governo de Lisboa estabeleceu as regras que deviam orientar a importação de livros pelos territórios ultramarinos, incluindo Angola, tendo em conta não tanto os escolares como os outros, englobados sob a designação de científicos, literários, artísticos ou pedagógicos, considerando-os livres de direitos alfandegários.
Em 11 de Agosto de 1948, foram aprovados os livros escolares a utilizar no ensino primário, no quadriénio de 1949-1950 a 1952-1953. Para a primeira e segunda classes adoptava-se o chamado "Livro Único"; na terceira e quarta classes poderiam usar-se os seguintes:
—Leituras, de Manuel Subtil, Cruz Filipe, Faria Artur e Gil Mendonça,
edição da Livraria Sá da Costa;
—Aritmética Prática, de Ulisses Machado, edição
da Livraria Rodrigues;
—Geometria, da Série Escolar Educação,
edição da Editora Educação Nacional;
—História de Portugal, de Janeiro Acabado, edição
de Gomes & Rodrigues;
—Apontamentos sobre História de Angola, de José
de Figueiredo, edição da Livraria Lello & Cª, de
Luanda;
—Breves Noções de Ciências Naturais, de
António Augusto de Barros Almeida, edição de Livraria
Popular, de Francisco Franco;
—Geografia, de Janeiro Acabado, edição de Gomes
& Rodrigues, aprovado provisoriamente, enquanto não fossem introduzidas
correcções e adaptações relativas ao ensino
desta matéria em Angola.
Esclarecia-se ainda que no ano lectivo de 1949-1950, atendendo a diversas dificuldades práticas, seria permitido o uso dos livros anteriormente aprovados para a terceira e quarta classes.
Por disposição tomada em 4 de Março de 1953, foram mantidos os livros escolares do ensino primário aprovados em 11 de Agosto de 1948, introduzindo naquela lista as seguintes alterações:
—Livro de Leitura da 3ª Classe, do Ministério da
Educação Nacional;
—Leituras, de Janeiro Acabado, edição de Gomes
& Rodrigues, ao qual deveriam ser introduzidos textos relativos ao
Ultramar.
Devemos ter presente que o livro de leituras para a terceira classe foi durante muitos anos considerado como "Livro Único", pelo menos em Portugal, e estamos convencidos de que também em Angola.
Segundo o disposto em 25 de Julho de 1956, continuariam a manter-se para o ano lectivo seguinte os livros anteriormente adoptados, com alterações que mais tarde foram introduzidas, acrescentando-lhes:
—Livro de Leitura (4ª classe), de António Matoso e Manuel Bandeira, edição da Livraria Lello & Cª, de Luanda, que ficaria desde já aprovado para o quadriénio de 1956-1957 a 1959-1960.
Em 9 de Maio de 1962, foram aprovados para o quadriénio que então se iniciava as seguintes obras:
—Primeiro Caderno de Leitura Inicial, para o ensino primário
rural, edição da Livraria Lello & Cª;
—Segundo Caderno de Leitura Inicial, também para o ensino
primário rural, da mesma editora;
—Leitura, igualmente para o ensino rural, da Livraria Lello
& Cª, de Luanda.
E no dia 10 de Agosto de 1963 foi aprovado ainda:
—Livro de Leitura, para o terceiro ano do ensino primário rural, edição de Livraria Lello & Cª, de Luanda, a usar no quinquénio seguinte. Embora se não indiquem autores, podemos pensar se não seriam António Matoso e Manuel Bandeira.
Com tais referências terminamos este capítulo, em que procurámos
dar ideia sumária da organização escolar, das alterações
nestes anos introduzidas, das medidas tomadas, dos meios de que se dispunha
e até mesmo das iniciativas empreendidas. Não chega para
saber tudo, mas é suficiente para formar uma ideia e basear juízo
crítico e apreciativo.
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