Um perfil psicológico de Salazar 

A sabedoria que detém as areias

Quem era Salazar ? 
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A SABEDORIA QUE DETÉM AS AREIAS

Uma vez, em Macau, pedimos a um letrado chinês que nos escrevesse nos caracteres da sua escrita o nome de Salazar.
Os chineses costumam fazer uma transposição dos sons de cada uma das sílabas do nome estrangeiro para os sons mais próximos das sílabas do chinês. No caso vertente, do dialect de Kuang-Tung. Como as mesmas sílabas chinesas podem ser pronunciadas em nove tons diferentes, a transposição dá por vezes origem a composições de sentido extremamente curioso.
A palavra Salazar é decomposta em SAT-LAI-SA. O letrado escreveu os caracteres correspondentes, no tom que lhe pareceu mais adequado. Quando lhe perguntamos o que significavam aqueles sinais, respondeu-nos: «a sabedoria que segura as areias».

É impressionante como esta definição traduz perfeitamente o papel histórico do homem sábio, cuja prudência foi, no extremo ocidental da Europa, a muralha que se opôs ao avanço das areias do deserto comunista. Romperam os norte-americanos a barreira que era a Europa; e esta apressou-se, na mira de salvar o melhor possível os negócios dos seus capitalistas, a ceder as suas posições em todo o mundo. Salazar foi a força moral que se opôs, juntando a si, de começo, a defesa espanhola. As areias escorriam por esta e por aquela brecha, mas a muralha salazariana resistia sempre. Se ele tem vivido mais alguns anos, teria sido possível a Europa salvar-se?

As forças que se levantavam contra ele já não eram os simples oposicionistas caseiros nem as dificuldades vizinhas. Era toda uma conjunção de interesses a rodear a inconsciência de tantos!

Uma noite em sua casa, nos anos sessentas, com a ofensiva internacional lançada em Angola, em Moçambique e na Guiné, e Goa já ocupada pela União Indiana, Salazar falou-nos das condições em que os portugueses teriam de aguentar a guerra. Esta dependia sem dúvida de acordos secretos entre os Estados Unidos e a Rússia dividindo entre si o mundo em zonas de influência. Para a Rússia isso não era um objectivo, mas somente um meio de ir alargando, com impressionante persistência, os limites do seu império. Teria o mundo de esperar que os americanos tivessem consciência desse facto. Enquanto isso não sucedesse, iríamos caindo aos pedaços!
Ao dizer-nos isto, agitado, dando alguns passos no seu gabinete, o homem sereno de quem o povo conhecia a imagem, tinha na face e na voz a expressão duma amargura extrema. Sentimos então a tragédia daquele velho que se entregara totalmente, na doação de uma vida inteira de trabalho e de sacrifícios, ao refazer duma pátria e via essa pátria ameaçada de se desfazer pela estupidez materialista dos chefes responsáveis do Mundo Ocidental.

Mas a tragédia sentida não fazia desviar o homem do sentido moral da existência colectiva dos portugueses. Aguentar até ao fim. Só os cobardes desistem e perdem tudo. Os homens e os povos com a consciência de um objectivo moral vão até ao fim, porque mesmo vencidos materialmente, nem tudo se perde.


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1 de Setembro de 1997
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