O DIA-A-DIA NA SALA DE AULA
Acostumados a comparar os resultados apresentados por seus filhos com os de outras crianças, nem sempre compreendem porque eles, nem sempre trazem para casa aqueles desenhos "bonitinhos" (às vezes feitos até mesmo pela professora), a escrita "certa", as cópias que equivocadamente consideram necessárias e importantes para a aprendizagem da escrita, as folhas mimeografadas etc. Quando não questionam as professoras, supõem eles próprios a fazer "correções" que, na maioria das vezes acabam interferindo no processo de aprender da criança e criando bloqueios que tornam mais difícil a aquisição da autonomia, tornando-a muitas vezes insegura e com pouca confiança em si mesma. Muitas vezes os pais dão mais trabalho às professoras que as próprias crianças, elas mesmas muito livres, criativas e ousadas quando o adulto não atrapalha. Para evitar que isso aconteça, uma das estratégias muito interessantes que usamos foi a aproximação maior entre pais e professores que tem acontecido em algumas escolas. Em minha classe tenho um exemplo de como esta aproximação pode resultar em benefício da criança. Não é o único caso, mas, em se tratando de uma criança que durante muito tempo se mostrava dependente e insegura, com uma dificuldade muito grande para se expressar e uma recusa taxativa em produzir, especialmente quando se tratava de algum trabalho de grupo, merece ser discutido. No ano de 1994, o aluno João , por força de um processo tradicional de ensino a que fora submetido na classe de maternal não só se recusava a participar das atividades de classe como também, mais tarde, quando já se sentia um pouco mais integrado e começava a ganhar confiança, passou a apresentar um desenvolvimento mais lento do que a maioria de seus colegas. Não gostava de participar das atividades físicas, não se integrava com o grupo nas brincadeiras, seu desenho era pré-esquemático e desorganizado, denunciando uma percepção incompleta dos objetos e das cores e uma compreensão mínima das relações espaciais. Sua mãe estava sempre "cobrando" a professora porque queria que o filho levasse para casa desenhos mais "bonitos". Ao mesmo tempo mostrava-se superprotetora, impedindo que o garoto participasse de qualquer brincadeira que pudesse feri-lo. (Por isso ele não "gostava" das atividades físicas.) Durante todo o ano foi muito difícil para a professora explicar para esta mãe quais eram as necessidades de seu filho. Com muito custo conseguiu convencê-la a não matricular o garoto na primeira série, para que ele aproveitasse mais um pouco as oportunidades que só a pré-escola lhe daria de crescer e desenvolver-se. Em 1995 João veio para minha classe. Procurei aproximar-me mais da mãe mostrando a ela o que ele estava produzindo e quanto ele poderia aprender com a ajuda da família. Posso afirmar que isso foi realmente muito bom, tanto para o garoto como para a família. Hoje ele está muito bem. Já gosta das atividades físicas e participa com seus colegas de tudo que é proposto, principalmente quando se trata de brincadeiras com os colegas. Evoluiu de uma representação pré-esquemática para um desenho esquemático, rico de detalhes e aplicando de maneira perfeitamente adequada todos os conceitos espaciais que já domina. Sua escrita ainda é silábica, mas ele perdeu o medo de escrever e, na maior parte das vezes já faz a correspondência sonora com as letras que utiliza. É um menino alegre que deixou de ser um reprovado em potencial (o que certamente aconteceria no Ciclo Básico onde as atividades estão mais voltadas para a sistematização de uma escrita que ele ainda não compreendia). Com o apoio dos pais ele segue naturalmente seu caminho da aprendizagem. Respeitado seu ritmo ele consegue agora desenvolver com autonomia as pequenas grandes tarefas de sua vida de criança.
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