XIII

A ESCOLA

 

Dois dias depois, Maurício veio me buscar para me levar à escola.

Ela está situada numa área enorme. Encarnada, ouvi, no Espiritismo, falar das Escolas no Plano Espiritual, referindo-se muito ao aprendizado que se faz quando desencarnado. Mas pouco sabia o que vinha a ser este aprendizado. Quem gosta de aprender, interessa-se sempre por estas escolas. Há escolas por todas as Colônias, são sempre grandes e acolhedoras. A que descrevo, a da Colônia São Sebastião, é linda. Está numa área com vários prédios, é repartida em alas, designadas por letras. O objetivo é bem claro, deveria ser o mesmo sempre em todos os planos: instruir. Na escola há cursos de conhecimentos, mas o principal ensino é o Evangelho, a Moral Cristã. Há muitos cursos para ensinar a viver desencarnado, como os que fiz de Volitação e Alimentação. Os cursos têm tempo marcado de duração. São poucos os orientadores e professores que moram na escola. Na Colônia São Sebastião, as moradias na escola são só para alojamentos. Muitos alunos moram lá durante o curso.

Entre um prédio e outro, há pátios e jardins. A escola toda é cercada com muitas árvores, flores e recantos agradáveis com bancos, onde alunos revêem a matéria, estudam, trocam idéias e conversam animados.

Maurício e eu rumamos para a Ala D. Enquanto andávamos, foi me esclarecendo:

—Aqui estão todas as salas de aula da Colônia. O estudo aqui abrange até certo grau. Aqueles que após cursá-lo querem continuar a estudar podem ir a outras Colônias maiores ou às Colônias de Estudos.

—São muitos os que querem estudar?

—Infelizmente não. Aqui tudo é facilitado. Não se pode dar as desculpas que encarnados dão para não estudar. Mesmo assim, estuda uma parte somente dos moradores. A continuação dos estudos abrange somente um apequena porcentagem. Estuda-se para ter conhecimentos.

—Como são estas escolas em Colônias de Estudos?

—Chamamo-las de Colônias de Estudos, embora cada uma delas tenha um nome. É um tipo de escola que para os encarnados seria uma Universidade, abrangendo conhecimentos maiores em várias Ciências. Estas Colônias são só escolas, ou melhor, há nelas somente locais de estudos, de pesquisas, e as moradias de professores e alunos.

—Maurício, se um aluno indagar algo que não sei, que faço?

—Diga simplesmente que não sabe, que irá indagar para responder. Você dará somente aulas de Português e Matemática. Eles perguntam mais nas aulas de Iniciação Evangélica e Moral Cristã, aulas dadas por professores experientes, que resolvem ou dão orientações a todos os problemas dos alunos. Agora vou apresentá-la a D. Dirce, a coordenadora da Ala D.

A Ala D dá para um pátio. Tudo é simples como toda a escola, pintada de cor clara e muito limpa. Maurício bateu numa porta em que estava escrito: Orientadora. D. Dirce nos recebeu alegremente.

—Oi, Patrícia, que bom tê-la conosco. Maurício, se quiser pode ir. Até logo! Você, Patrícia, ficará comigo, mostrarei o método que usamos para alfabetizar.

Entramos na sala da orientadora, que é mobiliada com muito bom gosto, mas simplesmente. Entusiasmada ela me mostrou o método que usam. Encantei-me com o modo prático e simples de ensinar. Os planos de aulas já estão prontos, muito bem elaborados. Observei D. Dirce, fala da escola e dos alunos com entusiasmo e alegria. Percebeu o que eu pensava, não me surpreendi. Aqui, a maioria sabe ler pensamentos. Disse delicadamente.

—Patrícia, amo ensinar, amo o que faço, amo esta escola! Venha, mostrarei esta ala a você.

Todas as classes davam para o pátio. As salas são pequenas, no máximo para quinze pessoas cada uma, isto para facilitar o aprendizado. Salas pequenas estão nesta ala, há salas de aula de diversos tamanhos na escola. D. Dirce bateu em uma das classes.

—Esta é a sala em que vai trabalhar.

A porta abriu e o professor nos recebeu sorrindo. D. Dirce nos apresentou como também aos alunos.

—Esta é Patrícia, que irá substituir Clóvis; este é o professor que licenciará.

Gostei deles e senti que eles gostaram de mim. Logo após conhecer todos, saímos. D. Dirce continuou esclarecendo-me.

Você irá substituir Clóvis que, por motivo de família, pediu licença.

Estranhei com este “pediu licença”. D. Dirce explicou.

—Patrícia, aqui tentamos aprender a servir por Amor. Todo trabalho é um aprendizado e não sacrifício. Certamente ao adquirir responsabilidade não deixamos nossos afazeres sem pedir aos nossos superiores. E, quando fazemos, é por motivo justo. Clóvis, a quem irá substituir, está conosco há três anos, seu filho desencarnou e vaga em sofrimento. Pediu licença para ver se consegue ajudar o filho e os familiares encarnados. Um pedido assim é comum aqui, sua avó, para ficar com você, pediu licença por um período do seu trabalho.

—Tudo bem organizado! — não pude deixar de exclamar.

Voltei para casa com meus planos, começaria a lecionar no dia seguinte. Em casa li-os e planejei o melhor modo de dar aula.

Contente, no dia seguinte lá estava bem antes do horário marcado. Conheci os outros professores da Ala D, muito simpáticos, todos foram gentis comigo. Lenita, uma das professoras, se ofereceu para me ajudar e orientar no que precisasse. Gostei dela e nos tornamos amigas.

Minha classe tinha doze alunos, senhores e senhoras, pessoas simples, quietas e tímidas. Ali não usamos o termo senhor e senhora nem eles me chamavam de dona, tratavam-me por você. Só nos referíamos ao tratamento respeitoso a D. Dirce. Iniciei a aula. Normalmente tinha que repetir as explicações, corrigir caderno por caderno. Eles não desanimavam, queriam aprender. Eu com paciência ensinava prazerosamente. Acostumamo-nos logo uns com os outros.

Lenita morava perto da casa de vovó, voltávamos da escola juntas, porque ela lecionava dois períodos e íamos em horário diferente. Conversávamos muito, desencarnou jovem como eu, vinte anos, é inteligente, poetisa, temos os mesmos objetivos e interesses.

Lenita é clara, usa uma longa trança nos cabelos e a joga do lado, que vem até a cintura, é muito bonita. Falando em beleza, os moradores da colônia são na maioria bonitos. Acho que é por dois motivos. Primeiro, a gente passa a vê-los como irmãos queridos. Segundo, porque os moradores são de paz, estão se equilibrando, tentando harmonizar-se. As pessoas assim, lindas interiormente, são agradáveis, portanto bonitas.

—Patrícia, fiz o curso que irá fazer, é maravilhoso, irá gostar.

Está sempre incentivando e elogiando a todos. Ela não gosta de falar de si, insisti para que contasse sua história.

—Desencarnei há muitos anos, fui assassinada. Foi bem triste e cruel. Sofri muito. Estava noiva, amava e era amada. Ao voltar do trabalho, à tardinha, sozinha, um homem me rendeu, me amarrou, tampou minha boca e me levou para um local isolado. Me estuprou e feriu com uma faca, largando-me num buraco. Desencarnei com muita dor e agonia. Socorristas me desligaram e levaram para um Posto de Socorro. Julguei que ainda estava viva, encarnada, não acredite, não queria nem pensar que desencarnara; iludi-me de tal modo que até esqueci o que acontecera, só queria sarar e voltar para perto dos meus. Como não me levaram, fugi, fui para a casa terrena. Decepcionei-me muito e fiquei magoada. Nada era como antes, meu noivo nem sentiu minha falta como eu pensei. Já namorava outra. Comecei a enlouquecer. Meus ferimentos voltaram, triste, fiquei a vagar. Só então entendi que desencarnara, pedi a Deus ajuda com sinceridade. Novamente fui socorrida. Desta vez, sem ilusão, magoada e triste, tive que fazer um longo tratamento para me recuperar. Estava revoltada com a maldade, a lembrança do acontecimento bárbaro fazia-me entrar em crise de desespero. Foi necessário recordar parte do meu passado, de uma outra existência, onde vi a ação que fiz para ter esta reação. Fui no passado distante um mercador de escravas jovens e bonitas, negociava-as para homens de maus instintos. Curada, adaptada, vim para esta Colônia estudar e trabalhar. Hoje sou feliz. Minha triste história não me incomoda mais.

—Ficou sabendo quem foi seu assassino?

—Sim, fiquei. Mesmo quando revoltada, não quis me vingar. Fiquei magoada mais pela maldade, do que com ele. Perdoei logo. Este irmão que me tirou a vida física sofreu muito. Não foi preso, mas a reação de seus erros veio em seguida. Tanto sofreu encarnado, como sofre desencarnado.

—Não pensou em ajudá-lo?

—Sim. Não faz muito tempo, pude com permissão tentar ajudá-lo no Umbral. Fui até lá. Não aceitou nem me ouvir. Ao me ver, gritou que era culpada por ele estar sofrendo. Que certamente fui dar queixa a Deus e Ele o colocou no inferno. Meus instrutores me aconselharam a deixá-lo. Um dia ele entenderá, se arrependerá com sinceridade e será socorrido. Oro muito por ele.

Que bonita lição podemos tirar da história de Lenita!

O trabalho da escola me fascinava. Dediquei-me tanto, que estava conseguindo ótimos resultados. D. Dirce estava contente comigo e Maurício não pôde deixar de sentir orgulho quando ela me elogiou a ele.

Depois, estava trabalhando, ganhando meus bônus-horas. Receber meu primeiro bônus-hora foi superagradável. Agora, não iria depender mais da vovó nem dos amigos para ir ao teatro, às salas dos computadores, lugares que gosto de ir. Alegrei-me tanto ao recebê-lo que fiquei orgulhosa, foi como receber encarnada meu primeiro ordenado. A sensação de autosuficiência é agradável, não ser peso, ser útil, poder colaborar é o máximo. Não estava lecionando só por este motivo. Trabalho é um bênção. Mas fiquei toda importante com os “meus” bônus, os que ganhei trabalhando.

Tudo que narro poderá parecer a muitos uma ficção. Mas o que é a morte senão uma nova etapa da vida?


XIV

VISITA EM CASA

 

Vovó me disse que logo poderia visitar meus familiares. Aguardei toda contente. Estava muito bem e feliz. As recomendações foram muitas. Em casa, vovó e suas amigas falaram por horas.

—Patrícia, você em sua casa deve ficar alegre o tempo todo.

—Lembre-se de que o lar é onde existe amor, o carinho de vocês não acabou. Continua o lar terreno sendo seu, só que não é para morar mais lá.

—Mesmo que sentir vontade de ficar, não deve. Irá somente visitá-los. É aqui o seu lugar. Amamos você e a queremos aqui. Etc...

Tudo que se espera chega. Chegou o dia tão aguardado de ir visitar meus familiares. Acompanhariam-me Artur, Maurício, Frederico e vovó. Não pude deixar de pensar se não eram muitas pessoas para ir comigo a uma simples visita. Maurício, como sempre lendo meus pensamentos, esclareceu:

—Sua avó vai porque quer prazerosamente acompanhá-la na visita à família. Eu vou porque sou responsável por você, Artur e Frederico vão porque querem estar com você desfrutando desta alegria.

—Vamos, Patrícia —, disse Artur, alegre como sempre.

—Não vai me recomendar nada? — indaguei.

—Não — riu. —Não acha que já escutou demais? Depois, com tantos acompanhantes, não duvido que seja você a nos orientar.

Rimos, mas estava ansiosa. Caminhamos para um dos portões.

—Artur — perguntei —, são todos os moradores e hóspedes que podem visitar seus familiares?

—Não, são poucos os que podem usufruir deste prazer. Tudo por falta de preparo e entendimento tanto dos desencarnados quanto dos encarnados. Os desencarnados moradores são os que já trabalham, os que são úteis. Os hóspedes da Colônia são os que estão em adaptação. Para visitar a Terra, necessitam estar aptos, conscientes da desencarnação, dos problemas dos familiares. Têm que ter total conhecimento que estão a visitá-los. Estas visitas também têm que ser com os encarnados conformados, sem o perigo de eles segurarem o desencarnado. Não podem usufruir destas visitas se tiverem uma leve perturbação. Muitos querem, poucos podem.

A Colônia São Sebastião tem três portões. São grandes, há neles três aberturas para os aeróbus passarem. Agre-se o portão inteiro, ou outra abertura de um tamanho médio e uma porta. São controlados por aparelhos de que os encarnados não têm ainda conhecimentos.

Estes aparelhos medem a vibração de quem deve passar por eles. Também há trabalhadores que guardam os portões. As Colônias não são idênticas, não são todas iguais, porém todas têm as mesmas bases, já que seus objetivos são os mesmos: servir de moradia provisória a desencarnados. Na Colônia São Sebastião, os portais, ou portões, são muito bonitos, são dourados clarinho com lindos desenhos em relevo, principalmente de flores.

A porta foi aberta e a atravessamos. Vi os muros. Toda a Colônia é cercada, ou murada; expressões, nomes dados não alteram. Ela é cercada por uma energia, força magnética, só é possível entrar e sair das Colônias pelos portões. Este muro, parede que a cerca, é do mesmo material que é feita toda a Colônia. Sendo assim, são poucos os desencarnados que podem atravessar esta muralha. Também há esta energia magnética que impede de entrar desencarnados que não podem ir à Colônia. Irmãos estes enraizados no mal e com intenções mesquinhas. É bonita a muralha. Cheguei perto, toquei-a, olhei para cima, não vi seu final. O muro é constituído até certa altura, depois só fica a energia magnética que envolve toda a Colônia. Para ver a Colônia necessita-se vibrar igual, muitos espíritos ignorantes no mal não a acham, não conseguem vê-la.

Meus três acompanhantes ficaram me observando enquanto olhava tudo curiosa.

—Artur, — indaguei — sempre tive a curiosidade de saber o que acontece se um avião passar por aqui.

—A Colônia fica longe do espaço onde passam aviões. Está bem mais alta. Mais alguns Postos de Socorro estão localizados no espaço onde podem passar aviões. Estes podem passar pelos Postos e não acontece nada. Colônias e Postos não são matéria bruta, mas sutil.

—E os foguetes, as naves espaciais?

—Não nos causam danos. Mas as Colônias não são imóveis, podem pela força mental dos que as sustentam mudar de lugar, se houver necessidade.

—Vamos, falou Frederico sorrindo.

Demos as mãos. Sabia volitar, mas seria a primeira vez que volitaria rápido e em grande distância. Deram as mãos para me ajudar. Quando grupos saem, não se dão as mãos, a não ser se há algum inexperiente como eu.

Viemos tão rápido, questão de minutos, que não deu para ver nada, descemos no quintal de minha casa.

—Entremos — convidou Artur.

—A porta está aberta, mas se você quiser, Patrícia, pode atravessar a parede — vovó explicou.

—Depois — respondi.

Mamãe estava sentada no sofá da sala fazendo crochê, estava mais magra. Olhei-a demoradamente. Amo-a demais. Fiquei parada na sua frente. Vovó falou carinhosamente.

—Venha, abrace-a e beije-a.

Aproximei-me de mansinho, beijei sua mão, seu rosto. Tendo consciência que se é desencarnado, nota-se muitas diferenças ao aproximar-se de um encarnado. Fui pegar nas mãos de mamãe, as minhas atravessaram as dela. Beijei seu rosto devagar, emocionei-me. Sempre dei valor a tudo que tínhamos, não em exagero. Sempre fui grata a tudo que tive e cuidei dando valor a cada objeto. Ver a casa, meu lar como sempre, dei graças ao Pai. Sempre tive muito mais que merecia. Senti vontade de chorar ali na frente de minha mãe, esforcei, levantei e refugiei-me nos braços de vovó.

—Agora — Artur disse me animando — vamos ver a Carla, depois vamos ao sítio para que veja seu pai e seu irmão.

—Você vai volitar ao nosso lado, vamos devagar — disse Maurício.

Os fluídos da Terra são bem mais pesados que os da Colônia. As Colônias têm boas vibrações, porque lá não há maldades. Na Terra, são mentes boas e más a vibrar. Muitos desencarnados das Colônias e Postos de Socorro ao voltar à Terra pela primeira vez sentem sufoco, tonteira, ligeiro mal-estar. Nada senti, estava sustentada pelos amigos que me acompanhavam.

Volitamos, fiquei no meio, mas sozinha. Ver a cidade de cima, voando, é bem agradável. Chegamos à casa de Carla, abracei-os, ela e meu cunhado Luiz Carlos, minha irmã logo daria à luz ao meu tão esperado sobrinho. Depois fomos ao sítio. Como é agradável volitar no campo, ver as árvores, as plantações e animais. Vi Juninho trabalhando, dei-lhe um forte abraço. Fui até meu pai, beijei suas mãos e o agradeci. Papai pensava em mim, mandava seus costumeiros incentivos. Beijei-o e abracei-o.

Olhei para nossa casa do sítio.

—Posso, agora, passar pela parede?

Com a afirmativa, fui em direção á casa, mas perto da parede parei.

—Como faço?

—É simples, pensa que o fará e faça.

Realmente é simples, passei diversas vezes pelas paredes e portas.

—Patrícia, vamos até a casa de sua tia Vera? Talvez, se tudo der certo, poderá você mesma ditar uma mensagem a sua mãe — Artur falou contente.

—Transmitir uma mensagem? Pela psicografia? Mas eu não sei!

—Aprende — Maurício respondeu calmamente.

“Como será ditar uma mensagem”, pensei. Curiosa dei a mão a eles e volitamos rápido.

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