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DOGMA
Que são os dogmas e os mistérios? Busquemos o sentido das religiões!
A religião se cerca de um aparato sombrio e temível. Tudo acredita-o ela, está sabido,
conhecido, descoberto. Profundo erro!
A verdade não pode separar-se de Deus, não pode ser um símbolo. É um raio luminoso,
escapado da fronte divina. Temos Deus em nós, mas não pelo seu corpo de carne (a hóstia).
Por intermédio de seus mensageiros é que se cumpre o sacrifício divino. Deus está em
nós pelas irradiações de sua verdade. Esta, porém, não é conhecida: é esperada.
Precisamos saber amá-la, para que ela desça até nós.
O homem é perfectível ao infinito. Comete grave falta quem lhe quebra as perspectivas
do futuro. A misericórdia divina lhe dá, com a esperança, a reparação sempre possível de suas
faltas.
A Igreja diz ao homem: Deixa que te guiemos. Esquece-se de que assim se torna
responsável para com Deus pela conduta das almas. E se a Igreja fôsse Deus, Deus seria
responsável pela conduta das almas. É falso! O homem poderia em tal caso adormecer na
confiança de estar sendo suficientemente dirigido.
A Igreja foi muitas vezes madrasta para os que lhe viviam no seio. Mutilou todas as
inteligências que passavam de um certo nível. Perderam-na o amor à matéria, o poder
temporal, o desejo da dominação. Invadiu-a a embriaguez do poder. Bebeu pela taça do
orgulho. Será essa a causa de sua decadência, pois que a matéria não pode dar vida.
O poder temporal esboroou-se; com os outros o mesmo sucederá. Respeitemos a Igreja,
como se respeitam pessoas idosas, que fizeram grandes coisas na mocidade. Hoje, as
multidões se afastam dela. As naves, a não ser por ocasião das pomposas cerimônias, se
conservam solitárias.
A Igreja não mais ama bastante, por isso é que morre. Amar cada vez mais - eis todo o
pensamento do Cristo, que amou os homens mais do que a si mesmo, como Joana (D'Arc)
amou a França. É o que a Igreja não mais sabe fazer. Cumpria-lhe governar as almas pelo
amor e não pelo medo. João disse: "Amai-vos, eis toda a religião!"
O Cristo amou a Tomé, que duvidava, até ao ponto de se materializar e apresentar-lhe
as chagas, para que fôssem por ele tocadas. A Igreja, porém, não ama os que duvidam;
repele-os. Para que uma fé seja real, é preciso que o amor a torne fecunda. O amor é a
alavanca da Humanidade. A Igreja o esqueceu e por isso está destinada a enfraquecer-se
de mais em mais.
Devemos saudá-la por haver recebido outrora o pensamento do Cristo. Presentemente,
já deu tudo que podia dar; fêz o seu tempo. Não compreendeu o século atual. Julga que tudo
dorme no passado. Mas, em lugar de remexer a cinza das velhas recordações, é necessário
pensar nos deveres para com os homens do presente e preparar os tempos futuros.
Nada de ódio! Devemos lamentá-la e deixar que se extinga suavemente. Não se clama
contra os que vão morrer. Que a paz seja com ela! Que todos orem por ela!
Quanto à sua atitude no que concerne a Joana, assim se explica: A Igreja quis fazer uma
santa popular e, por esse modo, readquirir um pouco da perdida influência. Como o patriotismo
se vai enfraquecendo, ela tenta apoderar-se desta ideia, em proveito próprio. Apanha a
espada de Joana e faz dessa espada uma arma para combater os que ela, a Igreja, considera
seus inimigos. Mas, não são suas antigas vítimas que poderão defendê-la neste momento.
Manifestação mais material do que espiritual! Deverá proceder de outra maneira: instaurar
um novo processo, para definir as responsabilidades, condenar Cauchon e livrar Roma. O
processo de reabilitação assentou sobre os textos. Não incriminaram os juízes; reconheceram,
mantiveram-lhes a vitalidade. Não basta trovejar contra eles do alto do púlpito; fora necessário
um ato mais solene. AIgreja não teve a coragem de suas ações e de sua política.
Jerônimo de Praga
Julho de 1909, pela incorporação.
Extraído do livro "Joana D'Arc" - Capítulo XV
Léon Denis
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A Igreja
A Igreja vai-se. São factícias sua energia, sua orientação. A energia lhe vem da
desorganização dos partidos que se lhe opõem. Só ela permanece de pé em face das
materialistas. Só ela representa a alma em face do materialismo e da ciência. No
momento em que a Ciência consagrar a alma, a Igreja desmoronará. A Igreja é um melhor
relativo. Todos os que sentem o enlevo da vida da alma se refugiam nela, porque não tem
outra coisa. Muitas almas não podem formar para si uma fé pessoal; pedem a outros a
crença e acham mais cômodo dirigir-se à Igreja. Mais vale crer no Catolicismo , do que não
crer em coisa alguma. Mas, no dia em que se constituir a filosofia científica, artística e literária,
que há de sintetizar o ideal, a Igreja atual desaparecerá. A Igreja recebeu em seu seio as artes
e as letras, não a ciência. Ela rejeita uma parte do saber; por isso mesmo, terá que ceder o
passo a uma filosofia que abrangerá todo o saber humano. Dizemos filosofia - e não religião -
porque esta última palavra tem hoje o sentido de seita.
A Reforma seduziu algumas almas, porque permitia unir a moral à religião. Tudo era então
consentido pela Igreja, contanto que cada um soubesse obter o perdão pelo dinheiro. A venda
das indulgências era pública. Todo o mundo via, de um lado, a moral; de outro, a religião. A
questão moral abalou a Igreja; hoje, será a Ciênica quem acabará com ela. No momento que
os homens "souberem", a Igreja virá abaixo.
Não choramos o seu desaparecimento. Ela não representa, na História, mais do que uma
das formas da idéia religiosa em marcha. Fêz o bem e preferimos ver esse bem a notar o mal
que causou; acima de tudo, apraz-nos ver nela a grande figura do Cristo, seu fundador.
Veremos sempre, na missa, o Evangelho, que lhe é ponto central e não a elevação da hóstia,
como muitos acreditam. Amamos esse Evangelho; é ele que ainda hoje nos atrai a algumas
catedrais. Amamos a Igreja, veneramo-la, como veneramos tudo o que haja proporcionado à
Humanidade alguma coisa de grande.
Mais tarde, maior veneração consagraremos àquele que há de trazer uma nova palavra
de vida, ao Espírito de Verdade, anunciado desde longo tempo. Será um homem de ciência,
um sábio, um filósofo e, sobretudo, um homem de delicada sensibilidade. Os Maometanos o
esperam também. Todas as religiões o prometeram. É mister que todas as almas se sintam
desorientadas, que todas experimentem a necessidade de sua vinda. A dissolução é mais
profunda do que na época em que o Cristo apareceu e também o desejo de saber. Todos os
povos se acham oprimidos pelos governos. A hora se aproxima.
Ninguém deve levantar-se contra o que se vão, contra a Igreja. O Cristo não clamou contra
a religião. Lembrai-vos de que ele pronunciou estas palavras por demais esquecidas: "Aos
Judeus, primeiramente!" Nós, também, por nossa vez, dizemos: "À Igreja, primeiramente!" pois
é ela que encerra maior número de espiritualistas; é ela quem deles maior necessidade tem.
A nova religião se elevará sobre as bases do Cristianismo, como o Cristianismo se elevou
sobre o Judaísmo. A antiga Igreja, como a lei de Moisés, será renovada, melhorada.
Jerônimo de Praga
Junho de 1909, pela incorporação.
Extraído do livro "Joana D'Arc" - Capítulo XV
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