Violetas
na Janela
Romance
de Patrícia
Psicografia
de VERA LÚCIA
MARINZECK DE CARVALHO
Dedicatória
Um trabalho que temos a graça e oportunidade de fazer é nossa realização. Dedicar a alguém é demonstrar, reconhecer que eles também ajudaram de algum modo. A meus pais José Carlos Braghini e Anézia Alba Marinzeck Braghini, que muito amo e aos quais muito devo.
Patrícia
As violetas não só enfeitaram a janela do meu quarto, mas também a do mundo novo que defrontava à minha frente. O amor permanecia além do tempo e do espaço.
Algumas
Palavras da Médium
Patrícia é minha sobrinha, filha de minha irmã. Tínhamos grande afinidade, éramos amigas.
Na adolescência, quase tudo que ela pensava, estando perto, captava seus pensamentos com facilidade.
Chegamos a brincar com a telepatia. Uma vez, no sítio de seus pais, fizemos uma experiência. Cada uma de nós ficou em um quarto, ela pegava um objeto e transmitia, eu adivinhava. Deu certo, experimentamos com palavras, com exatidão. Só ela conseguia transmitir, eu captar.
Como o acaso não existe, tenho a certeza de que nossos espíritos sabiam da tarefa que faríamos mais tarde.
Patrícia desencarnou aos dezenove anos, deixou uma lacuna, saudades da presença física, mas a certeza de que não nos separamos.
A vida continua, e é sobre esta particularidade, o prosseguimento, que ela vem amorosamente nos narrar, legando novos conhecimentos.
De minha parte, sou grata, profundamente grata ao Pai por me permitir desfrutar de sua companhia enquanto trabalhamos.
Vera
São Sebastião do Paraíso, MG, 1992.
Prefácio
Conheci Patrícia encarnada. Era uma menina, de infante tornou-se uma linda moça. Alta, magra, loura com cabelos cacheados compridos, olhos azuis parecendo pedaços do céu. Sorriso franco e alegre, maravilhava a todos. Mas não foi esta beleza perecível que me chamou atenção. Era pura, delicada, cultivara a parte verdadeira, que a acompanhou na desencarnação. Era Espírita. Tinha na Doutrina Espírita sua meta de viver. Inteligente, estudiosa, o conhecimento das verdades eternas era de seu interesse. Ouvia as orientações do seu genitor com profundo devotamento. Raciocinava sobre tudo que aprendia. Quando a conheci, soube que ia deixar o corpo físico jovem. Assim fez. Como uma flor colhida que enfeitava a Terra, veio nos encantar no Plano Espiritual.
Incentivei-a a ditar aos encarnados. Como amante da Literatura, pedi a ela que narrasse aos nossos irmãos na carne sua experiência. Como é agradável a morte do corpo nos surpreender com a consciência tranquila, sem erros, vícios e com conhecimentos da Vida Espiritual.
Para minha alegria, Patrícia aceitou. Para este evento, estudou. Tarefa que não foi nenhum sacrifício. Ama aprender.
Emocionado, apresento esta delicada alma que com sua simplicidade perfumará nossa Literatura Espírita.
Antônio
Carlos
I
DESPERTANDO
Por muitas vezes acordei para logo em seguida adormecer. Neste período desperta, observei o local onde estava. Era um quarto com paredes claras e uma janela fechada. O local estava na penumbra. Sentia-me extremamente bem. Ouvia a voz do meu pai, ou melhor, sentia as palavras: “Patrícia, filha querida, dorme tranquila, amigos velam por você. Esteja em Paz.” Embora estas palavras fossem ditas com muito carinho, eram ordens. Sentia-me protegida e amparada.
Estava deitada numa cama alta como as do hospitais, branca e confortável. Acordava e dormia.
Até que despertei de fato. Sentei no leito. Virei a cabeça devagar observando o quarto e foi então que vi ao lado do meu leito, sentado numa poltrona, um senhor. Quando o olhei, ele sorriu agradavelmente.
Apalpei-me, ajeitando-me entre os lençóis alvos e levemente perfumados. Estava vestida com meu pijama azul de malha. Arrumei com as mãos meus cabelos.
“Onde será que estou?” pensei.
Não conhecia o local e nem aquele senhor, que calmamente continuava a sorrir. Não tive medo e nem me apavorei. Fiquei calada por minutos, tentando entender. Até que o risonho senhor me dirigiu a palavra.
—Oi, Patrícia! Como se sente?
—Bem...
Pensei no meu pai. Senti-o. Interroguei-o mentalmente: “Papai, que faço?”. “Calma, esteja tranquila, diante do desconhecido, procure conhecer; nas dificuldades ache soluções. Pense em Jesus. O Divino Mestre é a Luz do nosso caminho.” Papai respondeu dentro de mim, era como se pensasse com a voz dele. Senti coragem e ânimo, certamente fluidos que me enviava. Confiei. Voltei a cabeça na direção daquele senhor, olhei-o fixamente e indaguei:
—Como sabe meu nome?
—Patrícia é um lindo nome, conheço-a há tempo.
—Onde estou?
—Entre amigos.
Realmente sentia assim. Estava calma. Ter acordado num lugar desconhecido e com aquele estranho ao meu lado pareceu-me natural. Logo eu que sempre fui tão caseira e avessa a estranhos. Interroguei-o novamente.
—Como se chama?
—Maurício. Sou amigo de seu pai.
—É médico? Trabalha no nosso Centro Espírita?
Não me respondeu, seu olhar tranquilo dava-me calma. Observei-o detalhadamente. É ruivo, com sardas pelo rosto, olhos verdes, boca grande e sorriso agradável. Deixou que eu o observasse. Minutos passamos em silêncio. Até que ousei perguntar:
—Estou sonhando ou desencarnei?
II
Aquele estranho, que por afinidades senti um amigo a velar por mim, continuava a sorrir. Olhou-me nos olhos. Lembranças de acontecimentos vieram à minha mente.
Ia levantar, era domingo, inverno, final de férias. Sentei na minha cama para trocar meu pijama quente por outra roupa, quando senti uma tonteira. Minha cama estava encostada na parede e foi nela que apoiei a cabeça. Parecia que algo explodia dentro de minha cabeça. Estas sensações foram por segundos. Vi e ouvi por instantes, sem definir quem fosse, pessoas ao meu lado.
—Calma, Patrícia, calma! — alguém falou carinhosamente.
Senti que seguraram minhas mãos, como também senti mãos sobre minha cabeça.
—Dorme, dorme...
Dormi realmente. As lembranças acabaram como por encanto. O fato é que estava num quarto que não era o meu, diante de Maurício. Olhei para todos os lados. Entendera, não foi preciso ele responder, Maurício somente me ajudou a lembrar. Desencarnei. Estava tão calma que estranhei. Suspirei, o melhor é assumir. Não sabia que iria desencarnar um dia? Voltei a indagar Maurício, como se fosse um assunto banal.
—Que aconteceu? De que desencarnei?
—Uma veia rompeu no seu cérebro. Tem que haver um motivo para o corpo morrer quando é vencido o prazo de o espírito ficar encarnado. Foi por um aneurisma cerebral.
—Onde estou?
—Na Colônia São Sebastião. No Hospital. Na parte de Recuperação.
—Recupero-me de quê?
—De nada, você está ótima, aqui está somente para se adaptar. Patrícia, lembra de sua avó Amaziles? Ela está aqui e quer vê-la.
A imagem de vovó veio à minha mente. Gostava muito dela. Esteve muito doente, piorara e fora para o hospital. Quando desencarnou estávamos, seus netos, a orar para que sarasse. Ao saber que desencarnou, pusemo-nos a chorar. “Como? — minha irmã indagou —Estávamos a orar para que sarasse.” Minha mãe respondeu: “Suas orações foram ouvidas. Jesus, vendo que ela não poderia sarar no corpo, levou-a para que sarasse no Plano Espiritual.” Senti, sentimos muito seu desencarne. Agora, ali estava ela querendo me ver. Corrigi meu pensamento. Gostava? Não! Gosto muito dela!
—Por favor, Maurício, faça-a entrar — disse emocionada.
Vovó entrou no quarto de mansinho. Estava diferente, mais bonita, esperta e sem seus grossos óculos. Beijou-me na testa e nos abraçamos demoradamente. Meus sentimentos naquele momento ficaram confusos. Sentia alegria em vê-la, mas, também, tive a certeza de que realmente tinha desencarnado. Senti um vazio e um ligeiro medo. Percebendo, vovó desprendeu-se, sentou-se ao meu lado, no leito. Sorriu feliz dizendo:
—Patrícia, aqui é lindo! Logo poderei mostrar a você lugares maravilhosos. Você está tão bem! Tão linda! Necessita de alguma coisa? Quer que lhe faça algo? Você...
—Vovó —
interrompi — como está mamãe? Papai? Juninho? Carla e o nenê? (Juninho e
Carla são meus irmãos. Carla, quando desencarnei, estava grávida do seu
primeiro filho.)
—Estão bem. São Espíritas. O Espiritismo dá aos encarnados o entendimento da morte do corpo. Compreenderam os acontecimentos e sabem que seu desencarne lhe trará muitas felicidades. Juninho está bem, Carla também: irá ter um belo menino. Seu pai é firme como a rocha, seu saber é o leme a dirigir o barco do seu lar.
—Vovó, eles não sentiram meu desencarne?!
—Sentiram. Claro que todos sofrem sua ausência. Se ajudam mutuamente com muita compreensão. Fazem de tudo para mandar a você o carinho e o amor que sentem. Um dia vocês irão se encontrar, como agora se encontra comigo. Verá que nunca estiveram separados. O amor une.
—Vovó, por favor, cuide deles, o senhor também, Maurício. Ajudem-nos. Mamãe deve estar triste. Será que chora por mim? Ela poderá não querer se alimentar.
Maurício, desde que vovó entrara no quarto, ficou sentado na poltrona em silêncio. Como me dirigi a ele, rogando ajuda, tentou tranquilizar-me.
—Patrícia, no seu lar terreno eles só nos pedem que cuidemos de você. A menina nos pede para cuidar deles. O carinho sincero que os une é laço forte. Cuidaremos de você e deles. Estarei sempre com você, até que se adapte bem me terá por companhia. Estou encarregado de velar por você.
—Obrigada — respondi tentando sorrir, mas acho que fiz foi uma careta.
Foi me dando um sono, uma vontade irresistível de dormir. Deitei. Vovó ajudou a me acomodar. Meus olhos foram fechando. Os dois sorriram para mim. Vovó me beijou na testa, segurou minha mão.
—Acho que vou dormir...